Acórdão nº 1/19.5T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020
Magistrado Responsável | TOM |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Processo nº 1/19.5T8FAR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – 1º Juízo Central de Competência Cível (Faro) – J2 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na acção comum de condenação proposta por (…) contra (…), (…), (…), (…) e (…), uma vez proferida sentença, a Autora veio interpor recurso da mesma.
* A Autora pedia que fosse: a) declarada a nulidade da compra e venda titulada pela escritura de 11/11/2010 relativa ao prédio designado pela letra "B", correspondente ao 1.º andar Sítio da (…), inscrito na matriz sob o artigo (…) da União de freguesias da Luz de Tavira e de Santo Estêvão, concelho de Tavira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/19950626.
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ordenado o cancelamento do registo da aquisição a favor da Ré (…), efetuado na sequência da escritura outorgada em 11/11/2010 pela apresentação (…), do dia onze de Novembro de 2010, do prédio designado pela letra "B", correspondente ao 1.º andar Sítio da (…), inscrito na matriz sob o artigo (…) da União de freguesias da Luz de Tavira e de Santo Estêvão, concelho de Tavira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/19950626.
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ordenado o cancelamento do registo da aquisição a favor dos Réus (…), (…), (…) e (…) efectuado na sequência da escritura de doação outorgada em 23-08-2018 pela inscrição no prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o nº …/19950626 da União de Freguesias da Luz de Tavira e de Santo Estêvão, concelho de Tavira.
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Caso assim não se entenda, deverá a Ré (…) ser condenada à restituição do valor total de € 79.581,40 por enriquecimento sem causa, acrescido dos juros de mora à taxa legal que se vencerem após a citação.
* Em abono da sua pretensão, a Autora alega que, com o intuito de enganar os seus credores, celebrou um contrato de compra e venda simulado de um imóvel com a 1ª Ré e que não foi pago o correspondente preço. Ao tomar conhecimento que a 1ª Ré doou o mesmo aos demais Réus, os quais também sabiam do acordo simulatório, pretende reaver para si o aludido imóvel.
Caso assim não se entenda, deve ser indemnizada do valor do imóvel, bem como das despesas que realizou na sua conservação.
* Devidamente citados, os Réus deduziram contestação.
A Ré (…) nega a existência de qualquer simulação do contrato de compra e venda a celebrado com a Autora, bem como o facto de esta não ter recebido o preço constante da escritura pública de compra e venda.
Os Réus (…), (…), (…) e (…) invocam que são terceiros de boa fé, desconhecendo o negócio celebrado entre a Autora e a 1ª Ré e terminam deduzindo pedido reconvencional, a título subsidiário.
* Para o caso da acção ser julgada procedente, apresentaram pedido reconvencional nos termos do qual deverá declarar-se a ineficácia da declaração de nulidade do negócio simulado em relação a si com a consequente inoponibilidade do negócio, devendo:
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Declarar se que os Réus/Reconvintes (…), (…), (…) e (…) são proprietários, em comum e parte iguais, por doação, da fração autónoma designada pela letra “B”, correspondente à habitação do 1.º andar, do prédio urbano sito na (…), em regime de propriedade horizontal, destinado a habitação, sito freguesia da Luz de Tavira, concelho de Tavira, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) da União de freguesas de Luz de Tavira e Santo Estevão, concelho de Tavira, com origem no artigo (…) da extinta freguesia da Luz de Tavira, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o número …/19950627, da freguesia da Luz de Tavira, concelho de Tavira, e aí inscrito a seu favor pela inscrição Ap. (…) de 2018/09/05.
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E, reconhecidos os Réus /Reconvintes como comproprietários, deverá a Autora e quem ocupar, ser condenada a restituir aos mesmos o prédio ocupado em causa nos autos livre e devoluto de pessoas e bens e em perfeito estado de conservação e de utilização, num prazo não superior a 20 dias a contar do transito em julgado da sentença.
* Em sede de terceiro articulado, a Autora manteve a posição já defendida na petição inicial.
* Foi proferido despacho saneador que fixou o valor da acção, o objeto do litígio e os temas da prova.
* Realizado o julgamento, o Tribunal «a quo» decidiu: a) absolver os Réus (…), (…), (…), (…) e (…) dos pedidos deduzidos pela Autora (…).
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Declarar os Réus (…), (…), (…) e (…) como proprietários, em comum, da fracção autónoma correspondente à habitação do 1º andar, letra B, do prédio urbano sito na (…), freguesia da Luz de Tavira, concelho de Tavira, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) da União de freguesas de Luz de Tavira e Santo Estevão, com origem no artigo (…) da extinta freguesia da Luz de Tavira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o número …/19950627.
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Determinar que (…) restitua aos Réus (…), (…), (…) e (…) o prédio urbano referido em b) por si ocupado, devendo a Autora abster se de praticar quaisquer actos que perturbem o direito de propriedade dos Réus (…), (…), (…) e (…), no prazo de 20 dias a contar do transito em julgado da presente sentença.
