Acórdão nº 234/17.9T8VLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCONCEI
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I-RELATÓRIO Cristina (…) instaurou contra Paulo (…) a presente ação declarativa sob a forma de processo comum, formulando os seguintes pedidos: a) se proceda à emenda a partilha por falta de acordo, nos termos do disposto no art. 71° n° 2 do Regime Jurídico do Processo de Inventário, condenando o R. a: 1) Alterar o valor atribuído às verbas do ativo, constantes do mapa de partilha, para os seus valores venais; 2) Sejam recalculados e apurados os quinhões nos termos do artigo 1790º do Código Civil; 3) Seja, no seguimento, retificado o valor das tornas efetivamente devidas; 4) Seja o R. condenado no pagamento de tornas à A.

  1. Caso assim não se entenda, deve o procedimento de partilha ser considerado nulo e o R. ser condenado a proceder a nova partilha das verbas descritas neste articulado, com os valores de mercado.

    6) seja o R. condenado no pagamento de danos morais avaliados em €2.000,00 (dois mil euros) e em danos patrimoniais de valor nunca inferior a €250,00 (duzentos e cinquenta euros).

    Contestou o R. invocando a exceção da caducidade do direito de arguir a anulabilidade, no mais impugnando a factualidade alegada pela A., concluindo pela improcedência da ação.

    Foi proferida sentença que julgou a ação procedente e, em consequência, decidiu declarar nulo o procedimento de partilha outorgado entre A. e R.. em face da manifesta desproporcionalidade da partilha do património do casal dissolvido.

    *Inconformado com a sentença, veio o Réu recorrer, formulando as seguintes conclusões: 1º- Vem o presente recurso do despacho saneador-sentença que decidiu julgar procedente a ação, no que ao pedido subsidiário concerne, e, em consequência, declarar nulo o procedimento de partilha outorgado entre a Autora e o Réu.

    2º- Ao recurso ora interposto roga o apelante seja dedicada a maior atenção, e efetividade no escrutínio, porquanto, no seu firme entender, a decisão da primeira instância viola vários dos ditames por que se deve pautar o fiel desempenho da função jurisdicional, não se ancorando nas traves mestras do processo de construção da Justiça.

    3º- De facto, no caso sub judice, a decisão recorrida claramente não convence do seu mérito e bondade, e muito menos nesta fase, sem que às partes seja dada sequer a possibilidade de produzir prova, através da instrução e discussão da causa, em ordem a demonstrar que não tem qualquer sentido, no caso sub judice, a aplicação, cega, da chamada “regra da metade”; 4º- Não traduzindo a decisão proferida uma acertada interpretação e aplicação da lei e do direito atinentes à matéria e à questão cuja apreciação vem suscitada, assim como traduzindo, antes, um desrespeito para com o silogismo judiciário que se impõe cumprir numa decisão jurídico-processual de mérito, pecando por falta de uma fundamentação clara, objetiva, assertiva, suficiente.

    5º- Na contestação que introduziu em juízo, o Réu/apelante deduziu defesa por exceção e também por impugnação.

    6º- A título de exceção, alegou o Réu matéria factual consubstanciadora do abuso de direito, na modalidade do “venire contra factum proprium”, e, bem assim, a caducidade do direito de ação; 7º- Mais alegou o Réu, em termos de impugnação, a sua contribuição para os bens comuns do casal, com bens e poupanças que a ele, e só a ele, pertenciam, do seu tempo de solteiro, assim como a liquidação, após o casamento, de um empréstimo contraído pela Autora para pagamento de um imóvel por ela adquirido ainda no seu tempo de solteira.

    8º- O Tribunal “a quo” não apreciou nem se pronunciou, como lhe competia, sobre a matéria de exceção alegada pelo Réu e, designadamente, no que às exceções do abuso de direito e da caducidade do direito de ação concerne; 9º- Tal omissão de pronúncia conduz à nulidade da sentença.

    10º- Por outro lado, não se pode pegar na partilha exarada no documento nº 3 da petição inicial (de fls. 13 a 15 dos autos), agarrar-se ao teor literal dos números aí postos ou atribuídos aos bens comuns e aos bens “próprios” nela (partilha) enunciados, despidos de tudo quanto a tal respeito foi alegado pelas partes, e concluir-se, sem mais, pela nulidade da partilha, por violação da regra da metade.

    11º- A decisão em recurso comete vários “pecados”, entre os quais o de considerar que os valores pelos quais foi feita a partilha são meramente patrimoniais e não os valores venais dos mesmos, e, não obstante essa consideração, fazer o uso de tais valores (que se consideram meramente patrimoniais) para sustentar a anulação da partilha.

    12º- De facto, acaso a usar se viessem os valores venais, à data da partilha, dos bens partilhados, e acaso a permitir se viesse a produção de prova e a consideração dos valores com que cada um dos partilhantes contribuiu, no antes e no pós casamento, para tais bens, considerando, ainda, a diferente proporção que cada um deles assumiu no pagamento do passivo da responsabilidade comum do extinto casal, certamente que a concluir se viria que a dita regra da metade não se mostra violada na partilha em pronúncia. Efetivamente, 13º- Não se poderia determinar a anulação da partilha sem a comprovação do valor venal ou real dos bens partilhados à data da sua efetivação, o que não se mostra apurado (seja por recurso a prova pericial, à avaliação de tais bens, ou a qualquer outra prova admissível).

    14º- Outrossim se não poderá considerar, e dar como provado, que à data da partilha, e para efeitos da mesma, constituíam bens próprios do cônjuge mulher os descritos sob as verbas nºs 1, 3 e 6 do “Ativo” a partilhar, e bens próprios do cônjuge marido os identificados sob as verbas nºs 4 e 5 do mesmo “Ativo”.

    15º- O que acaba de se dizer contende com o disposto no artigo 1.790º do Código Civil, segundo o qual “Em caso de divórcio, nenhum dos cônjuges pode na partilha receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos”.

    16º- Conforme é consabido, e pacificamente aceite, quando naquele artigo 1.790º se diz que nenhum dos cônjuges pode na partilha receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime de comunhão de adquiridos, não se está a querer dizer que se o regime de bens do casamento foi o da comunhão geral há que considerar, para efeitos de partilha, que o regime que vigorou foi o da comunhão de adquiridos. O regime de bens não é, de forma alguma, alterado.

    17º- O que o legislador teve em vista foi, antes, estabelecer o princípio de que os cônjuges não podem receber maior valor do que o que lhes caberia receber se o casamento tivesse sido contraído segundo o regime de comunhão de adquiridos (e não subtrair da comunhão da massa de bens comuns aqueles que cada um deles levou para o casamento, ou adquiriu, na constância deste, a título gratuito).

    18º- Transpondo o que acaba de se dizer para a situação sub judice, há que concluir que (todos) os bens submetidos à partilha outorgada entre a Autora e o Réu mantém a natureza de bens comuns, como tal sendo partilháveis, simplesmente não podendo qualquer dos cônjuges receber, por via de tal partilha, maior valor do que aquele que receberiam se tivessem casado sob o regime da comunhão de adquiridos.

    ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT