Acórdão nº 4200/07.4TBGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães 1. Relatório 1.1.

Por apenso aos autos de execução que o exequente J. S. move à executada M. S., o requerente M. M. deduziu o incidente de uso anormal do processo, ao abrigo do disposto no artigo 612º do Código de Processo Civil (CPC), pedindo que seja extinta a execução.

Alega, em síntese, que é irmão do exequente e filho da executada (sendo esta também mãe do exequente) e que a execução tem por base uma confissão de dívida simulada, visando prejudicar os outros filhos da executada.

*1.2. Por despacho datado de 6/07/2016, o Mm.º juiz a quo concluiu que «a sanção do uso anormal do processo tem aplicação à acção declarativa (a decisão a proferir deve obstar ao objectivo anormal prosseguido pelas partes), mas não à acção executiva porque a execução não procura decidir», pelo que verificando-se a excepção dilatória inominada de uso indevido de incidente, insuprível, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 576º, nº 2 e 578º do CPC, decidiu absolver os requeridos da instância (cfr. fls. 20 a 22).

*1.3. Inconformado com a decisão dela recorre o requerente M. M. (cfr. fls. 25 a 30), pedindo que se revogue a sentença recorrida, substituindo-a por outra, que considere a actuação do exequente e da executada como integrando a figura do uso anormal do processo, extinguindo-se desse modo a presente execução e, consequentemente, que se impeça ou anule a venda judicial do imóvel penhorado à executada ou a sua adjudicação ao exequente, caso a mesma já se tenha realizado à data da prolação do Acórdão que recair sobre o presente recurso.

Ou, caso assim não se entenda, pugna, pelo menos, pela revogação da sentença recorrida, determinando que o Tribunal "a quo" conheça do incidente de "uso anormal do processo", ainda que para tal seja necessária a produção de prova.

A terminar as respectivas alegações formulou as seguintes conclusões: «1. A execução constante dos autos principais do qual este é apenso, tem na sua base um título executivo simulado, fazendo crer que o exequente (e irmão do aqui Recorrente/Requerente) é credor dos seus pais, com o único objectivo de prejudicar os herdeiros daqueles.

  1. Tal facto está devidamente comprovado através da certidão, já junta aos autos, da homologação da partilha extrajudicial, bem como da cópia da acta de conferência de interessados, a qual se realizou tendo em vista a aceitação do passivo, que não incluía qualquer divida do aqui exequente/requerido.

  2. Tais factos demonstram que o presente processo executivo faz parte de um plano engenhoso, que não passa de um embuste levado a cabo pelo exequente e executada, que tem como único objectivo prejudicar o Recorrente, bem assim os demais irmãos deste, tentando deste modo arrebatar o património adjudicado à executado no âmbito do processo inventário por óbito de Dionísio Salgado, pai do exequente, do Recorrente e demais 4 irmãos e marido da executada.

  3. O património da executada é constituído pelo prédio penhorado na presente execução (lote 3), composto de pavilhão industrial e prédio designado por lote 5 que é precisamente a sua habitação, tendo este último sido dado em hipoteca pelo aqui exequente, o qual munido de poderes especiais, constituiu a referida hipoteca para garantia do crédito concedido pelo ainda "BANCO B" ao exequente e sua esposa (Cfr. docA junto com o incidente).

  4. A tudo isto acresce o facto da aqui executada (cabeça de casal no processo de inventário supra mencionado) ter sido patrocinada pelo Ilustre Causídico M. C., que ao mesmo tempo (e até final do ano 2009, altura em que renunciou à procuração), patrocinava o exequente, aqui requerido, contra a sua mãe (executada), no âmbito da presente acção executiva.

  5. Para tal usou título executivo, composto de confissão de dívida, também por si reconhecido e autenticado, apesar da executada não saber ler.

  6. O que confirma de modo cabal a fraude que é a presente acção executiva e, consequentemente, a sua utilização anormal.

  7. Como se deixou, a execução em causa, tem como único e exclusivo objectivo prejudicar os restantes herdeiros da executada em posterior partilha, uma vez que fruto da idade se torna cada vez mais evidente o decesso da executada.

  8. Entendeu ainda o Tribunal " a quo", de forma errónea no nosso modesto entendimento, que o incidente (do uso anormal do processo) a que este deitou mão não tem aplicação na acção executiva.

  9. Parece-nos, salvo o devido respeito que nos merece opinião contrário, que esta posição ofende os mais elementares princípios de justiça material, podendo, caso tenha vencimento a tese sufragada na sentença recorrida, ocorrerem situações de difícil reparação patrimonial, fruto de execuções simuladas com o objectivo de prejudicar terceiros, quer sejam terceiros credores, quer terceiros com interesses legítimos e dignos de tutela.

  10. Também o principio da economia processual obrigaria à aplicabilidade deste incidente à acção executiva.

  11. Barrar o uso deste incidente no processo executivo, permite que o uso de acordos simulatórios entre executado e exequente com o intuito de prejudicar terceiros, fiquem sem controlo e campeie a arbitrariedade ou se nos é permitida a expressão, a "artistice".

  12. Em sentido oposto ao da decisão recorrida já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão datado de 24-09-2002, disponível em http://www.pgdlisboa.pt/jurel/stj_mostra_doc.php?nid=12831&codarea=1, lá referindo expressamente que "se for levado ao conhecimento do tribunal ou este se aperceber que entre exequente e executado se estabeleceu um conluio, maxime em prejuízo de terceiros, deve o mesmo, à sombra do disposto no art. o 665 [actual 612.°] do CPC, obstar a que dele possa resultar qualquer efeito ¬actuação a tomar no processo onde se verifique tal situação "[parênteses e sublinhado nosso].

  13. Aquele Alto Tribunal no mencionado Acórdão não circunscreveu a aplicação da figura do "uso anormal do processo" somente ao processo declarativo, permitindo que a mesma seja também aplicada à acção executiva.

  14. Devia pois o Tribunal "a quo" conhecer do conluio existente entre exequente e executada, conluio esse levado a cabo com o único objectivo de prejudicar os herdeiros desta última e também irmãos do exequente.

  15. Consegue perceber-se, que a decisão a proferir no presente incidente quanto à extinção da execução obrigasse a contraditório e à produção de prova, nomeadamente testemunhal, não se compreendendo contudo a verificação da excepção dilatória, que levou à absolvição dos requeridos.

  16. Tal decisão...

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