Acórdão nº 1568/16.5T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Junho de 2018
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 07 de Junho de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO AA instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra BB, pedindo que este seja condenado: a) a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre o prédio urbano sito na Aldeia da Azoia, lote …, freguesia de Sesimbra (Castelo), inscrito na matriz predial da citada freguesia sob o art.º … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …; b) a restituir à autora a posse do imóvel livre de pessoas e dos seus bens; c) a pagar à autora a quantia de € 300,00 a título de indemnização por cada mês de ocupação abusiva daquele imóvel; d) a pagar à autora as despesas suportadas por esta na substituição de canhões de fechadura para entrar na sua habitação.
Alegou a autora, em síntese, que adquiriu por escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, datada de 17 de Maio de 2012 o referido prédio, pelo preço de € 126.173,53, sendo o mútuo no montante de € 100.000,00, tendo-se o réu constituído fiador para garantia do pagamento da quantia mutuada, sendo que à data autora e réu namoravam.
A autora abriu uma conta bancária com domiciliação de ordenado para ter condições mais vantajosas no crédito, da qual o réu veio a ser o segundo titular, tendo o mesmo passado a transferir um valor mensal para aquela conta sob a modalidade de ordenado mas essa mesma quantia era-lhe devolvida pela autora a maioria das vezes em dinheiro, sendo certo que desde Dezembro de 2015 a autora nunca mais entregou dinheiro em mão ao R., transferindo sempre daquela conta o montante do vencimento do réu ali creditado.
Não obstante do namoro entre ambos ter nascido uma filha, autora e réu mantiveram sempre vidas separadas e rotinas normais de fins-de-semana, existindo uma separação total de rendimentos e, por esse motivo, a autora sempre proveu à devolução do rendimento que o réu auferia naquela conta bancária, tendo, aliás, o namoro entre ambos terminado em 23.12.2014, mas o réu continua a ocupar o imóvel sem qualquer título que o legitime nem autorização da autora para tanto.
O réu contestou, afirmando ser comproprietário do imóvel dos autos em virtude de ter iniciado com a autora uma relação amorosa em 0.07.2009, pernoitando juntos quer na casa do réu em Sesimbra quer na casa da autora em Lisboa, com regularidade, tendo o casal acordado que iria estabelecer vida em conjunto, passando a residir na mesma casa que seria partilhada por ambos. Porém, como não tinham capacidade financeira para pagar o preço da casa sem recurso a crédito bancário e como o banco mutuário exigiu a existência de um fiador, optaram por adquirir a casa em nome da autora ficando o réu como fiador, o que se ficou apenas a dever a razões fiscais e de financiamento mais fácil, mas sempre ambos consideraram a casa como bem comum, tanto mais que ambos participaram com dinheiro próprio na sua aquisição, estando o valor desta a ser partilhado de forma igual por ambos.
Alegou também o réu ter suportado com a aquisição da moradia em causa, o valor de € 5.986,02 referente ao pagamento do Imposto de Selo e de IMT; ter realizado uma transferência no valor de € 2.000,00 para uma conta conjunta de autora e réu no dia 16.05.2012, para pagamento de despesas da casa; ter realizado outra transferência no valor de € 2.000,00 para a mesma conta no dia 17.05.2012, igualmente para pagamento de despesas; ter pago ainda as prestações do empréstimo para aquisição da casa até Maio de 2015, num valor total de € 12.555,04; e, por último, ter realizado obras no sótão da casa em 2014, nas quais despendeu a quantia de € 2.150,00.
Mais alegou o réu que a autora, antes da propositura da presente ação acordou consigo que este continuaria a habitar o imóvel em causa nos autos mediante o pagamento de uma contrapartida, tendo assim direito a usar a casa uma vez que é seu legítimo possuidor estando ainda a pagar um encargo pela mesma.
Deduziu ainda o réu reconvenção, formulando os seguintes pedidos: a) ser a autora condenada a reconhecer que ela e o réu vivem em união de facto desde 2012; e b) que a casa dos autos foi adquirida por ambos em comum e sem determinação de parte ou direito; c) ser reconhecido o direito ao réu a utilizar a casa dos autos como comproprietário, membro do casal em união de facto ou como arrendatário nos termos do último acordo celebrado entre as partes.
Subsidiariamente, caso o pedido reconvencional indicado na alínea b) não seja considerado procedente então deve a autora ser condenada a: a) restituir ao réu a quantia de € 17.877,40 que este pagou por conta do preço e encargos da casa, acrescida de juros de mora; b) pagar ao réu a quantia de € 7.500 euros referente às obras e benfeitorias que o mesmo realizou na casa dos autos, acrescida de juros de mora; c) reconhecer que o autor tem o direito a reter a casa, nos termos do disposto no artigo 754º do CC, enquanto a autora não lhe pagar as quantias referidas nas alíneas a) e b) supra.
