Acórdão nº 4387/18.0T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelMANUEL CAPELO
Data da Resolução28 de Setembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - Juízo Central Cível de Leiria - Juiz 1- G..., D..., E... e B..., instauraram contra Banco B..., S.A., acção declarativa com forma de processo comum pedindo que o réu seja condenado a restituir e a pagar aos autores a quantia de €56.876,96 (cinquenta e seis mil oitocentos e setenta e seis euros e noventa e seis cêntimos), acrescida de juros à taxa supletiva legal, contados sobre €50.000,00, desde a citação e até integral e efetivo pagamento, bem como em custas e em procuradoria condigna.

Alegam para tanto que M..., era cliente do Banco réu e subscreveu o boletim de subscrição de uma obrigação “SLN 2006”, no valor nominal de €50.000,00 (cinquenta mil euros). O referido documento, denominado “Boletim de Subscrição”, sem qualquer numeração, um mero impresso válido para qualquer operação junto do Banco réu, foi colocado na frente do falecido marido da primeira autora, já preenchido à mão, e este limitou-se a assiná-lo, julgando que se tratava de uma variante de um depósito a prazo, só que mais bem remunerado. O falecido marido da primeira autora só subscreveu a aquisição do título aqui em causa por que lhe foi afiançado pelo Banco réu que o retorno da quantia subscrita era garantido pelo próprio Banco, uma vez que se tratava de um sucedâneo melhor remunerado de um depósito a prazo, com semelhantes características. Não foi dada ao falecido marido da primeira autora a nota informativa da operação. Todos os funcionários do Banco réu que lidavam com o falecido marido da primeira autora sabiam que o mesmo não pretendia aplicar as suas poupanças em qualquer outro produto que não um depósito a prazo e tinham perfeita consciência de que o mesmo nunca, em circunstância alguma, aceitaria subscrever um produto como aquele que está em causa nestes autos.

Ao subscrever aquele produto nunca passou pela cabeça do falecido marido da primeira autora – nem tal lhe foi alvitrado – de que o empréstimo só poderia ser reembolsado a partir de 8 de maio de 2016. Nunca o falecido marido da primeira autora teria aceitado subscrever uma obrigação “SLN 2006”, se lhe tivessem sido bem explicadas as características do produto que lhe estava a ser vendido e, sobretudo, se lhe tivessem sido mostrados os documentos n.ºs 8 e 9, nomeadamente nos capítulos “REEMBOLSO ANTECIPADO”; “LIQUIDEZ” e “SUBORDINAÇÃO”, bem como a ausência de garantia do Banco à subscrição, ainda por cima estando em causa uma diferença de menos de 2% na taxa de juro nominal.

Na contestação, a ré invocou a excepção de prescrição do direito dos autores e impugnou a matéria alegada pelos demandantes defendendo que nenhum dever de informação foi por si violado e que nada do que foi informado ao subscritor o induziu em erro ou engano uma vez que a aplicação em causa tinha, na altura, um risco semelhante ao de um depósito a prazo como era informado.

Os autores responderam à matéria da excepção.

Realizada a instrução do processo com realização de julgamento veio a ser proferida sentença que julgou a improcedente, por não provada, a excepção peremptória de prescrição invocada pelo Réu e julgou parcialmente procedente, por provada, a acção instaurada por G..., D..., E... e B... contra o Banco B..., S.A., e em consequência: Condenando o Réu a pagar aos Autores a quantia de 50.000€ (cinquenta mil euros), acrescida de juros, vencidos e vincendos, calculados sobre tal quantia, à taxa legal em vigor para as operações civis, desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

… … Inconformada com esta decisão dela interpôs recurso o Banco réu concluindo que: … Fundamentação O tribunal em primeira insta julgou como provada a seguinte matéria de facto: … O tribunal em primeira instância julgou como não provada a seguinte matéria de facto: ...

Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (arts. 635 nº3 e 4 e 637 nº2 do CPC).

Na observação destas prescrições normativas concluímos que o objecto do recurso remete para a impugnação da matéria de facto que sinaliza como tendo sido incorrectamente julgada e, a partir da alteração do julgamento dessa matéria de facto, o recurso versa também sobre a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil que a apelante entende não se verificam, nomeadamente, por não existir ilicitude nem violação do dever de informação, inexistir culpa e nexo de causalidade que imponha qualquer dever de indemnizar.

