Acórdão nº 60/13.4TBBGC.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelANABELA TENREIRO
Data da Resolução11 de Julho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO A Caixa Geral de Aposentações intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum declarativo, contra a Ré, Companhia de Seguros, S.A., peticionando a condenação no pagamento da quantia de € 14.253,66, acrescida de juros de mora desde a data de citação até integral e efectiva liquidação daquele montante.

Alegou, em síntese, ter ocorrido, nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas na petição, um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo ligeiro de matrícula GO, pertencente a Jaime M. e conduzido por este, bem como o veículo ligeiro de matrícula GQ, propriedade de G. Pires, sendo que o primeiro veículo teria embatido com a sua parte da frente na parte lateral do segundo veículo, sendo assim tal sinistro ocasionado pelo comportamento negligente do referido Jaime M..

Mais alegou a Autora que, aquando do acidente, seguia como passageiro no banco da frente do veículo danificado com a matrícula GQ, Maria P., a qual, por força do aludido embate, sofreu traumatismo raquidiano, tendo-lhe, nessa sequência, e por força das referidas lesões, bem como pela circunstância de a mesma, aquando do sinistro, se deslocar da Escola, na qual exercia, à referida data, funções de professora do ensino público para casa, sido atribuída pela Demandante, e após sujeição daquela a junta médica, uma incapacidade permanente absoluta para o exercício das referidas funções de 15%.

Referiu ainda a Autora que, por força da caracterização do aludido sinistro no que tange a aludida Maria P., como acidente de serviço, o capital de remição a que aquela teria direito ascenderia ao valor de € 34.253,66, sendo que, no entanto, tendo a referida lesada deduzido pedido de indemnização civil contra a Ré Seguradora no âmbito do processo crime que correu termos sob o n° 63/1O.0TABGC e entre a mesma e a Ré celebrado acordo de transacção, na execução do qual esta pagou àquela a quantia de € 20.000,00 a título de dano patrimonial, a Autora apenas liquidou à referida Maria P., a quantia sobrante de € 14.253,66.

Concluiu, por fim, a Autora, salientando que, tendo procedido ao pagamento da referida quantia de € 14.253,66 à lesada, Maria P., tem direito de regresso contra a Seguradora Demandada nos termos do artigo 46° n.º3 do DL 503/99 de 20/11, direito esse que ora exerce por via da presente acção.

* Regularmente citada, a Ré deduziu contestação, alegando, em síntese, por via de excepção dilatória, a incompetência em razão da matéria deste Tribunal, no entendimento que a causa pertenceria ao domínio de competência dos Tribunais Administrativos.

Mais alegou a Ré, ainda por via de excepção dilatória, a ineptidão da Petição Inicial, na medida em que esta não integraria os factos dos quais se pudesse retirar que o acidente de viação aí alegado seria qualificável como acidente de serviço.

Finalmente, referiu ainda a Ré, por via de excepção peremptória, ter procedido ao pagamento, no âmbito da execução da transacção celebrada com a lesada, Maria P., no processo crime supra-referido, da quantia de € 26.679,18, tendo esta declarado, no âmbito de tal acordo e conforme cláusula constante do mesmo, ter sido ressarcida por essa via de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos como consequência do sinistro dos autos; nesse sentido, entende a Ré já ter cumprido a obrigação de indemnizar todos os danos sofridos pela lesada, sendo tal cláusula contida na aludida transacção oponível à Autora.

Por último, salientou não ter sido informada no âmbito do aludido processo-crime, fosse pela lesada, fosse pelo Ministério Público ou pelo Tribunal ou ainda pela Autora, de que o acidente em causa nos autos configuraria um acidente de serviço, só tendo obtido tal informação da depois de celebrada e executada a aludida transacção, a qual não teria sido celebrada, caso a Ré soubesse daquela qualificação; também nesse sentido, sendo a omissão do cumprimento dos deveres de informação contidos no artigo 47° n.ºl e 2 do DL 503/99 imputáveis, respectivamente, à lesada e ao Ministério Público, não lhe seria exigível o pagamento da quantia liquidada pela Autora à referida vítima a título de direito de regresso da Autora sobre a Ré.

Impugnou, por último, a Ré os factos atinentes à qualificação do acidente dos autos como acidente de serviço e ainda ao pagamento alegadamente efectuado pela Autora à lesada. Concluiu assim a Ré no sentido da respectiva absolvição da instância ou, caso assim se não entendesse, da respectiva absolvição do pedido.

