Acórdão nº 1996/15.3T8SLV.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | FERNANDO PINA |
Data da Resolução | 26 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE ÉVORA: I. RELATÓRIO A – Nos presentes autos de Processo de Recurso de Contra-Ordenação, que com o nº 1996/15.3T8SLV, correm termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Competência Genérica de Silves - Juiz 2, (...), residente na Rua (…), impugnou judicialmente a decisão administrativa proferida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve que o condenou numa coima no valor de € 20.000,00, pela prática de uma contra-ordenação, prevista na alínea a), do nº 3, do artigo 37º, do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei nº 239/2012, de 2 de Novembro, por violação das alíneas b), d) e e), do nº 1, do artigo 20º, do mesmo diploma, conjugado com o artigo 22º, nº 4, alínea a), da Lei nº 50/2006 de 29 de Agosto, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 89/2009, de 31 de Agosto, e na sanção acessória de reposição do terreno nas condições em que se encontrava anteriormente à intervenção ou na regularização da construção erigida ilegalmente – nos termos do nº 6, do artigo 37º, do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, conjugado com a alínea j), do nº 1, do artigo 30º, da Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto, com as alterações da Lei nº 89/2009, de 31 de Agosto, no prazo de 90 dias.
Enviados os autos ao Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Competência Genérica de Silves, remeteu-os a juízo, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1, do artigo 62º, do Regime Geral das Contra-Ordenações.
Realizada audiência de julgamento nesse tribunal, foi proferida sentença em 25 de Junho de 2020, que negou provimento ao recurso de impugnação e manteve a decisão recorrida, de aplicar ao recorrente a coima no valor de € 20.000,00, pela prática de uma contra-ordenação, prevista no artigo 37º, nº 3, alínea a), do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto e na sanção acessória de reposição do terreno nas condições em que se encontrava anteriormente à intervenção ou na regularização da construção erigida ilegalmente – nos termos do artigo 37º, nº 6, alínea e), do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, no prazo de 90 dias.
Inconformado com esta decisão, o arguido (...), dela interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição): A. O Recorrente entende que a meritíssima juíza não ordenou toda a prova necessária para a justa composição do litigio, B. Nomeadamente, ordenar fotografias obtidas através de voos aéreos ao local que provam o alegado nos presentes autos, C. Quando um acto tenha de ser anulado, anular-se-ão também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente, (artigo 195º, nº 2, 1ª parte, do Código de Processo Civil), pelo que, deverá ser dada assim também sem efeito a sentença proferida, requerendo-se a repetição da Audiência de Discussão e Julgamento quanto à prova viciada, nos termos do artigo 662º, nº 1 e nº 2, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil.
D. O processo administrativo contra-ordenacional rege-se, basicamente, pelos mesmos princípios que conformam o procedimento criminal e o procedimento administrativo sancionatório, nomeadamente pelo princípio da audiência prévia do interessado a realizar pela autoridade administrativa com competência para aplicar as penas (no caso a ANSR), sendo que por força deste princípio deve a autoridade sancionadora dar a conhecer aos interessados, não só os elementos de prova que irão fundamentar a sua decisão, como comunicar previamente ao arguido a pena que em concreto lhe tenciona aplicar, tudo antes de proferir definitivamente a decisão condenatória.
E. No caso aplicou a autoridade administrativa definitivamente a coima e a sanção acessória sem que a recorrente se tivesse podido pronunciar sobre as penas que, em concreto, aquela lhe pretendia aplicar, facto que vícia a decisão recorrida de nulidade, e que não foi tido em consideração pela meritíssima Juiz “a quo”.
F. O recorrente defendeu-se ainda alegando que nos termos do artigo 58º, nº 1, do Ilícito de Mera Ordenação Social, a decisão que aplique a coima e as sanções acessórias, deve conter sob pena de nulidade: a. A indicação dos arguidos; b. A descrição dos factos imputados; c. A indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d. A coima e as sanções acessórias.
G. Não é suficiente que a Câmara Municipal de Lagos afirme sucintamente os factos, é necessário explicar o porquê, in casu não se divisa o percurso lógico efectuado na senda de fixação dos factos dados por provados e, por outro lado, fixa-se a intenção do arguido, sem explicitar elementos concretos que sustentem tal conclusão.
H. A instância de recurso não é o local apto a suprir as insuficiências da fase administrativa do procedimento contra-ordenacional, sob pena de se desvirtuar o propósito da fase judicial, antes cabendo o ónus da reformulação e expurga dos vícios da decisão à entidade recorrida.
