Acórdão nº 18/15.9GTVIS.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelANA CAROLINA CARDOSO
Data da Resolução24 de Junho de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acórdão deliberado em conferência na 5ª seção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra 1. Relatório A.

interpôs recurso da decisão proferida no processo sumário n.º 18/15.9GTVIS, da Instância de Competência Genérica de Sátão, Comarca de Viseu, que indeferiu a requerida declaração de prescrição da pena em que foi condenado.

1.1. Decisão recorrida (que se transcreve integralmente): «Através do requerimento ora em apreço veio o arguido, por um lado, requerer que seja declarada a prescrição da pena de prisão de 18 meses de prisão em que foi condenado nos autos, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 122.º do Código Penal, por não terem sido cumpridos os requisitos legais previstos no n.º 5 do artigo 337.º do Código de Processo Penal, em vigor à data contumácia.

Doutra banda, veio ainda arguir a nulidade insanável que resulta do disposto na alínea e) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, em face da violação das regras de competência pelo Tribunal da Condenação, por serem, no seu entender, da competência do TEP, no que se refere quer à realização das diligências prévias à declaração de contumácia, nas quais se inclui a notificação edital, quer a emissão dos mandados de detenção.

A Digna Magistrada do Ministério Público pugnou pelo indeferimento do requerido, conforme fundamentos expendido na Douta promoção que antecede.

Cumpre apreciar e decidir.

Compulsados os autos verifico que no despacho proferido pelo Tribunal de Execução de Penas de Coimbra, datado de 3-10-2016, que declarou o ora condenado A.

contumaz, resulta que foi dado cumprimento ao artigo 337.º, n.º 5 e 6 do Código de Processo Penal, tendo dele sido, portanto, dado conhecimento ao então defensor do arguido.

Pelo que, a decisão proferida de declaração de contumácia do arguido, proferida em 7-10-2016, tem a força de caso julgado formal com força obrigatória dentro do processo, ficando o Tribunal nele vinculado pelas decisões aí proferidas mesmo sobre aspetos de natureza processual.

Acresce que, sobre tal decisão não houve recurso por parte do arguido, tendo a mesma transitado em julgado, pelo que ficou esgotado o nosso poder jurisdicional sobre a matéria em causa.

Acresce que, preceitua o artigo 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “irregularidades” que: “Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado”.

In casu, àquele ato de declaração de contumácia, sucederam-lhe outros, para os quais foi o Ilustre defensor do condenado dos mesmos notificado (refira-se, a título de exemplo a notificação expedida a 4-06-2018), pelo que teria já o mesmo, necessariamente, pleno conhecimento daquela mesma decisão.

Pelo que, há muito se encontra precludido o prazo para invocar uma qualquer irregularidade, à luz do citado n.º 1 do artigo 123º do Código de Processo Penal, que, a concluir-se que existiu, sempre já se encontraria sanada, não invalidando, portanto, quer o ato a que se refere, quer todos os subsequentes.

Assim sendo, a declaração de contumácia é válida e eficaz, produziram-se os seus efeitos de suspensão e interrupção da prescrição, ínsitos nos artigos 125º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 e 126º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, encontrando-se a prescrição da pena suspensa.

Quanto à violação das regras de competência pelo Tribunal da condenação também não assiste razão ao arguido.

