Acórdão nº 10/17.9PEFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução25 de Setembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Em conferência, acordam os Juízes na 2ª subsecção criminal do Tribunal da Relação de Évora I. Relatório 1.

– Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correm termos no Juízo Local Criminal de Faro (Juiz 2) do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, foi sujeito a julgamento ML, solteiro, nascido a 27. 01.1977, a quem o MP imputara a prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143°, n. 1, 145 n.1 al.a) e n. 2 e 132°, n° 1 e 2, al.c) e e), todos do C. Penal.

  1. – Realizada a audiência de julgamento, o tribunal singular decidiu condenar o arguido pela prática, como autor material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143°, n. 1, 145 n.1 al.a) e n. 2 e 132°, n° 2, als. c) e e), todos do C. Penal, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão.

  2. – Inconformado, recorreu o arguido extraindo da sua motivação, as seguintes conclusões: «Conclusões: A) o ora arguido não pode conformar-se com os factos dados por provados sob os pontos 5., 6., 7. e 9. conforme aí elencados, pelo que expressamente os impugna para todos os legais efeitos.

    1. No ponto 5. dos factos provados o Tribunal a quo deu por provado o seguinte: " 5. De imediato, e por julgar que estava perante o indivíduo que estava envolvido na situação referida em 1 ° e 2°, o arguido abeirou-se de LM, sem lhe dirigir qualquer palavra e desferiu-lhe vários socos e pontapés, na face, cabeça, tórax, tronco e membros superiores e inferiores, fazendo-o cair no chão inanimado." C) Sucede que a prova produzida em sede de audiência de julgamento não permite concluir que o ora recorrente se tenha dirigido ao ofendido sem lhe dirigir qualquer palavra porquanto o arguido nega tal facto e explica como se dirigiu ao ofendido e o ofendido, pessoa de alguma idade, que já sofreu operação ao crânio, não tendo memória da maior parte da situação, admite que possa ter havido um pequeno diálogo.

    2. Donde, e na ausência de qualquer outra prova, entende-se que não se pode dar por provado que o arguido não tenha dirigido qualquer palavra ao ofendido, muito menos que o fez no intuito de apanhar o ofendido desprevenido e causar um efeito-surpresa deixando-o sem possibilidade de defesa, conforme se dá por provado no ponto 9. dos factos dados por provados, o que também desde já se impugna, nomeadamente com os fundamentos que antecedem.

    3. O arguido também não se pode conformar com ter sido dado por provado que agrediu o ofendido com socos e pontapés, na face, cabeça, tórax, tronco e membros superiores e inferiores.

    4. Nem tão-pouco se pode o arguido conformar com ter sido dado por provado que as agressões foram infligidas ao ofendido antes e depois de ele cair no chão inanimado (ponto 6. Dos factos provados).

    5. O que sucedeu foi que a companheira do arguido, grávida de seis meses, e acompanhada de outro filho menor do arguido, chegou a casa assustada, arranhada e suja de sangue, muito nervosa e a sentir contrações e descreveu-lhe a situação sofrida; O arguido saiu de casa e deu de caras com o ofendido; O ofendido correspondia à descrição, feita pela sua mulher, relativa ao indivíduo dono do cão que nada fez para a ajudar e ainda se riu; quando confrontado com os factos o ofendido riu; o arguido, pessoa nervosa que se submete a tratamentos psicológicos e psiquiátrico reagiu com uma chapada; o ofendido, que se ia a levantar, caiu, bateu com a cabeça no banco e caiu ao solo; o ofendido tentou levantar-se e voltou a cair pelo menos duas vezes.

    6. Os factos que contrariam a factualidade dada por provada quanto à matéria invocada nas conclusões E) a G) decorrem das provas elencadas no artigo 29° da fundamentação de recurso e, que se dão por integralmente reproduzidas, que são nomeadamente as declarações do arguido, as declarações do ofendido, as declarações do menor R e as declarações de JV, bem como o teor dos relatórios médicos constantes dos autos.

    7. Da análise dos elementos de prova referidos na conclusão anterior resulta que não se pode comprovar que o arguido desferiu sobre o ofendido as agressões conforme configuradas na douta sentença recorrida e a verosimilidade das declarações do arguido.

    8. Assim, dúvidas não nos restam que as lesões apresentadas são perfeitamente compatíveis com o quadro de agressão descrito pelo arguido.

    9. Donde, em nosso modesto entender, nunca se poderá dar por provado que o arguido desferiu socos e pontapés na face, cabeça, tórax, tronco e membros superiores e inferiores, pois que tão-pouco se verificaram lesões a nível do tórax, tronco, membros inferiores e superiores compatíveis com socos e pontapés, nem com pontapés na face ou na cabeça.

    10. Nem tão-pouco o ofendido ficou inanimado no solo, como se considerou provado no ponto 7 dos factos provados, sendo que o facto de o ofendido não se recordar do episódio, não se pode retirar que este tenha ficado inanimado em momento algum e que essa não é a versão apresentada pelo arguido, nem pelas testemunhas R e JV, nem do próprio filho do ofendido que o acompanhou na ambulância, conforme já se transcreveu.

