Acórdão nº 504/17.6T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução18 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO 1.

No processo de contraordenação que correu termos na Infraestruturas de Portugal, S.A., por decisão de 16.01.2017, a arguida MB, Lda, com sede em Rua …, em Paredes, NIPC …, foi condenada na coima única de €8.000,00 (oito mil euros) por ter incorrido na prática de duas contraordenações previstas nas alíneas c) e d) do n° 2 do artigo 70° do Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, aprovado em anexo à Lei n° 34/2015, de 27 de Abril.

  1. A arguida interpôs recurso de impugnação judicial da referida decisão, o qual foi admitido e realizada audiência de julgamento, tendo a final sido proferida decisão pela qual foi julgado procedente o recurso interposto e, em consequência, revogada a decisão recorrida e ordenado o arquivamento dos autos.

  2. Não se conformando com esta última decisão, dela interpôs recurso o Ministério Público para este Tribunal da Relação de Guimarães, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: A) No âmbito do processo de autorização de utilização de infraestrutura de Canal Técnico Rodoviário (C.T.R.), em domínio público rodoviário, para acesso e instalação de cabo(s) de telecomunicações, como está em causa na situação de facto trazida pela impugnante, devem considerar-se um conjunto de princípios de ação, decorrentes da legislação aplicável ao caso sub species, que o Tribunal a quo, na nossa humilde perspetiva, ignorou; B) A Lei n.º 5/2004, de 10-02 (Lei das Telecomunicações) distingue, em termos de redes de comunicações, ativos de telecomunicações e infraestrutura de alojamento; C) Os ativos de comunicações são da propriedade dos operadores de telecomunicações; D) As infraestruturas de alojamento de ativos de comunicações instalados em infraestruturas rodoviárias, denominadas por C.T.R., constituem, como decorre da Lei e como é nossa posição, Domínio Público Rodoviário, e são geridas pela entidade gestora da infraestrutura rodoviária, in casu, a I.P.; E) O Tribunal a quo nem se pronunciou, como a nosso ver se impunha, quanto à necessidade ou não de autorização para a intervenção pela entidade executante; F) Só depois poderia concluir pela negligência, ou não, da sua ação na execução dos trabalhos em causa; G) A utilização da infraestrutura de C.T.R., instalada em domínio público rodoviário, pressupõe autorização da I.P.; H) O titular da Autorização é que é o responsável por todos os danos, diretos ou indiretos, causados, inclusive a terceiros, por motivos de utilização do C.T.R., sendo, nomeadamente, responsável por eventuais acidentes, deformações de pavimento, problemas de drenagem e deficiências de sinalização; I) Ora, Venerandos Desembargadores, perguntamos nós: num caso como o dos autos, quem assume o risco e é responsabilizado pelas incidências acima, se a entidade impugnante, que executou os trabalhos, não diligenciou pela obtenção de qualquer autorização nem sequer diligenciou pela averiguação se a autorização existia; quando a “TT, S.A.”, que alegadamente subcontratou a impugnante, procedeu exatamente da mesma forma, ou seja, nada averiguou e nenhuma autorização obteve; e a Telecomunicações X, chamada a esclarecer esta questão, nem sequer reconhece a necessidade dela, mais grave ainda, então não se responsabilizaria ninguém?; J) Nenhuma prova concludente se produziu nos autos no sentido de demonstrar de forma efetiva que existia contratação, subcontratação e/ou assunção de responsabilidades, e se sim em que termos, naquela alegada cadeia de entidades, impugnante, “TT, S.A.” e Telecomunicações X; K) Mas ainda que existisse, atrevemo-nos a questionar: não é a impugnante a autora imediata, material, não se lhe exigiria outro comportamento, mais diligente? L) Salvo melhor entendimento de V.

    as Ex.

