Acórdão nº 127/13.9TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

FACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

  1. RELATÓRIO I.- A “Petróleos P., S. A.”, sociedade com sede na Rua …, em Lisboa intentou a presente acção ordinária contra: 1 - “M. V., Herdeiros Lda”; 2 - Maria; 3 - V. V. (a A. desistiu do pedido quanto a este, e a desistência foi homologada por sentença que transitou em julgado); 4 - F. V.; 5 - M. C.; 6 - R. A.; 7 - R. O.; e 8 - “Pichelaria Lda.”, Pedindo a condenação solidária dos Réus no pagamento a si, Autora, da quantia € 87.689,07, referente aos valores em dívida constantes das facturas e notas de débito que junta, deduzido do valor das notas de crédito, que também junta, e que a 1.ª Ré tem direito a receber de si, Autora, quantia que deverá ser acrescida de juros comerciais à taxa supletiva desde a data do vencimento de cada uma das facturas e notas de débito, até efectiva liquidação, tendo em conta que os créditos da 1.ª Ré, já compensados, ascendem, na data da propositura da acção, ao valor de € 3.024,48.

    Fundamentou o seu pedido, alegando, em síntese, que a dívida da 1.ª Ré, no valor do capital peticionado, resulta dos fornecimentos de combustível que lhe efectuou entre 18 e 29 de Junho de 2012 (€ 87.264,20), incluindo ainda taxas de exploração respeitantes a Abril e Maio, no valor de € 3.003,19; na participação no programa fast Empresa de Energia de Maio e Junho de 2012 no valor de € 453,02; na promoção dos 3ºs Domingo e happy days, no valor de € 799,54, e na promoção M/C no valor de € 920,77.

    Fundamenta o pedido quanto aos demais Réus na fiança prestada no contrato, directamente pela 2.ª Ré Maria e pela 8.ª Ré, actual “Pichelaria, Ld.ª”, pelo cumprimento das obrigações da 1ª Ré para com a Autora, e quanto aos demais e ainda àquela 2.ª Ré, na sua qualidade de herdeiros de G. V., também ele fiador das obrigações do contrato, falecido em 29 de Maio de 1992, tendo tais Réus aceitado a herança que foi entre todos partilhada.

    A “Sociedade Central de Combustíveis e Óleos Ldª” alterou a sua denominação social para “S.”, tendo sido incorporada por fusão no património da 8.ª Ré “Pichelaria Ldª”.

    Todos os Réus contestaram por excepção, invocando a nulidade da fiança, e contestaram ainda por impugnação.

    A 1.ª Ré deduziu reconvenção, pedindo que a Autora seja condenada a pagar-lhe: - a quantia de 218.730,08 euros a título de indemnização por perda de clientela e por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa comercial até integral pagamento sobre a diferença deste montante e do que vier a apurar-se ser devido à Autora mercê dos fornecimentos invocados dos autos.

    A Ré/Reconvinte funda o pedido reconvencional invocando o direito à indemnização de clientela e o abuso de direito na denúncia do contrato.

    Houve réplica e tréplica e os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que: - julgou provada a acção quanto à 1.ª Ré, “M. V., Herdeiros Ldª”, condenando-a a pagar à Autora a quantia de € 87.689,07, acrescida dos juros de mora vencidos, no montante de € 3.024,48, e dos juros vincendos à taxa supletiva aplicável às operações comerciais, até integral pagamento; - julgou improcedente a acção, por não provada, quanto aos demais Réus, absolvendo-os do pedido contra eles formulado pela Autora; - julgou a reconvenção improcedente, por não provada, e absolveu a Autora/Reconvinda do pedido formulado pela 1.ª Ré/Reconvinte.

    1. Inconformada, a A. “Petróleos de Portugal, S.A.” impugna a decisão, pedindo a condenação solidária dos Réus: a 2.ª Ré, Maria, a pagar-lhe a totalidade da dívida, em que foi condenada a 1.ª Ré; e os 4.º a 7.º Réus a pagarem-lhe a referida importância, dentro dos limites do valor dos bem que cada um herdou do primitivo fiador G. V..

      Contra-alegaram estes Réus propugnando pela recusa de provimento ao recurso, defendendo a decisão.

    2. Também a Ré/Reconvinte “M. V., Herdeiros, Ld.ª” se não conformou com a decisão e pretende que, reapreciada a decisão da matéria de facto, seja revogado o que foi decidido, julgando-se procedente a reconvenção que deduziu.

      Contra-alegou a Autora/Reconvinda propugnando pela recusa de provimento ao recurso e, subsidiariamente, pedindo a alteração dos valores constantes do ponto 7º dos “factos provados”.

      Ambos os recursos foram recebidos como de apelação, com efeito meramente devolutivo.

      Foram colhidos os vistos legais.

      Cumpre apreciar e decidir.

      **II.- A Apelante Autora “Petróleos de Portugal, S.A.

      ” funda o seu recurso nas seguintes conclusões: 1. O carácter pessoal da garantia da fiança, a que alude o artigo 627º. nº 1 do Código Civil, traduz-se apenas em que o fiador assegura com o seu património a satisfação do direito do credor e não que a obrigação não possa ser transmitida.

