Acórdão nº 2886/16.8T9LSB.L2-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelFILIPA COSTA LOURENÇO
Data da Resolução28 de Novembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

ACORDAM EM CONFERÊNCIA, NA 9ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA RELATÓRIO No processo comum em Tribunal Singular com o nº 2886/16.8T9LSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo local criminal de Lisboa, juiz 7, o arguido e ora recorrente AA, devidamente identificado nos autos veio interpor recurso da sentença que nestes autos foi proferida a folhas 728 e seguintes, proferida em 7.11.2018, através da qual e juntamente com a co- arguida ”Fénix Working-Empresa de trabalho temporário, Ldª” foi condenado nos termos que infra se referirá.

No entanto cumpre desde já deixar assente que o arguido AA interpôs recurso intercalar a folhas 752 a 758, no entanto não deu cabal cumprimento ao nº 5 do artº 412º do C.P.P., pelo que não será o mesmo conhecido, por motivos óbvios, o que se declara.

Então: Através daquela sentença decidiu-se condenar os arguidos nos seguintes termos: A)Condenar a arguida, “Fenix Working - Empresa de Trabalho Temporário, Lda”, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na forma continuada, previsto e punido pelo artigo 107.°, com referência ao artigo 105.°, do Regime Geral das Infrações Tributárias, e 30.° do Código Penal, na pena de 350 (trezentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €5 (cinco euros), no total global de €1.750 (mil, setecentos e cinquenta euros); B)Condenar o arguido, AA, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na forma continuada, previsto e punido pelo artigo 107.°, com referência ao artigo 105.°, do Regime Geral das Infrações Tributárias, e 30.° do Código Penal, na pena de dois anos e dois meses de prisão; C)Suspender a pena de dois anos e dois meses de prisão, por igual período, ficando tal suspensão sujeita ao cumprimento da obrigação, por parte do arguido, de comprovar nos autos, no prazo de seis meses, o pagamento da quantia de €2.000 (dois mil euros), ao Banco Alimentar Contra a Fome.  D)Julgar o pedido de indemnização civil improcedente, absolvendo os demandados do pedido; E)Absolver a demandante do pedido de condenação como litigante de má fé.

Então, como se disse e não se conformando com a decisão proferida veio o arguido AA e seguintes, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal “ a quo”, apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem “ipsis verbis” ( sublinhados nossos): - III - CONCLUSÕES i.Com o presente recurso pretende o Recorrente defender-se do que considera ser uma condenação injusta, particularmente no que toca ao ter sido condenado pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal contra a segurança social, na forma continuada, previsto e punido pelo artigo 107.°, com referência ao artigo 105.°do Regime Geral das Infrações Tributárias, e 30.° do Código Penal.

ii.Recurso que versa sobre dois distintos segmentos.

a)Por um lado, e no que respeita à decisão do pedido cível, recorre-se da absolvição do Demandante na peticionada condenação em litigância de má-fé.

b)Por outro lado, e quanto ao segmento penal vem o presente recurso de apelação interposto da sentença proferida nos presentes autos, na parte em que a sentença considera preenchida a condição objectiva de punibilidade prevista na alínea b) do n.° 4 do artigo 105.° do Regime Geral das Infracções Tributárias e considera não se ter demonstrado qualquer causa da exclusão da culpa.

DA CONDENAÇÃO PELA ALEGADA PRATICA DO CRIME iii.A cabal notificação que decorre da alínea b) do n°.4 do artigo 105° do RGIT importa o conhecimento exacto do cálculo e indicação concreta das importâncias que o notificando deve pagar, se quiser evitar o procedimento criminal.

iv.Tal impõe-se, pois, que o notificando pode até estar em dívida para com outras quantias que não estão incluídas em processo concreto não estando assim obrigado a pagá-las no âmbito e para efeitos de tal notificação.

v.Deste modo, a notificação que não contenha tais elementos não satisfaz nem a letra, nem a ratio da norma pois o notificado tem o direito a saber qual é afinal a contrapartida concreta para que os factos não sejam puníveis, o que não pode ser deixado de ser notificado no acto da notificação.

vi.Doutra forma, os seus direitos, enquanto arguido de processo de natureza criminal, não estão acautelados e mostram-se, mesmo, grosseiramente violados.

vii.Nos presentes autos, e no que respeita à responsabilidade criminal do Arguido, este foi por duas vezes notificado nos termos e para os efeitos do artigo 105°, n° 4, alínea b) do RGIT, e, em ambas, para proceder ao pagamento de € 65.924,73 (sessenta e cinco mil, novecentos e vinte e quatro euros e setenta e três cêntimos) viii.Ora, como ficou cabalmente demonstrado no processo, sempre teve razão o Arguido quando foi dizer que não tinha que cumprir aquela notificação, por não ser devida aquela quantia.

