Acórdão nº 147/15.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelLINA CASTRO BAPTISTA
Data da Resolução09 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

SUMÁRIO I – A nossa lei consagrou a chamada teoria da substanciação, nos termos da qual a exceção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa, quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.

II – No que concerne à repetição da causa de pedir, importa apurar se a substância do litígio assenta nos mesmos factos concretos em ambas as ações, tendo por pressuposto que o caso julgado não impede que se invoque uma diferente causa de pedir para o mesmo pedido formulado em ação anterior.

III – Assim, o comprador de um imóvel pode intentar nova ação judicial pedindo – tal como na anterior – a reparação de defeitos de construção no imóvel, desde que tais defeitos concretos sejam diferentes dos invocados na antecedente ação.

IV – A taxa sancionatória excecional trata-se de um mecanismo de penalização dos intervenientes processuais que, sem a prudência e a diligência exigível, apresentam em Tribunal ações e requerimentos manifestamente infundados.

* Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I—RELATÓRIO S, residente na Travessa de S. Frutuoso, n.º …, Real, Braga, intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra H, representada pela cabeça de casal A, residente no lugar de Quintães, Goães, Vila Verde, e A, residente no lugar de Quintães, Goães, Vila Verde, pedindo que as Rés sejam condenadas: Ø Na realização das obras e trabalhos tendentes à retificação, supressão e eliminação dos vícios, defeitos e desconformidades verificados no prédio urbano identificado na Petição Inicial.

Ø A pagar-lhe a realização das obras de eliminação dos defeitos, caso as Rés não procedam às mesmas naquele prazo.

Ø A pagar-lhe uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, no valor nunca inferior a € 25 000,00.

Ø A pagar-lhe, a título de compensação pelos danos de natureza patrimonial, a quantia de € 1 061,38.

Alega, para tanto e em síntese, que os Réus, no desenvolvimento da atividade de construção civil e compra e venda de imóveis, construíram o prédio urbano para habitação, composto por casa de cave, rés do chão e andar, com logradouro, sito no lugar de S. Francisco, Lote n.º A, …, Real, Braga, e lho venderam, por escritura pública outorgada em 28/06/2006.

Afirma que, na data que passou a ocupar a casa, constatou a existência de um conjunto de defeitos de construção no mesmo.

Diz ter-se visto obrigada a recorrer ao Tribunal, a fim de as Rés eliminarem os defeitos de construção existentes no imóvel, tendo intentado ação de condenação, com processo comum ordinário, que correu os seus termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga, sob o n.º 487/07.1TBBRG e em que estas foram condenadas a eliminar definitivamente um conjunto de defeitos.

Alega que, além dos defeitos que as Rés foram condenadas a rectificar, surgiram novos defeitos, que denunciou, designadamente os elencados nos art. 15 e ss. da Petição. Especifica – entre o mais - que, pelo facto de a rede de distribuição de água apresentar diâmetros inferiores aos constantes do projeto e ficha técnica da habitação, ocorreram inundações, que provocaram danos nos móveis da garagem, em valor não inferior a € 1 000,00.

Mais alega que, em virtude de as Rés terem estado no imóvel a rectificar os defeitos a que haviam sido condenadas, teve que suportar o pagamento da colocação de novas fechaduras para a casa, que contabilizam € 61,38.

Alega, por fim, que sente desgosto e desilusão por ter adquirido uma casa com vários defeitos e que, apesar de terem sido alvo de intervenções, não desapareceram e não vão desaparecer na totalidade. Bem como que estes defeitos a privam do uso da habitação na sua plenitude. Entende ter direito a uma indemnização no valor de € 25 000,00, a título de danos não patrimoniais.

Notificada para esclarecer o último pedido formulado, a Autora veio juntar novo articulado de Petição Inicial, em que pede – quanto a este último pedido – que as Rés sejam condenadas a pagar-lhe, a título de despesas já suportadas por si, a quantia de € 1 308,49, assim discriminadas: € 1 000,00 pela reparação dos móveis da garagem; € 61,38 pelo pagamento de novas fechaduras e € 247,11 a título de despesas de água e luz correspondente ao período em que as Rés estiveram a realizar trabalhos de reparação.

Acrescentou em sede de articulado que existe o valor relativo à água e luz correspondente ao período em que as Rés estiveram a realizar os trabalhos de reparação, que têm que ser suportados pelas mesmas.

A Ré A veio apresentar Contestação, em que excepciona a existência de caso julgado, alegando que a esmagadora maioria dos defeitos reclamados pela Autora nos presentes autos já haviam sido reclamados no outro processo, sendo que alguns foram considerados provados e outros não. Bem como que, nessa mesma ação, a Autora peticionou indemnização por danos não patrimoniais, concretamente os mesmos que servem de base ao pedido formulado nestes autos, tendo a sentença considerado que os mesmos não eram passíveis da tutela do direito.