      1. Todas as relações jurídicas ou todas as coisas não exceptuadas por lei, nomeadamente os bens penhoráveis e outros direitos pessoais e do lado passivo das relações jurídicas, as obrigações e as dívidas podem ser objecto de transmissão sucessória.

      2. O fiador, ao prestar, sem restrição, a fiança presume-se que quer garantir a obrigação principal enquanto esta subsistir, podendo o credor ser prejudicado, porventura gravemente, com o facto de os herdeiros não responderem pelas obrigações contraídas pelo devedor afiançado, depois da morte do fiador.

      3. Por tudo isto, toda a jurisprudência dos nossos tribunais superiores vem a decidir que a fiança é transmissível aos sucessores dos fiadores, por a mesma ter conteúdo patrimonial, ainda que as obrigações sejam contraídas, após a morte do fiador originário.

      4. Face à certidão de fls. 43 a 60, quanto à matéria do artº 3º dos factos assentes em julgamento, deveria, ter sido dado como provado que “a 2ª Ré, Maria, recebeu, pela sua parte na herança do falecido G. V., Esc. 2.789.919$60, hoje equivalente a € 13.916,06 e cada um dos restantes herdeiros, filhos deste (os 3º a 7º Réus), Esc. 1.673.951$70, hoje equivalente a € 8.349, 64.” 6. Nestes termos, deveria a sentença recorrida ter aceite a transmissão, por via sucessória, das obrigações da fiança contraída pelo primitivo fiador, G. V. para os seus sucessores, os 2º e 4º a 7º Réus, responsabilizando-os, solidariamente, pelo pagamento da dívida em que foi condenada a 1ª Ré, M. V., Lda., dentro dos limites dos valores e bens herdados por cada um e condenando-os nos correspondentes termos.

      5. Não estavam em causa, na relação estabelecida entre a Autora e a 1ª Ré, como se pretende na sentença recorrida, “um conjunto de iniciativas empresariais ou uma relação complexa de negócios”, que pudessem provocar desenvolvimentos indetermináveis quando da celebração do contrato, mas a simples exploração de um posto de abastecimento de combustíveis que tinha como objecto fundamental a venda desses combustíveis, em que as obrigações da 1ª Ré para com a Autora passavam, essencialmente, pelo pagamento do valor dos combustíveis que esta lhe fornecia e que aquela, em princípio, recebera já antecipadamente dos clientes finais e, secundariamente (por implicar valores muito inferiores), pelo pagamento de uma remuneração, mais tarde apelidada de taxa de exploração.

      6. Pelo que, embora o objecto da fiança prestada não estivesse totalmente determinado, no contrato em causa nos presentes autos, o certo é que era perfeitamente determinável, pelo conhecimento que os fiadores tinham do negócio, quando assumiram a fiança e do que poderiam ser as obrigações da 1ª Ré afiançada para com a Autora, previstas naquele contrato.

      7. A jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores repetidamente vem a pronunciar-se, no sentido de que o objecto da fiança se encontra suficientemente determinável, quando a mesma, como é o caso dos presentes autos, se reporta às obrigações emergentes de um contrato concreto para o qual remete.

      8. Tanto mais, no caso presente, quanto é certo que o primitivo fiador, G. V., era sócio gerente da 1ª Ré afiançada, como tal outorgou no contrato de incumbência de exploração em causa nos presentes autos e, nesses termos, poderia controlar e conhecer toda a actividade da 1ª Ré afiançada e os limites das suas obrigações para com a SC, primeiro e a Autora, a partir do momento em que esta sucedeu àquela.

      9. E que a sua mulher Maria, precisamente por ser sua mulher, pelo menos através do marido, teve ou poderia ter naturalmente acesso a toda a realidade da situação da empresa afiançada e dos valores das suas obrigações para com a Autora, que afiançou.

      10. Sendo certo que, como resulta da certidão junta à p.i. sob o doc. nº 3, a fls. 46 e 47, esta última era casada com o G. V., no regime da comunhão geral de bens e, nesses termos, em vida deste, era contitular da quota que aquele detinha na sociedade afiançada.

      11. E, depois da morte daquele seu marido, em 1992, passou a ter maiores condições de acesso àquela realidade, na medida em que foi sócia e gerente da 1ª Ré afiançada, pelo menos, até 27.04.2007, data em que renunciou à gerência, embora continuando sócia.

      12. A perda da qualidade de sócio ou gerente, por parte do fiador, não determina a caducidade da fiança prestada, desde que a sua subsistência não se mostre (como é o caso dos presentes autos) condicionada à manutenção de qualquer daquelas qualidades.

      13. Sendo a fiança prestada também no interesse do credor, não é apenas a posição do fiador que merece a tutela do direito: antes a obrigação da fiança dura, por regra, até que as obrigações garantidas pelo fiador sejam cumpridas.

      14. Não foi a qualidade de sócio gerente do G. V. que determinou a duração da fiança, relativamente ao mesmo e à sua mulher Maria, uma vez que nada foi acordado neste sentido, designadamente no contrato em que a mesma foi prestada.

      15. A Ré Maria, para além de ser responsável, solidariamente, com o seu marido e a 1ª Ré, pelo cumprimento das obrigações assumidas por esta, no contrato de incumbência de exploração junto aos autos, em vida daquele e na constância do matrimónio, continuou a sê-lo, depois da morte dele.

      16. Deveria assim esta Ré ter sido condenada, solidariamente...

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