Acórdão nº 1299/16.6T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução22 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACÓRDÃO I- RELATÓRIO 1.

BB, A.

(habilitada no lugar de CC) nos autos à margem identificados nos quais figura como R. CC, não se conformando com os despachos de 21/02/2018 e 27/02/2018, que considerou, o primeiro, a testemunha DD inábil para depor nos termos dos artigos 195.º, n.º1, parte final, e 497.º, n.º1, ambos do CPC, e, o segundo, que indeferiu as declarações de parte da ora Recorrente por se tratar de acto inútil e, por isso, proibido por Lei, nos termos do artigo 139.º do CPC, deles interpôs recurso que concluiu como segue: “

  1. A testemunha DD foi a notária responsável pelo testamento da Autora CC, entretanto falecida, em 15 de Setembro de 2016 e que se encontra junto aos autos com o requerimento de Habilitação de Herdeiros.

  2. No entanto, o facto de ter conhecido a falecida no exercício das suas funções não significa, só por si, que o seu depoimento viole os seus deveres deontológicos e profissionais de notário ou que esteja a coberto do segredo profissional.

  3. Com efeito, as questões a que a Dr.ª DD teria de responder eram de carácter genérico (incidiam essencialmente sobre os cuidados a observar aquando da realização dos testamentos para avaliar a capacidade do testador, bem como a de saber como foi avaliado no caso a capacidade da Autora e como a mesma se encontrava no dia do testamento), não incidiam sobre o teor do testamento, como se pode constatar supra, pelo que as respostas da testemunha não violariam os deveres deontológicos de notário, não sendo abrangidas pelo normativo legal que impede os notários de deporem sobre factos que tiveram conhecimento no exercício das suas funções.

  4. Sendo certo que, a avaliação da capacidade / incapacidade do testador para testar não é abrangida pelo segredo profissional (ver Acórdão do TRG de 19/12/2011, CJ 2011, T.V., pp 298).

  5. Acresce que o art.º 497.º, n.º 3, não estabelece qualquer inabilidade ou impedimento da testemunha que esteja sujeita a sigilo profissional.

  6. Com efeito, o juiz não pode, em princípio, com base nesse preceito, impedir o depoimento de quem se lhe apresente e pretenda depor, antes o deverá admitir valorando depois o depoimento, tendo em atenção essa particularidade.

  7. O preceito está concebido essencialmente para proteger o depoente e não para o impedir de depor, ou seja, constitui uma prerrogativa, não um impedimento (vide Ac. TRL de 18/09/2014, proferido no âmbito do processo 718/13.8TVLSB-B.L1.-2, disponível em www.dgsi.pt.) H) Por sua vez, nos termos do disposto do artigo 466.º, n.º1, do CPC, “as partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo.” I) Com as declarações de parte, ao contrário do que sucede com o depoimento de parte, não se visa obter nenhuma confissão, destinando-se, unicamente, a esclarecer factos que, no entender da parte, ainda não se encontrem suficientemente esclarecidos, ou que só o próprio é que consiga esclarecer.

  8. Ora, “a assistência” ou não da parte à audiência não é condição de admissão ou não de tal meio de prova, nem o torna só por si “inútil”, pelo que o tribunal não poderia indeferi-lo com tal justificação e muito menos alegando que a sua audição seria um acto inútil e, por isso, proibido por Lei, nos termos do artigo 139.º do CPC (o tribunal, sublinhe-se, alude a este artigo, embora o mesmo não tenha nada a ver com esta questão…).

  9. Aliás, as declarações de parte, na esmagadora maioria das vezes, só fazem sentido no final da audiência de julgamento e após a parte ter ouvido os depoimentos das diferentes testemunhas porque só, nessa altura, é que poderá surgir a necessidade de esclarecer factos que não estejam ainda suficientemente esclarecidos.

  10. Só por manifesta ingenuidade é que, hoje, alguém pode afirmar que o facto de a parte ter estado presente na audiência de julgamento pode pôr em causa a integridade das suas declarações como se o facto de não estar presente na audiência fosse garantia de que a parte não soubesse o que lá se passou.

  11. Ao recusar tal meio de prova com os fundamentos aduzidos no despacho, agiu o tribunal preconceituosamente relativamente à parte, valorando a sua credibilidade e integridade, sem antes sequer ouvir as suas declarações, o que não é de maneira nenhuma aceitável.

  12. Decidindo, como decidiu, violou o Exmo. Juiz, designadamente, o disposto nos artigos 195.º, n.º1, 466.º, n.º1 e 497.º todos do CPC.

NESTES TERMOS, e porque só assim se fará justiça, deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, serem revogados os doutos despachos recorridos, substituindo-se por outros que admitam o depoimento da testemunha DD e as declarações de parte da Recorrente.”.

  1. Nas suas contra-alegações o recorrido sustentou energicamente a manutenção do decidido.

  2. Dispensaram-se os vistos.

  3. O objecto do recurso, delimitado pelas enunciadas conclusões (cfr.artºs 608º/2, 609º, 635º/4, 639º e 663º/2 todos do CPC) reconduz-se à apreciação das seguintes questões: a) Se ocorre inabilidade legal (ou outro impedimento) para a notária, Dra. DD, depor como testemunha; b) Se a circunstância de a A. ter assistido ao desenrolar da audiência final constitui impedimento à prestação de “declarações de parte”.

    II- FUNDAMENTAÇÃO 1.

    Os factos a considerar na decisão deste recurso são os que constam do antecedente relatório e, bem assim, que é o seguinte o teor da decisões proferidas pelo Tribunal “ a quo” no decurso da audiência final: 1.1. No dia 21.1.2018: “ Admito o incidente de impugnação de testemunha deduzido.

    Quanto ao invocado na mesma, a matéria sobre qual assenta já se mostra confessada nos autos, isto é, o facto da Senhora Notária apenas conhecido a Autora (falecida) no exercício das suas funções, aquando da realização do testamento já junto aos autos, não tendo tido qualquer outro contacto ou relação de proximidade/ parentesco com a mesma.

    Assim, passo a conhecer, nos termos do disposto no artigo 519.º n.º 3 do C.P.C.

    Nos termos do artigo 81.º da Lei n.º 155/2015, de 15 de Setembro “1 - O notário é obrigado a sigilo em relação a factos e elementos cujo conhecimento lhe advenha exclusivamente do exercício da profissão ou do desempenho de cargos na Ordem.

    2 - Os factos e elementos cobertos pelo sigilo só podem ser revelados nos termos previstos na lei ou, ainda, por decisão da direção da Ordem, ponderados os interesses em conflito.” No artigo 497º do Código de Processo Civil, integrado na subsecção sobre as inabilidades para depor como testemunha, estabelece-se que: 1 - podem recusar-se a depor como testemunhas, salvo nas acções que tenham como objecto verificar o nascimento ou o óbito dos filhos: a) os ascendentes nas causas dos descendentes e os adoptantes nas dos adoptados, e vice-versa; b) o sogro ou a sogra nas causas do genro ou da nora, e vice-versa; c) qualquer dos cônjuges, ou ex-cônjuges, nas causas em que seja parte o outro cônjuge ou ex-cônjuge; d) quem conviver, ou tiver convivido, em união de facto em...

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