Vem igualmente invocar a exceção de caducidade, alegando que os defeitos que a Autora vem agora invocar, e que não invocou na anterior ação judicial, deveriam ter sido denunciados e comunicados nos prazos de, respectivamente, 01 e 05 anos, a contar da data de entrega do imóvel.

Supletivamente, impugna a generalidade dos factos alegados na Petição Inicial e afirma que, em vistoria efectuada em 25/03/2014, ficou definido que todos os defeitos provados na sentença proferida na anterior ação judicial se mostravam eliminados. Acrescenta que existe por parte da Autora falta de conservação e de limpeza das paredes exteriores, dos muros exteriores, dos muros interiores e das grades de separação aplicadas sobre os muros, o que terá provocado novos defeitos no imóvel.

Conclui pedindo que as exceções sejam julgadas provadas e procedentes e a ação declarada não provada e improcedente, com a sua absolvição do pedido.

Em 16/09/2015, foi proferido despacho a convidar a Autora a esclarecer especificadamente o que é que na presente ação é novo face à ação anterior e, bem assim, quando é que tal ou tais novidades surgiram; a notificar a Autora para juntar aos autos certidão do Processo Executivo, que ateste quais os trabalhos que estão a ser peticionados nessa sede e a informar as partes que, caso não venham a ser prestados esclarecimentos bastantes, a exceção de caso julgado será oportunamente julgada procedente na parte vinda de referir.

A Autora veio responder especificadamente quanto a cada um dos defeitos agora invocados nestes autos e, posteriormente, juntar a indicada certidão judicial, defendendo que os defeitos ora reclamados são defeitos novos, sendo que alguns deles resultaram da intervenção da Ré aquando da eliminação dos defeitos. Pede que a exceção de caso julgado seja julgada improcedente, por não provada.

A Autora foi novamente notificada para prestar novos esclarecimentos, quanto aos muros e portões do imóvel e quanto às concretas intervenções levadas a cabo pelas Rés, ao que respondeu.

Por despacho de 22/06/2016, considerou-se que as questões carreadas para estes autos foram já objeto de conhecimento na anterior ação judicial, muito embora nem todas tenham ficado provadas, declarou-se verificada a exceção de caso julgado, nos termos dos art. 577.º, alínea i), 278.º, n.º 1, alínea e) e 576.º, n.º 1 e 2, todos do C.P.Civil(1) e condenou-se a Autora no pagamento de 5 UC, a título de taxa sancionatória excecional.

Inconformada com esta decisão, a Autora veio interpor recurso, rematando com as seguintes CONCLUSÕES (que se resumem): I. Na presente ação a Autora pede a condenação das rés a eliminarem os defeitos existentes no seu imóvel identificados no ponto 9, al. a) a al. ppp) da douta sentença proferida.

  1. Por ação declarativa de condenação com processo comum ordinário, que correu os seus termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga, sob o processo nº 4871/07.1TBBRG, a ora autora pediu a condenação das ora rés a eliminarem definitivamente os defeitos de construção existentes no seu imóvel.

  2. Tendo as rés no âmbito desse processo sido condenadas a eliminar os defeitos contidos nos pontos 12, 13, 14, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 49 e 58 da sentença proferida, no prazo de 90 dias, decisão junta aos autos a fls 189 a 252.

  3. Os quais não foram corrigidos pelas rés, encontrando-se a correr execução para prestação de facto, a fim de os mesmos serem eliminados conforme sentença proferida.

  4. Os defeitos carreados aos autos pela autora na presente ação tratam- se de defeitos novos, defeitos que surgiram posteriormente.

  5. Apesar da douta sentença se pronunciar expressamente quanto à eventual coincidência dos defeitos referidos no artigo 22 a 76 do presente articulado, conforme se demonstrou tais defeitos não são coincidentes.

  6. Acresce que, quanto aos defeitos identificados no ponto 9. al. b), g), h), i), n), o), p), s), v), w), x) ,y), z), aa), bb), cc), ee), ff), gg), hh), ii), jj), nn), pp), qq), rr), ss), tt) , yy), zz), aaa), bbb), ccc), ddd), eee), ggg), hhh), a douta sentença proferida não se pronunciou quanto à alegada coincidência com os defeitos alegados na anterior ação.

  7. Pelo que, na eventualidade de considerar procedente a excepção de caso julgado, em virtude de existir uma coincidência com os defeitos já referidos no artigo X, sempre teria de ser parcialmente procedente pois sempre teria de decidir quanto aos defeitos sobre os quais não se pronunciou.

  8. A excepção de caso julgado ocorre quando a causa se repete, pretendendo-se assim evitar que o tribunal seja colocado em alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior, X. Apesar de existir uma relação de dependência entre o objecto das duas apões o certo é que o mesmo não é coincidente.

  9. Aqui estão em causa defeitos novos, defeitos esses que não foram discutidos na ação que correu termos na Vara de competência...

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