Acórdão nº 3380/13.4TJVNF.G3 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução04 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO Nos presentes autos de procedimento especial de revitalização requerido por devedora N, foi aprovado, com 70,288% de votos a favor e 29,712% de votos contra (Volume XVIII, fls. 6283), o plano de recuperação com vista à revitalização da empresa, subscrito pelos membros do Conselho de Administração da sociedade requerente e pelo Administrador Provisório, nomeado nos autos, plano que se mostra junto a fls. 6306 a 6314.

Por requerimento constante de fls. 6144 e segs., o credor B, veio requerer a não homologação do plano de revitalização, com base nos artigos 215º e 216º do CIRE, invocando, em suma, o seguinte: Na página 15 do Plano apresentado pela Devedora, estipula-se que “As garantias pessoais prestadas aos credores bancários mantém-se e apenas poderão ser accionadas em caso de incumprimento total ou parcial do plano. Eventuais processos judiciais intentados contra os garantes pessoais cessam pela via de homologação do presente plano.” A salvaguarda dos direitos do credor, contra os condevedores ou terceiros garantes, encontra-se expressamente consagrada no n.º 4 do artigo 217.º do CIRE, quando prevê que “as providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos.” Ou seja, o CIRE prevê, expressa e intencionalmente, que a aprovação de qualquer Plano de Recuperação, em nenhuma medida interfere com as responsabilidades dos condevedores (terceiros garantes), não produzindo qualquer efeito relativamente a estes. Pelo que, os Credores têm que manter a possibilidade de exercer, conforme bem entenderem, os direitos que emergem de garantias pessoais de terceiros. Isso mesmo resulta expresso no recente Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 10.12.2013, transcrevendo-se, infra, parte do seu conteúdo e que se revela importante para questão em análise. Ao vedar-se o exercício desses direitos durante a vigência do Plano “está-se, evidentemente, a afectar os “direitos dos credores (…) contra (…) os terceiros garantes da obrigação”, o que colide com o princípio consagrado no n.º 4 do artigo 217.º do CIRE.” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 10.12.2013, disponível in www.dgsi.pt).

De igual modo, o BC, por requerimento apresentado em 11 de Junho de 2014, veio requerer a não homologação do plano de revitalização, alegando, em síntese:

  1. O plano de negócios subjacente ao plano de recuperação agora apresentado não tem em conta a violação do plano de pagamentos que constava do plano de insolvência anteriormente aprovado pelos credores N, nem as consequências que tal violação produziu nos créditos sobre a insolvência, nos termos do previsto no art.º 218º do CIRE; b) A medida prevista na alínea c) do ponto 4.2. da Proposta de Plano de Recuperação extravasa o âmbito legal de tal plano ao pretender regular, sem o acordo expresso das entidades visadas, o pagamento de encargos vincendos relativos às garantias bancárias activas; c) A medida prevista na primeira parte da alínea a) do ponto 4.2. da proposta de Plano de Recuperação extravasa o âmbito legal de tal plano ao pretender regular, sem o acordo expresso das entidades beneficiárias, os termos e efeitos das garantias pessoais prestadas para garantia dos créditos sobre a Requerente.

  2. A medida prevista na segunda parte da alínea d) do ponto 4.2. da proposta de Plano de Recuperação extravasa o âmbito legal de tal plano ao pretender regular, sem o acordo expresso das entidades beneficiárias, as consequências processuais da eventual aprovação dessa proposta, nomeadamente no que respeita aos efeitos de uma eventual aprovação sobre as acções em curso entre os credores da Requerente e os garantes desta.

    Também os credores, M, A, B, AC, C, CG, CA,E, F, G, J, JA, JE, JV, JM, JC, L, ML, MLC, ME, MJ, NF, NFE, PA, PM, RV, RF, RB e TC, por requerimento junto de fls. 6399 a 6410, vieram requerer a não homologação do plano de revitalização aprovado, nos termos e pelos fundamentos seguintes:

  3. Da inadmissibilidade do PER No âmbito do processo de insolvência nº 1277/11.1TJVNF que correu termos no 5º Juízo deste Tribunal em que era também devedora a N foi aprovado um plano de insolvência, homologado por sentença transitada em julgado. A aprovação deste plano de insolvência seguiu-se à declaração da insolvência da devedora.

    Nos termos do art. 17ºA do CIRE, o processo especial de revitalização destina-se às empresas em situação económica difícil ou de insolvência meramente iminente mas sobre as quais ainda não impende o dever de apresentação à insolvência. Situação que manifestamente não era, e não é, a da devedora, que, porque incumpriu o plano de insolvência, se encontra em situação de insolvência actual e não de insolvência meramente iminente.

