Acórdão nº 1514/12.5TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução08 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.

COMPANHIA DE SEGUROS.., SA, intentou a presente ação declarativa de condenação contra C.., LDª, com sede .., em Guimarães e T.., LDª, com sede .., em Valongo, alegando essencialmente que celebrou com a C.., Lda., entidade patronal de M.., um contrato de seguro do ramo de acidentes de trabalho, na modalidade de trabalhadores por conta de outrem, titulado pela apólice nº 0001307620, mediante o qual transferiu, relativamente àquele, o pagamento das indemnizações a que houvesse lugar, emergentes de acidente de trabalho.

Posteriormente ocorreu um acidente daquela natureza de que resultaram várias lesões para o referido M.., imputável à conduta ilícita e culposa das RR., tendo a A. diligenciado pelo tratamento das lesões da vítima e pelo pagamento do que lhe era devido (como lhe competia, tendo em conta o interesse de ordem pública da reparação das lesões e danos provenientes dos sinistros de trabalho), nos termos do contrato de seguro celebrado com a sua entidade patronal.

Na sequência do processo de acidente de trabalho, a A. foi condenada e suportou já, na reparação do acidente, várias quantias pecuniárias, a título de despesas, indemnizações por incapacidade e seus efeitos, subsídio e pensões a favor do sinistrado, no valor total de € € 107.878,45.

O empreiteiro da obra onde o sinistrado laborava era a 1ª R., que a havia dado de subempreitada à entidade patronal do sinistrado, C.., Lda. A grua de onde se soltou a peça que atingiu a vítima não satisfazia as necessárias condições de segurança, era propriedade da 2ª R. T.., e havia sido locada por esta à 1ª R., entidade responsável pela obra, devendo ser responsabilizadas pelo acidente.

À A. assiste o direito ao reembolso do que pagou no âmbito do contrato de seguro, nos termos do art.º 31º da Lei nº 100/97 de 13 de setembro. Celebrou um acordo de pagamento em prestações relativamente à quota-parte de responsabilidade da entidade patronal quanto à parte de salário que não se encontrava transferida no âmbito do seguro de acidentes de trabalho, sendo que tal quota-parte corresponde a € 22.882,76, recusando-se as RR. a pagar o remanescente.

Acrescenta que tem direito a receber daquelas, eventualmente na proporção das suas responsabilidades, mas sempre beneficiando da solidariedade destas na obrigação da indemnizarem, o montante global de € 84.995,69, o que requer.

Citada, a 1ª R. contestou a ação invocando a prescrição do direito de indemnização que a A. peticionou. Impugnou parcialmente os factos, designadamente no que respeita aos factos do acidente, alegando ainda que nunca teve qualquer intervenção, utilização própria ou uso da grua, nem antes da sua montagem, nem posteriormente, tendo a mesma sido entregue diretamente na obra pela R. T.. à subempreiteira, ficando esta responsável pela sua utilização.

Culmina o seu articulado no sentido de que se julgue procedente a exceção da prescrição ou, não sendo assim, se julgue a ação improcedente, com absolvição da contestante do pedido.

Ainda antes da apresentação da réplica e da citação da 2ª R., veio a A. requerer a ampliação do pedido inicial por si formulado, para € 90.358,31, alegando para o efeito e em síntese que, após a interposição da ação suportou novas despesas no valor global de € 5.362,62, que igualmente diz serem da responsabilidade das RR.

Tendo-se entretanto constatado que a R. T.., Ldª foi dissolvida e liquidada e que já se encontra registado o encerramento da sua liquidação, foi proferida sentença quanto a ela julgando extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Notificada da contestação, a A. apresentou réplica, na qual defendeu a improcedência da exceção perentória da prescrição. No mais impugnou a factualidade invocada na contestação, concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador onde foi julgada improcedente a invocada exceção da prescrição, seguindo-se a condensação, com factos assentes e base instrutória, de que as partes não reclamaram.

Designada, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença fundamentada em matéria de facto e de direito que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis: «Em face do exposto, julgo a acção totalmente improcedente e, consequentemente, absolvo a ré C.., Ldª do pedido.

Custas a cargo da autora, nos termos previstos no art.º 527, nºs 1 e 2, do NCPC.».

* Inconformada com a decisão sentenciada, recorreu a A. alegando com as seguintes CONCLUSÕES: «l- O Tribunal recorrido fez uma pouco rigorosa apreciação da prova produzida em audiência de julgamento e uma menos correcta aplicação da lei.

2- Na prossecução do seu fim social, a lª Ré procedeu ao aluguer de uma grua, tendo-a colocado à disposição dos seus subempreiteiros: C.., na fase inicial da obra, e S.., na fase final.

3- A 1ª Ré não acompanhou a montagem, instalação e ensaios da grua no seu estaleiro; não se certificou que a grua reunia as condições de operacionalidade e de segurança exigíveis; não mandatou ninguém que atestasse a veracidade do teor da “Verificação de Fim de Montagem” e dos “Ensaios de Fim de Montagem”.