ix.Não pode assim considerar-se que o aqui Arguido, e de resto também a sociedade coarguida, foram nunca notificados, nos termos e para os efeitos do artigo 105°, n°4, alínea b) do RGIT para proceder, no prazo de 30 dias, ao pagamento da quantia que representava a contrapartida concreta para que os factos não fossem puníveis x.Em face do exposto e verificando que a acusação não contem todos os factos que fundamentam a aplicação aos arguidos de uma pena, pois que, da mesma não consta a necessária condição objectiva de punibilidade exigida pelo tipo legal, impõe-se a absolvição de todos os arguidos.

xi. Impõe-se a absolvição do Arguido/Recorrente, pois, e ainda que se considere estar verificada a condição objectiva de punibilidade prevista na alínea b) do n° 4 do artigo 105° do RGIT, o que não se concede, o preenchimento desta condição não pode ser imputado ao Arguido.

xii.Notificado nos termos e para os efeitos da alínea b) do n° 4 do artigo 105° do RGIT, o Arguido/Recorrente sabia que o pagamento que lhe estava a ser exigido, já devia estar satisfeito.

xiii.Se não estava como se veio a verificar, permanecendo em dívida a quantia de 27.709,24 (vinte e sete mil, setecentos e nove euros e vinte e quatro cêntimos), e já não a quantia pela qual foi acusado, esta o montante de € 65.924,73 (sessenta e cinco mil, novecentos e vinte e quatro euros e setenta e três cêntimos), xiv.Se tal pagamento não havia ainda sido satisfeito, tal não resultou de qualquer conduta do Arguido, outrossim de uma actuação ilícita dos serviços competentes da Segurança Social.

Do PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CÍVEL xv.Devem ser apagados dos factos dados como não provados, os factos que constam nos números 1 e 2 xvi.Deve ser acrescentado aos factos dados como provados o seguinte ponto " Provado que no período a que se refere o pedido de indemnização cível deduzido, a dívida por contribuições retidas aos trabalhadores importa em € 23.628,52" xvii.E, como decorrência lógica da conclusão anterior, deve ser acrescentado aos factos dados como provados o seguinte ponto " Provado que o Instituto de Segurança Social, IP, deduziu pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar" xviii.Como resulta provado nos autos, nos termos que supra ficaram expostos, o Demandante i) deduziu pretensão cuja falta de fundamento não ignorava, ao peticionar indemnização por uma quantia que sabe não ser devida, xix.Resultando igualmente provado nos autos que o Demandante alterou a verdade dos factos omitindo factos relevantes para a lide, ao esconder do Tribunal que havia reformulado a forma como aplicou a verba proveniente da caução xx.Com esta conduta o Demandante preencheu a previsão das normas ínsitas nas alíneas a) e b) do n° 2 do artigo 542° do Código do Processo Civil.

xxi.Impondo-se como consequência que, à luz do estatuído naquelas normas, o Demandante seja condenado em litigância de má-fé xxii.A sentença recorrida comete, neste segmento, um erro de julgamento, ao considerar que "... não resulta que a mesma tivesse procedido na exposição dos factos das suas posições a uma alteração substancial dos factos que tenha sido absolutamente relevante para ajusta resolução do litígio nem que tenha agido de má fé.

xxiii.Ignorando que o Demandante deduziu pedido de indemnização civil pelos factos integradores do crime imputado ao Arguido, peticionando uma indemnização no valor de 65.924,736 (sessenta e cinco mil, novecentos e vinte e quatro euros e setenta e três cêntimos), quando, no momento em que o pedido foi deduzido, tal verba não era devida, como o Demandante bem sabia, e não tinha sequer como ignorar.

xxiv.Deste modo, deve a sentença, nesta parte, ser corrigida declarando a litigância de má-fé do Instituto de Segurança Social, LP. e, em consequência, ser aquele Instituto condenado a indemnizar o Demandado/Recorrente na quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) TERMOS EM QUE DEVE O RECURSO INTERPOSTO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER A DECISÃO RECORRIDA SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE NO SEGMENTO PENAL ABSOLVA O ARGUIDO DO CRIME DE QUE VEM ACUSADO, E QUE NO SEGMENTO CÍVEL CONDENE A DEMANDANTE EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, E NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO AO ARGUIDO DE € 10.000,00.

O recurso foi admitido a folhas 777, através de despacho judicial.

O MºPº junto da primeira instância respondeu só ao recurso apresentado pelo arguido pela forma constante de 781v., que aqui se tem por integralmente reproduzido.

Remetidos os autos para o Tribunal da Relação de Lisboa, a Digna Procuradora Geral Adjunta nela apos o seu “visto”,a fls 796.

Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o presente recurso fosse julgado em conferência.

Colhidos os vistos legais foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do mesmo diploma, cumprindo agora apreciar e decidir.

Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recuro.

FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412° do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de...

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