Acórdão nº 1752/12.0TBVNO-E.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelMATA RIBEIRO
Data da Resolução06 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA Nos autos de inventário a que se procedeu, por óbito de Deolinda M…, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo Local Cível de Ourém) em que são interessados BB (requerente do inventário), CC (cabeça de casal), DD, eE, FF, GG, HH e iI - Agência Imobiliária, S. A (donatária), veio esta, na sequência de notificação que lhe foi feita após ser realizada a conferência de interessados, na qual foi requerida a licitação de bens que lhe haviam sido doados (verbas n.ºs 15 e 16 da relação de bens), dizer que se opunha “à licitação sobre os bens doados” por resultar das licitações a inoficiosidade da doação, bem como requerer a realização de “avaliação dos bens sobre o ius relictum[1] da herança, isto é, das verbas n.ºs 1 a 14” ao abrigo do disposto no artº 1367º n.º 2 do CPC.

Por despacho de 21/02/2018, a realização da avaliação foi indeferida e nele, além do mais, foi ordenada a notificação das “interessadas DD (…) e BB (…), que vieram solicitar a licitação dos bens doados à donatária II pela inventariada, que se encontram identificados sob as verbas nº 15 e 16 da relação de bens, para virem, no prazo de 10 dias, esclarecer se pretendem solicitar a avaliação desses bens nos termos do artigo 1365º, nº 1 do CPC, atenta a oposição à licitação por parte da donatária.”*Irresignada com a dupla vertente desta decisão, interpôs a donatária o presente recurso e apresentou as respetivas alegações, terminando por formular as seguintes «conclusões»[2], que se transcrevem: “A. O presente recurso vem interposto do despacho de fls. 947 a 959 que indeferiu o pedido da Recorrente formulado no requerimento de fls. 837 a 840 dos autos de avaliação do ius relictum da herança, ao abrigo do regime previsto no artigo 1367º, nº 2 do CPC e com os fundamentos vertidos nesse requerimento.

  1. O Tribunal a quo indeferiu tal pretensão por entender que o regime do artigo 1367º, nº 1 do CPC prevê que: “(…) o donatário apenas poderá solicitar, nos ternos desta norma, a avaliação dos restantes bem da herança a partilhar, para além dos doados, caso resulte de forma evidente dos valores constantes da relação de bens que a doação é inoficiosa”. Ora, da análise dos valores dos bens que constam da relação de bens não resulta de forma evidente que a doação dos bens pela inventariada à donatária II será inoficiosa. Em conformidade, como se não regista o fundamento legal previsto naquele artigo 1367º, nº 1, não será viável deferir a pretensão da donatária II para se proceder à avaliação dos outros bens que fazem parte da herança a partilhar nos autos e que não foram doados.

    ” C. E, ainda, em alegada ocorrência de prescrição do direito cujo exercício era requerido por entender que «o donatário apenas poderá pedir a avaliação dos bens da herança que não foram doados, antes de ocorrer a licitação dos mesmos. Logo depois de ser efetuada a licitação dos bens da herança que não foram doados, o donatário já não poderá vir a solicitar a avaliação dos mesmos. Percebe-se que assim seja, na medida em que quando ocorre a licitação fica cumprido o objetivo da avaliação, designadamente que seja fixado o valor real dos bens em causa.

    » D. Adicionalmente o Tribunal a quo ordenou, em consequência do requerimento de fls. 837 a 840 dos autos, da donatária, a notificação das interessadas «para virem, no prazo de 10 dias, esclarecer se pretendem solicitar a avaliação desses bens nos termos do artigo 1365º, nº 1 do CPC, atenta a oposição à licitação por parte da donatária.

    » E. Não se conformando a Recorrente com o teor das supra referidas decisões, vem delas interpor o correspondente recurso.

  2. A lei processual prevê, nos termos do disposto do artigo 644º, nº 2, al. d) do CPC a possibilidade de recurso de apelação dos despachos sobre admissibilidade de meios de prova. A prova pericial unifica hoje o regime dos antigos três tipos de prova pericial existentes (exame, vistoria e avaliação), sendo que a lei processual precisamente previa, quanto a este último tipo (artigo 568º, nº 3 do CPC, na versão originária do código), tratar-se de prova que “tem por fim a determinação do valor de bens ou direitos”.

  3. É, pois, inquestionável que a avaliação é, como sempre foi, “um meio de prova por arbitramento”. O pedido de avaliação formulado pela Recorrente decorre, pois, do exercício do direito à prova, e o seu objeto consistiu na produção de prova por uma parte processual. O seu indeferimento consubstancia, assim, uma decisão judicial de rejeição de um meio de prova requerido por uma parte processual.

  4. Por outro lado, a notificação a uma parte processual para esclarecer se pretende solicitar a avaliação do ius donatum consubstancia um despacho judicial que determina não só um meio de prova, como a concessão a uma parte processual de um mecanismo de prova (e significativamente em sentido inverso ao da outra parte do mesmo despacho recorrido) que, no contexto em que foi decidido, não é admissível. Assim sendo, o despacho de fls., nessa parte, é também recorrível nos termos em que nesta apelação apresentamos o recurso.

    I. A donatária não esteve presente na conferência de interessados de 9.11.2017. Como decorre da correspondente ata, em função do que aconteceu nessa conferência de interessados, foi o Tribunal, por sua iniciativa, que decidiu notificar a donatária e ora Recorrente para esta “se pronunciar sobre se pretende opor-se à licitação das verbas 15 e 16 da relação de bens da Inventariada”, tendo-o decidido na conferência e tendo-o concretizado através do despacho de fls. vertido na referida ata.

  5. Tendo o decidido na Conferência de Interessados e este despacho de fls. transitado em julgado, existe caso julgado formal nos autos: à donatária foi concedido o direito de se poder opor a essa licitação sobre o donatum, licitação que havia ocorrido na conferência de interessados (cfr. acta de 09.11.2017), sem que a mesma tivesse ocorrido sobre os bens doados justamente por não existir decisão … pelo que não houve licitação sobre o donatum.

  6. Ora, nos termos do disposto no artigo 1367º, nº 2, do CPC, em função dessa mesma decisão justamente passou a caber à donatária, se assim o entendesse, requerer (ou não) a avaliação dos bens do relictum, o que esta fez a fls., e lhe foi recusado pelo despacho recorrido, com o fundamento de que tal só seria admissível “caso resulte de forma evidente dos valores constantes da relação de bens que a doação é inoficiosa” e entendeu o Tribunal que “(…) da análise dos valores dos bens que constam da relação de bens não resulta de forma evidente que a doação dos bens pela inventariada à donatária II será inoficiosa.” L. Andou mal o Tribunal a quo nesta matéria. Em primeiro lugar, aplica-se in casu o nº 2 do artigo 1367º do CPC, e não, como por lapso considera o despacho recorrido, o nº 1 daquela norma.

    Em segundo lugar, o regime desta disposição legal não prevê que o donatário apenas possa solicitara avaliação do relicutm “caso resulte de forma evidente dos valores constantes da relação de bens que a doação é inoficiosa”. O donatário, outrossim, pode pedir a avaliação do relicutm caso tal inoficiosidade resulte quer dos valores da relação de bens, quer do resultado das próprias licitações. Que foi exatamente o que aconteceu.

  7. Basta compulsar as licitações constantes da ata da conferência de interessados ocorrida a 09.11.2017 de fls., e a relação de bens de fls., para se verificar que o valor total da herança é de € 1.569.721,40, sendo composta por Desta composição da herança retira-se (evidentemente) que a herança é composta por um relictum no valor de € 840.540,00; um donatum no valor de € 729.181,37, não tendo passivo.

  8. Daqui decorre que o valor da herança, calculado nos termos do artigo 2162º do CC, é de € 1.569.721,40, sendo o valor da quota indisponível de € 1.046.480,90, correspondendo a 2/3, nos termos do artigo...

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