Acórdão nº 209/17.8T8VVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO CUNHA LOPES
Data da Resolução04 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

1 – Relatório Por Acórdão proferido em 26 de Novembro de 2 015, foi o arguido L. M.

condenado pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203º e 204º/2, e), C.P.

, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, tendo ainda sido condenado no pagamento da quantia de 4 062.69€ (quatro mil, sessenta e dois euros e sessenta e nove cêntimos), com juros de mora desde a data da notificação para contestar o pedido cível e até integral pagamento.

Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o arguido, que terminou com as seguintes conclusões: 1) “Com o devido respeito, que é merecido, o Arguido/Recorrente não se pode conformar com a douta sentença proferida merecendo a mesma censura, pelo que, o Recurso versará sobre matéria de direito e de facto.

2) Na verdade, não foi feita qualquer prova de que o arguido tenha praticado o crime pelo qual foi condenado.

A.

DA NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO A.1 – Nulidade – Falta de Notificação do Arguido 3) O arguido/recorrente foi julgado na ausência nos termos do 333ºnº1 e 2 do CPP, pelo que o prosseguimento da audiência sem a presença do arguido tem como pressuposto que ele tenha sido «regularmente notificado» da data para ela designada.

4) O direito à presença do arguido em determinados actos tem necessariamente o significado de presença física, e constitui uma garantia constitucional superior.

5) O arguido prestou TIR em 03/04/2014 (fls. 11).

6) “ A prestação de TIR regula um específico processo comunicacional entre arguido e tribunal, como seja a possibilidade de notificação por via postal simples [196ºnº3, alínea c)], cabendo ao arguido indicar uma residência para essa notificações e o dever de comunicar a subsequente mudança de residência ficando o mesmo em auto, descrevendo-se aí as operações praticadas, fazendo este fé em juízo ( 99ºnº1, nº 3, al. a), c) e d).” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo: 765/09.4PRPRT-A.P1, Relator: JOAQUIM GOMES, de: 04-07-2012, disponível em www.dgsi.pt ).

7) A notificação para o julgamento, porque o arguido prestou Termo de identidade e residência ( 313ºnº3 do CPP), foi efectuada por via postal simples, nos termos do artigo 113º nº1, alínea c), do CPP, ela tinha de ser efectuada para a morada indicada pelo arguido para esse fim, o que não aconteceu, o arguido indicou como morada: a Rua d…. Contudo a notificação ( Refª 138860188) da data da audiência de julgamento foi expedida para a morada : Rua … Vvd ( fls.377).

8) Pelo que não se pode considerar que o arguido se encontrasse regularmente notificado da data da audiência de julgamento.

9) O prosseguimento da audiência sem a presença do arguido tem como pressuposto que ele tenha sido regularmente notificado, o que de facto não aconteceu. Sendo nulo deve ser anulado em consequência todo o processado posterior, ou seja, o julgamento.

10) O Recorrente desconhece em que receptáculo postal o expedidor dos correios terá depositado as notificações que o Tribunal a quo lhe dirigiu, pelo que o código referido é de outra freguesia do concelho de Vila Verde (Barbudo).

11) O Recorrente não pode ser penalizado, nem responsabilizado, por um erro do Tribunal que enviou as cartas com uma morada inexistente e diferente daquela que foi indicada pelo Recorrente para efeitos do Termo de Identidade e Residência ; erro ao qual o Recorrente é totalmente alheio e a ele não deu causa.

12) Resulta a evidência do alegado que o Recorrente desconhecia que contra ele fora deduzida acusação, bem como que se encontrava agendado o julgamento, até porque sempre residiu naquela sua morada, factos que determinaram que não apresentasse a sua defesa nem que pudesse estar em julgamento, como era sua pretensão para repor a verdade dos factos, ao qual é totalmente alheio e a eles não deu causa.

13) O arguido sempre se mostrou ativo no inquérito, apresentando um requerimento a solicitar o levantamento do veículo, de sua propriedade, apreendido (fls. 50).

14) A notificação por carta simples e com prova de depósito — prova esta feita por uma entidade terceira estranha ao Tribunal — não garante que a pessoa a quem foi dirigida a comunicação a venha a receber ou dela tomar conhecimento ou que seja colocada na morada correta.

15) O código postal foi introduzido pelos diversos sistemas nacionais de distribuição postal fundamentalmente para acelerar o processo de separação dos objetos, designadamente através de mecanismos automáticos com utilização de leitores óticos, mas também para ultrapassar situações de erros de endereçamento e diferenças na designação dos locais, assim facilitando a entrega da correspondência. Nessa medida, o código postal constitui hoje o elemento fundamental do endereçamento postal, permitindo ultrapassar erros e divergências de toponímia, sendo acessível todos os cidadãos. Qualquer pessoa pode saber, seja por contacto com os correios, seja através das diversas ferramentas informáticas acessíveis online, qual a morada correspondente a um código postal e viceversa. ( cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo: 233/05.3GBOBR.C1, Relator: FERNANDO VENTURA, de: 08102008, disponível em: www.dgsi.pt ).

