Acórdão nº 6225/13.1TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Março de 2017
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 30 de Março de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores AA e BB intentaram, em 23-09-2013, no Tribunal de Braga, acção declarativa, sob a forma de processo comum, que prosseguiu no de Vila Verde, contra os réus: 1ºs – CC e marido DD; 2º – EE (entretanto, falecido); 3ª – FF; 4ª – GG.
; e 5ª – HH.
Pediram a condenação destes a pagar-lhes a quantia de €14.000,00 (a título de redução do preço de compra de uma fracção autónoma por limitação do direito sobre a coisa ou vício desta), bem como a quantia de 600,00€ (a título de indemnização por obras que tiveram de nela executar).
Para tanto, alegaram, resumindo(1): -Os 1ºs a 3ºs réus eram donos da fracção autónoma “D” de um prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito em Braga, que, em 28-09-2012, o autor lhes comprou, pelo preço de 41.500€, por intermédio da 4ª ré; -Com efeito, sendo emigrantes e interessados na compra de um apartamento naquela cidade, um colaborador da ré levou-os a visitar e mostrou-lhes aquele, que referiu como tendo, além do mais, uma cave com 91 m2 e 182m2 de área total; -Esta cave era composta por uma única divisão, com área igual à do andar (rés-do-chão) e o acesso era, então, feito exclusivamente através de umas escadas em “L” situadas no meio da sala; -Foi celebrado o contrato-promessa, ficando os autores convictos que estavam a comprar a fracção nas condições em que a visitaram e sem qualquer tipo de limitação ao direito de propriedade ou encargo com a sua utilização; -Na data aprazada para a celebração da escritura, compareceram na Conservatória o autor marido e os 1ºs réus, por si e em representação dos 2º e 3º, bem como uma colaboradora da referida mediadora, tendo nesse acto sido àquele entregues pelos réus o Certificado Energético do apartamento no qual consta a descrição da fracção em causa, correspondente à visitada; -Uma vez outorgada a escritura e ainda naquela repartição, a 1ª ré, CC, dirigiu-se ao autor e referiu-lhe a existência de uma sentença judicial respeitante à fracção em causa mas não lhe especificando o seu teor nem dizendo qual a decisão, e simultaneamente entregou-lhe uma pasta de documentos, onde constava uma certidão daquela (processo nº 703/07.9TBBRG, do 2.º Juízo Cível de Braga, já transitada em julgado em 24-11-2010), abandonando, sem mais explicações ou esclarecimentos, o local, assim como a representante da 4ª ré; -O processo referido opusera o Condomínio do prédio aos 1ºs a 3ºs réus, e ainda a II e marido JJ, comproprietários, à época, do imóvel; -Na sentença proferida, fora reconhecido que a cave existente no apartamento faz parte integrante da fracção “D” mas condenados os réus a eliminarem, à sua custa, o rasgo em “L” (escadas) que liga a sala à cave do imóvel; -Trata-se do único acesso existente para a cave; -Além disso, a sentença condenou ainda os ora réus a eliminarem, à sua custa, uma abertura por eles feita na parte exterior do prédio destinada à exaustão do esquentador; -Os autores eram completamente alheios, até àquele momento, a tais factos; -A obrigação imposta pela sentença ao proprietário do imóvel de eliminar as referidas escadas de acesso (único) da sala à cave priva o dono de qualquer outro acesso à mesma, inutilizando o espaço, consubstanciando assim uma limitação do direito de propriedade dos autores, além de um vício no bem adquirido, que o onera e desvaloriza; -Se os autores soubessem da existência de tal sentença, embora admitindo que teriam, ainda assim, adquirido o bem, jamais o fariam pelo preço de €41.500,00; -Sem possibilidade de acesso ao espaço da cave, o apartamento, à data do negócio, teria um valor máximo de mercado de €27.500,00; -A demolição das escadas, bem como a eliminação da referida abertura na parede exterior do prédio, destinada à exaustão do esquentador, assim como os trabalhos a eles associados, têm um custo orçamentado em €600,00; -Os 1ºs a 4ºs réus, durante a fase negocial e antes da celebração da escritura pública de compra e venda, tinham pleno conhecimento da sentença e das limitações e defeitos que esta causava no imóvel, mas todos omitiram deliberadamente a sua existência.
Concluíram que têm direito à redução do preço e a ser indemnizados.