A sustentar os pedidos subsidiários formulados em a) e b), alegou o réu que as quantias em causa foram feitas no pressuposto de que a casa seria um bem comum de autora e réu e que, não o sendo, o pagamento das mesmas corresponde a um enriquecimento da autora à custa de um empobrecimento do património do réu, pois a mesma beneficiará do pagamento inferior do preço da casa pelo facto do réu ter liquidado esse valor, convencido que estava a adquirir um bem, sendo que o réu nunca teria pago tais quantias se não tivesse sido acordado que a casa também seria sua ou se a mesma viesse a deixar de o ser por razões alheias à sua vontade. Além disso, o réu realizou despesas com melhorias e obras realizadas na casa das quais se quer ver ressarcido.
Convidado a aperfeiçoar/esclarecer o pedido formulado subsidiariamente em c), veio o réu dizer que por força das obras que realizou no sótão e pelos créditos que detém sobre a autora por força dessas obras e pelo pagamento do crédito à habitação, sempre terá o direito a reter a casa até que sejam liquidadas essas importâncias Foi realizada audiência prévia, tendo sido admitido o pedido reconvencional, foi feito convite às partes para aperfeiçoarem a matéria de facto vertida nos respetivos articulados, bem como a fundamentação jurídica, e foi dado conhecimento às partes da possibilidade de conhecimento imediato parcial do mérito da causa, com observância do contraditório, prescindido autora e réu de nova marcação de audiência prévia.
As partes vieram responder ao convite ao aperfeiçoamento, tendo o réu apresentado um articulado superveniente que foi parcialmente admitido.
Em 21.04.2017 foi proferido saneador-sentença onde se decidiu: «a) Julgar de imediato a ação parcialmente procedente e em consequência: a.1) Declarar reconhecido o direito de propriedade da Autora sobre o prédio urbano situado na Aldeia de Azoia, lote …, constituído por Rés-do-chão para habitação, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob a ficha n.º …/20010903; e b) Julgar de imediato a reconvenção parcialmente improcedente, e em consequência: b.1) Absolver a Autora de todos os pedidos reconvencionais principais.
Do assim decidido recorreu o réu, mas este Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 26.10.2017, transitado em julgado em 04.12.2017, julgou o recurso improcedente e confirmou a decisão recorrida.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual a autora confessou ter feito seus os valores pagos pelo réu a título de imposto de selo e IMT, considerando-os o reembolso de pagamento de serviços por ela prestados.
A final foi proferida sentença em cujo dispositivo se consignou: «Pelo exposto julga-se a presente acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência: - Condena-se o R. a restituir à A. o prédio urbano sito na Aldeia da Azoia, lote …, freguesia de Sesimbra (Castelo), inscrito na matriz predial da citada freguesia sob o art.º … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …, livre de pessoas e dos seus bens; - Condena-se o R. a pagar à Autora a quantia de € 300,00 (trezentos euros) a título de indemnização por cada mês de ocupação abusiva do imóvel, desde Abril de 2015 até efectiva entrega do imóvel, quantio deduzida dos valores que o R. tenha pago na sequência da transacção entretanto efectuada pelas partes em sede de providência cautelar; - Condena-se o R. a pagar à A. a quantia de 139,10 € (cento e trinta e nove euros e dez cêntimos).
Absolve-se o R. do remanescente peticionado.
*Condena-se a A. a restituir ao R. a quantia de 15.941,06 €, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, desde 22/3/2016 e até efectivo e integral pagamento.
Absolve-se a A. do remanescente peticionado.
*Custas por A. e R. na proporção dos respectivos decaimentos.
» Inconformado, o réu apelou do assim decidido, tendo finalizado as respetivas alegações com as conclusões que a seguir se transcrevem: «I - Face ao depoimento de parte da A. e à prova produzida pelas testemunhas Ricardo …, Luis … e Manuel … deve o quesito 33 ser alterado de forma a indicar que: o valor da mão de obra foi de cerca de 1.000 euros e deve dar-se como provado que: II - As obras efectuadas no sótão da casa melhoraram as condições de habitabilidade da casa, criando uma arrecadação e aumentaram o seu valor; III - Antes das obras realizadas pelo R. o sótão da casa não estava habitável nem tão pouco acessível e depois dessas obras a casa ficou com mais cerca de 20 m2 de área utilizável.
IV - Face aos elementos da prova, estas obras foram realizadas quando a A. habitava a casa e no interesse e a mando desta.
V - Desta forma, o R. agiu aqui numa posição muito semelhante à de um empreiteiro.
VI - Não se trata, assim, de benfeitorias realizadas por um possuidor (arrendatário ou comodatário), trata-se do pagamento do preço da mão de obra de uma empreitada ou de uma prestação de serviços.
VII - É, assim, irrelevante saber se as obras consistiram em benfeitorias e a natureza...
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