Acórdão nº 4029/16.9T8STB-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelFLORBELA MOREIRA LAN
Data da Resolução08 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.

Relatório Decretada a insolvência de BB – Cooperativa de Consumo, CRL, por sentença proferida em 17 de Junho de 2016, transitada em julgado, foi prolatada a sentença de graduação de créditos, no dia 13 de Julho de 2018, na qual, e para o que ao caso importa, se escreveu: “(…) Importa considerar o art. 333º, do Código do Trabalho: “1 - Os créditos do trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação gozam dos seguintes privilégios creditórios: a) Privilégio mobiliário geral; b) Privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua actividade.

2 - A graduação dos créditos faz-se pela ordem seguinte: a) O crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes de crédito referido no n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil; b) O crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes de crédito referido no artigo 748.º do Código Civil e de crédito relativo a contribuição para a segurança social.” No que respeita ao privilégio imobiliário especial dos trabalhadores tem vindo a entender-se que, o mesmo abrange todos os imóveis da entidade patronal que estejam afectos à sua actividade empresarial e, à qual, os trabalhadores estejam funcionalmente ligados, independentemente da localização do seu posto de trabalho.

Neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30-05-2017, processo n.º 4118/15.7T8CBR-B.C1.S1, em que foi relatora a Sr.ª Juíza Conselheira Dr.ª Ana Paula Boularot, disponível em www.dgsi.pt.

Por sua vez, a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor do bem imóvel hipotecado, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo (art.º 686.º e 693.º do Código Civil).

O pagamento dos credores garantidos ocorre prioritariamente após a liquidação dos bens onerados com garantia real e abatidas as correspondentes despesas, com respeito pela prioridade que lhes caiba. O remanescente deste crédito que não se mostre integralmente pago e perante os quais o devedor responda com a generalidade do seu património, passa a ser incluído entre os créditos comuns - cf. art.º 174.º, do CIRE.

Estão nesta situação, os créditos garantidos por hipoteca.

O pagamento aos credores comuns tem lugar após o pagamento dos que sobre si prevalecem, e efectua-se na proporção dos seus créditos, se massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral (cfr. art.º 176.º, do CIRE).

Os créditos de natureza subordinada são aqueles que são graduados depois dos restantes créditos sobre a insolvência, segundo a ordem definida no art.º 48.º do CIRE.

Assim, e tendo em conta os bens apreendidos serão pagos pelo produto da venda de cada um dos imóveis, respectivamente, os créditos que gozam de privilégio imobiliário especial, da titularidade dos trabalhadores seguidos dos créditos referentes a IMI, caso existam, sobre o imóvel a que respeita o crédito e dado que beneficia de privilégio imobiliário especial, seguidos dos garantidos por hipoteca sobre o imóvel em causa; e depois pelos créditos com privilégio imobiliário geral (IRC e ISS) depois pelos créditos comuns e por fim, dos créditos subordinados.

(…) Pelo produto do bem imóvel apreendido sob a verba n.º 46, serão pagos: - Em primeiro lugar os trabalhadores; -Em segundo lugar a CC – Mútua de Seguros, CRL, com garantia hipotecária no montante de € 169.864,50; - Em terceiro lugar os privilégios imobiliários gerais da Autoridade Tributária (IRC) e do ISS; - Em quarto lugar os créditos comuns; - Em quinto lugar o crédito subordinado.

(…)” A credora, CC – Mútua de Seguros, CRL, não se conformando, neste último conspecto, com a decisão prolatada dele interpôs recurso, apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: “1. A recorrente foi notificada pelo Sr. A.I. nos termos do disposto no art. 129º nº 4 do CIRE de que lhe havia sido reconhecido um crédito no valor de € 85.180,32.

  1. A recorrente impugnou o mencionado crédito com fundamento em que o valor total do credito que detinha sobre a insolvente era superior, acrescendo àquele um outro, no valor de € 171.894,93, garantido nos termos do art. 686º do Código Civil por hipoteca de 1º grau sobre imóvel sito na Rua das …, 112 e 112 A, em Lisboa, propriedade da BB-Cooperativa de Consumo, CRL., que lhe devia também ser reconhecido nos termos legais indicados.

