Acórdão nº 36/19.8PEFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução13 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, n.º 36/19.8PEFAR, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central Criminal de Faro – Juiz 2, foram submetidos a julgamento os arguidos (...) e (...) melhor identificados nos autos, tendo sido proferido acórdão, em 02/12/2020 – que foi depositado nessa mesma data – com o seguinte dispositivo «(…) acordam os Juízes que compõem o Tribunal Colectivo em: I) Absolver a arguida (...) da prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, na forma tentada; II) Absolver a arguida (...) da prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, na forma tentada; III) Absolver o arguido (...) da prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada (NUIPC 35/19.0PEFAR); IV) Absolver o arguido (...) da prática de um crime de furto qualificado (NUIPC 37/19.6PEFAR); V) Absolver o arguido (...) da prática de um crime de ameaça agravada, na forma continuada; VI) Absolver o arguido (...) da prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada, mas alterando a qualificação jurídica, condená-lo, como reincidente, pela prática de um crime de furto, na forma tentada (art.º 203º, n.º 1 e 2 do Código Penal), na pena de 6 meses de prisão, e num crime de violação de domicílio, previsto e punido pelo art.º 190º, n.º1 e 3 do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão (NUIPC 36/19.8PEFAR); VII) Condenar o arguido (...), como reincidente, pela prática de um crime de furto, previsto e punido pelo art.º 203º, n.º 1 Código Penal, na pena de 6 meses de prisão (NUIPC 1580/19.2PBFAR); VIII) Condenar o arguido (...), como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado na forma tentada, previsto e punido pelo art.º 203º e 204º, n.º 2, al. e) Código Penal, na pena de 1 ano e 4 meses de prisão (NUIPC 1654/19.0PBFAR); IX) Condenar o arguido (...), como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art.ºs 203 e 204º, n.º2, al. e) do Código Penal, na pena de 3 anos e 10 meses de prisão (NUIPC 1650/19.7PBFAR); X) Condenar o arguido (...), como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art.ºs 203 e 204º, n.º2, al.e) do Código Penal, na pena de 3 anos e 10 meses de prisão (NUIPC 1636/19.1PBFAR); XI) Operar o cúmulo jurídico das penas em que o arguido (...) é condenado e condená-lo na pena única de 6 anos e 4 meses de prisão; XII) Determinar a devolução das meias apreendidas ao arguido, ficando o mesmo notificado para reclamar a sua entrega no prazo de 60 dias, sob pena de não o fazendo, serem as mesmas consideradas perdidas a favor do Estado; XIII) Determinar a devolução da pedra da calçada à via pública; XIV) Determinar a notificação dos proprietários incertos para reclamarem a entrega da power bank, sob pena de não o fazendo no prazo legal, ser a mesma considerada perdida a favor do Estado; XV) Determinar que o arguido aguarde os ulteriores termos do processo sujeito a prisão preventiva; XVI) Declarar extinta a medida de coacção a que a arguida (...) se encontra sujeita; XVII) Condenar o arguido no pagamento das custas judiciais, fixando-se a taxa de justiça, em 4UC, nos termos do disposto no artigo 513.º do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e respectiva tabela III anexa, à qual acrescem as despesas e encargos a que deu azo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 514.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e 16.º e 17.º do Regulamento das Custas Processuais.

(…).» 1.2. Inconformado com o decidido, recorreu o arguido (...) para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões: «1 - Foi o recorrente condenado, como reincidente, nos presentes autos, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 203º e 204º n.º 2, alínea e) do Código Penal, na pena a três anos e dez meses de prisão (NUIPC 1650/19.7PBFAR) e; Pela prática como reincidente de um crime de furto qualificado p. e p. pelo art.º 203º e 204º n.º 2, alínea e) do Código Penal, na pena a três anos e dez meses de prisão (NUIPC 1636/19.1PBFAR).

2 - É deste Acórdão condenatório que nos permitimos discordar, com o devido respeito pela opinião contrária, no que à medida concreta das penas aplicadas respeita.

3 - Sempre com o referido respeito, entendemos que o Tribunal a quo não terá feito, na nossa óptica, uma adequada interpretação e aplicação do Direito aos factos ora em causa.

4 - A aplicação ao recorrente de uma pena de 3 anos e dez meses de prisão efetiva, em cada um dos NUIPC’s é desprovida de qualquer fundamento perante ausência de prova.

5 - Na determinação da medida da pena, há que considerar conjuntamente os factos e a personalidade do arguido (art.º 77º, n.º 1 do Código Penal).

6 - No entanto, e sempre com o devido respeito, entendemos que o tribunal a quo não terá ponderado exaustivamente todos estes factores, dando clara primazia aos antecedentes criminais do recorrente em detrimento do exame critico das provas ou ausência delas.

