Acórdão nº 3605/11.0TBGMR.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL SILVA
Data da Resolução22 de Outubro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - HISTÓRICO DO PROCESSO 1. AA…, SA (de futuro, apenas Autora) instaurou ação contra BB e CC (de futuro, apenas Réus) pedindo a sua condenação solidária a pagar-lhe € 22.237,19, acrescida de juros moratórios.

Para fundamentar tal pedido, referiram serem credores da sociedade DD, L.da, a qual era gerida por ambos os Réus; foi declarada a insolvência dessa sociedade e a mesma considerada culposa, assim como a da sociedade EE, L.da, para quem a primeira havia transferido a totalidade do seu património; os ora Réus bem sabiam da situação de insolvência da empresa e violaram o dever de apresentação à insolvência, pelo que devem ser responsabilizados ao abrigo do art. 78º do CSC.

Os Réus contestaram.

Realizada audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença que absolveu os Réus do pedido.

2. Inconformado com tal decisão, dela apelou o Autor, formulando as seguintes CONCLUSÕES: «AA, S.A., autora vencida na presente acção, em que são réus BB e CC, não se conformando com essa decisão e sobre ela pretendendo redarguir, B- Estriba-se nas dimensões de facto e de direito invocadas pelo Mmo. Juiz a quo, para si reveladoras de uma exegese imperfeita, para buscar agora lograr a declaração jurisdicional do preenchimento do tatbestand do art.º 78.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

C- O recurso, que é ao mesmo tempo de facto e de direito, principiará portanto pela revisão do elenco de factos sobre os quais a posição da apelante é marcada pelo dissídio.

D- É o que ocorre no tangente aos factos ee e ff do elenco dado como não provado, os quais postergam de toda a responsabilidade o recorrido BB.

E- Compulsada a prova produzida, outra decisão se impõe, primeiramente no atinente à prova testemunhal e aos seguintes depoimentos: Joaquim … in Habilus, Registo Fonográfico de 22.10.2014, no hiato de tempo delimitado pela marca da hora 10:39:42 e 11:00:25, muito em especial os minutos 1:10 a 1:30 e 8:30 a 11:00, nos quais postula a testemunha (Administrador da Insolvência da pessoa colectiva DD, Lda.) a qualidade de gerente do recorrido BB, atendo-se de seguida ao teor do seu relatório sobra a insolvência das DD, Lda, afirmando, inter alia, que sendo certo que a sociedade insolvente contraiu dívidas que a deixaram em situação deficitária no imediatismo no período pré - insolvencial (ano civil de 2009), mais certo é que o quadro narrado, de empolamento de endividamento para o porvir, era resultante, no mínimo, do ano de 2007.

Ora, entre um e outro facto uma presunção judicial se impõe, que é o assentimento deste réu à rede de negócios que expandiram a dívida da sociedade insolvente, ainda que numa posição de subalternidade face ao co-recorridoCC; Domingos … (antigo funcionário de toda a rede de empresas erigidas pelos réus para ocultar a situação patrimonial deficitária das DD, Lda, EE, Lda, FF, Lda), in Habilus, Registo Fonográfico de 22.10.2014, entre as 11:38:58 e as 11:56:59, com a pedra de toque a caber aos intervalos entre os minutos 2:00 e 3:30, 5:00 a 6:00 e 11:00 a 14:45.

Quanto a este, se no primeiro dos momentos delimitados a testemunha nos dá conta que o recorrido BB era um dos sócios da sociedade DD, Lda., com exercício de funções na empresa para lá daquelas que eram conaturais à posição de gerência (“ele trabalhava lá”; “trabalhava nos computadores”; “dava ordens”; “contratava trabalhadores”; “tomava decisões na ausência do CC”; “ficou na empresa com o CC até ao momento da sua insolvência”, eis alguns excertos, transcritos, passíveis de audição no seu depoimento), no segundo aloca ao exercício de mnemónica que faz que era conhecida e duradoura a periclitante situação financeira da empresa (“há muito tempo que a empresa tinha dificuldade com pagamentos”) por modo a poder incutir ao processoum dado novo, contido no terceiro hiato de tempo extraído: o recorrido João Paulo era o titular activo e pessoal da conta que servia amiúde de pagamento de salários aos trabalhadores, sendo seus (pessoais) os cheques emitidos. Pelo exposto, mal se vê por onde possa uma instância jus-decisora deixar de considerar que o recorrido conhecia, para ela contribuiu e não se acantonou a uma postura correctiva, antes tendo logrado, por actos jurídicos que lhe foram próprios, agravar a situação patrimonial da sociedade DD, Lda; José …, in Habilus, Registo Temporal de 13.11.2014, entre as 10:16:19 e as 10:23:34, onde o depoente, antigo fornecedor de toda a rede de empresas criadas pelos réus, sem embargo do reconhecimento da posição de domínio do réu CC, afirma conhecer também o réu BB como sócio, funcionário e namoradoda filha do co-recorrido (minutos 3:50 a 4:30); BB, réu, in Habilus, Registo Fonográfico de 28.11.2014, entre as 10:21:41 e as 11:14:22, que em depoimento de parte atesta, no que se transcreve sem hesitações decorrentes de qualquer nervosismo ou ansiedade, que não evidenciou, que o recorrido BB era gerente das DD, (minutos 1:00 a 1:30); que com ele tentou recuperar a empresa através da criação de outras, limpas, comidêntico objecto social (minutos 8:15 a 9:30); que este tinha na empresaas funções de ligação entre os fornecimentos dos bens do seu negócio eos correspondentes clientes (minutos 16:50 a 17:25); que o recorridoBB sabia de toda a situação patrimonial da empresa, o que é tãomais indelével quando foi preciso marcar reuniões da assembleia-geralpara gizar a estratégia de gestão patrimonial da empresa (minutos 17:30a 23:00 e 46:35 a 48:00); que o endosso de património e ocultação depassivo através da transferência da actividade para outras sociedades,como a EE, Lda. e a FF, Lda., foideterminado em 2007, bem antes da insolvência das DD, quesó sobreveio em 2010 (minutos 37:00 a 40:00), num momento em queeste recorrido ainda era gerente das DD, Lda.