* A recorrente não se conformou com a referida decisão e nas suas alegações apresentaram as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão que, depois absolver os Recorridos dos pedidos deduzidos pela Recorrente, quer o pedido principal, quer o pedido subsidiário, reconheceu o direito de propriedade a favor dos Recorridos e determinou a Recorrente a entregar àqueles, a fracção autónoma designada pela letra “B" correspondente ao 1.º andar, do prédio urbano, sito na (…), inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias da Luz de Tavira e Santiago sob o artigo (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/19950627.
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Versa o recurso quer sobre a matéria de facto, quer de Direito.
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O Tribunal a quo julgou erradamente os seguintes factos que considerou não provados, e que, portanto, importam também reapreciar: “a) A Autora e a Ré (…) acordaram em outorgar uma escritura de compra e venda do imóvel penhorado, por forma a acautelar eventuais penhoras futuras do prédio, a fim de proteger, a “esconder”, a salvaguardar o bem, dado que existiam outras dívidas, as quais mais cedo ou mais tarde, originariam outras penhoras sobre aquele imóvel (artigos 9º e 10º da petição inicial).
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A Ré (…) prometeu que após a realização da escritura de compra e venda do imóvel, o mais rapidamente possível, iria transferir a propriedade do imóvel para os descendentes da Autora, já que esta não queria ter mais nada em seu nome, pois iria brevemente apresentar-se à insolvência (artigo 14º da petição inicial).
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Em data que não consegue precisar, mas que situa em 2012, a Autora foi declarada insolvente (artigo 15º da petição inicial).
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No entanto, a Autora não queria vender, nem a Ré (…) queria comprar o imóvel, pretendendo proteger o mesmo, tendo sido esse o acordo firmado entre as partes (artigos 17º e 18º da petição inicial).
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A Ré (…) não pagou e a Autora não recebeu o preço declarado na escritura (artigo 19º da petição inicial).
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Após a realização do negócio simulado, várias foram as vezes em que a Autora e os filhos desta falaram com a Ré (…) por forma a transmitir o imóvel para a esfera jurídica destes, ao que esta respondia que o faria quando entendesse, quando achasse que devia fazer (artigos 20º e 21º da petição inicial).
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A Ré (…) sempre referiu à Autora e ao seu agregado familiar para não se preocuparem com a transmissão do imóvel pois desde que tratassem e cuidassem da Ré, a transmissão do imóvel estaria sempre assegurada, e não haveriam problemas (artigo 21º da petição inicial).
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A Autora confiou no acordo celebrado com a sua tia e na palavra desta de que iria tratar de repor a situação nos termos acordados, o que não aconteceu (artigo 22º da petição inicial).
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Ao longo dos anos, os filhos da Autora falaram várias vezes com a Ré (…) para que transferisse a propriedade, assumindo eles próprios as despesas necessárias para o efeito, mas aquela recusou sempre (artigo 26º da petição inicial).
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Os Réus (…), (…), (…) e (…) sabiam à data da realização do negócio, sobre o acordo realizado entre Autora e a Ré … (artigo 29º da petição inicial).
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Passados três meses do negócio simulado, a empresa em que são sócios os Réus (…) e (…) viu a tentativa de penhora do imóvel e também do recheio, por si realizada enquanto exequentes, frustrada, pois o imóvel já não pertencia a Autora, mas à Ré … (artigo 31º da petição inicial).
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A simulação foi um assunto do conhecimento e amplamente falado no seio familiar (artigo 34º da petição inicial).
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Após 11 de novembro de 2010, a Autora despendeu o valor de € 15.000,00 ao longo dos anos para manter, conservar e melhorar o imóvel (artigo 48º da petição inicial – parte).
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Da prova produzida em audiência de julgamento, e dos documentos juntos aos autos, outro deveria ter sido o entendimento.
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Pelo que não se entende como o Tribunal, apesar de tudo indicar o contrário, ter considerado que a Autora não havia apresentado prova do direito de que se arroga.
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Efectuada a análise da prova produzida, incluindo os depoimentos prestados em audiência e os documentos juntos, entende-se, ao invés, ter o Tribunal recorrido, apreciando-a incorrectamente, fixado por forma não criteriosa a matéria em causa.
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Assim, o Tribunal recorrido deveria ter julgado como provado os factos que sob as alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), k), l) e m) considerou como não provados.
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Quando se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, é elemento fundamental as declarações e os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento.
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Conforme as supra verificadas transcrições, e relativamente ao depoimento/declarações da Ré (…), esta começou por afirmar que nunca prometeu, nem sequer pensou em deixar o imóvel aos filhos da Autora, mas instada pela Meritíssima Juíza acaba por reconhecer a existência de um testamento, recusando-se a...
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