Acórdão nº 2131/11.2TBFAF de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução12 de Maio de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães 1. - Relatório. Cristóvão G intentou acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra L - Companhia de Seguros, S.A., pedindo que, sendo a acção julgada provada e procedente, seja a Ré Seguradora condenada a pagar-lhe a quantia de €68.411,89, para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, vencidos a partir da data da citação e vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegou, o autor, em síntese, que: - No dia 18 de Outubro de 2009, no Concelho de Fafe, foi vitima de um acidente de viação quando conduzia o veículo ligeiro de mercadorias, com a matrícula 04-FS-80, seguro na Ré, e do qual é o proprietário; - O acidente ocorreu em razão de o Autor, quando conduzia o veículo, foi acometido de um transtorno súbito, provocado por uma queda de tensão, o que fez com que travasse o veículo, entrando em seguida em despiste, e vindo a embater num muro de vedação de uma casa; - Do acidente resultaram danos no veículo do Autor, o qual ficou com a frente completamente destruída, sendo o custo estimado da sua reparação de €13.785,78, mas sendo o valor do veículo, à data do acidente, de €10.028,40; - Acresce que o Autor, no acidente, veio a sofrer um traumatismo crânio-facial, com fractura do osso frontal, fractura dos ossos próprios do nariz, fractura do maxilar superior à direita com fractura da apófise frontal e da parede externa da órbita direita, feridas inciso contusas na região frontal mediana e direita e ferida inciso-contusa no lábio superior à direita, sendo que, apesar de curado clinicamente das lesões, veio a ficar com sequelas permanentes; - Designadamente, veio o autor a ficar com uma afectação permanente físico psíquica fixável em 21 pontos, sendo capaz de manter a sua actividade profissional com esforços suplementares e medicação adequada, tendo ainda ficado com deformidade ligeira da pirâmide nasal, e cicatrizes as quais acarretam um dano estético fixável no grau 3 na escala de 1 a 7; - O autor, sofreu ainda de dores quantificáveis no grau 4 na escala de 1 a 7, indo necessitar de ser operado sob anestesia local para extracção de corpo estranho localizado na região frontal direita, cujo custo rondará os €350,00.

1.1. - Após citação, contestou a Ré Companhia Seguradora, por excepção e por impugnação motivada, aduzindo designadamente que o contrato de seguro com o autor outorgado não cobre os danos corporais e materiais do condutor do veículo seguro responsável pelo acidente, mas tão só os danos causados no próprio veículo seguro, razão porque , apenas terá o autor direito ao ressarcimento das despesas de tratamento com o limite de €1.000,00 por sinistro e, bem assim, ao valor de €8.864,40 pela perda total do veículo seguro.

Sucede que, diz a Ré Seguradora, na ocasião do acidente o autor conduzia com uma TAS superior a 0,5 g/l, razão pela qual se terá despistado, pelo que se encontra excluído da cobertura do contrato de seguro celebrado, nos termos do art.º 3.°, n.º 1, al. e), das Condições Especiais.

1.2. - Após Réplica, foi dispensada a audiência Preliminar e, proferido o competente despacho saneador, tabelar, fixou-se a matéria de facto assente, e, bem assim, organizou-se a base instrutória da causa, após o que, finalmente, procedeu-se depois à audiência de discussão e julgamento, iniciada a 12/12/2013.

1.3.- Por fim, conclusos os autos para o efeito, proferiu o tribunal a quo em 19/2/2014 a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor: “ (…) V - DECISÃO.

Nestes termos e face ao exposto, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência condeno a Ré, "L - Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao Autor, Cristóvão G, a quantia de €10.144,40, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, sobre o capital de €10.144,40, à taxa de 4%.

Custas na proporção do decaimento.

Notifique e registe. “ 1.4. - Inconformada com tal sentença, da mesma apelou então a RÉ L - Companhia de Seguros, S.A., apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as competentes conclusões e contra-alegando o Autor, sendo que, remetidos os autos a este Tribunal, e em Acórdão proferido em 26/6/2014, foi decidido: 6.1.- julgar procedente a apelação, anulando-se a decisão proferida sobre a matéria de facto (parcialmente, e tendo por objecto os pontos da matéria de facto correspondentes aos artºs 22º e 23º da contestação) e a respectiva sentença, e ordenando-se a reabertura da audiência, sendo concomitantemente a apelante notificada para, até à nova data designada, requerer a junção aos autos de documento para prova do alegado nos artigos 21º a 23º da contestação; 6.2. - Determinar que, após o referido em 6.1, e encerrada a audiência reaberta, seja proferida nova sentença, sendo nela respondido ex novo aos pontos da matéria de facto referidos em 6.1..

Custas pelo apelado.”.