F- Pelo exposto, deverá a prova ser revista e passar a atestar que o réu JoãoPaulo desempenhava funções efectivas na empresa, conhecia a sua situaçãodébil, para ela contribuiu e agravou-a, muito em especial quando emitiucheques pessoais para pagamento de dívidas societárias e quando criou, pordecisão própria e com um terceiro, a sociedade comercial FF, Lda., comobjecto social assimilável ao das DD, Lda. e para onde asociedade EE endossou o património que, por suavez, adquiriu anteriormente às DD, Lda.

G- Igual decisão peticiona a prova documental carreada para o processo,mormente o doc. 10 (certidão de sentença de qualificação da insolvência dasDD, Lda. comoculposa, com afectação de ambos os sócios: CC e BB) e o relatório de insolvênciadas DD, Lda., de onde resulta o recorrido BB, quando foi gerente das DD Lda., tornou-se responsável pelogravame culposo da impossibilidade de honraria das suas obrigações patrimoniais,por acção e omissão, aí cabendo o assentimento a um número plural de negóciosjurídicos prejudiciais ao interesse social e a culpa para a chegada desse estádio porincumprimento do dever legal de apresentação à insolvência a que alude o art.º186.º do CIRE.

H- Com efeito, no que nos reportamos primeiro àquele doc. N.º 10, aí se lê que em18.09.2008 foi criada a FF, Lda., cujo objecto social é o fabrico ecomercialização de cutelarias e cartonagem e cuja sede se situa na Zona Industrialda Gandra, Lote …, Guimarães; que são seus sócios BB eGG; que em 03.02.2009 foi criada a HH, Lda., cujo objecto social é o fabrico e comercialização decutelarias e cartonagem e de que é sócio-gerente BB; I- Pelo que se qualificou a insolvência das DD, Lda. como culposa, comafectação dos seus sócios BB e CC, sobre quem se decretou a inibição para a ocupação de qualquer cargo detitular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privadade actividade económica, empresa pública ou cooperativa durante um período de4 anos.

J- Já o Relatório de Insolvência das DD, Lda, se é relembrado, é-oporque aí refere o seu autor que “a sociedade já vem apresentando resultadosnegativos nos últimos anos de actividade”, presumindo-se a culpa grave dos seusadministradores pelo incumprimento do dever a que se refere o art.º 186.º doCIRE, pelo que o seu parecer só pôde ser que “pela ocorrência dessa falta, aqualificação de insolvência deverá ser qualificada de culposa, afectando osgerentes da sociedade insolvente BB e CC K- Aqui chegados, e quando é consabido o valor probatório do documento emsede judiciária - art.ºs 371.º e 376.º do Código Civil -, a verdade dos autos nãopode ser outra que não uma que implique a revisão dos factos ee e ff nãoprovados, por constarem do processo documentos autênticos que atestam,com a apodicticidade necessária, (1) que o réu BBincumpriu com culpa grave com a obrigação de apresentação da sociedade àinsolvência; (2) que criou a sociedade comercial Jofari, Lda, de escopoidêntico às DD, Lda. para tão-só poder ludibriar os seuscredores e estender o exercício desta sociedade inadimplente no tráfico; (3)que era parte activa do quotidiano da sociedade BB, Lda., sendogerente de facto e de direito; (4) que, na senda do parecer do competenteAdministrador de Insolvência nomeado, conhecia a situação financeira daempresa, para ela tendo contribuído, mormente por ser indelével o seu lugarde sócio - gerente de uma sociedade cuja filha do outro sócio, sua namorada,se tornou adquirente do acervo de bens da sociedade.

L- Revista a sentença nos reparos que a matéria de facto merece, é a componente dedireito que agora é chamada a confutação, o que é efectuado, em primeiro lugar,por aquele que foi o inciso enformador da causa de pedir, o art.º 78.º do CSC (“osgerentes ou administradores respondem para com os credores da sociedadequando, pela inobservância das disposições legais ou contratuais destinadas àprotecção destes, o património social se torne insuficiente para a satisfação dosrespectivos créditos”).

M- Para lograr a procedência da acção que interpôs, cuidou a autora por alegar quaiseram os comandos violados pela actuação ilícito-culposa dos recorridos, com oque trouxe à lide a invocação dos artigos 64.º e 259.º...

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