Acórdão nº 4097/15.0T9CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução26 de Junho de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo de Instrução 4097/15.0T9CBR da Comarca de Coimbra, Juízo de Instrução Criminal de Coimbra, Juiz 3 foi proferida decisão sumária em 5 de Dezembro de 2018 que rejeitou os recursos interpostos pelos arguidos, do seguinte teor: I. Relatório No processo de Instrução 4097/15.0T9CBR da Comarca de Coimbra, Juízo de Instrução Criminal de Coimbra, Juiz 3, em 17 de Novembro de 2017 foi proferida a seguinte decisão instrutória: Relatório O DM do Ministério Público deduziu acusação, requerendo o julgamento em processo comum, e perante tribunal singular, dos arguidos: - A., sociedade por quotas matriculada sob o NIPC (…), com sede na Rua (…), n.º (…), Loja n.º (…), (…) e com morada para notificação na Rua (…), (…), andar (…), (…); - B., (…), comerciante, nascido em (…), natural da freguesia de (…), concelho de (…), filho de (…), com morada na Rua (…), (…), andar (…), (…), Imputando-lhe a prática, ao arguido B., em autoria material, um crime de Abuso de Confiança em Relação à Segurança Social, na forma continuada, previsto e punível pelos artigos 6º nºs I e 2, 107º nºs 1 e 2 e 105° nºs 1, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) e pelo artigo 30° nº 2 do Código Penal e por força do disposto no art. 7º, nº 1 do RGIT, a arguida A. incorreu na prática do mesmo ilícito criminal e um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social p. e p. no art. 7. º, 107.º, n.º 1 e 2, por referência ao art. 105.º, n.º 1 e 4 da Lei nº 15/2001 de 05 de junho.

Inconformado com tal despacho veio o arguido requerer a abertura da fase da instrução, alegando, em síntese: - a substituição da acusação pela suspensão provisória do processo por se verificarem os respectivos requisitos legais elencados no artº 281 º do CPP com a - imposição de injunções que o tribunal entender e que no caso satisfazem as exigências de prevenção , geral e especial , que no caso se fazem sentir; - tal suspensão provisória deverá ser requerida pela co-arguida, A.; Foi declarada a abertura da instrução no decurso da qual foi junta pelo arguido documentação de fls. 465 a 468, 481 a 487,405 a 502; 520 a 536 e de fls. 562 a 567, de onde consta do respectivo averbamento registral a constituição de garantia de pagamento de caução no âmbito da SPP dos autos sobre o prédio, Lote de terreno destinado a construção urbana n.º 43 , localizado em (…), inscrito na matriz cadastral das Finanças sob o art.º (…) da freguesia de (…); A fls. 390 veio o requerente suscitar vício de nulidade de falta de notificação da acusação à sociedade arguida, pois o expediente foi remetido não para a sede da mesma mas para a morada do arguido requerente e sendo que este à data não era o legal representante daquela pelo que a sociedade não se encontra regularmente notificada da acusação. Já em sede de debate instrutório o arguido renunciou à invocada nulidade por ter tido conhecimento de que a sociedade arguida requereu à SS o pagamento da dívida em causa nos autos em 150 prestações sucessivas como aliás lhe é permitido pela lei aplicada.

Procedeu-se à realização do competente debate instrutório não tendo sido requerida qualquer diligência indiciária suplementar e tendo a sociedade arguida junto os elementos documentais de fls. 569 ss; Saneamento O Tribunal é competente.

Inexistem nulidades, excepções, questões prévias ou incidentais de que cumpra conhecer além da seguinte: - Da validade da notificação da acusação à sociedade arguida A.

Apesar da renúncia da arguição do vício processual de falta de notificação da acusação cumpre apreciar o mesmo já que se trata de irregularidade da notificação da acusação e constitui vicio de conhecimento oficioso em conformidade com o art.º 123 º do CPP, entre outros, Ac. TRG de 5-11-2007, CJ, 2007, TS, pág.287.

Resulta dos autos através da certidão comercial junta a fls. 328 ss que a arguida A. possui com o legal representante, gerente , desde 12 de Setembro de 2011 até à data (…) e não o requerente . A acusação foi notificada não a esta última mas ao requerente na vertente de representante da sociedade arguida.

Nesta linha e mobilizando a argumentação do Acórdão da Relação do Porto de 20-02-2013 acessível in www.dgsi.pt,O registo comercial destina-se a dar publicidade à situação jurídica dos comerciantes individuais, das sociedades comerciais, das sociedades civis sob forma comercial e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, tendo em vista a segurança do comércio jurídico. O registo constitui presunção de que existe a situação jurídica nos termos em que é definida. Entre outros factos relativos às sociedades comerciais por quotas, como é a recorrente, estão sujeitos a registo os que importem a cessação de funções, por qualquer causa que não seja o decurso do tempo, dos membros dos seus órgãos de administração. [9] Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo, embora quando sujeitos a registo e publicação obrigatória nos termos do n.º 2 do artigo 70.º só produzem efeitos contra terceiros depois da data da publicação.

