Acórdão nº 3949/12.4TBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | FILIPE CARO |
Data da Resolução | 13 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.
P.., intentou ação declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra PL.., LDA., alegando --- aqui no essencial --- que, na qualidade de promitente-comprador, celebrou com a R., promitente-vendedora, um contrato-promessa de compra e venda de uma fração autónoma de um edifício, destinada a habitação, entregando-lhe, no ato, a quantia de € 10.000,00 a título de sinal. O restante do preço seria pago em data a combinar no ato da escritura definitiva de compra e venda, a realizar 12 meses após o levantamento da licença de construção.
Tendo ocorrido o levantamento da referida licença no dia 17.6.2008, a escritura definitiva deveria ter sido realizada a 17.6.2009, mas a R. nem sequer a marcou, pedindo ao A. que aguardasse algum tempo.
No final de fevereiro de 2010, o A. concedeu à R. o prazo de um mês para que a ré acabasse as obras e marcasse a escritura, ou seja, na primeira semana de abril de 2010 o imóvel teria que estar pronto para que, nessa semana, se pudesse outorgar a escritura definitiva de compra e venda. O A. deixou claro que, se então não fosse realizada a escritura pública, resolveria o contrato-promessa e exigiria o sinal em dobro. Face à inércia da R., naquela primeira semana de abril o A. comunicou-lhe que não tinha mais interesse na manutenção do negócio solicitou-lhe a devolução valor do sinal, em singelo, para resolverem cordialmente a situação, tendo-se a R. recusado a fazê-lo. Daí, o A., por carta de 22.4.2010 que enviou à R., declarou definitivamente resolvido o contrato-promessa, com efeitos imediatos.
Porém, mais de um mês depois, o A. recebeu uma comunicação da R. a informar que a escritura seria marcada para o dia 11 de junho de 2010, mas não compareceu porque o contrato já estava resolvido, achando-se no direito de exigir o dobro da prestação que efetuou a título de sinal ou, na pior das hipóteses, o valor singelo do sinal se se considerar que o incumprimento do contrato não resultou de falta exclusiva e culposa da R.
Por tudo, terminou por deduzir assim o seu pedido: «Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e por via disso, 1- Declarar-se resolvido o contrato promessa celebrado entre a Autora e a Ré; 2- Condenar-se a ré a restituir ao autor a quantia entregue, a título de sinal em dobro, 20,000 Euros (vinte mil Euros), acrescida de juros legais desde a citação da Ré até efetivo pagamento.
3- Caso da prova produzida não resulte provado, o que se admite apenas por mera hipótese, que o incumprimento do contrato não foi por falta exclusiva e culposa da ré, deverá a mesma ser condenada à restituição ao autor do sinal em singelo, sob pena de haver um enriquecimento injustificado e ilícito por parte da ré.» (sic) Citada, a R. contestou a ação, impugnando parte dos factos alegados na petição inicial. Alegou que não havia um termo certo para a conclusão da obra e, sem ele, não poderia haver incumprimento definitivo. Nunca antes de abril de 2010 o A. manifestou vontade de resolver o contrato-promessa; mesmo depois dessa data o A. continuou a mostrar interesse na compra e venda. Por isso, a R. marcou a escritura definitiva, mas o A. recusou, apesar de a obra ter demorado mais tempo do que o previsto, também por o A. ter solicitado obras de alteração no seu apartamento.
Face ao incumprimento do A., a R. retificou as alterações que ele havia solicitado na fração objeto do contrato promessa e vendeu-a pelo preço de € 112.000,00, em 22 de novembro de 2011.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar, sem subsequente condensação.
Esgotada a fase da instrução, teve lugar a audiência de discussão e julgamento que culminou com respostas fundamentadas em matéria de facto, de que não houve reclamações.
As partes não apresentaram alegações escritas.
Foi então proferida sentença que, conhecendo de mérito, julgou a ação procedente e, consequentemente: - Declarou resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado em 14.03.2008 entre A. e R.; - Condenou a R. no pagamento ao A. da quantia de € 20.000 (vinte mil euros), correspondente ao dobo do sinal, acrescida de juros moratórios contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Mais condenou a R. nas custas.
* Inconformada, recorreu a demandada, por apelação, concluindo o recurso nos seguintes termos: «
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A douta sentença recorrida, salvo melhor opinião, julgou incorretamente a matéria de facto assente e fez errada aplicação do direito.
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Considera a Apelante incorretamente julgada a alínea k) da matéria de facto assente, que deve ser eliminada, uma vez que constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão e impõem decisão diversa.
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O Tribunal a quo consignou na fundamentação da decisão que assentou a sua convicção nos depoimentos das testemunhas arroladas pelo Autor, todavia somente a testemunha A.. foi considerado.
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Esta testemunha não se mostrou isenta nem segura na matéria em causa, antes demonstrou só querer confirmar a tese do A/Apelado, seu primo.