  4. Da falta de clareza do Plano de Recuperação O Plano de Recuperação está explicitado de forma obscura e contém disposições incompatíveis entre si. Desde logo, os créditos privilegiados laborais seriam pagos “... pela valorização e posterior alienação de activos não estratégicos nem afectos à exploração ...” (Cfr. 4.1.1.). Mas não esclarece em concreto que activos são esses.

    Por outro lado, contraditoriamente, o Plano prevê a manutenção e reforço das hipotecas de 1º grau sobre bens não afectos à exploração, a favor da Segurança Social (Cfr. 4.1.6.), sendo certo que esses mesmos bens não afectos à exploração seriam para alienar e para pagar os créditos laborais, como referido na alínea a) de 4.1.1..

    Não se percebe claramente o que se pretende dizer em 4.1.1. e), nem a sua relação com o vertido na alínea anterior.

    A dação em pagamento prevista em 4.1.2. c) conflitua com a cativação do produto da alienação nos termos da alínea imediatamente anterior: em caso de dação em pagamento, não há ingresso, na Requerente, de qualquer valor susceptível de ser cativado.

  5. Da violação do princípio da igualdade e da verificação da situação prevista no art. 216º nº 1 a) do CIRE Os credores ora requerentes foram todos eles trabalhadores da devedora, tendo os seus créditos a natureza laboral. De harmonia com o disposto no artigo 333º do Código do Trabalho, os créditos emergentes de contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação gozam (a) do privilégio mobiliário geral e (b) do privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o trabalhador preste a sua actividade. A restrição operada na parte final do citado preceito (privilégio apenas sobre o imóvel onde o trabalhador laborava) é inconstitucional, pelo que que o privilégio imobiliário não pode deixar de recair sobre todos os imóveis da Insolvente, mormente sobre os afectos ao seu estabelecimento mercantil. A insolvente é proprietária de diversos imóveis e os requerentes trabalhavam em vários deles, conforme indicaram na reclamação dos seus créditos oportunamente remetida ao Sr. Administrador Judicial. Por isso, mesmo que se siga o entendimento mais restritivo do aludido preceito, os aqui Requerentes têm sobre esses imóveis o privilégio imobiliário especial. O tratamento dos créditos laborais está feito no ponto 4.1.1 do Plano, de resto, de forma algo confusa e pouco clara, como já foi dito. O Plano estabelece medidas que afastam os privilégios previstos no art. 333º do Código do Trabalho, designadamente o privilégio imobiliário especial relativamente aos créditos laborais. Com efeito, todos os imóveis da devedora estão hipotecados à Banca e o Plano prevê que a Banca passe à frente dos ex-trabalhadores na prioridade dos pagamentos pelo respectivo produto.

    A cativação de que se fala em 4.1.2. b) é restringida aos trabalhadores que laboravam nesse imóvel, perdendo todos os outros o privilégio imobiliário que detêm.

    De resto, tal cativação fica desarmada se o imóvel for objecto da dação em pagamento prevista nas alíneas c) e d) do mesmo ponto 4.1.2.

    Mas, além de se verem assim despojados do privilégio imobiliário que detêm sobre todos os imóveis afectos ao estabelecimento mercantil, os titulares de créditos laborais como os Requerentes ficariam entregues a um longo processo (de mais de 7 anos) para poderem receber os seus créditos. Com a agravante de que poderiam não receber esses mesmos créditos, hipótese que é abordada no ponto 4.1.1. e), que, admitindo não ser possível satisfazê-los pelos fundos libertos pela actividade da empresa, refere que serão pagos “... no prazo subsequente ...”, sem especificar que prazo e que meios seriam então utilizados para pagá-los, ou seja, sem que garanta o respectivo pagamento. O mesmo é dizer que os créditos privilegiados laborais (i) perdem na prática o privilégio de que gozam, (ii) seriam pagos em prazo longo, os sete anos acima referenciados, (iii) mas sem qualquer garantia de que seriam pagos. Estas condições oferecidas pelo Plano colocam os credores laborais em situação pior do que aquela que lhes adviria da liquidação do património da empresa em situação de insolvência, o que é fundamento para a não homologação do mesmo, nos termos do art. 216º nº 1 a) do CIRE. Estas condições oferecidas pelo Plano violam o princípio da igualdade – violação expressamente reconhecida, no seu ponto 3.4 d) – em relação aos credores laborais e, em concreto, em relação aos aqui Requerentes que para tal não deram o consentimento exigido pelo art. 194º nº 2 do CIRE.

    Igualmente os credores, A, AJ, C, CR, D, F, H, I, J, JC, JN, MS, MR, ML, MF, MT, MC, MFS, PA, PJ, SC, VA, VV e Z, vieram opor-se à homologação do plano de revitalização nos termos e com os fundamentos seguintes:

    1. Da violação não negligenciável das regras procedimentais Ora, desde logo, a requerente N não está meramente em situação económica difícil, mas em situação de incumprimento generalizado das suas...

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