Acórdão nº 3370/19.3T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3370/19.3T8AVR.P1 Recurso de Contra-ordenação laboral 4.ª SECÇÃO I. RELATÓRIO I.1 B…, E.P.E. e C…, notificados da decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Aveiro - Juiz 1, que rejeitou a impugnação judicial da decisão administrativa da Autoridade Para as Condições do Trabalho -proferida no processo n.º 021800835, aplicando-lhes, para pagamento como responsáveis solidários, uma coima no valor de 9.180,00€ (nove mil cento e oitenta euros), pela prática, a título negligente, de uma contraordenação muito grave prevista no artigo 24º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02 -, não se conformando vieram interpor o presente recurso, pedindo que aquela decisão “seja substituído por outr[a] que receba a impugnação judicial apresentada pelos recorrentes e a considere tempestivamente apresentada, determinando o prosseguimento dos termos do processo para aferição das razões invocadas na impugnação em apreço”.

I.2 A decisão judicial sob recurso tem o conteúdo que se passa a transcrever (excluindo as notas de rodapé): -«Como resulta do despacho por mim proferido no âmbito do processo de contraordenação n.º 2103/19.9T8AVR, deste Juízo (junto aos presentes autos a fls. 195 v.º/196), numa primeira fase, os recorrentes B…, E.P.E. e C…, através do respectivo mandatário, em lugar de apresentarem a impugnação judicial na autoridade administrativa que proferiu a decisão – na circunstância, o Local do Baixo Vouga da Autoridade Para As Condições do Trabalho (ACT) –, remeteram-na via electrónica, através do “citius”, ao “Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro”, como acção de processo comum, atribuindo-lhe o valor de € 9.180,00.

Essa acção foi inicialmente distribuída ao Juízo Local Cível de Aveiro (J1), em 13/06/2019, tendo o exm.º mandatário das recorrentes, notificado da recusa do requerimento em 14/06/2019, requerido na mesma data o envio da peça processual para o Juízo do Trabalho de Aveiro, invocando lapso da secretaria do seu escritório no envio ao Juízo Local Cível.

Já neste Juízo do Trabalho de Aveiro, veio a ser por mim proferido o despacho em referência, rejeitando a impugnação judicial, nos termos do art. 38 n.º 1 da Lei n.º 107/2009, de 14/091, por inobservância do formalismo imposto pelo art. 33º, visto não ter sido apresentada na autoridade administrativa competente, para aí ser incorporada no processo respectivo, com posterior cumprimento da tramitação prevista no art. 36º n.º 1.

Notificados desse despacho, os recorrentes remeteram à ACT a impugnação judicial, em 04/10/2019, acompanhada de requerimento, dirigido à referida autoridade administrativa, onde invocam o lapso ocorrido e defendem que deve ser considerada como data da apresentação da impugnação judicial o dia 13/06/2019, nos termos do art. 144º do Cód. de Processo Civil, por corresponder à data da respectiva expedição – cfr. fls. 198 e segs.. Como estabelece o art. 33º, «1. A impugnação judicial deve ser dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. 2. A impugnação judicial é apresentada na autoridade administrativa que tenha proferido a decisão de aplicação de coima, no prazo de 20 dias após a sua notificação.».

Cabendo depois à autoridade administrativa competente, nos termos do art. 36º n.º 1, enviar os autos ao Ministério Público, no prazo de 10 dias, com apresentação de alegações, se assim o entender. Podendo em alternativa a esse envio, revogar total ou parcialmente a decisão de aplicação da coima ou sanção acessória, conforme previsto no n.º 2 do mesmo artigo.

Sendo que a apresentação extemporânea da impugnação ou a não observância por parte do recorrente das exigências formais previstas no art. 33º, acarreta a sua rejeição, em conformidade com o art. 38 n.º 1. Os recorrentes foram notificados da decisão condenatória em 28/05/2019 (cfr. avisos de recepção de fls. 190 a 192 dos autos), dispondo a partir daí de 20 dias para a impugnarem judicialmente – prazo que terminou em 21/06/2019, já contando com os três dias suplementares a que aludem os arts. 139º n.º 5, al. b) do Cód. de Processo Civil e 107º-A, al. b) do Cód. de Processo Penal.

Como impõe o n.º 2 do art. 33º, a impugnação judicial tem que ser apresentada nos serviços da autoridade administrativa que proferiu a decisão, no prazo de 20 dias após a sua notificação – o que de resto consta expressamente da notificação da decisão aos recorrentes e respectivo mandatário (cfr. fls. 186 a 188).

Só tendo no caso concreto a impugnação judicial dado entrada nos referidos serviços, em 04/10/2019, mais de 3 meses depois de findo o prazo legal.

E embora – como defendem os recorrentes –, nos actos que devam ser praticados por transmissão electrónica de dados, valha como data da prática a da respectiva expedição, nos termos do art. 144º n.º 1 do Cód. de Processo Civil, o problema aqui é que nem o acto devia ter sido praticado via “citius”, nem a expedição foi feita para onde devia.