Por outro lado, a notificação das sociedades feitas em processo penal segue as regras privativas dele, complementadas com as resultantes do processo civil quando necessário, mas desde que não contrariem os princípios gerais daquele. Nomeadamente, no que aqui nos interessa, os princípios do processo equitativo e do contraditório.

Ora, é norma constitucional que os arguidos em processo penal têm direito a que as causas em que intervenham sejam objecto de decisão mediante um processo equitativo e que assegure todas as garantias de defesa, incluindo a contraditar, não só na audiência de julgamento mas também nos actos instrutórios que a lei determinar. Quer isto dizer que o processo penal há-de garantir igualdade de armas à acusação e à defesa e uma efectiva oportunidade do arguido de se defender da acusação, o que passa, também, pelo direito de requerer a instrução com vista a comprovação judicial da acusação.

É dentro destes parâmetros que se deve considerar a questão aqui em dissídio. Assim, parece adequado pensar-se que só no caso da acusação deduzida pelo Ministério Público contra uma sociedade comercial por quotas ser notificada a quem efectivamente exerça a gerência se lhe permite o efectivo exercício do direito de defesa. Até porque não raras vezes a renúncia desse cargo tem subjacente um qualquer litígio com a sociedade ou sócios dela o que predispõe a situações adversas aos direitos de defesa da mesma. Daí que se nos afigure mais curial nestes casos em que a sociedade é arguida que a notificação de acusação seja feita a quem efectivamente for o seu gerente, pois que aqui se impõe não propriamente defender terceiros de actos da sociedade praticados por quem já não exerce a gerência da sociedade mas defender permitir a defesa desta de actos de terceiros. Conforme já disse em acórdão da Relação do Porto, «a autora ao propor uma acção judicial contra a ré não pode invocar que é terceiro para efeitos de registo quanto à indicação de quem é o representante legal da sociedade, requerendo que se cite seja quem for que seja ou haja sido membro do Conselho de Administração desta. A função da citação é permitir a defesa do réu contra o pedido formulado pelo autor o que só pode ser efectivamente praticado se à acção for chamada a ré, na pessoa do seu representante legal. Ora o representante legal da ré não parece completamente definido, sendo certo que, claramente não é o agravante, pelo menos com fundamento nos elementos dos autos, a menos que se demonstre que, posteriormente à renúncia que invocou veio ele a ser eleito ou designado, de novo, membro desse Conselho de Administração" E sendo esta solução, de resto, a que melhor se coaduna com os citados princípios do processo penal, naturalmente que a acolheremos.

Em conformidade considera-se regular a notificação da acusação nos termos efectuados pelo MP. Saliente-se que entendimento diferente seria caso o MP tivesse também acusado o legal representante da sociedade, o que não sucedeu pois quanto a este os autos foram arquivados. Tanto mais que a prova testemunhal recolhida em sede de inquérito - fls. 305ss, depoimentos de (…), (…), (…), (…), trabalhadores da empresa em causa no período descrito na acusação referiram de modo peremptório desconhecer por completo a gerente (…) que indicou uma morada sita na Venezuela.

Em todo o caso e mesmo que se partilhasse do entendimento de que a notificação da acusação deveria ter sido efectuada na pessoa de (…), uma vez que dos elementos dos autos resulta que a mesma se encontra com paradeiro desconhecido, tendo voltado à Venezuela sempre o processo teria de seguir em conformidade com o disposto no art.º 283º , n.º 5 do CPP e encontrando-se os direitos da mesma na qualidade de legal representante tutelados pelo instituto da contumácia.

Da suspensão provisória do processo Concordando-se com o douto Acórdão do STJ, de 13/02/08 (www.dgsi.pt) que: ( ... ) 1 - Tendo trazido a Lei n.º 48/2007 alterações significativas ao teor do art. 281.º do CPP (suspensão provisória do processo) é de aplicar imediatamente esta nova redacção ao processo em recurso, à luz do disposto no n.º 1 do art. 5.

0 do CPP, por se não verificar qualquer excepção do seu n. º 2. ( ... ) A Exposição de Motivos da respectiva proposta de lei confessa a intenção de «alargar a aplicação deste instituto processual de diversão e consenso» já fora consubstanciada em outras iniciativas legislativas e regulamentares como da Lei n.º 51/2007, de 31 de Agosto, que define os objectivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2007-2009, em cumprimento da Lei n.º 17 /2006, de 23 de Maio (Lei Quadro da Política Criminal)( ... ) A Lei n.º 48/2007, acentuou a natureza de poder-dever conferido pela norma do n.º 1 ao Ministério Público - e na instrução ao JIC - ao substituir a expressão "pode ( ... )...

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