Acórdão nº 5/10.3PEBGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução27 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1. No processo supra identificado, por acórdão proferido e depositado em 18/10/2013, o arguido C. F.

, entre outros, foi julgado e condenado como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21, n.º 1 do DL n.º 15/93 de 22/1, na pena de 5 anos e 3 meses de prisão. Foi ainda declarado perdido a favor do Estado o veículo automóvel com a matrícula VC pertencente ao mesmo e respectivos documentos, nos termos do disposto no art. 35° do D.L n.º 15/93 de 22/1 e 109º do C. Penal.

  1. Inconformado com a referida decisão, o arguido interpôs recurso, cujo objecto delimitou com as seguintes conclusões: «1. A decisão recorrida não fixou o ano em que terão ocorrido os factos que deu como provados de 1 a 19 da matéria apurada.

  2. Tal é imprescindível porque, no limite, pelo decurso do tempo, a sua conduta até poderia estar prescrita.

  3. Impõe-se, pois, que os autos sejam remetidos à primeira instância para que possa ser fixado o ano de ocorrência de tais pretensos factos.

  4. A necessidade de a defesa poder reagir a esta concretização do ano teria acontecido se a 1ª instância se tivesse apercebido do ocorrido, por força do disposto no artigo 358º do CPP.

  5. Em alternativa, tal matéria não pode ser considerada como provada.

  6. Ninguém pode defender-se contra factos não concretizados no tempo se e quando até é relativamente fácil concretizá-los a quem acusa.

  7. A pena concreta deve ser fixada em medida inferior a 5 anos e suspensa na sua execução.

  8. Ainda que sujeita ao regime de prova.

  9. Efectivamente passaram quase seis anos sobre a decisão recorrida, o recorrente era primário à data da mesma, continua a ter CRC imaculado e era toxicodependente, à altura dos factos, vicio que ultrapassou por completa.

  10. Estão, assim esbatidas a culpa e as necessidades de prevenção.

  11. Sendo que se justifica a suspensão da pena, por se verificarem os respectivos pressupostos, ainda que condicionada a regime de prova.

  12. Ao ter entendido de outra forma, a decisão recorrida violou os artigos 71º e 53º, ambos do C.P..

  13. Nada justifica a perca da viatura de sua propriedade apreendida.

  14. É que não se verifica, no caso concreto, a sua imprescindibilidade para o cometimento do crime.

  15. Violou, pois, nesse específico, a decisão recorrida o artigo 35º do DL 15/93.

    Revogando-se a decisão recorrida, nos termos reclamados, FAR-SE-Á JUSTIÇA!» 3. O arguido requereu a realização de audiência nos termos do disposto no art. 411º, n.º 5 do CPP, tendo como base as conclusões apresentadas.

  16. O recurso foi regularmente admitido.

  17. O Ministério Público junto da primeira instância respondeu, defendendo que a circunstância de nos factos provados não constar o ano em que os mesmos ocorreram, deve-se a um mero lapso de escrita, uma vez que no acórdão, no segmento da fundamentação de facto, para além das declarações do arguido F. M., da prova testemunhal, da prova pericial o Tribunal teve ainda em consideração a demais prova documental, como seja os autos de notícia de detenção, o auto de apreensão e o auto de busca domiciliária, no qual consta que os factos ocorreram no ano de 2010 – cf. fls. 3 a 11. Relativamente à medida concreta da pena aplicada, sustentou que o doseamento é o correcto em face das consequências maléficas para a sociedade da prática do ilícito em causa e das particularidades do caso, nomeadamente a quantidade de produtos apreendidos e o período temporal da actividade delituosa, bem como volume de vendas, fazendo com que as necessidades de prevenção especial e geral sejam elevadas. Defendeu também que a perda do veículo se encontra bem fundamentada e, por isso, deve ser mantida a decisão recorrida.

  18. Neste Tribunal, o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto, após elencar proficuamente as questões suscitadas no recurso, remeteu para a audiência de julgamento a pronúncia sobre as mesmas.

  19. Teve lugar a requerida audiência.

    *II - Fundamentação Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (art. 412º, n.º 1, do CPP), sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito, suscita-se neste recurso as questões de aferir: i) das eventuais consequências de não constar dos factos provados o ano em que os mesmos ocorreram; ii) se a medida concreta da pena deve ser reduzida e suspensa na sua execução; iii) se dos factos provados não resulta a imprescindibilidade do veículo na prática do crime.

    Para tanto, deve considerar-se como pertinentes ao conhecimento do objecto do recurso os factos considerados provados e não provados na decisão recorrida e respectiva motivação (transcrição): «1-No dia 20 de Março, cerca das 23,15 H., o arguido C. F. foi visto a sair da sua residência, acompanhado pelo arguido R. M., conhecido pela alcunha de “…” e também pelo arguido F. M., Conhecido pela alcunha de “…”.

    2-O arguido C. F. dirigiu-se para a sua Mercedes Vito, de cor branca, na companhia do arguido R. M., enquanto que o arguido F. M. se dirigiu sozinho para um veículo de marca Qp modelo Corsa, de cor branca, que estava estacionado próximo do local.

