Acórdão nº 145/15.2IDLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 28 de Outubro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO 1.
A sentença datada de 9 de janeiro de 2020 e proferida neste processo comum singular, decidiu: a) absolver os arguidos S., SA, C. e M. da prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, nos termos previstos no artigo 30.º n.º 2 do Código Penal; b) Condenar a arguida S., SA, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 7.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho de 2001), em conjugação com os artigos 98.º, 99.º, 100.º e 101.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aplicando-lhe uma pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); c) condenar a arguida S., SA, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 7.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho de 2001), em conjugação com os artigos e 19.º a 27.º e 41.º do Código de IVA, aplicando-lhe uma pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); d) condenar a arguida S., SA, pela prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, previsto pelos artigos 7.º, 105.º n. º5 e 107.º n. º1 e 2, todos do RGIT, aplicando-lhe uma pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); e) em cúmulo jurídico, condenar a arguida S, SA, pela prática dos crimes referidos em a) a d), numa pena única de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 (cinco euros); f) condenar o arguido C. pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 6.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho de 2001), em conjugação com os artigos 98.º, 99.º, 100.º e 101.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aplicando-lhe uma pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros); g) condenar o arguido C. pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 6.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho de 2001), em conjugação com os artigos e 19.º a 27.º e 41.º do Código de IVA, aplicando-lhe uma pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros); h) condenar o arguido C., pela prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, previsto pelos artigos 6.º, 105.º n. º5 e 107.º n. º1 e 2, todos do RGIT, aplicando-lhe uma pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros); i) em cúmulo jurídico, condenar o arguido C. pela prática dos crimes referidos em f) a h), numa pena única de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de 7,00 (sete euros); j) condenar a arguida M., pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 6.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho de 2001), em conjugação com os artigos 98.º, 99.º, 100.º e 101.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aplicando-lhe uma pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); k) condenar a arguida M., pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105.º, n.º 1, 2 e 4, 12.º, n.º 3 e 6.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho de 2001), em conjugação com os artigos e 19.º a 27.º e 41.º do Código de IVA, aplicando-lhe uma pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); l) condenar a arguida M., pela prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, previsto pelos artigos 6.º, 105.º n. º5 e 107.º n. º1 e 2, todos do RGIT, aplicando-lhe uma pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); m) em cúmulo jurídico, condenar a arguida M., pela prática dos crimes referidos em j) a l), numa pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 (cinco euros); 2.
Inconformados com estas condenações, interpõem os condenados o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 2.1. M a) Foi incorrectamente julgada a factualidade constante dos pontos 4 a 16, 18, 20, 21, 23, 24, 26, 27, 29 a 41, bem como o facto B da matéria dada como não provada; b) A arguida, ora recorrente, era, à data dos factos ilícitos, titular de órgão social da sociedade infractora, contudo não detinha o poder funcional sobre os mesmos; c) A convicção do Tribunal a quo, que fundamentou a sua motivação e condenação operada, não pode estar mais distante daquela que é a realidade e daquela que foi a prova produzida, sendo inclusivamente contrária a esta; d) O Tribunal a quo apoiou-se unicamente na presunção resultante do registo público que atribui à, aqui, recorrente os poderes e funções de Vice-Presidente do conselho de Administração da sociedade arguida para concluir que tais poderes e funções eram efectivamente exercidos por aquela, atribuindo-lhe o necessário domínio do facto penal; e) A presunção resultante do registo é ilidível; f) A prova produzida revela de forma clara que a recorrente nunca praticou os actos de gestão necessários ao bom (ou mau) funcionamento da sociedade arguida; g) O co-arguido C. continuamente aludiu para a gerência de facto exercida por Paulo Saraiva, excluindo-a do domínio de actuação da arguida; h) Quis o legislador responsabilizar individualmente o “respectivo agente” e não objectivamente o titular do órgão social, artigo 7.