Acórdão nº 54843/19.6YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I.

Relatório X - Sociedade Unipessoal de Carpintari, Lda.

intentou contra Y Construções Lda procedimento de injunção, alegando, para tanto, que no exercício da sua actividade foi contratada pela Ré para efectuar uma empreitada de colocação de cozinhas, portas, roupeiros, móveis de casa de banho, escadas, rodapés, entre outros produtos de mobiliário, num empreendimento imobiliário que consistiu numa obra de requalificação de um edifício sito em Viana do Castelo, tendo a Ré aceitado os dois orçamentos que apresentou para esse efeito, no valor de €19.386,00 e de €5.773,00, respectivamente.

Mais alega que iniciou os trabalhos no dia 18 de janeiro de 2019 nas várias fracções do prédio, tendo dado por concluídos os trabalhos no início do mês de abril do mesmo ano, mas que se encontra em dívida o valor total de €6.998,00, por referência às facturas n.ºs 2/415 e 2/454, vencidas, respectivamente, em 18/02/2019 e em 01/04/2019, e que apesar de diversas vezes interpelada para o efeito a Ré ainda não pagou tal montante.

Pede por isso a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €6.998,00, acrescida dos juros de mora vencidos, contados à taxa legal desde 01/04/2019, e dos vincendos, estes contados desde a citação, em ambos os casos até integral pagamento.

A Ré deduziu oposição alegando que a Autora não executou a totalidade dos trabalhos que lhe foram contratados – e que, alguns deles, apresentam defeitos – e que abandonou a obra, pelo que calculou e aplicou as multas previstas no contrato, devidas pelos atrasos verificados.

Mais alega que, na sequência da instalação e operação de fixação da estrutura e móveis de cozinha do T0 do 2.º andar, por incúria e negligência na execução da furagem da parede para fixação, os funcionários da Autora causaram danos (um furo) no depósito da estrutura do depósito de água da sanita, do que resultou infiltração de água no edifício que penetrou no apartamento do piso inferior, causando danos diversos que obrigaram e obrigam a intervenção imediata e urgente de reparação, no que teve que despender a quantia de €6.200 + IVA, que por compensação reclama nos presentes autos.

Conclui pugnando pela improcedência da acção – e consequente absolvição do pedido – ou, sem prescindir, pela procedência da excepção de compensação invocada.

Notificada para o efeito, veio a Autora responder às excepções invocadas na oposição, contrapondo, por um lado, que não acordou a inclusão de qualquer cláusula penal no contrato celebrado com a Ré e, por outro, que executou a obra sem quaisquer defeitos.

Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Pelo exposto, na procedência parcial da acção, o Tribunal decide condenar a R. Y Construções Lda. a pagar à A. X - Sociedade Unipessoal de Carpintari, Lda. a quantia de 6.998,00 € (seis mil novecentos e noventa e oito euros) contra a eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18 do elenco de factos provados por parte da A., absolvendo-se a R. do mais peticionado.

Custas a cargo de A. e R., fixando-se as mesmas em partes iguais (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 528.º, n.º 4, e 607.º, n.º 6, todos do CPC).

Fixo o valor da causa em 7.225,89 € – cfr. artigos 297.º, n.º 1, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.

Registe e notifique”.

Após a prolação da sentença a Ré, por requerimento apresentado em 01/07/2020, veio arguir a nulidade da gravação da audiência por, pretendendo recorrer da sentença proferida, e fazê-lo quanto à matéria de facto, ter requerido, presencialmente, no dia 25 de Junho de 2020, cópia da mesma, tendo constatado que dela não constava a acareação entre o legal representante da A. e a testemunha F. P., realizada no passado dia 12 de Fevereiro de 2020, durante a tarde.

Em 07/07/2020 foi proferido despacho considerando que “(…) Posto isto, a alegada falta da gravação ocorreu na sessão de audiência final realizada no dia 12.02.2020, pelo que o prazo previsto no n.º 3 do artigo 155.º do CPC terminou em 14.02.2020 e o do n.º 4 em 24.02.2020.

Acontece que só no dia 1.07.2020 é que a A. veio arguir a falta da gravação nos termos acima descritos, ou seja, num momento em que o prazo previsto no n.º 4 do artigo 155.º do CPC já tinha decorrido, com a consequente sanação da eventual nulidade decorrente da falta da gravação.

Em face do exposto, conclui-se que o requerimento apresentado pela A. é extemporâneo, o que tem como consequência o indeferimento da pretensão formulada”.

Inconformada, apelou a Ré da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES 1. A recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal a quo que condenou a 1.ª Ré e aqui Recorrente, no pagamento à recorrida da quantia de €6.998,00 contra e eliminação simultânea dos defeitos identificados no ponto 18 do elenco de factos provados por parte da A. mas que julgou improcedente a existência de Credito a favor da recorrente, resultante da aplicação da clausula penal objecto do contrato, e operando e julgando procedente a respectiva compensação de créditos.

