Acórdão nº 3132/17.2T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução06 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: 1. Pretendendo o juiz efectuar um enquadramento jurídico diverso do alegado pelas partes, deve previamente garantir o exercício do direito de contraditório, sob pena de proferir decisão-surpresa.

2. A anulação da decisão recorrida por omissão do contraditório não origina a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objecto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários.

3. Estão sujeitas ao regime das cláusulas contratuais gerais, as inseridas em adenda ao contrato, pré-elaboradas pela empresa predisponente, e relativamente às quais não se demonstrou terem resultado de uma efectiva e ponderada negociação contratual.

4. A cláusula que confere à empresa de manutenção de elevadores, em caso de denúncia sem justa causa pelo utilizador, o direito a receber antecipadamente e na íntegra o valor das prestações contratuais devidas até ao termo do prazo estipulado, sem ter de efectuar a contrapartida desse preço, de manutenção dos elevadores, com os correspondentes custos com pessoal e material, excede, objectivamente, o montante dos prejuízos decorrentes da antecipação do prazo de cessação do contrato.

5. Tal cláusula confere à empresa uma situação patrimonial mais favorável que aquela que ocorreria se o contrato tivesse perdurado até ao fim, e ultrapassa o âmbito de uma prestação indemnizatória, assumindo-se como cláusula de fidelização não expressa, atribuidora de uma indemnização por interesse contratual positivo, com carácter mais amplo e abrangente do que a resultante das regras gerais aplicáveis em sede de resolução do contrato.

6. É, pois, proibida pelo artigo 19.º, alínea c), da LCCG, e como tal nula.

Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Local Cível de Setúbal, foi proferida sentença julgando parcialmente procedente a acção proposta por (…), Elevadores, Lda. contra Condomínio do Edifício n.º 18, sito na Rua (…), em Setúbal, contendo o seguinte dispositivo: a) condenar o R. a pagar à A. a quantia de € 6.905,11, acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa comercial, desde a data de vencimento das respectivas facturas e até integral e efectivo pagamento; b) declarar a nulidade da cláusula 5.7.1.1. da Adenda do contrato de manutenção simples de elevadores celebrado entre as partes em 10.11.2015, absolvendo o R. do pagamento da quantia de € 3.874,50, peticionada a título de cláusula penal.

Inconformada com a parte da sentença que lhe é desfavorável, a A. recorre, identificando nas suas conclusões as seguintes questões: I. Não subsunção do contrato ao regime das cláusulas contratuais gerais: A. As “condições gerais” do Contrato são elaboradas antecipadamente à proposta negocial e dirigidas à generalidade dos clientes da Recorrente, mas podem sempre ser (e são) objecto de negociação entre as partes, mediante inscrição nas “condições particulares”.

  1. A proposta negocial pré-impressa prevê a possibilidade da negociação diversa do texto contratual proposto destinado à inscrição de quaisquer alterações, designado de “Condições Particulares”.

  2. Caberá a cada cliente sugerir ou não uma ou mais alterações à proposta negocial da Recorrente. Não será razoável, porém, concluir que as cláusulas inseridas no Contrato dos Autos não foram negociadas ou susceptíveis de modificação por o Recorrido não ter pretendido actuar desse modo.

  3. Foi dado como provado a negociação do contrato entre A. e R., por via da celebração de adenda ao mesmo, com alteração do clausulado inicialmente proposto pela A. – pontos 8 e 9 dos factos provados.

  4. Recaía sobre o Recorrido o ónus de alegação de que a referida cláusula (i) havia sido elaborada sem negociação individual, (ii) que tinha sido coarctada a possibilidade da sua negociação, (iii) tendo-se limitado a subscrevê-la e aceitá-la.

  5. A existência de contratos assinados pelo representante do Recorrido em 2015, para além do facto de a comunicação e/ou validade das cláusulas nele constantes não ser posta em causa pelo Recorrido em nenhum momento da Contestação, leva a concluir que a cláusula 5.7.1.1. foi aceite pelo Recorrido.

    II. Excesso de pronúncia resultante do conhecimento oficioso da validade da cláusula 5.7.1.1.

    : G. O Recorrido não alegou qualquer facto sobre a aplicabilidade do regime das cláusulas contratuais, não alegou qualquer facto que pusesse em causa a aceitação da cláusula 5.7.1.1., e não invocou a sua nulidade.

  6. Não se encontra dentro dos poderes de conhecimento oficioso do Tribunal a apreciação da validade daquela cláusula.

    I. Ao apreciar oficiosamente a nulidade validade da cláusula 5.7.1.1., o tribunal recorrido conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, violando o disposto nos arts. 608.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.

    III. Validade da cláusula 5.7.1.1.

    : J. A cláusula 5.7.1.1. tem por finalidade salvaguardar o investimento efectuado pela Recorrente com a celebração deste tipo de contrato em caso de resolução injustificada pelo cliente.

  7. A disposição ali prevista traduz-se numa cláusula penal, através da qual as partes fixaram, previamente e por acordo, o montante da indemnização respectiva, exigível em caso de resolução injustificada do Contrato, pelo que o Recorrido aceitou pagar – sem necessidade de prova dos prejuízos da Recorrente – uma indemnização por danos no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado em caso de resolução injustificada do contrato.

    L. Era ao Recorrido a quem competia provar a desproporção entre os prejuízos da Recorrente e o valor acertado contratualmente em sede de fixação da cláusula penal.

  8. Tendo em conta a dimensão empresarial da A. – e extrema dificuldade da quantificação dos danos resultantes da saída de elevadores da sua carteira de clientes – as partes acordaram em previamente estipular a indemnização devida pelo cliente em caso de resolução por mora do R.

  9. Convencionaram este valor com vista a dispensar o credor da – diabólica, quando não impossível – “prova da extensão dos prejuízos...

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