Não se põe em causa que tal se tenha devido a lapso, como alegam os recorrentes.

Suscitando-se no entanto a questão de saber se esse lapso cometido justifica que se admita a impugnação judicial, contra o que expressamente determina o art. 33º n.º 2. A esse respeito, dispõe o n.º 2 do art. 146º do Cód. de Processo Civil que «Deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte, o suprimento ou a correção de vícios ou omissões puramente formais de atos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa.».

Mesmo admitindo que está em causa vício ou omissão puramente formal e que com o requerimento que acompanhou o envio da impugnação judicial à ACT (cfr. fls. 176), os recorrentes pretenderam requerer perante o juiz o respectivo suprimento, não nos parece que se possa considerar que o lapso cometido não lhes é imputável a título de culpa grave.

Com efeito, para além de na notificação da decisão se fazer expressa menção ao facto da impugnação judicial dever ser apresentada nos serviços da autoridade administrativa que proferiu a decisão, no prazo de 20 dias após a sua notificação, tratou-se de acto praticado pelos recorrentes através de advogado/mandatário judicial, ainda que porventura através dos serviços de secretaria do respectivo escritório.

Acresce que quando o exm.º mandatário dos recorrentes foi notificado pelo Juízo Local Cível de Aveiro da recusa do requerimento, estava ainda em tempo de enviar a impugnação judicial à ACT, em vez de requerer o envio da peça processual para o Juízo do Trabalho de Aveiro.

Não podendo olvidar-se, por fim, que admitir a impugnação judicial como tempestiva, significaria estender o prazo de recurso (que é de 20 dias) por mais do quíntuplo da sua duração legal, visto que terminou em 21/06/2019 e a impugnação só deu entrada na ACT em 04/10/2019.

E implicaria também contrariar o entendimento subjacente ao despacho de rejeição que por mim foi anteriormente proferido no âmbito do processo de contra-ordenação n.º 2103/19.9T8AVR, deste mesmo Juízo.

Razões pelas quais se rejeita a impugnação judicial, por extemporaneidade e inobservância do formalismo legal, nos termos do disposto nos arts. 33º n.º 2 e 38 n.º 1 da Lei n.º 107/2009, de 14/09, determinando-se o oportuno arquivamento dos autos.

Custas incidentais a cargo dos recorrentes, com taxa de justiça mínima.

Notifique.

Comunique à Autoridade Para As Condições do Trabalho.

(..)».

I.3 As alegações do recurso, o qual foi admitido e fixado o modo de subida e efeito adequados, foram sintetizadas com as conclusões seguintes:

  1. O despacho em crise, notificado aos recorrentes através de documento elaborado na plataforma informática Citius em 2019.10.21, rejeitou a impugnação judicial apresentada por aqueles, como reação à decisão da ACT que lhes foi notificada, em 2019.05.28, e os condenou solidariamente no pagamento de uma coima no valor de 9.180,00€ (nove mil cento e oitenta euros), nos termos do disposto no artigo 38º da Lei n.º 107/2009, de 14/09, com fundamento em extemporaneidade e falta de observância dos formalismos legais previstos no artigo 33º do mesmo diploma, por considerar que foi apresentada à autoridade administrativa após o decurso do prazo de 20 (vinte) dias ali previsto para o efeito.

  2. O despacho recorrido sustenta que o suprimento, pelo juiz, de omissões ou vícios formais, conforme estabelecido no artigo 146º do CPC, apenas é admissível se a falha não tiver sido praticada com dolo ou culpa grave e o suprimento não implicar relevante prejuízo para o andamento da causa.

  3. O tribunal entendeu que a impugnação em apreço não deveria ter sido enviada via Citius e entregue diretamente na instância judicial, mas sim enviada à entidade que aplicou a coima, omissão que considerou ter sido praticada com culpa grave, pelo facto de o ato ter sido praticado com intervenção de mandatário, através dos serviços de secretaria do escritório e que a admissão da impugnação consubstancia uma prorrogação do prazo de interposição de recurso de 2019.06.21 para 2019.10.04 (data em que foi entregue na entidade que proferiu a decisão).

  4. Os recorrentes entendem que o tribunal, ao proferir despacho de rejeição liminar, errou na apreciação dos factos e na interpretação das normas jurídicas aplicáveis, em desconsideração pelo particular regime processual aplicável. Com efeito, e) Em 2019.05.28, os recorrentes foram notificados da decisão administrativa da ACT Baixo Vouga, que os condenou solidariamente no pagamento de uma coima no valor de 9.180,00€ (nove mil cento e oitenta euros), pela prática, a título negligente, de uma contraordenação muito grave prevista no artigo 24º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02, conjugado com os artigos 13º da Constituição da República Portuguesa; f) Dispunham, a partir dessa atura de 20 dias para impugnar, querendo, essa decisão, nos termos previstos...

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