    3-Em seguida, dirigiram-se todos para a zona das piscinas, nesta cidade e, ao chegarem junto do Instituto de Emprego e Formação Profissional, o arguido F. M. entrou também para a Mercedes Vito, após o que seguiram pela Ava. das Cantarias em direcção ao 1P4, tendo entrado nesta via e tornado a direcção Bragança/ Porto.

    4-Pelo facto de o arguido C. F. se fazer acompanhar dos demais arguidos, ambos referenciados nesta cidade como toxicodependentes, foi aguardado o regresso dos mesmos a Bragança.

    5-Assim, pelas 3,25 H., foram os mesmos localizados no 1P4, na zona de Macedo de Cavaleiros, já no sentido Porto/Bragança, pelo que foram os mesmos seguidos, e ao chegarem à Av. das Cantarias, em frente ao n°. …, foram os mesmos mandados parar.

    6-Aquando da sua intercepção, o arguido C. F. vinha ao volante do veículo, no meio vinha o arguido R. M. e, no lado direito, junto à janela, vinha o arguido F. M..

    7-Após os arguidos saírem do veículo procedeu-se a uma revista sumária dos mesmos.

    8-Na sequência dessa revista, apurou-se então que o arguido R. M. possuía com ele, no interior de um bolso do casaco que tinha vestido, duas embalagens em plástico, contendo um produto de cor castanha, que depois de analisado e pesado se apurou tratar-se de heroína, com o peso de 9,48 gramas.

    9-Feita também uma busca à viatura onde os arguidos se faziam transportar, foi encontrada na porta do lado do condutor um saco de plástico que continha quatro embalagens de um produto de cor branca.

    10- Produto que depois de analisado, se verificou tratar-se de cocaína, com o peso de 14,37 gramas e também três embalagens contendo um produto de cor castanha, que se apurou ser heroína, com o peso de 9,70 gramas.

    11-Os produtos encontrados e apreendidos aos arguidos apresentavam um grau de pureza bastante elevado e encontravam-se ainda em “bruto”, dais e podendo retirar que os mesmos, depois de adulterados com outros produtos dariam ainda uma quantidade maior de produto estupefaciente e, consequentemente, depois de vendidos, dariam ainda lucros mais avultados.

    12-Seguidamente e face à suspeita de que o arguido C. F. transaccionava os produtos estupefacientes no interior da sua residência e porque lá poderiam existir outros bens ou produtos relacionados com tal actividade ilícita, foi-lhe solicitada uma busca à sua residência, que ele autorizou, tendo então aí sido também encontrado: - no interior duma gaveta de uma mesa de cabeceira, no quarto, um pequeno saco de nylon, de cor preta, contendo uma embalagem de um produto branco, que após analisado, se revelou tratar-se de cocaína, com o peso de 2,69 gramas e uma outra embalagem, com um produto castanho, que depois de analisado, se apurou ser heroína, com o peso de 4,40 gramas e ainda no mesmo saco, havia um pequeno tubo de plástico, contendo cinco pequenos pedaços de cocaína, com o peso de 0,27 gramas (vulgarmente designadas por “bases”); - no armário, dentro de uma prateleira, uma caixa de metal, de cor prateada, contendo vários pedaços de um produto de cor castanha, que depois de analisado e pesado, veio a revelar-se ser haxixe, com o peso de 1,40 gramas.

    13-Os produtos apreendidos aos arguidos R. M. e C. F. e os que foram também encontrados na residência deste destinavam-se a ser vendidos aos consumidores de tais produtos que os contactassem para o efeito, permitindo-lhes angariar proveitos económicos com tal actividade.

    14- Acompanhado dos outros dois arguidos, o arguido C. F. deslocou-se a Amarante, a fim de comprar mais produtos estupefacientes, o que indica que o dinheiro obtido com a venda de tais produtos era lucrativa.

    15- O que permitia ao arguido C. F. a compra de mais produtos sem que ainda se tivesse esgotado o stock anterior e também que a procura seria bastante significativa.

    16- De tal modo que não queria arriscar a ficar sem produto para poder vender, aos consumidores que habitualmente o procuravam.

    17- Aos arguidos, no momento da sua detenção, foram igualmente apreendidos os respectivos telemóveis, bem como o veículo propriedade do arguido C. F., de marca Mercedes e modelo Vito.

    18-Os produtos estupefacientes apreendidos destinavam-se a ser vendidos pelos arguidos C. F. e R. M..

    19- O arguido C. F. vendeu produtos estupefacientes nesta cidade a várias pessoas consumidoras dos mesmos.

    20-O arguido vendeu também por diversas vezes heroína, ao preço de dez euros a dose, no interior da sua residência, a A. F., de alcunha “B.”.

    21- Igualmente o H. D., de alcunha “…”, pelo menos entre Outubro de 2009 até Março de 2010, comprou heroína ao arguido C. F., pelo preço de dez euros cada dose.

    22-Também a J. C. o arguido C. F. vendeu por inúmeras vezes heroína pelo preço de dez e vinte euros respectivamente, cada dose de heroína e cocaína, sendo também as transacções antecedidas de uma chamada telefónica a acordar o...

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