Acórdão nº 833/15.3T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução16 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrentes: - Seguradora X – Seguros Gerais, S.A.; - H. B.

e P. N.; Recorridos: - H. B.

e P. N.; - Seguradora X – Seguros Gerais, S.A.;M.

* Acordam os Juízes na 1ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: 1. RELATÓRIO H. B. e P. N., moveram a presente ação contra a Seguradora X – Companhia de Seguros SA, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia de 270000€ a título de dano não patrimoniais, acrescida dos juros vencidos desde a citação e, ainda, de 5% nos termos do art. 829º-A/ 4 C. Civil.

A Ré, contestando, pediu a improcedência da ação.

Instruída a causa, procedeu-se a realização de audiência final para prolação de sentença, com o seguinte dispositivo.

Termos em que julgo a presente ação parcialmente procedente e provada, nos termos sobreditos e, consequentemente: a) Condeno a Ré a pagar aos Autores H. B. e marido PeP. N. a quantia global de 52.500 € (cinquenta e dois mil e quinhentos euros), sendo que relativamente à parcela de 16.666,67 € (dezasseis mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos) cabem 2/3 à Autora H. B. e 1/3 ao Autor marido e que quanto ao remanescente cabe metade a cada um; b) Condeno a Ré a pagar juros de mora à taxa de 4% sobre a mencionada quantia global de 52.500 €, desde a data desta sentença e até integral e efectivo pagamento.

  1. Absolvo a Ré do mais peticionado.

    Custas da ação por AA e ré, na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido.

    Não há indícios de litigância de má-fé.

    Entretanto o Tribunal a quo pronunciou-se sobre as nulidades da sentença, invocadas pelos Autores, julgando-as improcedentes (cf. fls. 288).

    *Não se conformando com a decisão, dela apelou a Ré, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que a seguir se reproduzem: 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, condenando a ora recorrente “SEGURADORA X” a pagar aos Autores H. B. e P. N., a quantia global de Euro 52.500,00, (sendo que, relativamente à parcela de Euro 16.666,67, cabem 2/3 à A. H. B. e 1/3 ao Autor marido e que, quanto ao remanescente, cabe metade a cada um) acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% contados desde a data da sentença até integral pagamento.

    1. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, a douta sentença proferida não contempla uma adequada apreciação da prova e decisão de facto, nem uma apropriada aplicação do direito, pelo que se impõe a sua revogação, nos termos que passaremos a enunciar.

    2. Entende-se, e sempre com o máximo respeito que, por um lado, incorreu o Meritíssimo Tribunal “a quo” em erro de julgamento, ao dar como provados os pontos 20º e 22º dos factos provados, factualidade essa, face à prova produzida, temos por não suficientemente evidenciada.

    3. E, por outro, independentemente do invocado erro de julgamento, não podemos deixar de manifestar a nossa discordância quanto à imputação, a título de culpa efectiva, de parte da responsabilidade pela ocorrência deste lamentável acidente ao condutor do veículo QG, na medida em que, ao fazê-lo, o Meritíssimo Tribunal “a quo” exige ao condutor do veículo, uma diligência, não de acordo com o padrão do condutor normal, mas sim o de um verdadeiro “superhomem”.

    4. Adicionalmente, e para além da questão atinente à responsabilidade pela ocorrência do funesto evento, não se conforma a Seguradora R. com o quantum indemnizatório fixado a título de perda do direito à vida, de dano não patrimonial dos AA., e ainda quanto ao dano moral da própria vítima (sendo que, quanto a este último, para além de discordarmos do respectivo valor, entendemos que não resultou minimamente provada factualidade da qual se pudesse inferir a sua verificação).

      DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO DO ART. 20º DOS FACTOS PROVADOS 6. Ao art. 20º da enunciação da matéria de facto provada foi conferida a seguinte redacção: “Ao retomar a marcha, sem assinalar previamente a sua intenção, e ao fazê-lo nos termos referidos em 17) destes factos provados, apesar de saber que a altura da carrinha Trafic lhe retirava a visibilidade, o José actuou de forma desatenta”.

    5. Salvo o devido respeito por diversa opinião, a matéria reportada à censura da conduta do condutor ínsita nesta alínea dos factos provados, consubstancia pura matéria de direito, ou seja, matéria de teor eminentemente conclusivo.

    6. Nessa conformidade, e salvo o devido respeito por diversa opinião, deverá a citada alínea 20º ser suprimida do elenco da matéria de facto provada 9. O que se deixa alegado para todos os devidos efeitos legais.

      DO ERRO DE JULGAMENTO: DO ART. 22º DOS FACTOS PROVADOS: 10. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, perante a prova produzida, não podia o Meritíssimo Tribunal “a quo” dar como provados os concretos factos vertidos no art 22º da factualidade provada.

    7. Com efeito, e tal como demonstraremos infra, a prova produzida impunha diversa decisão quanto ao supra citado ponto da factualidade dada como provada.

