Acórdão nº 1154/18.5T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução19 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Sumário: 1.

Quando isso não comprometa o interesse público na administração da justiça, há que atender ao interesse das partes na determinação do foro competente para o julgamento da acção.

  1. Os pactos atributivos de jurisdição são válidos nos termos do art. 25º do Regulamento (UE) nº 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, e do art. 94º CPC.

  2. Quando ao abrigo de pacto atributivo de jurisdição válido, as partes prevêem dois foros alternativos, o português e o espanhol, pode o autor optar por instaurar a acção em qualquer deles.

  3. Quando simultaneamente com o pacto atributivo de jurisdição, as partes igualmente convencionarem qual o Tribunal territorialmente competente, não pode o Tribunal conhecer oficiosamente da questão da incompetência territorial para daí concluir pela incompetência internacional dos tribunais portugueses.

I- Relatório A “X OPTICS, S.L.”, sociedade de direito espanhol, intentou neste Juízo Central Cível de Vila Real a presente acção de processo comum contra N. A., “N. B., S.A.”, J. M., J. L., P. M. e C. M.

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Peticiona que, pela sua procedência seja(m): a) Declarada ilícita e ineficaz a resolução do acordo parassocial operada pelo 1º Réu em 30 de Outubro de 2015; b) Declarado o incumprimento definitivo do acordo parassocial, bem como o incumprimento definitivo do contrato de compra e venda por facto exclusivamente imputável aos Réus; c) Declarada a resolução por parte da Autora, quer do acordo parassocial, quer do contrato de compra e venda de acções; d) Os réus condenados solidariamente, no pagamento à Autora da quantia de € 120.000,00 (cento e vinte mil euros) a título do preço já pago por conta da compra das acções da sociedade 2ª Ré, contra a entrega das acções da sociedade 2ª Ré, no prazo e na forma que vier a ser judicialmente fixada à Autora na sentença a proferir.

e) Os réus solidariamente, condenados no pagamento de juros à Autora, às taxas legais em vigor, a contar desde a data da citação até integral e efectivo pagamento; f) Os réus solidariamente, condenados no pagamento de custas de parte e demais encargos do processo; g) Os Réus, ainda, solidariamente, condenados no pagamento à Autora de todos os prejuízos que esta situação lhe causou, os quais, por ora, não são possíveis de apurar e contabilizar, relegando-se a sua quantificação para execução em sede de liquidação de sentença.

Em sede de contestação, vieram os réus invocar a excepção de incompetência (absoluta), porquanto, em seu entender, nos aludidos contratos, as partes convencionaram expressamente a competência dos tribunais espanhóis.

Notificada, respondeu a autora, pugnando pela improcedência da excepção.

Foi então proferida decisão que julgou o Juízo Central Cível de Vila Real absolutamente incompetente para a apreciação da presente acção, por preterição das convencionadas regras de competência internacional, atento o disposto nos artigos 95º e 96º a 99º do CPC, e, ao abrigo do disposto nos artigos 576º,1,2, e 577º,a do CPC, face à verificação de uma excepção dilatória, absolveu os réus da instância.

Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (artigos 644º,1,a, 645º,1,a, 647º,1, todos do CPC).

Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1ª Da análise da cláusula 4ª do contrato de compra e venda de acções e da cláusula 5ª do acordo parassocial, resulta que Recorrente e Recorridos estipularam submeter qualquer litígio que pudesse surgir (quer relacionado com o contrato de compra e venda de acções, quer com o acordo parassocial), expressa e indistintamente, à jurisdição dos tribunais espanhóis e dos tribunais portugueses.

  1. Nos termos do nº 1 do artigo 94º do C.P.C.: “As partes podem convencionar qual a jurisdição competente para dirimir um litígio determinado, ou os litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica, contanto que a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica”. (o realce e sublinhado são nossos).

  2. As partes submeteram, expressa e indistintamente, qualquer litígio emergente dos contratos de compra e venda de acções e do acordo parassocial, à ordem jurídica portuguesa e à ordem jurídica espanhola.

  3. Daqui resulta, desde logo, que as partes reconheceram e atribuíram aos Tribunais Portugueses competência internacional para dirimir o presente litígio.

  4. Sem prejuízo destas estipulações das partes, cumpre referir que, mesmo que assim não fosse, sempre os tribunais portugueses teriam competência internacional para dirimir o presente litígio, nos termos da legislação portuguesa em vigor.

  5. Todos os Recorridos são portugueses, têm domicílio em Portugal, mais concretamente no …, excepção feita ao 6º Recorrido que tem domicílio em …, ou seja, todos os Recorridos sem excepção, têm domicílio na área da Comarca de Vila Real.

  6. Pelo que, nos termos conjugados dos artigos 59º, 62º e 71º n.º 1, todos do C.P.C., dúvidas não restam de que os tribunais portugueses têm, quer pela via contratual, quer pela via legal, competência internacional para dirimir o conflito em causa nos autos.

  7. De facto, as partes quiseram atribuir, sem preferência, competência para apreciar um eventual conflito subjacente à relação contratual em causa aos tribunais portugueses e aos tribunais espanhóis, à luz do princípio da autonomia da vontade.

  8. Princípio este reconhecido amplamente, conforme decorre da leitura do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (doravante “STJ”), relativo ao processo n.º 165595/11.1YIPRT.G2.S1, de 09-07-2014 (Gabriel Catarino).

  9. Acresce que Portugal e Espanha estão vinculadas ao Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de Dezembro, relativa à Competência Judiciária, Reconhecimento e Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial [doravante “Regulamento (UE)”].

  10. Nos termos das disposições conjugadas do nº 1 do artigo 5º, da secção 7 e do n.º 1 do artigo 25.º do Regulamento (UE) acima referido resulta que os pactos de jurisdição insertos nos contratos de compra e venda de acções e no acordo parassocial são absolutamente válidos, no que respeita à sua competência internacional.

  11. Nos termos do disposto pelo artigo 94º n.º 2 do C.P.C., mesmo que houvessem dúvidas quanto ao ordenamento jurídico aplicável, a partir do momento em que os Tribunais portugueses têm competência para o efeito, então deve entender-se que as designações convencionais estabelecem competência exclusiva dos tribunais portugueses.

  12. Sendo que, em caso de dúvida, os pactos de jurisdição permitidos pelo artigo 94.º do C.P.C. presumem que a designação é feita exclusivamente aos tribunais portugueses.

  13. A vingar o entendimento do Tribunal “a quo” de que um conflito existente nos contratos em causa nos autos no que respeita à competência territorial interna afecta a competência internacional dos Tribunais...

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