Lançando mão dos argumentos aduzidos na Douta promoção que antecede, com a qual concordamos e a cujos fundamentos aderimos, temos que “a questão suscitada tem a sua génese no sentido interpretativo atribuído às regras que delimitam a competência material do TEP, consagradas no Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro, particularmente quando lidas à luz do critério que o legislador enunciou na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 252/X, que esteve na base da redação daquele diploma. Ora, o teor do ponto 15 da Exposição de Motivos da Proposta de Lei 252/X, que está na génese da aprovação do CEPMPL tem o seguinte teor: “No plano processual e no que se refere à delimitação de competências entre o tribunal que aplicou a medida de efetiva privação da liberdade e o Tribunal de Execução das Penas, a presente proposta de lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das Penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade, após o trânsito em julgado da sentença que as aplicou. Consequentemente, a intervenção do tribunal da condenação cessa com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade. Este um critério simples, inequívoco e operativo de delimitação de competências, que põe termo ao panorama, atualmente existente, de incerteza quanto à repartição de funções entre os dois tribunais e, até, de sobreposição prática das mesmas. Incerteza e sobreposição que em nada favorecem a eficácia do sistema”. Parece daí resultar o propósito do legislador em estabelecer a linha de fronteira de atuação entre os dois tribunais, no trânsito em julgado da sentença condenatória que aplicou a pena privativa ou a medida privativa da liberdade. Nesta aceção, a partir do trânsito da sentença, toda a atividade de execução da pena competiria ao TEP. Aliás, é o artigo 138º, nº 2 do CEPMPL que dispõe que, após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respetiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal.

Não obstante, tal interpretação é posta em causa na própria fundamentação da Exposição de Motivos, literalmente entendida, quando nela, a dita linha de fronteira é referida ao trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade.

Assim é que, na verdade, a sentença condenatória decreta uma pena de prisão, mas não decreta o ingresso do agente num estabelecimento prisional pois, como se sabe, é por intermédio de um mandado, vulgo, mandado de condução ao estabelecimento prisional para cumprimento de pena, necessariamente posterior ao trânsito da sentença, que este procedimento se desenrola. Posto isto, e na senda das mais recentes decisões da Relação de Coimbra, somos do entendimento que, tendo em consideração que a pena de prisão decretada por sentença transitada só inicia a sua execução quando o condenado ingressa no estabelecimento prisional, competindo ao TEP, como vimos, “acompanhar e fiscalizar a respetiva execução” dir-se-á que tal competência só se ‘inicia’ após o ingresso do condenado na instituição prisional – vide, neste sentido o Acórdão da Relação de Coimbra, datado de 21-02-2018, proferido no processo n.º 685/13.8TACLD-B.C1, cuja argumentação aqui seguimos de muito perto.” Considerando o exposto, conclui-se que as diligências prévias à declaração de contumácia e a emissão do mandado de condução ao estabelecimento prisional para execução da pena de prisão não são, ainda, um momento do acompanhamento e fiscalização da execução da pena, mas um procedimento prévio, ficando, portanto, de fora das competências atribuídas ao TEP.

Decorre do disposto na alínea x) do n.º 4 do artigo 138º do CEPMPL que é da competência material do TEP: “Proferir a declaração de contumácia e decretar o arresto de bens, quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento”.

Do preceito legal transcrito resulta balizada a competência do TEP em matéria de contumácia, a qual se limita à sua declaração.

Ou seja, da norma não decorre que é da competência do TEP todas as diligências prévias a tal decisão, que são do Tribunal da Condenação, como, de resto, tem sido a prática judiciária, até ao momento.

Doutra banda, determina ainda aquele dispositivo legal, na alínea t) que compete, em razão da matéria, ao TEP “Emitir mandados de detenção, de captura e de libertação”.

Assim, dispondo o artigo 470º, n.º 1 do Código de Processo Penal que, a execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de 1ª instância em que o processo tiver corrido, sem prejuízo do disposto no artigo 138.º do Código da Execução das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade, entende-se que a emissão do mandado de detenção para cumprimento de pena é da competência do Tribunal da Condenação.

E, de acordo com a jurisprudência dominante do Tribunal da Relação de Coimbra, compete ao TEP, nos termos do disposto no artigo 138º, nº 4, t) do CEPMPL, emitir mandados de detenção, captura ou libertação que visem a execução das suas próprias decisões, sendo, por isso, competente para emitir o mandado de detenção destinado ao início da execução de uma pena de...

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