    8. O art. 22º dos factos provados mereceu a redacção que se passa a recordar: “O P. N. sofreu uma dor lancinante, no momento em que a roda lhe passou por cima da cabeça, tendo perdido a consciência de seguida, assim se mantendo até sobrevir a morte” 13. Perante a prova efectivamente produzida, cremos que se impunha dar como não provado que a desafortunada vítima “sofreu uma dor lancinante”.

    9. Com relevo para a prova desta factualidade, há que reapreciar depoimento da testemunha J. F., médico, (depoimento prestado em audiência de julgamento de 03/03/2016, com inicio às 16.39 horas, e gravado em suporte digital, ficheiro 20160303160600_1087710_2890454) e cujos concretos trechos e minutos relevantes para o apuramento desta factualidade, se acham transcritos e assinalados no corpo das presentes alegações.

    10. Sendo que, em face do depoimento da sobredita testemunha, que depôs de forma manifestamente desinteressada, e com conhecimentos técnico científicos para os juízos por si formulados, temos que se impunha considerar altamente improvável que a malograda vítima tivesse experienciado dor no concreto momento do evento.

    11. Sendo que, por força disso, e no que toca aos factos vertidos no art. 22º dos factos provados, impunha-se dar como provado apenas que: “O P. N., no momento em que a roda lhe passou por cima da cabeça, perdeu a consciência, assim se mantendo até sobrevir a morte” 17. O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos efeitos legais, designadamente, para a modificação da decisão de mérito, no que diz respeito à atribuição de uma compensação por danos patrimoniais.

      DO DIREITO: 18. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, e independentemente da ora propugnada alteração da decisão quanto à matéria de facto, temos por certo que andou mal o Meritíssimo Tribunal “a quo” na atribuição, ainda que apenas em parte, da culpa pela produção do evento ao condutor do veículo automóvel DA RESPONSABILIDADE PELA OCORRÊNCIA DO EVENTO DANOSO: 19. Jamais poderemos concordar com o douto entendimento manifestado na sentença recorrida a propósito da imputação de parte da culpa pela ocorrência do funesto acidente, ao condutor do veículo automóvel.

    12. Os argumentos vertidos na douta decisão que servem de base ao estabelecimento da concorrência entre responsabilidade a título de culpa efectiva, ao condutor e ao menor (este na pessoa do seu pai e ao abrigo do instituto da culpa in vigilandum) não fazem aqui qualquer sentido, atentas as concretas circunstância do caso sub judice.

    13. Cotejada a douta fundamentação da decisão aqui posta em crise, verificamos que o Meritíssimo Tribunal “a quo” impôs ao condutor do QG um dever de diligência manifestamente superior ao de um condutor médio, nomeadamente, no que diz respeito à necessidade de apitar antes de arrancar com o veículo.

    14. Do mesmo modo, considerou culposa a conduta do condutor na medida em que não terá assinalado a sua intenção de reiniciar a marcha.

    15. Só que, e sempre com o merecido respeito por diverso entendimento, analisado todo o acervo fáctico que rodeou esta infeliz ocorrência, somos levados a concluir que, em concreto, o facto do com condutor não ter apitado ou solicitado auxílio aos demais peões, ou previamente assinalado a sua intenção de retomar a marcha, são actuações omissivas que não têm a relação de causalidade directa e necessária com o evento que o Meritíssimo Tribunal “a quo” lhes conferiu.

    16. Na verdade, tendo a criança enfiado a cabeça debaixo do Ford Transit junto à roda dianteira direita sem que ninguém se tivesse apercebido – concretamente o seu pai que também se encontrava no local - e sendo absolutamente impossível ao condutor avistar a criança nessa situação, o facto de dar pisca, por exemplo, ou pedir ajuda às pessoas que se abeiraram do veículo era absolutamente inócuo para a produção do dano, já que não seria adequado a afastálo.

    17. Isto porque, naturalmente, sendo certo que ao condutor do veículo era absolutamente impossível ver que a criança estava naquela posição, não menos certo é o facto dos outros dois indivíduos também não terem visto o menor.

    18. Não faz, pois, aqui qualquer sentido o apontamento vertido na douta decisão no sentido de que o facto do condutor ter actuado em infracção ao art. 12º n.º 1 do Cód. Estrada por ter retomado a marcha sem tomar qualquer precaução, numa localidade, num veículo alto, que lhe retirava a visibilidade e na proximidade (não concretamente apurada) de crianças que brincavam fora da via.

    19. Isto porque, e sempre com o máximo respeito, não era legitimo ao referido condutor prever que uma criança de 16 meses andasse desacompanhada, que se introduzisse na via sem que ninguém disso desse conta e, muito menos, que fosse colocar a cabeça junto à roda dianteira direita do veículo que estava imobilizado.

    20. Na verdade, e ainda que o veículo não fosse alto, sempre o menor, face à sua altura e escassa distância do veículo, não seria visível para um qualquer condutor.

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