4- A l- Ré, na qualidade de locatária da grua e de empreiteira geral da obra a executar, assumiu deveres e obrigações que simplesmente ignorou, pelo simples facto de não ser ela, mas outras entidades, a utilizarem directamente a grua.

5- O facto de ter dado de subempreitada partes da empreitada que lhe havia sido confiada pelo dono da obra, não isenta a lã Ré da obrigação e assegurar que todas as medidas de segurança são respeitadas, nomeadamente as que dizem respeito à montagem e estado de conservação da grua a utilizar no estaleiro.

6- Foi a 1ª Ré quem assumiu a responsabilidade de, e por isso era a ela que competia, pagar do aluguer da grua, garantir que a grua apenas seria manobrada por pessoas competentes, zelar peia conservação e bom manuseamento da grua e cobrir o risco decorrente da sua utilização.

7- Aquando da entrega e montagem da grua, não estavam presentes na obra funcionários da lã Ré (nem da C..) com competência para se certificarem que a grua reunia boas condições de segurança e de conservação); tal obrigação cabia à lª Ré.

8- A resposta ao quesito 6 da BI deve ser alterada para “Provado”, 9- A resposta ao quesito 7 da BI desse ser alterada para “Provado apenas que a grua foi transportada para o local da obra pela T.. e que, na altura, apenas se encontravam na obra dois trabalhadores da subempreiteira, que não possuíam conhecimentos técnicos da montagem de gruas”.

10-A resposta ao quesito 8 da BI deve ser alterada para “Não provado”.

11-A resposta ao quesito 9 da BI deve ser alterada para “Provado apenas que se a grua foi objecto de ensaios”.

12-A resposta ao quesito 10 da BASE INSTRUTÓRIA deve ser alterada para “Provado que a l5 Ré ficou responsável pela lubrificação da grua e peto bom funcionamento da mesma, assim como avarias causadas pelo mau funcionamento da mesma e por deficiente abastecimento eléctrico à máquina”.

13- Por fim, a resposta ao quesito 11 da BASE INSTRUTÓRIA deve ser alterada para “Provado que a lª Ré ficou responsável por denunciar à T.. quaisquer avarias ou anomalias da grua”.

14- Enquanto responsável pelo dever de vigilância ou pelo dever de assegurar a vigilância da grua, e da integridade da sua estrutura, a 1ª Ré deve ser condenada a pagar à Autora os montantes peticionários, a título de reembolso pelo que foi esta obrigada a despender na regularização do acidente dos autos, nos termos do disposto no art. 493º do Código Civil.

15- Existe uma relação de comissão entre a 1ª Ré e a T.., já que foi a primeira quem contratou com a segunda o fornecimento e instalação da grua que esteve na origem do acidente de trabalho dos autos; como tal, e concluindo-se pela responsabilidade da T.. no fornecimento de uma grua defeituosa; sempre será a 1.ª Ré a responsável perante a Ré, pelos valores peticionados.

16-A Sentença recorrida faz uma incorrecta apreciação da prova produzida, devendo, como tal, ser revogada e substituída por outra que, concluindo pela responsabilização da 1ª Ré, na qualidade de entidade locatária da grua, e de empreiteira geral da obra em apreço, a condene no pedido.» (sic) Defendeu, assim, a revogação da sentença e a sua substituição por outra decisão conforme as conclusões.

* Não foram oferecidas contra-alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II.

As questões a decidir --- exceção feita para o que for do conhecimento oficioso --- estão delimitadas pelas conclusões das apelações da A. recorrente (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º, do Código de Processo Civil [1]).

Impõe-se assim a apreciar e decidir: 1. Erro de julgamento em matéria de facto; e 2. A responsabilidade delitual da 1ª R. nos termos do art.º 493º ou, pelo risco, com base na existência de uma relação de comissão entre a 1ª R. e a Tacharon.

III.

Os factos dados como provados na ação [2]: 1. No dia 24 de Março de 2006, pelas 17 horas, numa obra, sita na Quinta da Naia, Lote 6, Maximinos, em Braga, enquanto prestava a sua actividade profissional de pedreiro, sob as ordens e direcções da sociedade comercial C.., Lda., M.. foi atingido na cabeça por uma peça de metal, caída de uma grua que se encontrava no local da obra, e adstrita à obra (al. A) dos Factos Provados).

  1. O objecto metálico, peça da referida grua, que caiu de uma altura de mais de vinte metros, e atingiu a cabeça do referido M.., provocando-lhe um traumatismo craniano, com perda de massa encefálica, e traumatismo torácico, com contusão pulmonar subjacente (al. B) dos Factos Provados).

  2. A entidade patronal do M.., à data do sinistro, havia transferido a sua...

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