Acórdão nº 85/12.7TBFLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DA PURIFICA
Data da Resolução15 de Outubro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães RELATÓRIO: J.. intentou a presente acção declarativa com processo sumário contra a .. Companhia de Seguros SPA pedindo que o tribunal condene a ré a pagar a quantia de € 20.730,47, acrescida de juros vincendos à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

A fundamentar este pedido alegou que acordou com a ré um contrato de seguro que, entre outras coisas, previa o pagamento de uma determinada quantia em caso de furto na casa do autor.

Acontece que a casa do autor foi furtada tendo desaparecido bens, que figuravam como parte do recheio da habitação, no valor de € 23.295,00. Uma vez que o valor do seguro para os casos de furto, era de € 61.999,56 o autor tem direito a receber a quantia relativa aos bens furtados com um limite correspondente a 30% do valor global do seguro.

Citada a ré contestou dizendo em síntese que no que concerne ao contrato em causa estava em vigor uma proposta de seguro, que junta aos autos, que previa como valor máximo para os furtos € 5000,00, com as devidas actualizações Seguindo este argumento da ré, o autor tem direito a receber a quantia de € 5006,10, aplicando-se a regra proporcional prevista no artigo 14º, n.º 1 das condições gerais da apólice de seguro.

O segundo argumento é o de que, ainda que se considere que o valor global do seguro em causa é de € 61.999,56, sempre o autor apenas teria direito a receber a quantia de € 6998,50. Isto porque se deve aplicar ao caso concreto a norma prevista no artigo 13º, ponto 1.3 das condições gerais, que impõe que em caso de furto o tomador tem apenas direito a receber 30% do valor dos bens furtados.

Foi proferido despacho saneador- que declarou a instância totalmente regular, estado em que se mantêm – organizada matéria factual com interesse para a decisão da causa, instruído processo e realizada a audiência.

O Tribunal proferiu decisão sobre a matéria de facto sem reclamações.

No final foi proferida a seguinte decisão "Em face de todo o exposto, o Tribunal julga a presente acção parcialmente procedente e, consequentemente: a) Condena a Ré a pagar ao autor a quantia de € 18.559,87 (dezoito mil quinhentos e cinquenta e nove euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, vencidos desde a citação e vincendos, à taxa legal de juros civis, nos termos peticionados; e b) Absolve a Ré dos restantes pedidos formulados.

  1. Custas pelo Autor e pela Ré, na proporção do decaimento, que se fixa em 10% para o Autor e 90% para a Ré.

Registe e notifique".

Inconformada a ré veio interpor recurso da sentença no qual apresenta as seguintes conclusões: I) A parte do contrato de seguro aqui em apreço, a das respectivas condições particulares, não poderá considerar-se sujeita ao regime das cláusulas contratuais gerais, não tendo resultado de um mero contrato de adesão, estando, pois, como esteve, na livre disponibilidade das partes, não só quanto à sua celebração, como também no que se refere ao seu clausulado, de acordo com o princípio da liberdade contratual. Ao assim considerar, o tribunal recorrido fez, desde logo, uma errada aplicação do previsto naquele citado diploma legal, designadamente, do preceituado no art.º 11º nº 2 do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, que norteou toda a interpretação por parte do tribunal a quo do contrato de seguro objecto dos autos.

II) A apólice de seguro em apreço era titulada pelas respectivas condições gerais, especiais e particulares e pela respectiva proposta de seguro tendo por objecto seguro o edifício e o respectivo conteúdo ou recheio, sendo que este conteúdo incluía o conteúdo genérico e o conteúdo especial.

III) Nas «condições particulares» da apólice em apreço previu-se, para garantia dos conteúdos (genérico e especial) o capital seguro de € 60.000,00, sendo que na «proposta de seguro» que levou à emissão da mesma apólice, o apelado indicou, para garantia do conteúdo genérico o capital seguro de € 55.000,00, e para garantia do conteúdo especial, o capital seguro de € 5.000,00 (actualizado para € 5.166,63), proposta que foi aceite pela apelante e que deu origem ao contrato em apreço.

IV) O valor dos bens seguros (valor em risco) pelo conteúdo especial era o de € 23.295,00, e o valor do capital seguro (valor seguro) para os mesmos bens era o de € 5.166,63, pelo que, aquele valor era, pois, muito superior a este último.

  1. Impõe-se, como tal, a aplicação aqui da regra proporcional prevista no artº 14º/1 das «condições gerais» da apólice de seguro e no artº 134º do RJCS.

    VI) Com a aplicação desta regra a indemnização a pagar pela apelante ao apelado pela cobertura do conteúdo especial em causa é, portanto, a de € 5.006,10 e não o montante a que foi aquela condenada a pagar ao apelado.

    VII) O contrato de seguro em apreço é um seguro de danos e de coisas, pelo que, em face do disposto nos artºs 123º e seguintes do RJCS, o valor total do conteúdo seguro a que se refere o primeiro parágrafo do citado ponto 1.3. do artº 13º das «condições gerais» da apólice é o valor em risco, ou seja, é o valor dos bens seguros à data do sinistro.

    VIII) Compete ao tomador do seguro indicar o capital seguro (cf. artº 13º das «condições gerais») no caso do conteúdo especial e porque aquela obrigação, em relação a ele, não foi cumprida, esse prejuízo fica limitado a 30% do seu valor, sendo esta a interpretação a dar ao citado artº 13º/1.3 das «condições gerais» da apólice.

    IX) Os bens descritos no ponto 9 da matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido da petição integravam o conteúdo especial coberto pela apólice em apreço, sendo que o valor deles ascendia a € 23.295,00, como tal, por força do citado ponto 1.3. do artº 13º das «condições gerais» da apólice, o limite de indemnização a receber pelo autor não poderá, pois, exceder os € 6.988,50 (€ 23.295,00 x 30%), valor que, na hipótese aqui em apreço, deverá ser, no máximo, atribuído ao apelado.

  2. Por tudo o exposto, fez o tribunal a quo uma errada aplicação do disposto nas condições gerais e particulares do contrato de seguro em causa, bem como dos artigos artº 128º, 130º, 131º e 134º, todos do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (RJCS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril, devendo, pelos motivos expostos, ser a sua decisão alterada conforme atrás concluído.

    TERMOS EM QUE o presente recurso deverá ser julgado procedente, alterando-se a sentença recorrida conforme atrás concluído, com o que se fará O autor contra alegou apresentando recurso subordinado com as seguintes conclusões 1ª - A douta sentença de fls. , não se pronunciou sobre questões que devesse apreciar, pelo que enferma da nulidade da alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPC.

    1. – A douta sentença recorrida ( na parte decisória) não se pronunciou sobre o valor relativo à perda dos objetos de conteúdo genérico apurados no ponto 11 da fundamentação de facto da sentença e que são indemnizáveis no contexto dos valores correspondente aos restantes 70% do capital seguro, ou seja, do conteúdo genérico.

    2. - Somando os diversos valores apurados nos pontos 11 e 12 da fundamentação de facto, verifica-se que o valor dos bens do conteúdo genérico é de 1.614,00€, valor que corresponde ao apurado pela ré, acrescido de 150,00€ do PC e-escolas.

    3. - Por outro lado, a sentença contem outra omissão, pois não decide sobre a indemnização relativa aos danos no edifício seguro, apesar de no ponto 13 da fundamentação de facto ter ficado apurado que, em consequência do furto, o edifício sofreu danos na portada da janela da cozinha, no montante de 516,00€.

    4. - Esta verba relativa à portada da janela da cozinha está coberta pelo capital de 250,000,00€ de cobertura do edifício.

    5. - Se não tivessem ocorrido estas omissões na sentença recorrida, o total da indemnização arbitrada ao autor seria de 20.729,87€, a saber: d) 18.559,87€ pela perda de objectos do conteúdo especial ( ouro); e) 1.614,00€ pela perda dos objectos do conteúdo genérico; f) 516,00€ pelos danos causados no edifício ( portada da janela da cozinha).

    6. – Devem suprir-se a invocada nulidade e corrigir-se a sentença no sentido da apelada companhia de seguros ser condenada, para além da indemnização de 18.5559,87€ já arbitrada, a pagar ao apelante a quantia de 1.614,00€ a titulo de indemnização pela perda do objectos do conteúdo genérico e a quantia de 516,00€ pelos danos causados na portada da janela do edifício seguro.

    TERMOS EM QUE o presente recurso deverá ser julgado procedente, alterando-se a sentença recorrida conforme o alegado na conclusão 7ª, condenando-se a apelada na totalidade das custas, com o que se fará JUSTIÇA! A ré contra alegou pugnado pela improcedência do recurso subordinado.

    Determinada a baixa dos autos para se dar cumprimento ao disposto no artº 670º do CPC quanto à nulidade invocada foi mantida a decisão proferida.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    Versando o recurso unicamente sobre matéria de Direito --- as parte não põem em causa a matéria de facto dada como provada ou não provada pelo tribunal a quo e considerada na sentença recorrida --- este tribunal tê-la-á como assente.

    O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações.

    Assim, as questões a decidir traduzem-se em saber se: . o contrato celebrado entre A. e R. configura ou não um contrato de adesão . interpretação de clausulas do contrato . a sentença é nula por omissão de pronúncia FUNDAMENTAÇÃO De facto Factos considerados provados na decisão recorrida 1- O autor é dono do prédio urbano composto de casa de cave, rés-do-chão e andar, sito na Rua .., Felgueiras, inscrito na matriz predial urbana sob o número...

    2- O autor vive em permanência na casa referida em 1.

    3- O autor pagou o prémio de seguro relativo ao contrato descrito infra, em 23 de Julho de 2009.

    4- O contrato de seguro descrito infra foi celebrado pelo prazo de um ano e seguintes e teve o seu início em 31.07.2009.

    5- O texto do contrato de seguro não foi sujeito a qualquer alteração posterior e mantêm-se actualmente em...

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