Acórdão nº 263/11.6IDBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES SILVA
Data da Resolução10 de Outubro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO: Nos presentes autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, foram submetidos a julgamento os arguidos Luís F.

, Maria C.

e “…S…, S.A.

”, tendo sido proferida sentença que absolveu a arguida Maria C. e condenou Ø o arguido Luís F.

, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 6.º, 105.º, n.º 1, 2 e 5, do RGIT (Lei 15/2001, de 5 de Junho), na pena de 2 (dois) anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 4 (quatro) anos, suspensão condicionada ao pagamento, no prazo de 4 (quatro) anos, das prestações tributárias referidas em 10) dos factos provados, e demais acréscimos legais, nos termos dos artigos 50.º, do Código Penal e artigo 14.º, n.º 1, do RGIT.

Ø a arguida “...S…, Lda.”, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa, à taxa diária de €10,00 (dez euros), pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 7.º, 105.º, n.º 1, 2 e 5, do RGIT (Lei 15/2001, de 5 de Junho).

*Inconformado com a sentença condenatória, o arguido Luís F.

interpôs recurso, apresentando a motivação que remata nos termos seguintes: CONCLUSÕES: I - No entendimento do Recorrente, os factos dados como provados, constantes dos pontos 11, 12 e 13, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, foram incorrectamente valorados pelo Tribunal a quo, atendendo aos depoimentos e às declarações produzidas em audiência de julgamento e a outros elementos probatórios não valorados que também se revelam essenciais à boa e correcta decisão da causa.

II - Tal situação constitui um erro notório na apreciação da prova, nos termos do previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 410º do CPP.

III – De facto, no que diz respeito aos factos 11) e 13) dados como provados pelo Tribunal a quo, o ora Recorrente, em representação da sociedade … ...S..., SA, não se apoderou das quantias de IVA, integrando-as no seu património e utilizando-as em proveito próprio. Na verdade, o não pagamento dos impostos não resultou de má administração da empresa, mas sim de um conjunto de adversidades que impediram a empresa de cumprir as suas obrigações fiscais. Na verdade, o arguido Luís F. nas suas declarações (volta 20151106100307_48494451_2870588) gravadas em sistema áudio Citius na acta e audiência do dia 06/11/2015, a partir das 10h03m, em especial ao minuto 1.46 até ao minuto 3.50, esclareceu que “…chegou-se ao mês de Outubro e a empresa não tinha dinheiro para pagar os impostos…o imposto a pagar às finanças era muito mais alto, optei por adiar o pagamento do IVA, esperando que a banca nos facilitasse o crédito e posteriormente pagar…”, esclarecendo ainda que “…Cheguei ao princípio de Dezembro, um credor fez uma execução de penhora com remoção de bens, transtornou-nos a vida, que a gente não teve hipótese de cumprir com os compromissos a que estava obrigado, nesse caso era o pagamento do IVA…”.

IV - Bem como, também a testemunha Ricardo J.

, no seu depoimento gravado (volta 20151106105432_4849441_2870588) em sistema áudio Citius na acta e audiência do dia 06/11/2015, a partir das 10h54m, em especial ao minuto 13.46 até ao minuto 15.21, quando refere que “…não foi uma intenção de não pagarmos, foi um adiamento até a situação económica tentar ser resolvida e regularizada…” e esclarecendo ainda que “…se se pagasse os impostos naquela altura não havia forma de…as lojas fechavam”.

V - Face à prova produzida, os factos 11) e 13) não deviam ter sido dados como provados, nos termos em que o foram pela sentença recorrida, na medida em que, o ora recorrente nunca deu ordens e instruções, nem se apropriou ou integrou quaisquer quantias para integrarem o património da empresa arguida.

VI - Ao dar como provados os factos 11) e 13), constantes da sentença recorrida, os quais não resultaram da prova produzida em audiência de julgamento, violou o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127º do CPP.

VII - Ora, se os factos 11) e 13) constantes da sentença ora objecto de recurso, tivessem sido dados como não provados o recorrente haveria de ser absolvido.

VIII - Para além disso, entende o Recorrente que também o facto dado como não provado descrito na alínea g) foi incorrectamente valorado pelo Tribunal a quo, atendendo aos depoimentos e às declarações produzidas em audiência de julgamento. Na medida em que, nos termos do previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, encontra-se ferida de uma contradição insanável entre a fundamentação e o facto dado como não provado na alínea g), respeitante à contestação do arguido Luís F.

, que refere “A sociedade arguida não procedeu ao pagamento do IVA por manifesta impossibilidade económica para efetuar tal pagamento”.

