Acórdão nº 8057/13.8TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães ANTÓNIO e mulher ODETE intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra JOÃO e mulher, MARIA, e X – CONSTRUÇÕES, S.A., pedindo que: - seja declarada a conduta dos 1.ºs RR. e 2.ª R. como a única e exclusiva causa dos danos materiais verificados no prédio dos AA., descritos em relatório técnico junto à p.i. e que os 1.ºs RR e 2.ª R. sejam declarados únicos e exclusivos culpados na produção do evento-causa; - sejam todos os RR. condenados, solidariamente, a executar todas as obras adequadas a repor o prédio dos AA., no estado de conservação anterior ao evento-causa, por si ou por intermédio de terceiros, à escolha dos AA.

ou em alternativa, - sejam todos os RR. condenados a pagar aos AA., a quantia de € 98.010,00, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, a título de danos patrimoniais destinada à execução de obras de reparação; e sempre, cumulativamente, - sejam os RR. condenados, individual ou solidariamente, a pagar aos AA. a quantia de € 11.690,00 a título de outros danos patrimoniais e a quantia de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais, bem como as quantias que se vierem a quantificar em execução de sentença, quer a título de desvalorização do prédio dos AA, quer a título de danos não patrimoniais futuros, quantias estas acrescidas de juros moratórios vencidos calculados à melhor taxa legal em vigor, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Alegaram, para o efeito, que os 1ºs Réus são proprietários de um prédio urbano contíguo ao seu, no qual aqueles levaram a efeito a demolição e reconstrução do edifício aí existente, tendo para o efeito celebrado com a 2ª. Ré um contrato de empreitada.

As obras, que tiveram o seu início em meados do mês de Dezembro de 2010, acabaram por afectar o imóvel dos Autores, que sofreu forte abalo na sua estrutura e apresentou uma fissura vertical ao longo do alçado lateral de todos os três pisos e águas furtadas, que constitui uma parede meeira de ambos os prédios.

Alegaram, ainda, que estes danos foram de imediato denunciados inicialmente à 2ª. Ré e, posteriormente, também aos 1ºs Réus, os quais depois de contactos e conversações, solicitaram a elaboração de um relatório de vistoria. Não obstante o resultado desse relatório, os 1ºs e 2ºs Réus não levaram a efeito quaisquer obras no prédio dos Autores com vista à reposição do mesmo no estado de conservação em que se encontrava anteriormente, obras essas que ascendem ao valor de € 98.010,00.

Para além destes danos, a incúria dos Réus levou à deterioração do recheio do prédio dos Autores, computando estes o valor de € 2.500,00 respeitante aos móveis e € 2.500,00 relativos a fotografias. Referem, também, ter suportado despesas com honorários de peritos (€ 500,00), com taxa de justiça (€ 1.020,00) e com honorários à mandatária (€ 5.000,00), para além de danos não patrimoniais, reclamando a este título € 15.000,00.

A 2ª R. foi a primeira a contestar, nos termos constantes de fls. 22 a 34 do processo físico, começando por excepcionar a prescrição do direito invocado pelos Autores, pois os trabalhos ter-se-ão iniciado em 16-11-2009 e não em meados de Dezembro de 2010, como alegam aqueles, tendo a demolição terminado em meados de Janeiro de 2010. Como tal, quando foram citados para a presente acção (31-12-2013) há muito tinha já decorrido o prazo de prescrição previsto no art. 498º do Cód. Civil.

Invocou, ainda, a exceção de ilegitimidade, alegando que apenas se obrigou perante os 1ºs Réus a executar a obra de acordo com um projecto previamente fornecidos por estes, tendo-o feito segundo as regras da arte e sem violação de qualquer dever especial de conduta, pelo que nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada e, a existir nexo de causalidade entre os danos e a obra, aqueles ficam a dever-se a um erro de projecto, da responsabilidade dos 1ºs Réus.

Pugnou, ainda, pela existência de abuso de direito e pela ocorrência de culpa dos próprios Autores, pois a tardia denúncia dos danos contribuiu necessariamente para o seu agravamento, defendendo-se no final por impugnação no que respeita a grande parte da factualidade alegada na petição inicial.

Terminou pedindo a sua absolvição da instância e do pedido, requerendo ainda a intervenção principal da seguradora “Y – Companhia de Seguros, S.A.”, para quem havia transferido a responsabilidade civil decorrente de danos emergentes da empreitada.

Os 1ºs Réus também contestaram (fls. 56 a 69 do processo físico), nos termos constantes de fls. 170 a 189, excepcionando igualmente a prescrição do direito à reparação, pois as obras tiveram efectivamente o seu início em 16-11-2009 e a demolição ficou completamente concluída em meados de Janeiro de 2010.

