Acórdão nº 860/18.9T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução28 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – L..., em 20/2/2018, propôs acção de processo comum contra a E..., SA, pedindo a condenação da mesma a reconhecer e respeitar o direito de propriedade dele, A., sobre o prédio identificado no art 1º da petição e, consequentemente, remover o posto de transformação nele instalado.

Alegou, em suma, que sendo dono de um determinado prédio rústico, em última análise por o ter adquirido por usucapião, foi contactado, em finais de 2011, pela R., que lhe solicitou autorização para colocar um posto de transformação tipo cabine pré-fabricado no limite nascente desse prédio, tendo o A., ultimados contactos nesse sentido, vindo a conceder tal autorização nos seguinte termos: «A presente autorização é concedida a título gracioso e precário, dela não resultando qualquer direito a v/favor, pelo que constitui v/obrigação proceder à remoção e deslocalização do equipamento se porventura a sua implantação se revelar inconveniente no futuro aproveitamento do prédio que o signatário ou qualquer dos seus sucessores vier a levar a cabo no referido prédio. Em tal caso a remoção será solicitada por escrito e deverá ser atendida no prazo de 180 dias». Alega o A. que a R. aceitou as referidas condições. Sucede que a Câmara Municipal de ... deu já início aos trabalhos para a elaboração e aprovação do plano de pormenor da área urbanizável na qual se insere o prédio do A, sendo que a presença do posto de transformação da R. prejudica o aproveitamento urbanístico de toda a frente do prédio, além de que prejudica a afectação do prédio pelo A. para outros fins, nomeadamente de locação, pelo que este solicitou, em 20/1/2016, da R. a remoção do referido posto em 180 dias, ao que a mesma nada respondeu. O A. insistiu e a R. recusa-se a proceder à remoção daquele equipamento, invocando que obteve o licenciamento da sua instalação junto da Direcção Geral de Centro do Ministério da Economia e que lhe assistia o direito de ocupar o prédio do A. enquanto não se encontrasse licenciada a execução de obra que colidisse com a presença do mesmo. Entende o A. que nada ter a ver com o licenciamento junto do Ministério da Economia a que a R. alude, pelo que a mesma carece de qualquer título que lhe confira o direito de manter o referido equipamento no seu prédio.

A R. contestou, excepcionando a incompetência material do tribunal judicial, referindo que a linha e o PT estão devidamente licenciados pelo órgão do Governo com competência para tal e que tais licenças são concedidas ao abrigo do DL 26852, de 30/7/1936, que fixa as normas a seguir para o licenciamento de todas as instalações destinadas à distribuição de energia eléctrica, entendendo que estando em causa a implantação de uma instalação eléctrica levada a cabo pela R. e devidamente licenciada nos termos da legislação aplicável, verificando-se que a constituição da respectiva servidão administrativa exigiu um acto definidor da administração pública, sendo que só após este foi imposta, e atendendo que o pedido deduzido pelo A. pressupõe, antes de mais, a impugnação do processo administrativo que conduziu ao respectivo licenciamento, são competentes para a acção os tribunais administrativos e não os judiciais. No mais impugnou a pretensão do A.

Notificado este para se pronunciar sobre a invocada excepção, fê-lo a fls 55 e ss, concluindo pela respectiva improcedência.

Foi solicitada cópia ao Ministério da Economia a decisão administrativa que culminou com o licenciamento do posto de transformação cuja remoção o A. pretende, tendo sido junto aos autos os documentos de fls 67 a 94, sobre os quais o A. espontaneamente se pronunciou nos termos de fls 96 a 98, reiterando o seu entendimento a respeito da competência dos tribunais judiciais.

Foi então proferida a seguinte decisão: Da Incompetência em Razão da Matéria: Citada a ré E..., S.A. invocou, além do mais, a incompetência material deste Tribunal dizendo para o efeito, no essencial, que a linha e o posto de transformação em causa nos presentes autos foram licenciados pelo órgão do Governo com competência, licenciamento concedido ao abrigo do DL n.º 26852, de 30/07/1936, que fixa as normas a seguir para o licenciamento das instalações destinadas à distribuição de energia eléctrica. Mais diz que a constituição das servidões administrativas de passagem sobre os prédios e terrenos dos particulares assumem natureza especial, porquanto exigem um acto da administração. O pedido formulado pressupõe, pois e como disse, a impugnação do processo administrativo que conduziu ao licenciamento da instalação eléctrica, por eventual ilegalidade ou inexistência do mesmo. Pronunciando-se o autor pugnou pela competência material deste Juízo Local dizendo, em súmula, que a licença de exploração atribuída à ré constitui acto administrativo de efeitos apenas aquela favorável sendo e ao qual foi completamente alheio, não produzindo tal licença qualquer efeito relativamente a si. Mais diz que a constituição de servidão administrativa sobre os prédios necessários para a instalação de equipamentos da concessionária depende de um acto a tanto destinado mas que não se confunde com a licença para aquela. Termina dizendo que a predita licença não envolve nem representa a constituição de uma servidão administrativa, nem o acordo celebrado com o autor representa uma relação ou contrato submetido a regime de direito público, estando-se apenas perante uma relação de direito privado, não dependendo o seu pedido da prévia impugnação do “processo administrativo que conduziu ao respectivo licenciamento”.

Cumpre, pois, aferir da existência da invocada excepção em razão da matéria, importando para tanto conhecer dos fundamentos da acção e pedido formulado.

Como bem refere Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, pág. 44, a competência dos Tribunais é a medida da sua jurisdição, ou seja, é o complexo de poderes atribuído por lei a cada um dos tribunais no exercício da sua função jurisdicional.

A este propósito refere Ferreira Pinto, in Lições de Direito Processual Civil, Almeida e Leitão L.da, 1996/1997, 2ª edição, págs. 142/143, que “(…) é a parcela ou fracção do poder abstracto de julgar que é atribuído em concreto a cada uma das categorias de tribunais existentes no nosso ordenamento jurídico – competência abstracta – é o poder que o tribunal tem, não já em abstracto mas sim em...

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