Acórdão nº 1392/19.3T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelEM
Data da Resolução07 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório J… (Autor)intentou a presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “F…, Lda” (Ré), solicitando, a final, que a Ré fosse condenada a pagar-lhe os seguintes valores pecuniários: a) €9.123,68 a título de retribuição de férias; b) €9.123,68 a título de subsídio de férias; c) €3.551,43 a título de subsídio de natal; d) €8.870,80 a título de descanso compensatório; e e) juros moratórios sobre as quantias em dívida, à taxa legal, desde a propositura da acção e até integral pagamento.

Para tanto, e em síntese, alegou que foi admitido ao serviço da Ré em Maio de 1987, para prestar serviço de motorista de veículos pesados de passageiros, tendo o contrato de trabalho cessado em 20 de Julho de 2018, por caducidade motivada pela sua reforma.

Mais alegou que, durante a vigência da relação laboral, a Ré pagou-lhe mensalmente quantias a título de trabalho suplementar (até Março de 2009, sempre sob a designação de trabalho suplementar e, a partir de Março de 2009, uma parte sob a designação de trabalho suplementar e outra sob a designação de tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade), e trabalho nocturno, por ter prestado, a solicitação da Ré, regularmente trabalho suplementar e trabalho nocturno, trabalho esse cuja média não foi considerada para o pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de natal, o que vem agora peticionar.

Alegou ainda que a Ré não lhe concedeu o descanso compensatório remunerado, correspondente a 25% das horas de trabalho suplementar pagas ao Autor.

…Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.

…A Ré contestou, solicitando, a final, a procedência da invocada excepção de prescrição de juros e, quanto ao demais, a improcedência da acção, devendo, em consequência, ser absolvida do pedido.

Alegou, em síntese, que, nos termos do art. 310.º, al. d), do Código Civil, se mostram prescritos os juros vencidos até ao dia 07-06-2014.

Mais alegou que durante o horário de trabalho do Autor houve vários períodos de inactividade, ou seja, períodos durante os quais não houve prestação de actividade de condução ou de outra natureza, de duração variável, sendo, porém, prática da Ré remunerar os seus motoristas de todas as horas compreendidas entre o início e o termo dos respectivos horários de trabalho, ressalvados os intervalos de refeição, quer se trate de tempo de efectiva actividade de motorista, quer se trate de tempo durante o qual nenhum trabalho de condução ou de outra natureza lhes era solicitado, razão essa pela qual a remuneração diária dos seus motoristas contemplava habitualmente os acréscimos previstos para o trabalho suplementar, sendo que até Abril de 2009 esse pagamento figurou nos recibos de vencimento na rúbrica respeitante ao trabalho suplementar e a partir de Maio de 2009 na rúbrica relativa a tempo de disponibilidade.

Alegou igualmente que, nos termos do art. 342.º do Código Civil, ao Autor incumbe a alegação e prova dos factos constitutivos do direito a que se arroga, devendo indicar na petição inicial os factos constitutivos da situação jurídica que quer fazer valer, assim individualizando a causa de pedir, nos termos do art. 552.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil, pelo que, tratando-se de prestações relacionadas com a prestação de trabalho suplementar, o Autor deveria alegar (e não alega) e discriminar (e não discrimina) os dias em que o alegado trabalho suplementar foi prestado e quantas horas prestou em cada dia e não individualiza (devendo individualizar) os dias concretos de descanso compensatório que não gozou, limitando-se a alegar os quantitativos mensais e anuais que lhe foram pagos a título de trabalho suplementar, não cumprindo, assim, o ónus da substanciação do pedido.

Alegou ainda que, no âmbito do CCT aplicável, o regime dos descansos compensatórios aplica-se apenas em sede de trabalho prestado em dias de descanso semanal, estando excluído o trabalho suplementar prestado em dias úteis, e que as prestações pagas ao Autor como compensação do tempo de disponibilidade não possuem natureza retributiva, logo não integram o valor da remuneração paga pelo período de férias e pelo subsídio de férias.

Alegou, por fim, quanto ao subsídio de natal, que, em face dos CCT aplicáveis e da legislação em vigor, os suplementos remuneratórios indicados pelo Autor não são susceptíveis de integrarem tal subsídio.

…Em 08-10-2019, foi proferido despacho judicial com o seguinte teor: Trabalho suplementar, tempo de disponibilidade, trabalho noturno ou descanso compensatório são conceitos jurídicos.

A integração de uma determinada situação da vida nesses conceitos necessita de uma correta alegação de factos.

