Acórdão nº 61/16.0T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelEUG
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I.

RELATÓRIO Recorrentes: Joaquina e Manuel Recorrida: Maria Maria, residente na Avenida …, em Braga, propôs a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Joaquina e Manuel com residência na Rua …, Fafe, pedindo que: a) se declare e reconheça o direito de propriedade da Autora sobre o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial; b) se condenem os Réus a reconhecer tal direito de propriedade; c) se condenem os Réus a absterem-se da prática de quaisquer atos que atentem conta aquele direito de propriedade da Autora, designadamente os descritos nos artigos 10.º a 20.º, da petição inicial; d) se condenem os Réus a pagar à Autora a quantia de € 5.000, a título de indemnização pelas invasões da propriedade e pelos danos morais, acrescida de juros desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Alega, para tanto e em síntese, ser dona do referido prédio, que adquiriu por partilha subsequente a divórcio, vindo a praticar sobre o mesmo atos de posse suscetíveis de conduzir à sua aquisição por usucapião e encontrando-se o mesmo registado a seu favor na Conservatória do Registo Predial, e que os réus o vêm a invadir, o que lhe acarreta danos patrimoniais e não patrimoniais.

*Devidamente citados, os Réus apresentaram contestação, onde se defendem por exceção, ao invocarem, como facto impeditivo do direito da Autora, o seu direito a entrar no prédio da Autora por o mesmo estar onerado com uma servidão de água, e por impugnação, ao negarem factos alegados por aqueles.

*Foi proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

*Realizou-se a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais.

*Foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência, a: a) Declarar e reconhecer que a Autora é proprietária plena do prédio identificado no ponto A. da factualidade assente, condenando os Réus a reconhecer e respeitar esse direito; b) Condenar os Réus a absterem-se da prática de quaisquer atos que atentem contra o direito referido em a); c) Condenar a Ré Joaquina a pagar à Autora a quantia de € 350 (trezentos e cinquenta euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, acrescida dos juros moratórios vencidos desde a data da presente decisão, à taxa legal em vigor em cada momento, até integral pagamento; d) Absolver os Réus do demais peticionado.

*Os Réus apresentaram recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a sentença recorrida. Formularam as seguintes CONCLUSÕES: 1- Ao contrário do decidido pelo tribunal “ a quo”, ficaram provados factos que concedem aos réus o direito de entrarem no prédios da autora para verificarem a mina, bem como o óculo que faz parte da mesma, além de que ficou sobejamente provado que a autora não sofreu nenhum dano como alega.

2- Ficou também provado que o óculo fica localizado no prédio da Autora e que este é completamente vedado, ao contrário do decidido pelo Tribunal recorrido; 3- Ficou também provada a existência de uma servidão a favor do prédio dos RR. conforme consta do ponto M dos factos provados; 4- Resulta da perícia efectuada nestes autos que o óculo que se encontra na propriedade da autora tem como finalidade o arejamento da mina, e acesso para extração de resíduos provenientes da sua limpeza; 5- E que aquele óculo em concreto é necessário para arejamento e limpeza da mina, para renovação do ar e recolha de resíduos provenientes da natureza.

6- E ficou provado que o conjunto de todos os prédios da autora delimitados por um muro, o único meio para aceder ao óculo é passar pelo prédio urbano da autora.

7- Face aos factos dados como provados impõe-se a alteração da matéria de facto constante do ponto K - Em prédio não concretamente apurado existe um óculo de acesso à mina referida em J.; 8- Deve o ponto K ser alterado constando do mesmo que: “No prédio da Autora existe um óculo de acesso à mina referida em J.”, pois até a Autora confessou tal facto – minuto 02:37; 9- Deve ser dado como NÃO PROVADO – “Há mais de dois anos, a Ré invade o prédio referido em A.”-ponto E.

10- Não estamos aqui perante uma invasão completamente desmotivada, mas sim legitimidade pelo direito de servidão existente; 11- A testemunha Hilário chegou a ir lá várias vezes quando a casa da Ré não tinha água, para verificar se tinha de ser feita alguma coisa, ou arejar – minuto 05:51; 12- Assim, deve ser dado como NÃO PROVADO, o ponto E; 13- Deve ser dado como PROVADO o ponto 8 – Os Réus entram no prédio referido em A. apenas para fazer respirar as minas e proceder à sua limpeza.

14- Deve ser dado como NÃO PROVADO, o ponto F – A Ré já foi encontrada no jardim e no espaço privada da casa.

15- A razão pela qual esta factualidade deve ser alterada prende-se com o facto de não ter sido feita nenhuma prova nesse sentido, e os factos dados como provados quando conjugados imporem coisa diversa.