1.5.- Regressados os autos à Primeira instância, e reaberta a audiência de julgamento a 19/6/2015, veio a mesma a ser concluída no mesmo dia, sendo que, conclusos os autos para o efeito, em 5/9/2015 foi proferida nova Sentença, integrando a mesma o seguinte excerto decisório: “(…) V - DECISÃO.

Nestes termos e face ao exposto, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência condeno a Ré, "L - Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao Autor, Cristóvão G, a quantia de €10.144,40, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, sobre o capital de €10.144,40, à taxa de 4%.

Custas na proporção do decaimento.

Notifique e registe.“.

1.6.- Mais uma vez inconformada com a sentença do tribunal a quo, da mesma veio apelar a Ré Seguradora, aduzindo agora as seguintes conclusões : 1.º - O presente recurso visa a revogação da douta Sentença porquanto, atenta a matéria de facto provada, a conclusão jurídica tinha que ser diversa da sufragada pelo Tribunal recorrido, pugnando-se pela absolvição da aqui recorrente seguradora.

  1. - No caso dos autos, encontra-se demonstrado ter sido estipulado, no artigo 3.º, n.º 1, al. e), das Condições Especiais do contrato de seguro que vigora entre o Autor e a Ré foi estipulado que "Ficam excluídos da cobertura os acidentes ocorridos em consequência de (...) Acção ou omissão do Segurado influenciada por uso de álcool ou bebida alcoólica que determine grau de alcoolémia superior a 0,5 gramas por litro e/ou uso de estupefacientes fora da prescrição médica, ou quando incapaz de controlar os seus actos".

  2. - É certo que, como bem se refere na sentença recorrida, que a interpretação desta cláusula contratual deve obedecer ao disposto no art.º 236°, n.º 1, do Código Civil, nos termos do qual "A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele." 4.° - Ou seja, "não pode ser atendido qualquer sentido objectivo da declaração; é preciso que ele seja imputável ao declarante. Por outras palavras, torna-se necessário que o declarante, actuando com a diligência imposta pelo ónus de adequada declaração, devesse contar com a possibilidade de ao seu comportamento declarativo ser atribuído aquele sentido objectivo.".

  3. - Diga-se, desde já, que quanto às quebras ou danos próprios ocorridos seguindo o condutor do veículo sob influência do álcool, estupefacientes ou produtos tóxicos, tal exclusão não apela a qualquer nexo de causalidade entre os danos e a dita "condução sob influência de ... ".

  4. - Acresce ser o sentido que assim se alcança o único consentido pela consideração de a condução com TAS igual ou superior a certo limite; 7.° - Aliás, diga que, como tem entendido a jurisprudência maioritária, a assunção, pela seguradora dos riscos acrescidos que a ilícita condução sob a influência do álcool, estupefacientes ou produtos tóxicos envolve, seria nulo, por contrariar normas legais imperativas, vd. art. o 280.°, n.º 1, do Código Civil.

  5. - Sendo de presumir que o "bonus pater familias" a que acima se fez referência, não acolheria a consagração de cláusulas contratuais a que atribuísse alcance contrário a lei imperativa, e designadamente da área estradal e penal.

  6. - Para que tal exclusão actue basta que o condutor seja portador, na altura do acidente, de uma T.A.S. superior à permitida por lei, não havendo que indagar se a correspondente alcoolemia foi ou não adequadamente causal do sinistro.

  7. - Neste sentido, decidiu-se no Ac. da Relação de Coimbra de 02/10/2001 - CJ, Ano XXVI, Tomo IV, pág. 20 e no Ac. ReI. Porto de 20/01/2005 - Processo 0436988, N° Convencional JTRP00037606, Relator: Des. Gonçalo Silvano, in www.dgsi.pt/jtrp, lendo-se no sumário deste que, "se num contrato de seguro facultativo de responsabilidade civil por danos próprios relativos a um veículo automóvel e por danos pessoais e materiais é estabelecida uma cláusula em que se estipula que ficam excluídos os sinistros resultantes de ... ou quando este conduza em contravenção à legislação aplicável à condução sob o efeito de álcool não são indemnizáveis as consequências directa ou indirectamente derivadas dos eventos envolventes quando o condutor se encontre sob o efeito do álcool, com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente permitida".

  8. - Seguindo o condutor do veículo segurado com uma taxa de alcoolemia (0,58 g/l), não pode deixar de concluir-se que o mesmo agiu em contravenção à legislação aplicável à condução sob o efeito do álcool já que ultrapassava o mínimo legal que era de 0,5 gramas de álcool por litro de sangue.

  9. - Assim à luz da mencionada cláusula contratual, não são indemnizáveis as consequências directa ou indirectamente derivadas dos eventos envolventes quando o condutor se encontre sob o efeito do álcool, com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente permitida.

  10. - Neste âmbito, entendemos que o espirito do contrato...

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