Acórdão nº 1285/17.9T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução03 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 1285/17.9T8PTG.E1 Comarca de Portalegre Juízo Central Cível e Criminal de Portalegre – Juiz 3 Apelante: (…) Apelado: (…) *** Sumário do Acórdão (Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC) (…) * Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte: I - RELATÓRIO (…), solteiro, maior, aposentado, residente na Rua (…), n.º 43, 7480 - 328 Ervedal, NIF (…), intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra (…), casado, residente na Rua (…), n.º 24, 7480, Ervedal, pedindo a condenação do Réu a restituir-lhe a quantia de € 52.744,36, correspondente ao montante que este último levantou ou transferiu da conta bancária identificada no artigo 7º da petição inicial para outra, ou outras, a que acrescem juros legais desde a data da citação até integral pagamento.

Subsidiariamente, pediu a condenação do Réu a restituir-lhe o montante de metade desse valor, ou seja, € 26.372,18, que o R. levantou ou transferiu da conta bancária identificada no dito artigo 7º para outra, ou outras, a que acrescem juros legais desde a data da citação até integral pagamento.

Cumulativamente com qualquer um dos pedidos atrás enunciados, pediu ainda a condenação do Réu a indemniza-lo na quantia de € 5.000,00, pelos danos não patrimoniais, acrescida de juros legais a que acrescem juros legais desde a data da citação até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, o seguinte: Tem 92 anos, é solteiro e não tem, nem nunca teve, filhos, sendo tio do Réu, acrescentando que desde 18 de Setembro de 2013 que ele e o Réu são titulares da conta bancária n.º (…), a que corresponde o IBAN PT50 (…), do balcão de Avis do Banco “(…)”, “no regime de movimentação solidária”; Disse ainda que todo o dinheiro depositado nessa conta foi fruto do seu trabalho, figurando o Réu como cotitular dessa conta bancária apenas por precaução, dada a idade avançada que tem, não ter filhos e o Réu ser seu sobrinho, mais referindo que em 03 de Abril de 2017 o Réu transferiu dessa conta conjunta nº (…) para uma conta pessoal dele, sem a sua autorização e conhecimento todo o valor aí depositado à data, ou seja € 52.744,36, pelo que em 07 de Novembro de 2017 enviou-lhe, através de mandatário judicial, uma carta registada com aviso de receção a interpelá-lo para, em 8 dias seguidos, proceder à devolução dos € 52.744,36, carta essa que o Réu recebeu em 09 de novembro de 2017, recusando-se, porém, aquele a devolver-lhe o montante de € 52.744,36 que levantou da dita conta bancária.

Concluiu mencionando que em consequência dessa conduta do Réu viu-se de um dia para outro sem o dinheiro que tinha poupado durante uma vida inteira, o que lhe causou perturbação, instabilidade e ansiedade.

* Regularmente citado o Réu contestou, arguindo a falta de mandato do advogado do Autor, afirmando que este último desconhece a propositura da presente ação, mais alegando ainda e em síntese que o Autor sempre quis ter com ele, em comum, o seu dinheiro para ser tido como pertença de ambos e ele, Réu, poder dispor dele livremente, esclarecendo que, além disso, a natureza da conta bancária onde o dinheiro se encontrava depositado permite a qualquer titular fazer movimentos sem a intervenção dos demais, sendo, pois, válida a transferência feita por si e irrelevante que o dinheiro tivesse sido ou não do Autor.

Concluiu, pedindo que seja julgada procedente a exceção dilatória invocada com a sua absolvição da instância e, em caso de prosseguimento dos autos, que seja a final julgada improcedente a ação e absolvido do pedido.

* Findos os articulados, foi designada data para realização da audiência prévia, na qual se revelou inviável a conciliação entre as partes, tendo sido indeferida a questão prévia de falta de mandato suscitada na contestação e fixados os temas da prova.

No decurso da audiência final o Autor apresentou um articulado superveniente, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 588.º e 589.º do Código de Processo Civil, o qual veio a ser admitido, tendo o Réu apresentado articulado de resposta impugnando os factos aditados pelo Autor.

Foram aditados temas de prova.

Na sequência de incidente suscitado na pendência dos autos foi nomeado curador provisório ao Autor que, notificado, ratificou todo o processado.

* Realizada a audiência final, seguiu-se a prolação de sentença que contêm o seguinte dispositivo: “Nesta conformidade, tudo visto e ponderado, decido julgar parcialmente procedente, por provada, a presente ação, e, consequentemente:

  1. Condeno o Réu (…) a restituir ao Autor a quantia de € 52.744,36 (cinquenta e dois mil, setecentos e quarenta e quatro euros e trinta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa civil vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento; b) Condeno o Réu (…) a pagar ao Autor a título de danos não patrimoniais quantia de € 3.000,00 (três mil euros), acrescida de juros de mora à taxa civil vencidos e vincendos desde a data da presente sentença até integral pagamento; c) Absolver o Réu do demais peticionado pelo Autor.

    Custas a cargo do Réu.