* A Autora apresentou articulado de resposta, pronunciando-se no sentido da improcedência das excepções de incompetência material deste Tribunal e de ineptidão da Petição Inicial, e concluindo, quanto à excepção peremptória atinente à cláusula de limitação de responsabilidade contida na transacção celebrada entre a Ré e a lesada, ser tal cláusula inoponível em razão do carácter imperativo da norma contida no artigo 46° n.º3 do Decreto-Lei 503/99 de 20/11, sendo certo que a omissão por parte da Demandada Seguradora de comunicação à Autora da supra-referida transacção também seria imputável àquela, porquanto a mesma não poderia desconhecer sem culpa que a sinistrada era professora, que o acidente havia ocorrido num dia de semana e num horário consentâneo com o horário de trabalho daquela.

*Proferiu-se sentença que julgou a presente ação procedente, por provada, e, em consequência, decidiu condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de € 14.253,66, correspondente ao capital de remição pago pela CGA à subscritora n° 1460154-RR, Maria P., em consequência do acidente referido em 1) a 3) dos factos provados, acrescida aquela quantia de juros de mora, à taxa legal civil aplicável, contados da citação até integral e efectivo pagamento.

*Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso, finalizando com as seguintes Conclusões 1. Em 13/12/2010, já depois da participação do acidente como sendo em serviço à entidade empregadora, a lesada e beneficiária da CGA/Recorrida apresentou pedido de indemnização cível contra a aqui Recorrente, no âmbito do processo-crime que correu termos pelo extinto Tribunal da Comarca de Bragança, com o nD.63/1o.oTABGC (nD.24 FP).

  1. Nesse processo, o pedido de indemnização apresentado pela sinistrada e beneficiária da CGA, no valor global de 60.000,00€, abarcava, entre outros, a pretensão daquela ser indemnizada pela IPP de 15%, decorrente do acidente dos autos, recebendo o valor de peticionado a esse título de 56.500,00€ (n°.25 FP).

  2. Enquanto Demandante no pedido de indemnização cível, processado no âmbito do processo-crime e apresentado em juízo a 13/12/2010, sobre a beneficiária da CGA impendia o ónus legal previsto no n.º1, do artº.4 do D.L. 503/99 de 20 de Novembro, de informar no processo cível por si instaurado de que era beneficiária da CGA e que havia previamente participado o mesmo acidente à sua entidade empregadora como sendo em serviço, assim se permitindo dar cumprimento ao n.º2 do mesmo artigo; 4. Acontece que, como resulta provado nos autos, a beneficiária da Recorrida nunca deu conhecimento no âmbito do processo-crime da sua qualidade de beneficiária da CGA e, muito menos, informou os autos que até em data anterior à propositura do pedido de indemnização já tinha participado o acidente em causa como sendo em serviço à sua entidade patronal, estando em marcha o procedimento administrativo decorrente dessa participação.

  3. Nem daqueles autos precedentes, que correram pelo extinto Tribunal de Comarca, foram alegados indícios que permitissem desconfiar da natureza do acidente em discussão como sendo, além de viação, também em serviço, pois a Autora além de omitir tal facto apresentou documentação da qual constava a referência expressa ao mesmo como sendo APENAS de viação - cfr. n°.26 dos FP.

  4. Mas o Tribunal a quo olvidou qualquer consequência a retirar da omissão de tal dever imputável à lesada e beneficiária da CGA, legalmente consagrado, optando por fundar a omissão e desconhecimento da natureza de acidente em serviço, num inovador dever de auto-informação da Seguradora quanto à natureza do acidente - cfr. pág. 20 da sentença.

  5. Desculpa-se e legitima-se a omissão e, consequente, violação do cumprimento de um ónus legalmente previsto e imputável ao sinistrado - principal beneficiário do regime que tutela os direitos emergentes de acidente em serviço e doenças profissionais - com um inovador ónus de auto-informação a cargo da seguradora, de indagar em todo e qualquer acidente de viação que lhe seja participado, se foi também ou não em serviço! 11. Mesmo quando não há qualquer indício que o faça supor; mesmo quando se confia que o sinistrado - enquanto cidadão cumpridor das normas legais que deve respeitar - cumprirá um ónus legalmente...

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