Acórdão nº 878/16.6T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018
Magistrado Responsável | TOM |
Data da Resolução | 08 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Processo nº 878/16.6T8FAR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível – J3 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, proposta por Oksana (…) contra “Seguradoras (…), SA” (anteriormente “…– Companhia de Seguros, SA”), a Ré não se conformou com a sentença proferida nos autos e interpôs recurso dessa decisão.
* A Autora pediu a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 325.600,00 € (trezentos e vinte e cinco mil e seiscentos euros), a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência de acidente de viação.
* Em benefício da sua posição, alegou, em síntese, que ocorreu um acidente de viação do qual resultou a morte do marido, que lhe provocou danos de natureza patrimonial e não patrimonial e cuja verificação imputa a culpa da outra condutora interveniente no mesmo. A responsabilidade civil por danos causados a terceiros encontrava-se transferida para a Ré.
* No articulado de contestação, a Ré impugnou a generalidade dos factos alegados na petição inicial relacionados com o embate ocorrido e os danos sofridos.
* Foi deduzido incidente de intervenção acessória provocada da condutora do veículo seguro. Admitido o referido incidente, a interveniente impugnou a versão apresentada pela Ré quanto à dinâmica do acidente.
* Foi citada a instituição de segurança social da qual era beneficiário o falecido, a qual não apresentou qualquer articulado.
* Foi dispensada a realização da audiência prévia, proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, sem que tenha sido apresentada reclamação.
* Realizada a audiência final, o Tribunal «a quo» decidiu condenar a Ré “Seguradoras (…), SA” a pagar à Autora Oksana (…) a quantia de € 47.500,00 (quarenta e sete mil e quinhentos euros), a título de danos patrimoniais e de € 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da prolação da sentença até integral pagamento, absolvendo a Ré do demais peticionado.
* A recorrente não se conformou com a referida decisão e apresentou alegações com as seguintes conclusões:
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Da análise conjugada dos factos dados como provados nºs 15, 17, 19 verifica-se uma evidente contradição, à qual se aludiu nos pontos 1 a 5 das alegações, padecendo tais factos, nessa medida, de um erro de julgamento.
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O facto dado como provado nº 17 deverá ser entendido, lido e interpretado, de acordo com a seguinte redacção: "No pavimento foi deixado pelo veículo ligeiro um rasto de travagem de 86,80m, desde o local do embate, até à imobilização de tal veículo", devendo ser proferida decisão nesse sentido, de acordo com o alegado no ponto 7 das alegações.
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Igualmente, deverá ser proferida decisão que exclua o facto dado como provado sob o nº 19 do elenco de factos provados aposto na Sentença Recorrida, em consonância com o invocado no ponto 9 das alegações.
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Quanto ao facto dado como não provado sob a al. c) da Sentença Recorrida, na esteira do mencionado nos pontos 12 a 14, subsiste uma contradição entre o mesmo e a Fundamentação de Facto, pelo que, em harmonia com o disposto no artigo 615º, nº 1, al. c), in principio, do CPC deverá ser declarada a nulidade da sentença, no que respeita à decisão que deu como não provado o facto constante da al. c) da matéria factual, com todas as consequências legais.
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Das declarações de parte de (…) e do depoimento da testemunha (…) resulta uma versão dos factos que permite concluir que o Tribunal a quo não deveria ter dado como não provado o facto plasmado na al. c) dos factos dados como não provados, mas sim como provado, devendo ser proferida decisão nesse sentido, aditando-o ao elenco dos factos provados.
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Relativamente ao facto dado como não provado sob a alínea e), verifica-se uma contradição entre a decisão sobre o facto em crise e a Fundamentação da Decisão, na parte concernente com a matéria de Direito, a qual, nos termos do artigo 615º, nº 1, al. c), in principio, do CPC é cominada com a nulidade da sentença, no que respeita à decisão que deu como não provado o facto constante da al. e) da matéria factual, a qual deverá ser declarada, com todas as consequências legais.
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Ainda quanto a este facto, da conjugação das declarações de parte da Interveniente (…), com o depoimento prestado pela testemunha (…), resulta também que o condutor do velocípede terá guinado para a esquerda aquando a execução da manobra de ultrapassagem pela condutora do veículo seguro, devendo ser proferida decisão que dê o facto constante da al. e) dos factos não provados como provado, aditando-o ao elenco de factualidade provada.
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No que respeita ao facto dado como não provado sob a al. f) verifica-se, novamente, uma contradição entre a decisão sobre a matéria de facto e a fundamentação utilizada pelo Tribunal a quo em ordem a decidir da mesma, razão pela qual, aplicando o artigo 615º, nº 1, al. c), in principio, do CPC deverá ser declarada a nulidade da sentença no que respeita à decisão que deu como não provado o facto constante da al. f) da matéria factual, com todas as consequências legais.