16) Deste modo, e como se comprova nos presentes autos em que o Recorrente — muito embora o expedidor postal tenha enviado ao Tribunal documento comprovativo do depósito — a notificação por carta simples não foi depositada na caixa de correio do Recorrente e nem sequer a morada estava correta; até porque, tal endereço não existe, devendo o expedidor ter devolvido as notificações, como devia, com a indicação de endereço insuficiente, ou inexistente.

17) A presunção de notificação presente na notificação para julgamento, já não tem precedência legal, porque o Tribunal a quo não pode dar como real um facto comprovadamente falso, ou seja, que o código postal estava errado.

18) A forma de notificação prevista no artigo 113° n.° 3 do Código de Processo Penal, viola uma das garantias constitucionalmente consagradas em processo criminal e como tal, a referida forma de notificação é inconstitucional, o que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos, por violação do disposto no artigo 32° n.º 1 da Constituição Portuguesa que refere "o processo criminal assegura todas as garantias de defesa", e como tal deverá também garantir e prever os meios eficazes para que os visados possam exercer os direitos de defesa, designadamente, e a forma como deverão ser feitas as comunicações para que o interessado possa exercer os seus direitos de defesa, ou seja, prever meios em que com certeza absoluta se afira que determinada pessoa foi efetivamente notificada podendo / devendo o Tribunal na ausência do arguido diligenciar pela sua presença, até tendo em conta a complexidade dos factos.

19) Numa leitura jusfundamental dos direitos do arguido não podemos ter a certeza que o mesmo recebeu a carta, isto significa, que não se pode considerar o arguido regularmente notificado para a audiência e discussão de julgamento. Estas são normas de interesse e ordem pública, prendendo-se com o cerne das garantias do processo penal e, por conseguinte com a validade e eficácia do sistema legal processual penal.

Assim, com o devido respeito, a decisão recorrida é nula por violação do 119º alínea c) do Código de Processo Penal.

A.2. – Nulidade – Falta do arguido Notificado 20) Na audiência de discussão e julgamento do dia 20-11-2015 foi promovido pela Digna Magistrada do Ministério Público, relativamente aos arguidos faltosos a condenação dos mesmos em multa e o prosseguimento do julgamento nos termos do artigo 331ºnº3, do Código de Processo Penal, de seguida a Mmª Juiz de Direito condenou os arguidos em multa, no montante de 2 UCs pela falta injustificada e determinou o início da audiência de julgamento na sua ausência.

21) O Tribunal deve ponderar sempre a necessidade da presença do arguido na audiência, limitando-se a possibilidade de adiamento da audiência, estando aquele regularmente notificado, à imprescindibilidade da sua presença desde o início, para a descoberta da verdade. Exige-se que, na ausência do arguido, o presidente do tribunal tome as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência.

22) A celeridade processual é um objectivo a perseguir no sentido da materialização do direito do arguido a um julgamento rápido, mas tal objectivo pressupõe porém que estejam sempre asseguradas todas as garantias de defesa.

23) In casu, face às declarações do Arguido, aqui recorrente a flls. 178, as suas declarações em audiência de julgamento seriam importantes para a descoberta da verdade material, pelo que a celeridade processual neste caso assumiu uma importância suprema face à verdade material.

24) Como se diz no Acórdão da Relação de Lisboa (Rec. Nº 9354/02), “ Se é assim certo que o processo penal deve consagrar expedientes legais que permitam atingir o sobredito desiderato de se chegar a um julgamento no mais curto prazo possível também não é menos certo que a expectativa legítima do arguido é a de que lhe seja feita justiça e não a de que pura e simplesmente se lhe "arrume" o processo de qualquer maneira e a qualquer preço e, por isso, a interpretação das normas vigentes não podem deixar de acautelar até ao limite o sentido que mais eficazmente se coadune com a melhor e mais adequada protecção das garantias de defesa e que salvaguarde um desenvolvimento do processo efectivamente equitativo.

25) Nesta linha de pensamento já doutrinou também o Supremo Tribunal de Justiça (Ac. para fixação de jurisprudência n° 6/2000 de 00.01.19 ao afirmar: "A celeridade processual, como objectivo, só deve prevalecer quando o direito do arguido não possa ser afectado de forma injustificada e definitiva, sendo este o limite de qualquer opção legislativa.” 26) “O legislador relativizou, de certo modo, o direito de presença do arguido na audiência mas apenas em circunstâncias muito concretas e acautelando, mesmo assim, esse direito [direito de defesa].” (Cf...

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