Além dos demais réus, também os 1ºs a 3ºs réus (CC e Outros) contestaram, impugnando, por desconhecimento ou falsidade, os factos fundamentadores da acção, e alegando, em síntese que: -Comunicaram à 4ª ré imobiliária todas as circunstâncias relativas à fracção, incluindo as decorrentes da sentença proferida e teor desta, entregando-lhe uma cópia, bem como lhe forneceram todos os elementos relativos à descrição predial e inscrição matricial, instruindo-a para aos possíveis interessados darem conhecimento da sentença, mas desconhecendo como procedeu a dita ré, sendo certo que esta é que tratou de tudo e nenhum contacto tiveram com os autores, salvo o do dia da escritura; -A fracção foi posta à venda pelo valor de €67.500,00, que era o seu valor de mercado na altura (aliás o seu valor fiscal, avaliado em 2012, era de € 58.911,72€, sem contar com a cave), mas vendida afinal pelo de 41.500,00€, proposto pelos autores, apesar de cientes de todas as circunstâncias; -Aliás, os documentos relativos à fracção foram-lhes disponibilizados, nomeadamente a descrição predial e caderneta predial, neles se verificando que a cave não consta como fazendo parte da fracção, tendo eles conhecimento que “a cave não se encontrava legalizada” mas que a sentença a reconheceu como “fazendo parte integrante da fracção”; -Tal se depreende também do declarado no artigo segundo do contrato-promessa de compra e venda, onde consta: “O segundo outorgante declara que lhes foi facultada toda a informação disponível referente ao prédio objecto da promessa do presente contrato e lhes proporcionou a possibilidade de o visitar e inspeccionar, pelo que conhece e aceita as características e o estado em que o mesmo presentemente se encontra e irá ser vendido, bem como eventuais limitações ao seu uso e aproveitamento”; -Mesmo assim mantiveram o seu interesse e fizeram a citada proposta; -Não sofreu a fracção qualquer desvalorização, nem os autores tiveram qualquer prejuízo, pois a sentença até definiu que a cave integra a fracção; -Acresce que, o acesso à cave nunca ficaria impossibilitado, e consequentemente, a cave nunca ficaria inutilizada, pois, consta dos factos provados da aludida sentença que “o acesso à cave sempre se fez pelo interior da parte habitacional da fracção D”, que “(…) alteraram o acesso que já existia desde a parte habitacional para a cave”, resultando assim claro que podia ser reposto o acesso primitivo à cave.
Concluíram que não existe fundamento para a pedida redução do preço, devendo ser absolvidos.
Entretanto, faleceu o 2º réu, tendo corrido a respectiva habilitação e nesta sido declarado seu único herdeiro KK.
Realizou-se a audiência de julgamento nos termos e com as formalidades narradas nas actas (fls. 219 a 223, 228 a 232 a 234).
Foi, depois, com data de 27-10-2016, proferida a sentença (fls.240 a 264) que culminou na seguinte decisão: “Nestes termos e face ao exposto, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência:
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Condeno os Réus CC, DD, FF, por si e na qualidade de herdeiro [2] de EE, e KK, este na qualidade de herdeiro de EE, a pagar ao Autor AA a quantia de € 600,00; b) Absolvo os Réus CC, DD, FF, por si e na qualidade de herdeiro de EE, e KK, este na qualidade de herdeiro de EE, dos restantes pedidos contra si formulados; c) Absolvo as Rés “GG.” e “HH Seguros, S.A.”, dos pedidos contra si formulados.
* Custas pelo na proporção do decaimento – Cfr., art.º 527.º, do Código de Processo Civil.
Notifique e registe.
” Inconformados, os autores dela interpuseram recurso (fls. 277 a 288) para esta Relação, alegando e concluindo nos seguintes termos: “1. A douta decisão em mérito deveria ter julgado provado, ao contrário do que sucedeu, que a área da cave equivale à totalidade das restantes divisões da casa, situadas no rés-do-chão, nos termos enunciados no ponto 7. dos factos provados.
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Por outro lado, deveria, atentos o conjunto de factos julgados provados, ter julgado igualmente provado que: i) A eliminação das escadas foi judicialmente imposta; ii) A única passagem para a cave faz-se através dessas escadas; iii) A consequência imediata dessa eliminação é a impossibilidade de acesso à cave por parte do proprietário; iv) E, consequentemente, a inutilização total do espaço.
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A sentença proferida no âmbito do proc. nº 703/07.9TBRG, que correu termos no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Braga, ao contrário do considerado pelo douto tribunal recorrido, não poderá ser interpretada no sentido de que é permitida a reabertura de um acesso original à cave, supostamente existente, em tempos, na fracção.
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Em rigor, e tal como se reconhece expressamente na sentença recorrida, aqueloutro aresto “não se pronunciou, no seu dispositivo, sobre a questão de saber se os aí réus podiam ou não reabrir o primitivo acesso à cave.” 5. Por outro lado, o tribunal a quo não poderia, num exercício supositício e imaginativo, afirmar o que o tribunal que proferiu aquela sentença teria decidido, acaso fosse chamado a pronunciar-se, em determinado sentido.
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Pelo contrário, aquela decisão de condenação na eliminação das escadas fundamenta-se no facto de se ter operado um corte na laje do respectivo piso, pelo que uma nova abertura para a cave, noutro local da fracção – o primitivo ou outro -, implicaria, necessariamente, um corte nessa mesma laje, assim contendendo com uma parte comum do prédio, motivo pelo qual foi determinada a destruição das escadas.
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A necessidade de abertura da laje para introduzir um novo acesso foi expressamente confirmada pela testemunha dos Recorridos, JJ.
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Assim, o tribunal a quo deveria ter julgado provado que a obrigação decorrente da sentença judicial de eliminação das escadas existentes faz com que o proprietário da fracção deixe de...
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