º, n.º 3, do RGIT, na medida em que podemos estar, como no caso dos autos, perante pessoas diferentes; i) Não obstante nenhuma das testemunhas conhecer ou alguma vez ter contactado com a arguida, aqui recorrente, (mas já sim com o seu filho) e o coarguido declarar que a gerência de facto era levada a cabo pelo filho da arguida foram tais elementos de prova desvalorizados pelo Tribunal a quo; j) Se nenhum trabalhador reconheceu o exercício de cargo de gestão à arguida M., se os técnicos oficiais de contas da sociedade e consultor afirmam nunca terem contactado com aquela, apenas com o arguido C., e se o próprio co-arguido C. afasta o exercício da gestão efectiva da arguida atribuindo-o ao seu filho, não pode o Tribunal a quo, a despeito destes elementos de prova, concluir que ainda assim aquela exerceu a gestão efectiva da empresa; l) O Tribunal a quo obliterou ilegalmente a vasta prova que ilidia a presunção resultante do registo de que a arguida exercia a gerência da empresa; m) A gerência de facto foi publicamente exercida pelo filho da arguida, conforme a conjugação das declarações prestadas, sob juramento, em sede de julgamento; n) É por meio de erro notório na apreciação da prova produzida que deu o Tribunal a quo como provado o exercício efectivo da gestão da sociedade por parte da arguida; o) Não deveriam ter sido dados como provados os factos que atribuem à arguida o exercício de actos de gestão, nomeadamente os relacionados com a prática dos crimes por que foi, a final, condenada; p) Não foi produzida prova de ter a arguida intervenção directa na execução criminosa e que se resignou ao resultado típico, querendo-o; q) No âmbito do Direito Penal os agentes dos crimes não são passíveis de serem alcançados por meio de deduções, diferentemente, deve ser produzida prova de quem é o agente e, dentro do possível, do elemento subjectivo que percorreu a sua conduta, o que não ocorreu; r) Nos termos do n.º 3, do artigo 7.º, do RGIT a responsabilidade da sociedade não exclui a responsabilidade individual dos respectivos agentes e estes não se confundem (não obstante o poder ser) com os titulares de órgãos sociais; s) É em sentido contrário à prova produzida que o Tribunal a quo dá como provado factos que imputem à arguida o exercício efectivo da gerência da sociedade, em geral, e, em particular, factos que imputem à arguida a prática dos crimes por que vem condenada; t) A factualidade do ponto 5 omite a concretização de produtos, serviços, preços e respectiva tributação. Mais, o valor de 9.061,78 € não encontra justificação em facturação respectiva nem existe nos autos prova cabal do recebimento por parte da sociedade dos efectivos valores tributáveis.
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Pelo que não deveriam ter sido dados como provados os pontos n.ºs 5, 6, 8 e 9 que se encontram incorrectamente julgados.
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O artigo 105.º, n.º 4, do RGIT consagra uma condição adicional de punibilidade.
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Pelo que a total e ilegal inércia do Estado em liquidar o seu crédito não pode agir como causa prejudicial à, aqui, Recorrente.
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O disposto no referido artigo 89.º do CPPT deveria ter sido considerado na decisão ora em crise, quanto mais aliado à interpretação do artigo 105.º, n.º 4, do RGIT no sentido em que configura uma condição objectiva de punibilidade, pelo que se consideram tais normas violadas.
aa) O ponto 20 da matéria dada como provada contém uma tabela com alegados valores mensais cujo pagamento, a título de contribuições para a Segurança Social, foi omitido. E é feita referência neste mesmo ponto ao valor global em dívida de 92.570,22 €, contudo tal soma não nos leva àquele valor, pelo que não se pode condenar de preceito.
bb) É omitida qualquer referência às concretas remunerações auferidas pelos trabalhadores e/ou gerentes da sociedade e montante concreto que, relativamente àquelas remunerações, terá sido retido e não entregue.
cc) A decisão em crise é totalmente omissa em relação aos concretos salários e respectivas quantias de IRS retidas e não pagas, o valor global em dívida a título de IRS imputado aos arguidos encontra-se sem qualquer referência factual...
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