7 - Em matéria de prova, no processo penal, vigora no nosso ordenamento jurídico, o princípio da livre apreciação, previsto no artigo 127º. do Código de Processo Penal, nos termos do qual, salvo existência de prova vinculada, como a prova pericial, face ao valor que lhe é reconhecido no artigo 163º. nº. 1 do CPP, o tribunal decide quanto ao mais de acordo com as regras da experiência e da livre convicção.

8 - No entanto, o princípio da livre da apreciação da prova pressupõe e exige uma indicação dos meios de prova e um complementar e exigente exame crítico.

9 - No caso presente, a prova produzida foi insuficiente para provar os indícios da acusação no que diz respeito aos dois crimes de furto qualificado dos NUIPC’s 1650/19.7PBFAR e 1636/19.1PBFAR.

10 - No Processo 1650/19.7PBFAR, o Tribunal a quo deu como provados os factos constantes do ponto 20 a 24 do Douto Acórdão recorrido: “20. No período compreendido entre ao 20:20 horas e as 22:15 horas do dia 7 de Dezembro de 2019, o arguido (…) introduziu-se através de uma janela de correr no interior da residência de (…), situada na Praceta (…), e de lá retirou e fez seus os seguintes bens: a. um envelope com €1.300,00 em notas do Banco Central Europeu, que se encontrava no interior da gaveta da cómoda do quarto; b. um relógio Montblanc, Meisterstrck, prateado, com os dígitos 48 e 10 entre os botões, no valor de €1.500,00, que se encontrava no interior da gaveta da comoda do quarto; c. um canivete de marca Navaja Vitorinox 9023Outider, preto, no valor de €60,00, que se encontrava no interior da gaveta da cómoda do quarto, e que foi recuperado; d. um fio de ouro com uma medalha, de valor não apurado; e. um par de luvas castanhas, marca Polo Ralph Laurent, tamanho L, no valor de €55,00, que se encontrava no interior da gaveta de cómoda do quarto, e que foram recuperadas; f. um telemóvel Samsung Galaxy, A2, no valor de €100,00, que se encontrava no interior da gaveta da cómoda do quarto; g) uma quantia monetária de, pelo menos, 65 dólares americanos que ase encontrava no interior da gaveta da cómoda do quarto; h. um computador portátil de marca Apple, Macbook Pro 13”, no valor de €800,00, e uma mala de computador Tumi, Alfa 2, com iniciais PHW gravadas, no valor de €400,00, pertença de (…) e que se encontrava na sala de estar, i. um computador portátil de marca Apple, Macbook Pro 13”, no valor, em novo, de €1.349,63, com o número de série C02SP4NBFVH3, pertença de (…).

  1. O arguido (...), agiu conforme acima descrito, livre, voluntária e conscientemente, com o propósito concretizado de se introduzir naquela residência através de uma janela e de se apropriar de objectos e quantias monetárias de valor superior a €102,00 que sabia não lhe pertencerem e que agia contra a vontade e sem autorização dos respectivos donos, o que representou, quis e conseguiu.

  2. O arguido (...) sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei Penal, que podia e devia ter observado”.

    11 - O recorrente em Audiência de Julgamento remeteu-se ao silêncio, no entanto, em sede de 1º. Interrogatório Judicial de Arguido Detido, o mesmo declarou que havia adquirido os objetos que se encontravam na sua posse a um terceiro.

    12 - Conforme resulta no Douto Acórdão “(…) não há prova testemunhal ou pericial que coloque o arguido (...) no interior desta residência.” 13 - Com efeito, conforme se sublinha no Acórdão da Relação do Porto de 23-10-2013, o simples facto de o recorrente ter na sua posse objetos furtados, ainda que cinco dias após os factos, não é suficiente como indício seguro e inequívoco, capaz de fundar um juízo de certeza para além de toda a dúvida razoável, e não de mera probabilidade, de que foi ele o autor do furto.

    14 - Pese embora se possa cogitar, á luz das regras da experiência, que seja o recorrente o autor do furto, é também razoável a dúvida que resulta de poder ter sido outro o autor do ilícito e de que só posteriormente os objetos entraram na posse do arguido.

    15 - Não basta para se alcançar um juízo de certeza razoável quanto á culpabilidade do recorrente o facto de o mesmo ter sido encontrado na posse de alguns objetos furtados, podendo igualmente admitir-se a hipótese de lhe terem sido dados por terceiros ou de os ter encontrados abandonados, ou até mesmo comprado a um terceiro.

    16 - Acresce que, daquilo que foi supra exposto, o direito do recorrente ao silêncio na Audiência de Julgamento não o pode prejudicar, não sendo sobre ele que recai o ónus de provar que os objetos furtados estavam na sua posse por outro motivo que não a autoria do furto, cabendo antes à acusação o ónus de provar o contrário, pelo que a dúvida que a esse respeita se suscita não o pode prejudicar, devendo sim, beneficiá-lo.

    17 - Assim sendo, entendemos que quanto ao Processo nº. 1650/19.7PBFAR, impõe-se a aplicação ao recorrente do princípio do in dúbio pro reu, pela...

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