Acórdão nº 34/11.0TBMTR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelISABEL SILVA
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Apelação nº 34/11.0TBMTR.G1 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - HISTÓRICO DO PROCESSO 1. O AAintentou ação contra BB., pedindo a sua condenação a: · Reconhecer que ocupa espaço aéreo do autor com a implantação de seis torres destinadas a produção de energia eólica; · Pagar uma indemnização anual ao autor pela ocupação desse espaço, na proporção de 3.740,00 euros por cada torre, para além de juros moratórios; · Pagar uma indemnização ao autor de 10.000,00 Euros, para ressarcimento dos prejuízos sofridos por esta pela não fruição plena dos seus terrenos.

Fundamentou a sua pretensão alegando ter celebrado com CC um contrato de cessão de exploração dos AA, por força do qual o segundo pagaria por cada torre e como contrapartida da ocupação do solo, um valor de 2.500,00 Euros até estar concluído o estudo e licenciamento do parque e o valor de 3.740,00 Euros, a partir daí; em 15.03.2006, tomou conhecimento que o referido CC cedeu a sua posição contratual à Ré, tendo esta iniciado a construção de um parque eólico, com a instalação de seis ventoinhas, sendo que apenas tem vindo a pagar a indemnização relativa a uma das ventoinhas.

Mais alegou que no contrato celebrado com CC, apenas se cedia o direito de servidão para passagem de pessoas, máquinas, linhas elétricas e meios de ligação, já não uma servidão para ocupação do espaço aéreo pelas hélices das torres.

A DD. requereu a sua intervenção principal espontânea, com fundamento que a Ré lhe cedeu a sua posição contratual no contrato debatido nos autos, intervenção essa que veio a ser admitida.

A interveniente deduziu contestação, por exceção e por impugnação.

A Ré manifestou a sua adesão ao requerimento da Interveniente.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que decidiu: «1. Condena-se a interveniente DD. a reconhecer que ocupa o espaço aéreo dos autores AA, com a implantação de 5 (cinco) torres destinadas a produção de energia eólica.

  1. Condena-se a interveniente DD. a pagar aos autores AA uma quantia anual de 3.740,00 Euros por cada uma das cinco torres aerogeradoras que ocupam o espaço aéreo dos seus terrenos, num total anual de 18.700,00 Euros.» 2. Inconformada, vem a Interveniente apelar para este Tribunal da Relação, formulando as seguintes CONCLUSÕES: «1.O contrato de cessão de exploração dos autos tem como objeto a implantação de aerogeradores com a consequente utilização do espaço aéreo que compõem os terrenos AA, não estando legitimada a ocupação do mesmo espaço aéreo, com implantação de aerogeradores, em terrenos vizinhos, via contrato de cessão de exploração relativo aos terrenos dos AA.

  2. No relatório da sentença recorrida, pode ler-se que a Recorrida expressamente pontualizou que, no contrato de cessão de exploração, «apenas se cedia o direito de servidão para passagem de pessoas, máquinas, linhas eléctricas e meios de ligação, já não uma servidão para ocupação do espaço aéreo pelas hélices das torres» (cfr, sentença recorrida).

  3. Não ficou estabelecido, em termos de factos provados, qual a altura dos aerogeradores.

  4. A ocupação de espaço aéreo, a existir, não pode ser tratada no quadro da implantação de aerogeradores, previstos no contrato de cessão de exploração dos autos.

  5. Existe uma destrinça fundamental a fazer operar entre espaço aéreo privado e espaço aéreo público, a qual, apenas poderá resultar do apuramento objetivo da concreta altura dos aerogeradores que se encontram implantados nos EE.

  6. A alegação da matéria de facto sobre tais elementos competia à Recorrida (artigo 342.º n.º 1 do Código Civil).

  7. Faltando tal elemento factual, não poderia o Tribunal a quo ter decidido no sentido de considerar que a ocupação do espaço aéreo, nos AA, existia.

  8. Deveria o Tribunal a quo ter decidido que, na falta da alegação da concreta matéria de facto, o pedido formulado pela Recorrida, quanto à condenação da Recorrente no reconhecimento de que ocupava o espaço aéreo dos AA, relativamente aos aerogeradores nºs 2, 3,5 e 6, era improcedente, por não estar delimitado se a ocupação em causa, abrangia o domínio aéreo privado ou público.

  9. Não poderia o Tribunal a quo, ter entendido que a Recorrente tinha uma obrigação de pagamento, fundada no contrato de cessão de exploração, até porque foi a própria Recorrida que clarificou que, nos termos do mesmo contrato: «apenas se cedia o direito de servidão para passagem de pessoas, máquinas, linhas eléctricas e meios de ligação, já não uma servidão para ocupação do espaço aéreo pelas hélices das torres» (cfr, sentença recorrida).

  10. Não poderia o Tribunal a quo, ter enformado uma prestação debitória, a cargo da Recorrente, com base no aludido contrato de cessão de exploração.

  11. Os princípios da proporcionalidade e do equilíbrio contratual não permitiriam, também, a solução que veio a ser perfilhada pelo Tribunal a quo.