  2. A mencionada impugnação não foi objeto de resposta por qualquer das partes/intervenientes nos presentes autos, nomeadamente por nenhum dos trabalhadores reclamantes.

  3. Mereceu a concordância do Sr. A.I. e a Comissão de Credores não proferiu sobre a situação qualquer resposta.

  4. O Sr. Juiz a quo, na sentença ora em recurso, sob o número 5., reconhece à ora recorrente um crédito no valor total de € 257.075,25, sendo € 169.864,50 com natureza garantido por hipoteca sobre imóvel apreendido sob a verba nº 46 do auto de apreensão e € 87.210,75 com natureza comum, o que se aceita.

  5. Mas já não se aceita que pelo produto da venda do referido bem imóvel apreendido sob a verba nº 46 sejam pagos em primeiro lugar os trabalhadores, relegando-se a ora recorrente para segundo lugar, como o fez a sentença sub judice, em frontal violação do quadro normativo aplicável, ao abrigo de um suposto privilégio creditório imobiliário especial que seria concedido àqueles pelo art. 333º nº 1 b) e nº 2 b) do Código do Trabalho.

  6. Privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente de registo, de serem pagos com preferência a outros (art. 733º do CC), sendo da essência desta garantia as características de legalidade e de excecionalidade pelo que a mesma não é passível de interpretação extensiva em violação do art. 9º do CC e de analogia.

  7. Apesar de em termos literais o privilégio imobiliário do citado art.333º do Código do Trabalho incidir tão só sobre o imóvel no qual o trabalhador presta a sua atividade, a jurisprudência vem fazendo uma interpretação distendida do preceito de modo a nele incluir os imóveis da entidade patronal que estejam afetos à sua atividade empresarial e à qual os trabalhadores estejam funcionalmente ligados/em conexão efetiva, independentemente da localização do respetivo posto de trabalho.

  8. Esse entendimento não só não prescinde da alegação e prova pelos trabalhadores reclamantes da verificação dos correspondentes e necessários pressupostos fáticos quanto ao local de trabalho que poderão acionar a excecional prioridade no pagamento prescrita no art. 333º do Código do Trabalho, 10. Como requer a demonstração de uma necessária, indispensável e direta afetação dos imoveis em causa à atividade empresarial a que os trabalhadores estejam funcionalmente ligados, não se bastando com a circunstância de os mesmos constituírem meros ativos imobiliários da insolvente, uma vez que 11. No atual quadro normativo nacional não assiste aos trabalhadores um privilégio imobiliário especial sobre todo o acervo de bens imóveis pertencentes à sua entidade patronal, antes esse direito está circunscrito nos termos delineados no art. 333º do Código do Trabalho, tudo como consta da jurisprudência citada nas presentes alegações.

  9. Extravasar os mencionados entendimentos quanto à interpretação já distendida do art. 333º do Código do Trabalho e respetiva aplicação, é atingir a violação de princípios consagrados constitucionalmente, designadamente dos princípios da legalidade, da igualdade e da segurança jurídica.

  10. O Sr. Juiz a quo não podia, sem mais, decidir, como decidiu, pela prioridade dos trabalhadores no pagamento pelo produto da venda do referido imóvel, relegando a recorrente para segundo lugar, porque: - nenhum trabalhador alegou ou provou nos autos que o concreto imóvel em questão constituía o seu local de trabalho ou, sequer, que o mesmo estava afeto à atividade empresarial/económica da insolvente nos termos supra referidos, ónus que lhes cabia, - a impugnação de créditos da recorrente com a alegação de uma credito imobiliário garantido de pagamento prioritário não mereceu dos mesmos qualquer resposta; - resulta dos autos que a atividade da insolvente se concretizava na sua sede e através de 30 lojas nos locais elencados no auto de apreensão de bens móveis a fls......, neles se não incluindo o imóvel em questão, cuja descrição imobiliária nenhuma relação tem com a atividade da insolvente, integrando apenas o seu património em razão de operação de fusão; - inexiste qualquer facto nos autos que permitisse ao Sr. Juiz, sem mais, extrair a...

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