  1. O meritíssima Juiz a quo fez incorrecta apreciação e julgamento dos factos e aplicação do Direito aos mesmos.

    Questão Previa, Da Nulidade falta gravação prova: 3. O recorrente arguiu os termos e para os efeitos previstos no arts 155.º, n.4 do CPC, conjugado com o disposto no art. 640.º e 195.ºdo CPC a nulidade da Gravação da Audiência de Julgamento nos termos e com os fundamentos seguintes: A Ré, pretendendo recorrer da sentença proferida e fazê-lo quanto à matéria de facto, requereu, presencialmente, no dia 25 de Junho de 2020, ao tribunal copia da gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento para poder cumprir o obus estatuído na alínea b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC. Apos respectiva analise constatou que da gravação requerida não constava a acareação entre o Legal representante da A e a testemunha F. P. realizada no dia 12 de Fevereiro de 2020, na parte da tarde ada audiência de julgamento – cfr teor da acta de audiência de julgamento cujo conteúdo se da como integralmente reproduzido.

  2. Na verdade, “(…) Finda a inquirição da testemunha (F. P.) , foi pedida a palavra pelo Dr. N. M. e, sendo-lhe concedida, no seu uso fez um REQUERIMENTO para a acta, no sentido de requerer a acareação da testemunha acabada de depor com o legal representante da autora, pelo que foi concedida apalavra ao Dr. P. V. que, no seu uso respondeu a tal REQUERIMENTO tendo no mais dito nada ter a opor à requerida acareação, requerimento que o Meritíssimo Juiz de Direito, por DESPACHO, deferiu, conforme se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 16 horas 50 minutos e 32 segundos e o seu termo pelas 16 horas 54 minutos e 03 segundos. * Após, o Meritíssimo Juiz de Direito continuou com a produção da prova: ACAREAÇÃO ENTRE A TESTEMUNHA e o LEGAL REPRESENTANTE DA AUTORA (artigo 523.º, do Código de Processo Civil) F. P. e P. P., devidamente identificados nos presentes autos. Foram advertidos que continuam sob juramento, uma vez que já se encontram ajuramentadas. As suas declarações encontram-se gravadas através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 16 horas 55 minutos e 37 segundos e o seu termo pelas 17 horas 11 minutos e 29 segundos.” 5. Acontece que o depoimento/ declaração de parte daquelas duas testemunhas (se mostrou, afinal, de grande importância para a decisão da matéria de facto, como resulta expressamente da respectiva fundamentação na douta sentença proferida e acareação entre ambas decisiva para aferir a credibilidade das mesmas e sentido da decisão.

  3. Por isso a Ré se dirigiu logo ao tribunal para verificar se havia lapso na gravação facultada tendo sido constatado que, na verdade, da gravação das sessões de audiência de julgamento, fora omitida e estava em falta a gravação da identificada acareação.

  4. a impossibilidade de ouvir esses depoimentos, de inequívoco relevo no processo, conduz a que, por um lado, a parte que discorda da decisão proferida sobre a matéria de facto e recorre não possa indicar as passagens da gravação que alicerçam essa sua discordância, e leva, por outro, a que o Tribunal da Relação fique impedido de os sindicar e valorar convenientemente, não podendo cumprir a finalidade legal pretendida com o recurso relativamente à reapreciação da prova gravada.

  5. A inexistência do registo magnético dos depoimentos, aqui em concreto do teor da acareação, produzidos na audiência de julgamento consubstancia omissão de acto que a lei prescreve e que tem óbvia influência no exame e decisão da causa, uma vez que impede ou condiciona o cumprimento do artigo 640.º do Código de Processo Civil, vindo, por isso, a constituir uma nulidade secundária, de harmonia com o estatuído no artigo 195.º do mesmo diploma legal.

  6. Nulidade que expressamente se arguiu.

  7. Foi proferido despacho que indeferiu a nulidade arguida – cfr despacho proferido nos autos e transcrito nas alegações.

  8. Esta decisão importa uma interpretação do preceito do art. 155.º n.º 4 que restringe os direitos das partes e lhes impõe um ónus de controlo dos actos materiais de competência do tribunal e da secretaria que não lhe deve competir.

  9. É verdade que “a omissão ou deficiência das gravações é, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, um problema que deve ficar definitivamente resolvido ao nível da primeira instância, quer pela intervenção oficiosa do juiz que preside ao ato, quer mediante arguição dos interessados”.

  10. Porém e como se refere tal obrigação impende tanto sobre o juiz oficiosamente como sobre as partes. No entanto, deve ser entendido como permitindo às partes, como o fez a recorrente, arguir a respectiva nulidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT