Acórdão nº 288/09.1TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução12 de Setembro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO A… instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra B…, S.A. e C…, S.A., pedindo que as rés sejam: a) declaradas responsáveis pela anulação da apólice do seguro multiriscos n.º 000000000 da D…, S.A.; b) condenadas, solidariamente, a pagar ao autor a quantia de € 24.000, acrescida de IVA, para proceder à reparação dos danos identificados nos artigos 5.º a 7.º da p.i., bem como os que se vierem a liquidar em execução de sentença; c) condenadas, solidariamente, a pagar ao autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 2.500,00.

Para tanto, alegou, em resumo, que: - é dono de um prédio urbano, tendo celebrado com a D…, S.A. um contrato de seguro multirisco habitação, sendo o pagamento dos prémios emergentes desse contrato, de periodicidade anual, efectuado por débito na conta de depósitos à ordem titulada pelo autor na 1.ª ré, que, depois, procedia à entrega do valor do prémio de seguro à 2.ª ré para esta, por sua vez, efectuar o pagamento do prémio à D….

- na noite de 4 para 5 de Fevereiro de 2009, ocorreu um sinistro na casa do autor, que consistiu na ruptura de um tubo na cozinha, que provocou inundações no 1.º piso e no rés-do-chão, o que provocou danos em diversos locais, importando a sua reparação em € 24.000 (s/ IVA).

- o autor participou a ocorrência do sinistro à dita D…, que se escusou, no entanto, a assumir a responsabilidade do pagamento do custo da reparação no prédio do autor, já que em virtude do não pagamento do prémio de seguro, havia procedido à anulação da apólice nº 000000000, com efeitos desde o dia 02.01.2009.

- a 1.ª ré, em 13.01.2009, retirou da sua conta à ordem a quantia de € 637,99 para pagar o prémio de seguro, quantia essa que, depois, entregou à 2.ª ré, para que pagasse aquele prémio de seguro à D…, S.A., o que aquela não fez.

As rés contestaram, apresentando cada uma o seu articulado.

Alegaram, no essencial, que ao contratar o referido seguro, o autor subscreveu junto da seguradora uma autorização para débito em conta de todos os prémios de seguro que fossem devidos por força daquele contrato, consentindo que tais débitos fossem efectuados na conta de que era titular junto da 1.ª ré, sendo essa cobrança levada a cabo pelo sistema de débitos directos.

Sucedeu que na data do vencimento do primeiro prémio do seguro, ocorrido em 02.01.2009, o prémio não foi pago pela circunstância de a conta do autor não ter saldo suficiente para o efeito, razão pela qual a 1.ª ré foi interpelada pela D…, por carta de 12.01.2009, no cumprimento do estabelecido no contrato, para se substituir ao autor, querendo, no pagamento do prémio de seguro.

Porque não pretendia que o seguro fosse definitivamente anulado, a 1.ª ré procedeu então ao débito a descoberto em 13.01.2009, na conta do autor, do valor do prémio em dívida no montante de € 637,99 e fez a entrega, em numerário, à 2.ª ré, sociedade que trata destes procedimentos junto de outras seguradoras em seu nome, do montante em causa para que esta contactasse a Global no sentido de pagar o prémio em dívida.

Porém, tendo a 1.ª ré constatado que o autor a informara, por carta de 23.12.2008 que iria proceder à transferência do seu crédito à habitação para uma outra instituição de crédito, o que efectivamente veio a suceder, pelo que colocada na situação de liquidar no prazo de oito dias o prémio em dívida, ou seja até 21.01.2009 e indo consumar-se, como consumou, a transferência para o Deutsche Bank do crédito que justificava o seguro, logo a 1.ª ré se desinteressou por completo em efectuar tal pagamento, tendo procedido ao estorno, na conta do autor, do montante debitado para tal efeito, com data-valor de 13.01.2009 para que nenhuns encargos ou despesas fossem imputados a este por utilização da conta a descoberto.

Na sua contestação a 2.ª ré acrescenta ainda que não celebrou qualquer contrato com o autor, pelo que não violou nem poderia ter violado nenhum dever ou obrigação contratual de pagamento de qualquer prémio de seguro.

Terminam as rés pedindo que a acção seja julgada improcedente, com a sua consequente absolvição do pedido.

Houve réplica, concluindo o autor como na petição inicial.

Dispensada a audiência preliminar, proferiu-se despacho saneador tabelar e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à organização da base instrutória.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, sendo a matéria de facto decidida nos termos do despacho de fls. 286 a 390, sem reclamações.

Por fim, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e a absolver as rés do pedido.

Inconformado com o decidido, recorreu o autor para esta Relação, encerrando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: «1- Atenta a fundamentação da sentença apelada constatamos que o tribunal “a quo” não ponderou toda a factualidade dada por provada, concentrando antes toda a sua atenção no facto de o A., na data em que deveria ser efectuado o débito directo, não ter a sua conta provisionada com o montante necessário ao pagamento do prémio de seguro, olvidando-se, desde logo, de que no âmbito do sistema bancário existe a figura comummente designada de descoberto em conta.

2- Ora, o descoberto em conta traduz-se na concessão de crédito bancário, com ou sem acordo prévio, e consiste na operação pela qual o banco consente que o seu cliente saque para além do saldo existente na conta de que é titular, até um certo limite e por determinado prazo, sendo o seu reembolso exigível a todo o tempo - Acórdão da Relação do Porto, de 16.3.1998, CJ, Tomo II, pág. 206.

3- Trata-se, portanto, de uma medida excepcional, de crédito de curto prazo para acudir a necessidades momentâneas e imprevistas de clientes de confiança, e sem necessidade de instruções escritas.

4- Ora, na situação em análise é indubitável que o A., na data em que entrava o débito directo, não dispunha na sua conta de fundos necessários ao desconto para o pagamento do prémio de seguro. Porém, também está provado que, em 13 de Janeiro a 1.ª Ré debitou, a “descoberto”, na conta titulada pelo A. a quantia de €637,99 com vista ao pagamento da apólice de seguro multiriscos, quantia essa entregue à 2.ª Ré para proceder em conformidade – cfr. als. f), o) e p) dos factos provados.

5- Ora, esta situação consubstancia um comportamento social típico nas relações bancárias revelador da vontade de que a 1.ª Ré adiantasse os meios para cobrir o valor de tal débito directo, o que esta aceitou, adiantando fundos seus com os quais pretendeu efectuar o respectivo pagamento; 6- Sendo certo que, posteriormente a isso, mormente em 10 de Fevereiro de 2009, a 1.ª Ré ainda deu a conhecer ao A. que movimentou a débito da sua conta o valor de €637,99, precisamente, para pagamento do prémio de seguro, tendo, inclusive, cobrado juros pelo pagamento a descoberto da conta – cfr. doc. n.º 4 junto com a PI.

7- A isto acresce que, apesar de tal débito ter sido feito a descoberto de conta, o certo é que, conforme resulta do extracto de conta junto com o articulado da contestação (doc. 4), logo em 19 de Janeiro de 2009, ou seja, ainda antes de terminado o prazo concedido pela D… à 1.ª Ré para...

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