Acórdão nº 133/17.4T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução19 de Abril de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

João, com os sinais dos autos, move a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, a José, com os sinais dos autos, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de total 85.847,55 €, acrescida de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento, pelos fundamentos que constam da pi e se dão por reproduzidos.

Regular e pessoalmente citado, o réu não contestou.

Foram então considerados confessados os factos articulados pelo autor.

O autor apresentou alegações de direito.

Posteriormente foi proferida sentença em que se decidiu nos seguintes termos: “Termos em que julgo a acção parcialmente procedente e provada, nos termos sobreditos, e, consequentemente: Condeno o Réu a pagar ao Autor a quantia global de 38.486,92 € (trinta e oito mil quatrocentos e oitenta e seis euros e noventa e dois cêntimos), acrescendo juros de mora à taxa de 4% desde a prolação desta sentença até integral pagamento.

No mais, absolvo o Réu”.

Inconformados com esta decisão, dela interpôs recurso o Autor, sendo que, das respectivas alegações desses recursos extraiu, em suma, as seguintes conclusões: I Em termos de danos patrimoniais decorrentes do custo com deslocações suportado pelo Recorrente a decisão recorrida não fundamenta a razão pela qual não é adequado o critério da tabela de ajudas de custo por km, nem igualmente esclarece quais os factos inerentes ao invocado custo real das deslocações, mero conceito ou conclusão que deverá aferir-se de factos concretos (consumíveis, desgaste de componentes, portagens, repercussão de custos de manutenção e seguros, de imposto de circulação, etc.), que se não vislumbram sequer aflorados nem ocorrem por mera remissão para a web através da “ via Michelin”.

II As ajudas de custo visam compensar os colaboradores pelas despesas com deslocações (aqui exclusivamente no que respeita ao custo/Km) e ainda que os respectivos valores estejam definidos na lei apenas para a Administração Pública, é normalmente entendido que os mesmos servem de referência para o sector privado, sendo que, por outro lado nem a Douta Sentença fundamenta, nem a invocada “fonte michelin” permite qualquer conclusão fidedigna quanto ao apontado custo real das deslocações em prejuízo do critério seguido.

III Não existe qualquer incongruência quanto ao total de quilómetros já que o número de kms percorridos, foi o invocado na P.I. nos Artºs 25., 26., 28. (este com referência ás deslocações invocadas no Artº 27.), e finalmente no Artº 29., o que perfaz o total referido no Artº 30.

IV Deve manter-se o cálculo pela forma inicialmente efectuada de acordo com o critério mais fidedigno invocado pelo Recorrente e pelo total de distância e valor globais indicados na P.I.

V Em termos de danos patrimoniais decorrentes da incapacidade que afecta irreversivelmente o Recorrente, designadamente do dano biológico, ao contrário do que considerou a decisão recorrida, a capacidade profissional futura, que mais não fosse enquanto músico, no quadro de uma actividade em que se havia colectado e se viu forçado a encerrar (cfr. Artºs 44., 46., 47., 48. e 49. da P.I. e Docº nº 12 junto com a mesma), é algo que ficou totalmente afectado face ao tipo de lesões sofridas.

VI Os critérios de verosimilhança, de probabilidade e razoabilidade para fixar o quantum indemnizatório não ocorrem no raciocínio plasmado na decisão impugnada, quando se alicerça no valor salário mínimo garantido atual, para, depois, com base no alegado défice funcional encontrar um valor anual que, extrapolado com base na esperança média de vida para outro valor, faz incidir sobre este a dedução das prováveis despesas próprias do Recorrente deduzindo, ainda, em termos de antecipação do capital, um desconto de 15% chegando a um valor que, arredondado por equidade, fixou, por defeito, a indemnização em 28.000 €.

VII Este raciocínio é inaceitável porque, considerando uma esperança média de vida de mais 42 anos, tem por base de cálculo o actual salário mínimo garantido de 557 €, não prevendo sequer a possibilidade de actualização em função desse salário mínimo – facilmente expectável no apontado período de esperança média de vida – ou de outro tipo de rendimentos a que o Recorrente entretanto aceda, pelo que na ponderação do que antes fica referido entende-se que o silogismo da Douta Sentença não tem fundamento, não se mostra excessiva a indemnização peticionada a este título pelo montante de 50.000 €.

VIII A indemnização por danos não patrimoniais, para responder actualizadamente ao comando do Artº 496º do Código Civil e constituir uma efectiva possibilidade compensatória, tem de ser significativa, viabilizando um lenitivo para os danos suportados e a suportar, o que não ocorre na Sentença recorrida ao fixá-los globalmente em 10.000 €, considerando, designadamente o quadro dos Artºs 62º e ss. da P.I. que a mesma invoca.