    11. Donde, não obstante as lesões que vieram a ser verificadas no ofendido poderem eventualmente ter sido consequência da conduta do arguido, muitas delas sempre se trataram de consequências indirectas, não sendo expectável ao arguido que dando uma chapada ao ofendido, tendo este caído, que viesse a causar danos significativos na integridade física do ofendido e muito menos que os pretendesse causar.

    12. Assim, também não se poderá dar por provado, conforme se faz no ponto 7. dos factos provados na douta sentença recorrida, que todas as lesões aí elencadas ocorreram em consequência directa e necessária da conduta do arguido.

    13. Também não corresponde à verdade o ponto 9. dos factos dados por provados.

    14. Como se vem dizendo, o arguido deparou-se com a sua mulher grávida de 6 meses, suja de sangue, muito enervada, com contrações, relatando que um cão atacou o seu animal de estimação, sendo que esta, para além de grávida, tinha aos seus cuidados o filho do arguido com 6 anos, e que para tentar proteger todos da actuação do cão ficou toda arranhada e cheia de sangue, ao que o dono de referido cão ficou a rir da situação em vez de tentar ajudar a mulher do arguido.

    15. O arguido, pessoa nervosa que vive crises de ansiedade extrema desde os seus 24 anos, sendo acompanhado psicológica e psiquiatricamente saiu à rua de cabeça quente e deparou-se com um indivíduo que em tudo correspondia à descrição dada pela sua companheira.

    16. Interpelado acerca da situação o ofendido riu-se, o que além de ser a mesma atitude que o dono do cão agressor teve, foi interpretado pelo arguido como sinal de gozo e desprezo pela situação da sua companheira, pelo que o arguido nem pensou na idade do ofendido nem pretendeu ter qualquer efeito-surpresa ou aproveitar-se da sua superioridade física sobre o ofendido.

    17. Certo é que, o arguido saiu do local não tendo visto o ofendido inanimado mas apenas caído, nem percebeu ou sequer considerou que a chapada que desferiu fosse apta a causar danos de relevo.

    18. Donde, atenta nomeadamente a dinâmica dos factos que efectivamente aconteceram, em momento algum se poderá dar por provado que o arguido pretendeu gozar da sua superioridade física face à idade do ofendido ou que a sua atitude era apta a causar um efeito surpresa e deixa aquele sem qualquer possibilidade de defesa.

    19. No que respeita à Qualificação Jurídica do Crime cometido pelo arguido como sendo de Ofensa à Integridade Física qualificada, por referência às alíneas c) e e) do artigo 132, n. 2 e n. o 1 do Código Penal, entende-se que face à factualidade que deverá ser dada por provada, o arguido não cometeu o crime de que vem acusado mas si um crime de Ofensas à Integridade Física simples, p. e p. pelo artigo 1430 do Código Penal, por não se verificar o requisito de especial censurabilidade ou perversidade na sua actuação, atento tudo o invocado na fundamentação de recurso que se dá por integralmente reproduzida.

    20. Quanto à determinação concreta da medida da pena foram ponderadas na douta sentença recorrida as circunstâncias seguintes: - o grau de ilicitude, que aparece como elevado atentos os motivos injustificados que conduziram o arguido a ofender uma pessoa idosa que se encontrava na rua; - a ausência de arrependimento demonstrada em sede de audiência de julgamento, já que, não obstante haver dirigido um pedido de desculpas ao ofendido, fê-lo apenas ao fim de um longo período de tempo e pressionado pelo formalismo existente na sala de julgamentos, não se nos aparentando ser um pedido sincero; - os antecedentes criminais do arguido, que já cometeu outros ilícitos que ofendem bens eminentemente pessoais, como a saúde; - a integração familiar, social e profissional do mesmo; - as elevadas necessidades de prevenção geral positiva de reafirmação contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violadas; - as necessidades de prevenção especial - que se apresentam como elevadas - ligadas à reinserção social do arguido, que aconselham uma intervenção que lhe permita servir de advertência para o não cometimento de futuros crimes e uma recomposição amigável dos valores sociais e comunitários.

    21. Atenta a moldura penal aplicável, todo o circunstancialismo dado por provado na douta sentença, atendendo-se também às alterações que devem ser feitas na matéria de facto provada e eventualmente na qualificação jurídica dos factos, verifica-se que a pena aplicada ao arguido foi e é manifestamente excessiva.

    22. Sendo certo que o arguido foi condenado, por duas vezes, pela prática de crimes de ofensa à integridade física, a verdade é que, estes crimes ocorreram há mais de 20 anos, enquanto o arguido ainda era jovem! Z)O arguido demonstrou arrependimento sincero e pediu desculpas ao ofendido e à sua família, em pleno Tribunal.

      A

    23. Por outro lado, o arguido encontra-se social, profissional e familiarmente inserido. Tem 40 anos de idade e...

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