Assim, a causa de pedir de um crédito (qualquer crédito) relativo à prestação de trabalho suplementar é constituída pela alegação do horário de trabalho, com a indicação das horas de início e do termo do período normal de trabalho diário, os respetivos intervalos e a indicação das horas de trabalho prestado fora dos horários de trabalho estabelecidos.

O mesmo se diga relativamente aos outros conceitos acima referidos.

Só com a alegação de factos se pode dizer que existe trabalho suplementar, em período noturno ou em dia de descanso.

Assim, tendo presente o disposto no artigo 61.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, convida-se o autor a aperfeiçoar, no prazo de 10 dias, a alegação dos artigos 17.º a 1855.º da sua petição inicial.

…Respondendo a tal convite, o Autor veio alegar, resumidamente, que a sua petição inicial tem como causa de pedir não, em primeira linha, a prestação de trabalho suplementar ou nocturno, mas antes, o facto de ter recebido, a esse título, determinadas quantias e se trabalho suplementar, tempo de disponibilidade, trabalho nocturno ou descanso compensatório são conceitos jurídicos, dizer que o Autor recebeu como retribuição uma certa quantia é matéria de facto.

Alegou ainda que, em sede de contestação, a Ré aceitou que efectivamente pagava horas de trabalho suplementar ao Autor, referindo, no entanto, que apenas uma parte dessa rúbrica é que serviria para o pagamento de trabalho suplementar, não elucidando, porém, que parte daqueles valores eram referentes a retribuição por trabalho suplementar, competindo-lhe a ela o ónus de demonstrar e provar qual a parte dos pagamentos que efectivamente serviam para pagar o referido trabalho suplementar.

Mais requereu a junção aos autos de discos de tacógrafo e registos de ponto referentes a vários dias de prestação de trabalho entre 1990 e 2018, dos quais, entende, ser possível inferir a respeito dos horários diários de trabalho que o Autor cumpriu ao longo da relação laboral.

Requereu, por fim, que fosse realizada perícia aos registos de tacógrafos juntos, em virtude de a sua informação se encontrar codificada.

…Em resposta à junção dos documentos pelo Autor, veio a Ré alegar que tais documentos não lhe foram fornecidos e que, por não terem sido alegados os respectivos factos pelo Autor (não discriminou os dias em que foi prestado o alegado trabalho para além do período normal diário, nem quantas horas prestou em cada dia, como não individualizou os dias concretos de descanso compensatório que não gozou), não vislumbra qualquer utilidade ou interesse para a descoberta da verdade na junção de tais documentos, pelo que requereu o seu indeferimento.

…O tribunal de 1.ª instância considerou, nos termos do art. 61.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho, estar em condições de conhecer o mérito da causa e, com fundamento na manifesta improcedência da acção, julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos contra si deduzidos.

…Não se conformando com a sentença, veio o Autor interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem: A. Vem o presente recurso de apelação interposto da Sentença proferida em 12 de Novembro de 2019 pelo Juízo do Trabalho de Portimão – Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro.

B. Na ação de processo comum proposta contra a Ré, o Autor peticionou que fosse a Ré condenada a pagar a este quantias a título de retribuição de férias; subsídio de férias; subsídio de natal; descanso compensatório e juros de mora à taxa legal.

C. A Sentença recorrida julgou improcedente a presente ação e, em consequência, foi absolvida a Ré.

D. Desde logo, a sentença recorrida é omissa quanto ao leque de factos provados e não provados, violando o disposto nos números 3 e 4 do art. 607º do Código de Processo Civil.

E. Além disso, salvo o devido respeito conforme se demonstrará, entende o ora recorrente que não assiste razão ao Tribunal a quo na apreciação feita, impondo-se decisão diversa da ora posta em crise. Vejamos; F. Refere o Douto Tribunal na sua decisão que: “Deixar prosseguir esta ação, com estas insuficiências, é absolutamente inútil. Assim, como o autor não alega os factos essenciais necessários para a procedência dos pedidos, só pode considerar-se que a ação é manifestamente improcedente e, por isso, deve nesta fase (após os articulados) conduzir à sua improcedência. (…)” G. Face ao exposto, em sede de decisão, julgou totalmente improcedente a ação.

H. Ora, nos termos do art. 5º, nº1, Código de Processo Civil, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir.

I. Salvo melhor entendimento, o autor cumpriu, pelo menos em parte, o ónus que sobre si impendia! J. Com efeito, o autor alega que foi admitido ao serviço da ré, com a categoria profissional de motorista de veículos pesados de passageiros e que no exercício das suas funções auferia mensalmente quantias pecuniárias a título de retribuição base, diuturnidades, subsídio de agente único, trabalho suplementar, subsídio noturno, refeições, tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade, sendo estes últimos pagos como trabalho suplementar até determinada altura, e...

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