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O momento da apreciação judicial visa, primacial e quase geneticamente, sindicar da justeza da aplicação da sanção. Não proferir uma decisão ex-novo, pelo que, é nula a decisão da autoridade administrativa.
J. Por todo o exposto, deveria a sentença proferida ter sido de absolvição da arguida atenta as nulidades verificadas e existentes no auto de notícia.
K. No entanto, caso assim não se entenda, o que só por mero exercício de patrocínio se concede, sem conceber, entende a recorrente que não lhe deveria ter sido aplicada a coima, quando bastava no caso em apreço para cumprir as finalidades da punição uma pena de admoestação.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas., Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá a decisão recorrida ser revogada e, em consequência, substituída por outra que absolva a arguida.
Caso V. Exas. assim não entendam, o que só por mera hipótese de raciocínio se concebe, sem conceder, deve a coima aplicada ser substituída por uma pena de admoestação, por esta pena cumprir de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, fazendo-se assim Justiça.
O Ministério Público junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso interposto, concluindo por seu turno (transcrição): 1. Por decisão administrativa proferida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve foi o Recorrente condenado numa coima no valor de € 20.000,00, pela prática de uma contra-ordenação, prevista na alínea a), do nº 3, do artigo 37º, do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei nº 239/2012, de 2 de Novembro, por violação das alíneas b), d), e e), do nº 1, do artigo 20º, do mesmo diploma, conjugado com o artigo 22º, nº 4, alínea a), da Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 89/2009, de 31 de Agosto, e na sanção acessória de reposição do terreno nas condições em que se encontrava anteriormente à intervenção ou na regularização da construção erigida ilegalmente, nos termos do nº 6, do artigo 37º, do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, conjugado com a alínea j), do nº 1, do artigo 30º, da Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto, com as alterações da Lei nº 89/2009, de 31 de Agosto, no prazo de 90 dias.
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Discutida a causa, decidiu o Tribunal “a quo” julgar improcedente a impugnação judicial de decisão administrativa apresentada pelo Recorrente, decidindo não revogar a mesma, mantendo tal decisão nos seus precisos termos.
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Inconformado com a mesma, o Recorrente interpôs o presente recurso, pugnado, em síntese, pela nulidade da sentença e da decisão administrativa, bem como pela aplicação, pelo Tribunal “a quo”, de uma admoestação.
DA NULIDADE DA SENTENÇA 4. Defende o Recorrente que o Tribunal “a quo” não ordenou toda a prova necessária para a justa composição do litígio.
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Não se vislumbra, face à fundamentação transcrita na sentença recorrida e que se subscreve na íntegra, que tivesse o Mm. Juiz “a quo” de ordenar qualquer produção de prova adicional (que, ressalve-se, nem sequer foi requerida pelo Recorrente em sede própria).
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Resulta claro, sem margem para qualquer dúvida, que o Tribunal “a quo” não teve quaisquer dúvidas em considerar provados os factos que fundamentam a confirmação da decisão condenatória da autoridade administrativa, inexistindo omissão de pronúncia.
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Não poderá a sentença proferida ser declarada nula e, consequentemente, ser repetida a audiência de discussão e julgamento, por inexistir qualquer violação do disposto nos arts. 195º, nº 2, 1ª parte, 615º, nº 1, al. d) e 662º, nºs 1 e 2, als. b) e c), todos do CPC, não merecendo o recurso interposto provimento.
DA NULIDADE DA DECISÃO ADMINISTRATIVA 8. Não é permitida a aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória sem antes se ter assegurado ao visado a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre (art. 50º, do RGCO).
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Porém, se o impugnante se prevalecer na impugnação judicial do direito preterido (abarcando, na sua defesa, os aspectos de facto ou de direito omissos na notificação mas presentes na decisão/acusação), a nulidade considerar-se-á sanada.
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Em sede de sentença, o Mm. Juiz aferiu das correctas notificações efectuadas ao Recorrente referindo: “Conforme resulta de fls. 28 e 38, o arguido foi notificado do teor do auto de notícia, bem como da contra-ordenação que lhe era imputada e sobre a sanção em que incorria, verifica-se que não foi preterida qualquer formalidade legal, tendo sido respeitadas as formalidades essenciais à defesa e ao direito de participação.” 11. Mais se poderá constatar que, na sequência dessa notificação, o recorrente exerceu o seu direito de defesa, conforme consta de fls. 39 e seguintes.
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Não só o Recorrente teve possibilidade de se defender, como a autoridade administrativa lhe comunicou previamente as sanções que, em concreto, lhe iriam ser aplicadas, tendo este exercido o seu direito de...
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