… Abordando em primeiro lugar a impugnação da matéria de facto, a apelante sustenta que os pontos 15 e 25 dos factos julgados provados na sentença deveriam ser julgados como não provados.

Refere o nº1 do art. 640 do CPC que quando haja sido requerida impugnação da matéria de facto, o recorrente deve obrigatoriamente e sob pena de rejeição especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham a decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

E acrescenta o nº2 do preceito que no caso de terem sido invocados meios probatórios gravados como fundamento do erro na apreciação do recurso, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens gravadas em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

Sendo estes os requisitos de forma estabelecidos na lei como imprescindíveis ao conhecimento da impugnação e estando eles satisfeitos no recurso interposto, deixa-se expresso que a matéria de facto impugnada é a constante dos pontos 15 e 25 que, tendo sido julgados provados, pretende a Apelante que sejam considerados como não provados.

...

Uma primeira conclusão que se deve retirar é a de que a tónica informativa geral, e concretizada na subscrição envolvendo o falecido, era a de que o capital estava garantido, que o produto tinha a segurança de um depósito a prazo e que o risco era zero porque era risco do banco. Para lá do sentido laudatório do produto que remetia para uma aliciante taxa de juro que deveria ser apresentada como argumento e igualmente, para a segurança e garantia que se desenhava semanticamente como um deposito a prazo, a verdade é que era desconsiderado que a obrigação fosse subordinada e não do próprio banco, sendo significativo que a testemunha G... tenha declarado que esta subordinação nem mesmo era tida por consciente pela maior parte dos funcionários. Tudo se passava como se fosse um produto do banco oferecido pelo próprio banco e tipificado para arrumo de explicação como um deposito a prazo que por ser de maior capital e de maior prazo teria nisso a justificação da melhor remuneração.

Com estes elementos julgamos que é correcta a convicção vertida nos pontos 15 e 25 ao serem julgados como provados porquanto, confrontados os argumentos dos funcionários que remetiam apenas para as vantagens afiançadas de que o banco garantiria o retorno da quantia subscrita e que as semelhanças com um depósito a prazo divergiam apenas no que era vantajoso (taxa de juros mais alta em função de uma mobilização de capital mais alto e de um prazo de imobilização mais extenso) cremos que segundo as regras de experiência comum [1], é inteiramente seguro em termos de raciocínio lógico fundado na prova, concluir que o decisivo para o subscritor concreto foi o quadro de segurança e de apresentação formal do produto que lhe propunham como um depósito a prazo. E daqui decorre, com o auxilio do quadro de cliente fornecido pela testemunha ..., que aquele não teria realizado a subscrição se tivesse sido alertado para que aquele produto proposto na sua agência bancária pelo seu funcionário mais próximo não uma aplicação que pertencesse ao Banco e que não era este que garantiria alguma vez as obrigações de juro e capital. É que, no modelo de cliente referido e neste particular da prova, a alusão a um depósito a prazo que é um produto por excelência típico e modelar da actividade do banco com os clientes para lá da elementar abertura de conta com a criação da conta à ordem, tudo isto nos conduz a , seguramente, entender que a prova foi correctamente fixada quando considerou provado também que do banco nunca o falecido marido da 1ª A. teria aceitado subscrever a obrigação se lhe tivessem sido explicadas as características do produto que lhe estava a ser vendido e, sobretudo, se lhe tivessem mostrado a nota informativa associada ao produto, nomeadamente se o tivessem inteirado de que o banco não garantia a subscrição e era alheio a ela, excepto na sua venda.

Nestes termos julgamos que a prova quanto à matéria impugnada foi correctamente decidida e, como assim, julga-se improcedente a impugnação deduzida mantendo-se a fixada em primeira instância sem alteração.

… Da decisão de direito Numa prévia definição do contrato celebrado cumpre identificar o R. como uma instituição de crédito (art.º 3º, al. a) do DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro - Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, abreviadamente designado por RGICSF) sendo que, nos termos do art.º 4º do RGICSF cabe nas suas atribuições a possibilidade de realizar as seguintes actividades: «1 - e) Transações, por conta própria ou da clientela, sobre instrumentos do mercado monetário e cambial, instrumentos financeiros a prazo, opções e operações sobre divisas, taxas de juro, mercadorias e valores mobiliários; f) Participações em emissões e colocações de valores mobiliários e prestação de serviços...

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