    Notifique e registe.” * Inconformado, veio o Réu apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação de Évora, alinhando as seguintes: “CONCLUSÕES 1- A lei exige que, em causas como a dos autos, a parte constitua advogado (artº 40º do C. P. Civil) e disciplina a forma como o mandato deve ser conferido (artigos 373.º, n.º 2, do C. Civil e 151.º, 152.º e 154.º do Código Notariado), sendo nulo o processado que se opere sem intervenção de advogado. A consequência é a absolvição da instância (artº 41º do C. P. Civil).

    2- É verdade que, antes de isso decidir, tem o tribunal de convidar a parte a constituir advogado; mas, entretanto, terá de anular todo processado. No caso, todo o processado subsequente à apresentação da petição inicial.

    Isso se requer.

    3- Ao apresentar-se como curadora, em representação do Autor, a nomeada Joana devia, também ela, ter constituído advogado, bem sabendo que não podia continuar a invocar a procuração passada pelo Autor.

    4- Ocorre, assim, mais um motivo de anulação do processado a operar a partir da nomeação da curadora, se não proceder a falta de mandato invocado nos precedentes pontos 1 e 2.

    5- A situação criada não pode deixar de constituir motivo de forte suspeição sobre quem seja o verdadeiro Autor, se o (…) ou a (…), e de perplexidade pela ligeireza com que da parte do Autor se está litigando com a prática de vícios.

    6- A sentença condenou em objecto diferente do que foi pedido. Pedia o Autor a condenação do Réu na restituição do dinheiro, por ter violado as regras do contrato de depósito feito com o Banco. E a Meritíssima Juiz condenou-o por prática de acto ilícito e também a coberto do enriquecimento sem causa. Cometeu-se a nulidade do artº 615º, nº 1, al. e), do C. P. Civil.

    7- Tivesse a acção sido proposta com base em responsabilidade aquiliana e o Réu teria invocado a prescrição por terem decorrido mais de 3 anos sobre a transferência do dinheiro para aplicação a favor do Réu.

    8- Deve anular-se a sentença e ordenar-se que a acção seja julgada de acordo com as regras da responsabilidade contratual. Julgada nessa perspectiva deve a acção ser julgada improcedente por o Réu ter actuado a coberto de acordo celebrado entre ele, o Autor e o Banco.

    9- O julgamento de facto não resiste, com o devido respeito, ao confronto dos factos entre si, pois que há contradição entre muitos deles e a prova documental e gravada obrigam à alteração de sentido, de mudança de provado para não provado ou vice-versa, de vários outros.

    10- Não pode o Tribunal decidir tendo por base que “... nem faria qualquer sentido que o Autor, pessoa de avançada idade, analfabeto e sem familiares diretos, decidisse “dar” a totalidade ou pelo menos uma grande parte do dinheiro que amealhou ao longo da sua vida, ficando desse modo total ou grandemente desprovido de qualquer aforro económico nos últimos anos da sua vida...” face à prova concreta (documental e testemunhal) existente nos autos, chegando a fazer referência às declarações de parte do Autor, do qual declarou a sua incapacidade judiciária.

    11- Assim e particularmente não pode dizer-se no ponto 9, que foi por precaução que o dinheiro ficou também em nome do Réu, quando do depoimento das testemunhas (...) e (...) resulta que o Autor sempre quis doar parte do dinheiro ao Réu; tal como nos pontos 16, 22 e 29 que foi sem conhecimento, sem autorização e sem consentimento do Autor que o Réu transferiu parte do dinheiro para conta sua, desde que no facto 6 se dá por assente (e bem porque resulta da documentação bancária) que a conta primitiva era solidária em termos de qualquer dos depositantes a poder movimentar, assim como o ponto 25. A manutenção da aplicação durante 4 anos e o recebimento dos juros permite a presunção judicial de que houve doação desse valor.

    12- Não pode também dizer o Autor nos pontos 28 e 30 que desconhecia que o Réu transferiu o dinheiro para aplicação só em seu nome e só em Abril de 2017 soube disso, desde que no ponto 15 se dá como assente que tal aplicação foi feita em 2013 e nos pontos 23 e 24 se diz que a mesma produzia juros e era a (…) que mensalmente os levantava, e os gastava em prol do Autor, bem sabendo de onde vinham.

    13- Por fim, não pode dar-se como não provado, como se vê das als. c), d) e f) dos factos não provados, que o dinheiro não foi depositado para ser de ambos os depositantes, nem o Autor doou, depois € 50.000,00 ao Réu, para ser dele embora com juros a favor do Autor, desde que testemunhas próximas de ambos, como são as testemunhas (…) e (…) asseveram que sabem que o dinheiro foi mesmo doado. Vale aí sobretudo a prova gravada, registada no texto, mas reforçada pela circunstância de o Autor e a sobrinha (…) fazerem mensalmente levantamento dos juros, bem sabendo, porque recebiam a documentação, que os mesmos vinham da aplicação a favor do Réu. E não pode, igualmente, por esta última...

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