IX - É entendimento do recorrente que, é notória a contradição existente entre tal facto dado como não provado e a motivação da sentença a quo, quando refere que “Esclareceu ainda o arguido que no período em causa a empresa (sociedade arguida) passou por dificuldades, resultantes de uma crise no mercado, aliada á proliferação de supermercados e às dificuldades de obtenção de financiamento junto da banca, tendo optado por dar prioridade ao pagamento de dívidas que lhe permitissem continuar a laborar, designadamente pagamento a fornecedores e trabalhadores, tudo com a intenção de ultrapassar a crise e retomar o pagamento de impostos.” E ainda quando referido que tais declarações soaram credíveis. E mesmo quando é referido na motivação da douta sentença recorrida, relativamente à testemunha “Ricardo A., TOC da sociedade arguida durante 7 anos, descreveu as dificuldades financeiras que a sociedade atravessou, confirmando que a gerência (arguido Luís F.), optou por canalizar os recursos financeiros para pagamento aos fornecedores e trabalhadores”.

X - Ademais, se a douta sentença recorrida deu como provado no ponto 19), dos factos dados como provados, as dificuldades financeiras da empresa da sociedade arguida, administrada pelo arguido Luís F., fundamentando-se nas declarações do arguido e da testemunha Ricardo A., tal prova era suficiente e cabal para dar como provado que a sociedade arguida não procedeu ao pagamento do IVA por manifesta impossibilidade económica para efetuar tal pagamento. Na medida em que, foram as dificuldades económicas da sociedade que impossibilitaram economicamente esta de proceder ao pagamento dos impostos, designadamente do IVA. Pelo que, face ao teor da fundamentação da douta sentença recorrida, não deveria ter havido qualquer dúvida para o Tribunal a quo em dar como provado o facto constante na alínea g).

XI - Aliás, as dificuldades económicas da empresa arguida foram confirmadas no depoimento da testemunha Ricardo A.

(volta 20151106105432_4849441_2870588) gravado em sistema áudio Citius na acta e audiência do dia 06/11/2015, a partir das 10h54m, em especial ao minuto 1.48 até minuto 2.20, quando referiu que “…foram surgindo alguns problemas que já vinham de trás, foram-se agravando, e depois foram-se tomando decisões em função das necessidades, tentando nunca prejudicar o Estado, mas também tendo em atenção as famílias, as pessoas que trabalham, até a mercadoria que era necessária para manter, foram feitas opções em Agosto e Setembro, até Dezembro…”.

XII - Pelo que, em nosso entender sempre se terá de considerar que foi feito um incorrecto julgamento sobre a matéria de facto, ao dar como não provado o constante na alínea g) do elenco dos factos não provados, quando face à prova produzida, tal facto deveria constar como facto provado pelo Tribunal a quo.

XIII - Mais ainda, nos termos do previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, na medida em que a douta sentença recorrida não atendeu à personalidade do arguido, pese embora na contestação tenha sido alegado o carácter do arguido e as testemunhas Ricardo A. e Paula M. tenham sido inquiridas sobre estes factos. Com efeito, no depoimento da testemunha Ricardo J.

(volta 20151106105432_4849441_2870588) gravado em sistema áudio na acta do dia 06/11/2015 a partir das 10h54m, em especial ao minuto 20:08 até minuto 20:19, esta referiu que o arguido: “é pessoa séria, trabalhadora e empenhada no que faz. Séria e honesta”. Também a testemunha Paula M.

(volta 20151106115306_4849441_2870588) no seu depoimento gravado em sistema áudio na acta do dia 06/11/2015 a partir das 11h53m, em especial ao minuto 11:17 até minuto 11:30, referiu que o arguido: “é uma pessoa trabalhadora, dedicada, responsável, cumpridora dos seus deveres.” XIV - Ora, padece de vício da insuficiência da matéria de facto, da alínea a) do artigo 410º, n.º 2 do CPP, a sentença condenatória que não contém os factos necessários para a decisão sobre a pena, nos quais se incluem os factos relativos à personalidade do arguido, aliás neste sentido in www.dgsi.pt, o Acórdão da Relação de Évora de 04.04.2013. Para além disso, também o Acórdão do STJ, de 03.04.2013, considerou que na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. Contudo, a douta sentença recorrida não faz qualquer referência à personalidade do arguido Luís F., excluindo o facto de referir que este não possuir antecedentes criminais.

XV - Com efeito, em nosso entender o Tribunal a quo fez um incorrecto julgamento da matéria de facto provada, na medida em que deveria ter considerado como provado a matéria respeitante à personalidade do arguido, concretamente devia ter dado como que o arguido é “pessoa séria e honesta e cumpridora”.

XVI - Pese embora o Tribunal a quo tenha dado como provado os factos constantes dos pontos 19), 20), 21), 22) e 23) da douta sentença recorrida, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos, face às dificuldades financeiras da sociedade arguida, “…o arguido Luís F., como administrador de facto e de direito…, passou a gerir as disponibilidades...

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