IX Relativamente aos danos não patrimoniais “gerais” a que se reporta a factualidade alegada designadamente nos Artºs 33. até 44. da P.I., o montante de 10.000 € traduz o mínimo ajustado que releva para o seu justo ressarcimento.

X No que respeita aos danos não patrimoniais decorrentes do dano biológico, também atendíveis e que a Douta Sentença recorrida parece não equacionar, os mesmos assumem acrescida relevância, pois que a comprovação da perturbação considerável do nível e de qualidade de vida do Recorrente resulta inquestionavelmente da incapacidade permanente e para a vida decorrente do dano biológico de que padece e padecerá – para toda a vida - essencialmente no que respeita á situação irreversível de surdez total e acufenos associados.

XI Os acufenos afectam a qualidade de vida (dificuldade em conciliar o sono, incapacidade de concentração nos estudos ou na vida profissional, perda de equilíbrio, irritação, sensibilidade acrescida ao ruido, desequilíbrios e problemas nervosos, ansiedade e fadiga...) e afectam-na considerável e significativamente em termos de função física, desempenho físico, dor física, saúde em geral, vitalidade, função social, desempenho emocional e saúde mental sendo que as maiores dificuldades se centram na subescala emocional apresentando os sujeitos afectados maior frustração, irritabilidade, insegurança e mesmo aspectos psicopatológicos com ansiedade e depressão, acusando, mais de 50% perturbação da sua vida social e alterações no relacionamento familiar e com amigos e mais de 65% problemas na realização de tarefas de âmbito profissional ou doméstico” (Vasco Antunes Neves de Oliveira “Qualidade de Vida em indivíduos com queixas de acufenos: Comparação com a percepção do acompanhante “ Dissertação apresentada tendo como orientadora a Profª Drª Rute F. Menezes, na Universidade Fernando Pessoa da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Porto, Maio de 2017).

XII A real e grave perturbação do nível e qualidade de vida da vítima, ora Recorrente, face ás lesões efectivas apuradas e demonstradas, decorrente dos apontados danos, não pode, em termos não patrimoniais - face aos danos suportados actualmente e a suportar, tendo presente também a idade da vítima - justificar, sob pena de manifesta irrelevância ou insignificância, o valor fixado na Douta Sentença, entendendo o Recorrente que a quantificação de todos os danos de natureza não patrimonial, também no que respeita ao dano biológico, deverá computar-se globalmente nos 35.000 € inicialmente peticionados.

*O Apelado não apresentou contra alegações.

*Colhidos os vistos, cumpre decidir.

*II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, a questão decidenda é, no caso, a seguinte: - Analisar da adequação ou não dos valores indemnizatórios fixados a título de despesas de deslocação, de danos patrimoniais e danos não patrimoniais.

*III- FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.

Factos provados.

Conforme consta da decisão recorrida resulta demonstrada a matéria de facto alegada na petição inicial, por ter sido confessada, sendo só de realçar que: - A alegada em 1º a 12º nem era objecto de prova, pois que por força do artigo 623º a contrario Código de Processo Civil, nas relações lesante-condenado e lesado, a sentença penal faz prova plena contra aquele quanto aos elementos do tipo (em que se incluem, no caso do crime de ofensas á integridade física graves, as lesões, pois que é um crime de resultado e de dano) e pressupostos da punição, e, portanto, é insusceptível de prova em contrário, e mostra-se junta a referida sentença, já há muito transitada; de todo o modo, se assim não fosse, i. é., se não houvesse sentença penal, então a prova seria feita por confissão.

- o grau de IPP não é um facto, antes uma conclusão; - a idade está provada por documento.

Assim resulta demonstrada a seguinte materialidade: 1. No dia 31.08.2013, pelas 02:40 horas, junto ao Bar X nesta cidade de Bragança, o A. encontrava-se com um grupo de amigos tentando entrar no referido bar.

2. Tal entrada foi-lhes recusada por um segurança e após pedirem para chamar o gerente do bar, que manteve tal recusa, gerou-se uma confusão sendo arremessadas garrafas do interior do bar para o exterior.

3. Apareceu, então, o R. que, em tom agressivo e ameaçador, encetou uma discussão com o A. que, a determinada altura, lhe disse que “se a polícia estivesse aqui eras o primeiro a fugir”.

4. Acto contínuo e sem que nada o fizesse prever, o R. empurrou o A. u o A. por forma a desequilibrá-lo e fazê-lo cair ao solo, desferindo-lhe de seguida vários pontapés na cabeça causando-lhe o desmaio e perda consciência.

5. Ainda neste quadro, já com o A. inconsciente no solo, o R. continuou a desferi-lhe vários pontapés na cabeça, até abandonar o local… 6. Sem qualquer oposição, face á perda consciência do A. e ás agressões de que também foram alvo alguns dos seus amigos e ao alheamento dos demais presentes.

7. O A. teve que recorrer á...

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