Acórdão nº 5384/15.3T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2016
Magistrado Responsável | EDUARDO AZEVEDO |
Data da Resolução | 30 de Novembro de 2016 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães Mediante participação da Autoridade para as Condições do Trabalho relativo a B., o Ministério Público, formulando pretensão em conformidade, intentou acção declarativa especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra Massa Insolvente da Casa de Saúde C., SA.
Alegou, no essencial: a existência de um contrato de trabalho, na medida em que, nomeadamente, a referida B., enfermeira, desde Junho de 2011 presta as suas funções nas instalações da R e utiliza os seus instrumentos de trabalho, tem um horário pré-definido, controle das horas de início e termo da prestação de serviço, recebido formação de integração e recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho.
A R contestou alegando, em súmula: a acção deveria ser intentada e correr por apenso ao seu processo de insolvência (3576/14.1T8 GMR), uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente; havia incompetência material do tribunal; e no sentido de impugnar os factos alegados pelo MºPº, estando-se perante um contrato de prestação de serviços.
Foi cumprido o disposto no artº 186º-L, nº 4, do CPT.
Efetuado julgamento, onde se respondeu à matéria de fato, foi elaborada sentença, pela qual se julgou improcedente a invocada incompetência material do tribunal e com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julga-se a acção procedente por provada e, e consequência, reconhece-se que a relação contratual que existe desde Junho de 2011 entre a R.“ Casa de Saúde C., SA”(declarada insolvente) e a trabalhadora B., consiste num contrato de trabalho enquadrável no conceito definido no artº 12º do C. do Trabalho”.
A R recorreu e concluiu: 1) A R. veio na contestação invocar a excepção da incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, com o fundamento que a presente acção deveria ser intentada e correr por apenso ao Processo de insolvência nº 3576/14. 1 T8 GMR, uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente.
2) A acção intentada pelo MP deu entrada após trânsito da sentença que decretou a insolvência da Casa de Saúde C..
3) Daí que qualquer consequência emergente desse reconhecimento de existência contrato de trabalho projectar-se-á, já não sobre o insolvente, mas sim SOBRE a massa insolvente.
4) Estamos, assim, em pleno âmbito de aplicação das conjugadas normas dos artigos 51.º e 55.º do CIRE, pelo que a acção (ou procedimento cautelar) que seja susceptível de onerar a massa insolvente deve correr por apenso ao respectivo processo, conforme imposto pelo artigo 89.º, n.º 2, do CIRE, sendo a competência para o seu conhecimento e tramitação, por necessário, cometida ao Tribunal do Comércio, ao abrigo do disposto no artigo 89.º, n.º 2, da LOFTJ.
5) “Destarte, não é propriamente por o preceito aludir a dívidas da massa insolvente que se devem excluir do seu âmbito de aplicação acções que, não tendo na sua base, imediata ou directamente, dívidas de natureza pecuniária, têm, contudo, a virtualidade de virem a afectar, por via reflexa, a massa insolvente, o que reclama a competência dos tribunais do comércio para o seu conhecimento”. Cfr. Ac. Tribunal da Relação do Porto de 28/10/2015.
6) É da competência do Tribunal de Comércio o conhecimento da acção proposta pelo Ministério Público, tendo em vista o citado artigo 89, n.º 2 do CIRE.
7) Todavia, não se perseguindo este ponto de vista jurídico, sempre se discorda da decisão recorrida no que concerne à factualidade dada como assente, como se diverge do direito para tal matéria, reparado que seja o erro de julgamento que está patente na decisão recorrida.
8) E no que concerne à matéria de facto de que se discorda, na ponderação a concretizar, deve-se atentar como critério de resolução o que se escreveu no acórdão o que se exarou no acórdão do STJ de 21/03/2003, proc. 4324/02, relator Afonso Correia, que refere: “A admissibilidade da respectiva alteração por parte do Tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação. Assim, por exemplo: a) (…); b) apoiar-se exclusivamente em depoimento(s) de testemunha(s) que não depôs(useram) à matéria em causa ou que teve(tiveram) expressão de sinal contrário daquele que foi considerado como provado;… “.
9) Manifestamente se diverge a Ré dos seguintes factos dados como provados, ou na sua totalidade, ou, então, parcialmente, os seguintes: 6, 10 a 13, 15, 16, 19 e 22. Assim se cumpre o dever de especificação previsto no ordenamento adjectivo.
10) Como se anuncia, do mesmo passo, como decorre da exposição subsequente, quais as provas impositivas, quais aquelas provas que, afinal, suportam a posição jurídica da decorrente e, afinal, revelam o erro de julgamento que importa ultrapassar.
11) No ponto de facto n.º 6 dos factos provados - “sem nunca ter sido celebrado contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária “ – sendo manifesta a sua imprecisão, deverá ser acrescentado “por escrito”, dando-se, assim, como provado o seguinte: “sem nunca ter sido celebrado, por escrito, contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária”.
12) Por outro lado, reconhecendo-se que as testemunhas relevantes para a definição da factualidade em apreciação são, exclusivamente, as duas inspectoras do ACT e a testemunha Teresa, deve dizer-se que nem aquelas nem esta - a então enfermeira – chefe da Ré, não dá qualquer cobertura ao que ficou a constar dos factos 10 a 13, que agora especificamente se impugnam. Ouvido o depoimento prestado pela testemunha Teresa prestado na audiência de julgamento de 23/11/2015, entre as 15:26:29 e as 15:51:16 (cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538), há factos dados como provados que ela não acolheu, pois pela mesma foi dito que: “TERESA: Pronto, nós sendo um hospital privado e passando por diversas dificuldades que fomos passando neste último tempo os horários era... havia diminuição do trabalho ou aumento do trabalho e muito imprevisível, o que é verdade hoje é mentira amanhã, posso não ter cirurgia nenhuma não é? E de repente aparece-me uma cirurgia, acciona todo uma equipa não só de enfermeiros, como anestesistas, médicos, etc.. Pronto. Como é que eu faço isso? É sempre muito complicado, em cima do joelho, dada a nossa instabilidade profissional neste momento no hospital, eu faço um horário que muda todos os dias e todas as semanas, começo por um horário com os enfermeiros que temos com contrato de trabalho, esses têm de ter ao final do mês as horas... MANDATÁRIO R.: Primeiro preenche com os enfermeiros contratados? TERESA: Contratados. MANDATÁRIO R.: Muito bem. TERESA: Para assegurar que o horário deles é cumprido e será pago para não ficarem com banco de horas, ou...
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