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O depoimento da testemunha, gravado na audiência de 11 de junho de 2013, de 00:00:01 a 00:15:20, passagem 05.40, refere: - A..: Não estaria totalmente pronto porque eu ainda vi algumas pessoas lá, a trabalhar, não sei exatamente o que é que estavam a acabar, mas ainda estavam a acabar alguma coisa.
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A testemunha apenas relata uma suposição e não descreve, em concreto, quem eram as pessoas, o que faziam no local, que trabalhos executavam, sob as ordens de quem, etc.
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Esclareceu, no entanto, que fez a escritura do seu apartamento em junho de 2010, pelo que o seu depoimento e suposição não se coadunam com as regras de experiência comum que importa aqui invocar.
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Tanto mais que foi a Apelante a marcar exatamente para junho de 2010 a escritura, sendo do seu especial interesse realizar tal diligência nessa data.
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Acresce que a testemunha da Apelante, Á.., cujo depoimento foi gravado na audiência de 11 de junho de 2013, de 00:00:01 a 00:07:26, na passagem 03.00, quanto à data da conclusão dos apartamentos esclareceu: - A..: Foram todos ao mesmo tempo.
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Esta testemunha foi o fornecedor dos móveis de cozinha para todos os apartamentos vendidos pela Apelante e disse que todos foram concluídos ao mesmo tempo.
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De relevar que o imóvel possui o Alvará de Utilização nº 144/2010, de 18/3/2010, junto aos autos, comprovativo da verificação das condições do prédio para o fim habitacional.
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Os indicados meios de prova impõem decisão diversa no que respeita à factualidade da al. k) devendo ser esta eliminada da matéria de facto assente, conforme decorre da análise crítica da prova produzida e das regras da experiência comum.
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A douta decisão recorrida, salvo melhor opinião, fez ainda errada aplicação do direito, em divergência com a maioria da doutrina e jurisprudência sobre o tema incumprimento do contrato promessa.
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O contrato-promessa é a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato e, como qualquer outro, está sujeito a resolução que corporiza um direito potestativo extintivo.
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A declaração resolutiva, sendo uma declaração receptícia, produz os seus efeitos logo que recebida pela contraparte, ficando resolvido definitivamente o contrato, independentemente de tal resolução ser legal ou ilegal. Arts. 224º, 230º e 436º do CC P) Esta declaração não está sujeita a forma especial e, por isso, pode ser meramente tácita. Art. 217º do CC Q) A declaração negocial de resolução do contrato pode ser expressa, afirmando a parte que pretende a resolução e pode ainda ser corroborada por outros factos de que se deduza que é esse o seu propósito, designadamente a recusa em comparecer para a celebração da escritura.
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Permite-se a resolução de contrato em consequência de mora culposa do devedor, em caso de conversão da mora em incumprimento definitivo e da declaração antecipada de não cumprimento e da recusa de a cumprir.
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Segundo a doutrina e jurisprudência atuais só o incumprimento definitivo justifica a resolução do contrato promessa, pois a simples mora não produz tal efeito.
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O A/Apelado, na sua carta de resolução do contrato não estipulou nenhum prazo para o cumprimento da obrigação pela Apelante, e sempre o princípio da boa fé obrigaria à concessão de um lapso de tempo que se mostrasse necessário e razoável.
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Nesta perspetiva, não pode reconhecer-se ao teor da aludida carta meio válido e adequado para constituir a Apelante em incumprimento definitivo do contrato.
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Por sua vez, o A/Apelado comunicou a sua vontade inequívoca de resolver o contrato e exigiu a devolução do sinal que prestara, e, de seguida intentou a presente ação com o mesmo âmbito petitório, o que constitui recusa de cumprimento do contrato.
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Uma das situações que tipificam o não cumprimento do contrato é a declaração do devedor de não querer cumprir a obrigação, equiparada pela doutrina e jurisprudência à falta definitiva de cumprimento.
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Nesta situação, o credor (Apelante) não tem de esperar pelo vencimento da obrigação, não tem de alegar e provar a perda de interesse na prestação do devedor, nem o tem de interpelar admonitoriamente, para ter por não cumprida a obrigação.
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A manifestação de vontade do A/Apelado e a recusa de celebrar a escritura foram concludentes e constituem causa de incumprimento definitivo do contrato.
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A douta sentença violou as disposições legais citadas e deve ser revogada, como é de JUSTIÇA» (sic) O A. respondeu em contra-alegações, pugnando pela negação do recurso e confirmação do julgado, pedindo também a ampliação do recurso nos termos do art.º 636º, nº 2, do Código de Processo Civil, prevenindo a hipótese de procedência das questões suscitadas pelo recorrente, conforme as conclusões que também tirou e agora se expõem: «1- Com o devido respeito, o que a recorrente faz nas suas alegações de recurso é pura e simplesmente limitar-se a alegar que a alínea K) da matéria assente deveria ter sido excluída da...
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