16- Foi dado como provado que o prédio da A. está vedado – ponto C dos factos provados e pela Autora foi afirmado que o óculo está na parte rústica do seu terreno, fazendo parte da sua quinta, o que desde logo impõe que seja dado como NÃO PROVADO, o PONTO F., pois a Ré atravessa o logradouro da casa da autora, mas na parte rústica, longe da parte privada da casa, para ir ver o óculo, fazendo-o apenas por extrema necessidade quando a água da mina não corre por falta de arejamento da mina.

17- Deve o PONTO 7 dos factos não provados – “O acesso às minas e aos óculos foi efectuado sem oposição de ninguém sempre que era necessário para fazer respirar as minas ou proceder à sua limpeza.

” - ser dado como PROVADO – conforme depoimento da testemunha das testemunhas Hilário (Minuto 05:51) e da testemunha Fátima - Minutos 01:28, 02:30, 06:27, 08:59 e 15:10; 18- Convém ainda referir por ser importante que a apreciação dos depoimentos das testemunhas, pelo tribunal “ a quo” não teve em consideração o facto de a testemunha José, ser anterior proprietário e ex-marido da Autora, tendo um claro interessa na causa.

19- Além disso, e é do conhecimento do Tribunal “ a quo” da existência de vários processos crimes entre esta testemunha e a Ré mulher, tendo aquele agredido violentamente a mesmo, e tendo sido condenado por sentença pela pratica do crime de ofensas à integridade física.

20- E esta referência é aqui feita porque considerou o tribunal “ a quo” que o depoimento desta testemunha foi isento, quando não o poderia ter considerado, atentas as circunstâncias envolventes destes autos e dos vários processos-crime; 21- Como foi dito pelos RR. em sede de contestação estamos perante “uma servidão legal de aqueduto e passando este a ser subterrâneo, em vez de por rego aberto a superfície, o proprietário do prédio dominante tem a faculdade de aceder ao prédio serviente para inspecionar o aqueduto através de óculos de observação ou caixas de visita, ou para nele fazer limpeza em caso de entupimento, por tais actos se inserirem nos “adminicula servitutis”.

22- Sendo que tais actos de administração são definidos no Acórdão datado de 23.04.2013, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, “Os adminicula servitutis são poderes ou faculdades acessórias da servidão, mas não são servidões acessórias, designadamente é adminiculum necessário, na servidão de passagem, o ingresso livre no prédio serviente, mesmo quando este seja vedado”.

23- Os RR. têm uma servidão de água beneficiando do direito de entrada e passagem pelo prédio da Autora para inspecção e conservação dos poços e minas de onde a mesma provém.

24- Alterando-se a matéria de facto, estão preenchidos os requisitos da existência de uma servidão de água a favor dos RR, tendo estes o direito de aceder ao terreno da Autora quando necessário.

25- Os adminicula servitutis são poderes ou faculdades acessórias da servidão, mas não são servidões acessórias, designadamente é adminiculum necessário, na servidão de passagem, o ingresso livre no prédio serviente, mesmo quando este seja vedado.

26- “O direito de servidão predial é um direito real de gozo sobre coisa alheia, mediante o qual o proprietário de um prédio tem a faculdade de se aproveitar de utilidades de prédio alheio em benefício do aproveitamento das do primeiro”16 In Luís A. Carvalho Fernandes, “Lições de Direitos Reais”, 6.ª ed., Quid Juris, 2009, p. 457.

27- Como afirma Tavarela Lobo, “… a finalidade da servidão é, de facto, servir os fins ou destino económico do prédio dominante, pelo que, visando uma utilidade específica, um escopo determinado, a servidão deverá compreender, no seu conteúdo e extensão, tudo o que é necessário a tal escopo”18 In “Mudança e Alteração de Servidão”, Coimbra Editora, 1984, p. 26.

28- A indemnização peticionada pela Autora por todo exposto não lhe é devida pois não existiu nenhum comportamento ilícito por parte da Ré, ao invés existe a servidão a favor dos RR., permite que estes se desloquem ao terreno da Autora, conforme escritura publica junta aos autos; 29- Por todo o exposto, alterando-se a matéria de facto dada como provada, impõe-se a revogação da douta sentença proferida, por outra que julgue a acção totalmente improcedente.

30- A sentença proferida violou entre outras normas, a constante do artigo 496º, 610º al. a), 1344º, 1390º, 1543º, 1561º e 1556º do C.C.

*Foram oferecidas contra-alegações pela Autora, onde sustenta ser de manter a sentença recorrida. Formula as seguintes CONCLUSÕES: I - A douta sentença recorrida encontra-se brilhantemente elaborada e fundamentada, pelo que não é merecedora de qualquer reparo ou censura, pois nela se fez correcta aplicação do direito aos factos provados; II – Independentemente de não assistir o mínimo de razão à recorrente, como está assente nos autos, nunca este venerando tribunal – tribunal de segunda instância - poderá conhecer do recurso, quanto à impugnação da factualidade assente, por a recorrente não ter cumprido o disposto no artigo 640 do CPC; III - Na verdade, ao pôr...

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