  12. O aerogerador n.º 1 encontra-se implantado nos AA, ocupando, exclusivamente, na totalidade do seu raio de ação, estes Baldios e os outros quatro aerogeradores, não se encontram implantados nesses AA, mas sim, nos EE, ocupando, cada um deles, diferentes percentagens do espaço aéreo dos AA.

  13. Tomando em conta que as torres aerogeradores nºs 2, 3, 5 e 6 estão implantadas nos EE e, não, nos AA, ainda que se configurasse uma ocupação do espaço aéreo destes últimos Baldios, não poderia o valor ser o correspondente ao da implantação de uma torre, como é o caso da torre aerogerador n.º1, a qual ocupa, exclusivamente, na totalidade do seu raio de ação, o Baldio do Sacozelo, até porque a Recorrida pagará, nos EE, um valor por cada torre implantada nos mesmos.

  14. Não poderia, pois, a sentença recorrida ter decidido como decidiu, nomeadamente, que: «a obrigação sobre o autor por força da relação negocial assumida … foi satisfeita, assistindo-lhe, por isso, o direito ao cumprimento por parte do co-contraente da prestação debitória que se fixou como contrapartida da cessão de exploração dos terrenos» (cfr, sentença recorrida).

  15. A contraprestação nunca poderia ser o pagamento de 3.740,00 euros por ocupação percentual de espaço aéreo.

  16. Não poderia, o Tribunal a quo ter-se escudado no teor da cláusula quarta do contrato de cessão de exploração e na interpretação a dar à mesma, à luz do artigo 236.º do Código Civil e, menos ainda, que não foi invocada, pela Recorrida, que tal cláusula não era aplicável às situações das torres aerogeradoras n.ºs 2, 3, 5 e 6, devendo ter sido alegado (e provado), pela Recorrida que a vontade real das partes, quanto a estas torres aerogeradoras, impunha uma redução proporcional do valor contratual fixada, a pagar por cada aerogerador.

  17. A literalidade da cláusula quarta do contrato de cessão de exploração não é apta à interpretação que é feita pelo mesmo Tribunal a quo, quanto às torres aerogeradoras n.ºs 2, 3, 5 e 6, em face da situação da torre aerogeradora n.º 1 e, em face da indemnização paga aos EE, pela implantação daquelas torres.

  18. Nunca a ocupação de percentagens do espaço aéreo dos AA poderia dar lugar a uma contraprestação de 3.740,00 euros, a qual só pode ser entendida, como sendo devida, no âmbito de uma ocupação total do referido espaço aéreo por uma torre e não por percentagens de ocupação de espaço aéreo.

  19. Tal é a única interpretação que pode resultar da leitura e análise do teor da cláusula quarta, à luz do artigo 236.º n.º 1 do Código Civil.

  20. Inexiste uma circunstância modificativa do direito da Recorrida ao cumprimento, por parte da Recorrente, da prestação debitória, pois, no caso das torres aerogeradoras nºs 2, 3, 5 e 6, não está em causa qualquer circunstância modificativa, mas sim, o fazer valer a interpretação da cláusula quarta, à luz do artigo 236.º n.º 1 do Código Civil, nos termos supra referidos.

  21. Não poderia o Tribunal a quo ter condenado a Recorrente no pagamento de 3.740,00 euros anuais, por cada uma das torres aerogeradoras n.ºs 1,2,3, 5 e 6, nos termos em que o fez.

  22. Foi, pois, violada a norma do artigo 236.º do Código Civil, bem como o artigo 342.º do Código Civil, tendo ainda sido violados, na sentença recorrida, os princípios da proporcionalidade e do equilíbrio contratual.» 3. Não houve contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    II - FUNDAMENTAÇÃO 4. OS FACTOS Foram os seguintes os factos considerados em 1ª instância: «1. Todas as terras que vão do Alto do Talefe até ao Alto do Corral do Covelo são terrenos que integram os AA e que têm vindo a ser administrados pela comunidade de Sacozelo, há mais de 30 anos.

  23. Consta da acta n.º 4, de 25 de Março de 2002, da reunião celebrada entre os Presidentes das Juntas de Freguesia de Covelo do Gerês, Lugar de Sacozelo e de Ferral e as “comissões de compartes” de Covelo do Gerês e de Sacozelo que: “… todos juntos acordamos a divisão dos Baldios destas Freguesias: Denominação das divisões: É da Cruz da Estrada, à possa grande, em linha recta pelas Cavadas, até ao marco Geodézico, depois pelas águas vertentes pelo alto fora, até à partilha com Paradela; pelos mesmos ficou acordada esta divisória…”.

  24. Estes terrenos são locais privilegiados para a construção de ventoinhas para aproveitamento de energia eólica.

  25. A 21 de Agosto de 2005, o AA celebrou um acordo com CC, que denominaram de “contrato de cessão de exploração”, onde consta, além do mais, que: “(…) Segunda: Pelo presente contrato o primeiro outorgante...

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