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Sem prescindir, também quanto a este ponto, entendemos que terá de ser proferida decisão que dê o facto vertido na al. f) da Sentença como provado, ao invés de não provado, aditando-o ao elenco dos factos provados. j) No atinente com a Matéria de Direito, sendo a situação dos autos enquadrável no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, para que exista obrigação, por parte da Recorrente/Ré, de indemnizar a Recorrida/Autora, é necessária a verificação cumulativa dos cinco pressupostos estatuídos pelo artigo 483º, nº 1, do CC: i) facto voluntário do agente; ii) ilicitude; iii) culpa; iv) dano e v) nexo de causalidade entre o facto e o dano.
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Para a verificação do primeiro desses pressupostos – facto voluntário do agente – seria necessário que a conduta da condutora do veículo seguro lhe pudesse ser imputada em virtude da sua vontade.
I) Do exposto nos pontos 47 a 58 (inclusive) das Alegações, resulta que não se encontra observado o primeiro pressuposto da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, atenta a inobservância, por parte da condutora do veículo seguro, de qualquer comportamento por si dominável e a si imputável, susceptível de causar o presente sinistro, sendo certo que foi o comportamento adoptado por Mykhailo (…) que constituiu a única e exclusiva causa subjacente à ocorrência do sinistro em apreço.
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No que respeita ao pressuposto "culpa", são excepcionais os casos de responsabilidade sem culpa, nos quais só existe obrigação de indemnizar nos casos especificados na lei, conforme, aliás, estatui o art. 483º, nº 2, do CC configurando a responsabilidade civil pelo risco, na parte relativa aos acidentes causados por veículos uma dessas situações.
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Devendo a culpa ser entendida, em sentido normativo, como a omissão da diligência que seria exigível ao agente de acordo com o padrão de conduta que a lei lhe impõe, decorre do sufragado nos pontos 56 a 73 que tal diligência não foi omitida pela condutora do veículo seguro.
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Dos pontos 74 a 96 das Alegações, retira-se, em suma, que a culpa subjacente à ocorrência do sinistro é imputável, na proporção de 100%, ao condutor do velocípede.
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Estando afastado o pressuposto da culpa da lesante e demonstrada a culpa integral do lesado, inexiste, para a Recorrente, qualquer obrigação de indemnizar a Recorrida, devendo ser a decisão recorrida ser substituída por outra que absolva a Recorrente do pedido.
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Caso se entenda pela verificação de uma concorrência de culpas da lesante e do lesado (e correspondente responsabilidade) subjacente à ocorrência do sinistro, por mera cautela de patrocínio e salvo melhor opinião, não poderá ser fixada na proporção de 60% para o condutor do velocípede e 40% para a condutora do veículo seguro.
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A entender-se pela existência de uma concorrência de culpas na ocorrência do sinistro, considerando o dissertado nos pontos 98 a 101 das Alegações, sempre esta deverá ser fixada na proporção de 90% para o condutor do velocípede e de 10% para a condutora do veículo segurado e, nessa conformidade, ser a decisão recorrida substituída por uma outra que condene a Recorrente tendo presente a mencionada proporção e a absolva quanto ao demais.
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Também para a eventualidade de se entender que a Recorrente terá alguma responsabilidade pela regularização do sinistro em apreço, sempre o quantum indemnizatório fixado na Sentença Recorrida relativamente à violação do direito à vida e danos morais daí decorrentes, nomeadamente o dano vida em si, o dano moral da própria vítima e os danos morais resultantes do sofrimento da Recorrida, afigura-se exacerbado.
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Neste conspecto, cremos que o Tribunal a quo deveria ter aplicado a Portaria 377/2008, de 26/05, com as alterações constantes da Portaria 679/2009 de 25/06.
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Da aplicação de tais Portarias e dos respectivos anexos, a que se aludiu nos pontos 104 a 117 das Alegações, verifica-se que o montante total máximo que a Recorrida teria direito a receber a título de indemnização por danos não patrimoniais, resultante do somatório dos montantes elencados nos pontos antecedentes, seria de € 73.872,00.
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Uma vez que a Recorrente apenas responde pelo pagamento da indemnização fixada na proporção da responsabilidade fixada para o segurado deverá, neste cenário, o quantum indemnizatório ser determinado em consonância com a proporção da responsabilidade fixada para a condutora do veículo seguro na Recorrente, o que certamente será objecto de apreciação por este Tribunal ad quem.
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Concluindo, atento o exposto, a Sentença Recorrida violou o disposto nos artigos 483º, 496º, 499º, 503º, 505º, 563º, 564º e 570º, todos do Código Civil.
Termos em que, i) Atentos...
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