Impugnaram, também, que as obras realizadas tenham causado quaisquer danos no prédio dos Autores, até porque a parede que confinava com o prédio dos 1ºs Réus foi protegida da entrada das águas pluviais e alegaram não ter tido qualquer intervenção na direcção da obra, a qual foi efectuada pela 2ª. Ré, pelo que apenas esta poderá ser responsabilizada pelos alegados danos.

Por fim, também invocam o abuso de direito, dado o lapso temporal que mediou entre a demolição e a denúncia dos danos, responsabilizando os Autores pelo agravamento dos mesmos.

Concluíram, pedindo a improcedência da acção.

Por despacho de 03-10-2014 (fls. 211 e 212 do processo físico) foi admitida a intervenção principal da seguradora “Y – Companhia de Seguros, S.A.”.

A mesma apresentou também a sua contestação (fls. 221 a 229 do processo físico), arguindo de igual forma a prescrição do direito com os mesmos fundamentos e excepcionando a exclusão dos danos invocados nas coberturas do contrato de seguro.

A 2ª. Ré respondeu às exceções deduzidas pela seguradora (fls. 248 a 251 do processo físico).

Procedeu-se a uma audiência prévia (cfr. acta de 27-05-2016, a fls. 335 a 340 do processo físico), no decurso da qual foi proferido despacho saneador, onde foi negado provimento à excepção dilatória de ilegitimidade que havia sido deduzida pela 2ª. Ré na sua contestação, enquanto o conhecimento das restantes excepções (peremptórias) de prescrição e abuso de direito foi relegado para final.

De seguida foi fixado o objecto do litígio e foram elaborados os temas da prova.

Procedeu-se seguidamente a julgamento.

Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “julgar procedente a exceção perentória de prescrição do direito invocado pela Autora, deduzida pelos Réus e, em consequência, julgar improcedente a presente acção, absolvendo os Réus do pedido.” Inconformados como o decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: “I - O presente recurso vem interposto da sentença final em que julgou procedente a exceção da prescrição, e consequentemente absolveu os Recorridos, do pedido.

II - Da matéria assente como provada, não restam dúvidas de que sobre os Recorridos recai o dever de indemnizar os Recorrentes, a título de responsabilidade cível extracontratual, resultante da prática de factos ilícitos.

III - Os Recorridos levaram a cabo obra de reconstrução de prédio contíguo ao dos Recorrentes, em pleno centro histórico de Braga.

IV - Os Recorridos ao invocarem a prescrição, cabia-lhes o ónus da prova dos fados respetivos, nos exatos termos previstos nos artigos 342º nº 2 do CC e 264º nº 1 do CPC competindo-lhes, tratando-se de factos continuados, invocar e provar factos que permitam efetuar uma discriminação temporal entre as omissões que lhes são imputadas e os respectivos danos, para que alguns possam caber no aludido prazo de 3 anos".

V - Os Recorrentes, não lograram provar em que data os Recorrentes, tiveram conhecimento dos danos, nem dos iniciais, nem dos que se seguiram, como era de seu ónus.

VI - A exceção perentória da prescrição, deveria ter sido julgada improcedente, pois in casu, os danos foram ocorrendo sucessivamente no tempo, e os Recorridos não lograram provar que todos os danos alegados pelos Recorrentes foram conhecidos de forma imediata e instantânea. Atente-se no excerto infra do Ac. TRGuimarães de 23.10.2012: "De acordo com o disposto no artigo 486º do Código Civil as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando há, por força da lei, o dever de praticar o acto omitido, o que acontece quando o proprietário, por inércia, cria ou mantém uma situação de perigo provocada pelas coisas que lhe pertencem, vindo estas a provocar danos na esfera pessoal ou patrimonial de terceiros.

Nas situações em que o lesado tem conhecimento do facto danoso (e, inerentemente, do direito que lhe compete) logo que o mesmo ocorre, começa de imediato a correr o prazo prescricional caso o facto ilícito alegado tenha natureza instantânea.

No entanto, se as omissões de que emerge a responsabilidade traduzem factos« continuados e se prolongam no tempo, mantendo-se igualmente uma produção de danos, não sendo possível efectuar uma destrinça entre os diversos momentos temporais que desde tal altura ocorreram àqueles atinentes, o prazo de prescrição de três anos só começa a contar a partir do momento em que o lesado tomou conhecimento da produção efectiva de todos os danos, uma vez que as obrigações futuras só prescrevem no prazo de três anos contados do momento em que cada uma seja exigível (ou conhecida) pelo lesado.

VI - O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia; está presente, desde logo, na norma do art. 334.° do CC, que, ao falar nos limites impostos pela boa-fé ao exercício dos direitos, pretende por essa via assegurar a proteção da confiança legítima que o comportamento contraditório do titular do direito possa ter gerado na contraparte".

VII - No caso sub judice, resulta mais do que claro que todos estes pressupostos se encontram cumpridos: - Existência dum comportamento anterior do agente suscetível de basear uma situação objetiva de confiança...

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