    as, a nosso ver, exigiria, tanto mais que, a assim não se admitir, até podemos atribuir à Telecomunicações X a qualidade processual, como que fazendo um reporte remissivo exemplificativo para o Código Penal, uma instigadora ou pelo menos autora moral da prática da infração, mas nem isso seria bastante para desresponsabilizar a conduta negligente da impugnante; M) Quem responsabilizamos por danos ou, mais clamoroso ainda, quem responsabilizamos por qualquer deformação de pavimento, problemas de drenagem e deficiências de sinalização que poderia até levar a consequências graves, tragédias até em última análise para transeuntes e/ou condutores de veículos que por ali circulassem? N) Ocupa-se a via, utiliza-se o C.T.R., domínio público rodoviário, sendo que, no caso dos autos, a sua utilização implicou a ocupação da estrada com cabos, sinais, meios humanos,…; O) Segundo a impugnante nenhuma autorização é necessária e, no caso de até ser, não quer saber se existe ou não. Não há negligência na intervenção? Não se exigiria à impugnante, profissional da área, que se informasse convenientemente, não realizando as obras mencionadas, sem autorização ou licença da I.P.? P) Exigir-se-ia, sim, até por razões decorrentes da utilização da via e possíveis danos que pudessem advir daquela intervenção cujos trabalhos estavam a ser executados por ela própria, impugnante, estava e está atribuída à I.P. (art.

    os 42.º, 43.º e 49.º do E.E.R.R.N.).

    Q) Até para dar início aos próprios trabalhos, como bem sabe a impugnante, maxime a Telecomunicações X, careceria daquela autorização prévia, tudo de acordo com o que se encontrasse definido em sede de cronograma de trabalhos; R) Como empresa da área, que, tal como foi dado como provado em sede de Sentença, dedica-se a prestar serviços e assistência para a Telecomunicações X (com algumas reservas nossas, uma vez que ao longo de todo o processo nunca foi exibida e/ou junta qualquer documentação, de que índole probatória fosse, que o comprove), era-lhe exigível outro comportamento procedimental; S) Relembramos, mais uma vez, que, em concreto, estamos perante a utilização de um C.T.R., em domínio público rodoviário; T) A demonstrar esta relevância material do domínio público subjacente, está o facto de até o cabo a instalar ter de estar devidamente identificado com o nome do operador e/ou entidade proprietária, de forma a ser possível o seu reconhecimento a partir de qualquer Caixa de Visita (C.V.); U) Todos os trabalhos a executar na via pública, como é o caso dos autos (trata-se de uma caixa de visita cuja utilização, por se tratar de uma infraestrutura implantada em plena via pública, sempre dependeria de informação e autorização prévias da I.P. para intervenção e/ou utilização do C.T.R.), têm de estar sinalizados no cumprimento do Regulamento de Sinalização de Trânsito [Decreto Regulamentar 22A/98 e do Código da Estrada]; V) O procedimento de autorização decorre, à saciedade (no nosso humilde entendimento), das disposições conjugadas dos art.

    os 42.º, 56.º e 65.º do Estatuto da Rede Rodoviária Nacional (Lei nº 34/2015, de 27-04 - E.E.R.R.N.); W) Nos termos do disposto no art.º 3.º, alí. a), do E.E.R.R.N., a administração rodoviária encontra-se atribuída à I.P., que sucedeu à “E.P.- Estradas de Portugal, S.A.”, nos termos do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 91/2015, de 29-05; X) É à I.P. que cabe zelar pelo cumprimento do referido E.E.R.R.N., o qual estabelece as regras que visam a proteção da estrada e sua zona envolvente, fixa as condições de segurança e circulação dos seus utilizadores e as de exercício das atividades relacionadas com a sua gestão, exploração e conservação (in allium, art.º 1.º, n.º1 do E.E.R.R.N.), além das normas de proteção às estradas nacionais, as quais podem ser proibitivas, permissivas ou impositivas; Y) Só à I.P. é que são conferidos todos os poderes de autoridade administrativa estabelecidos pela legislação em vigor em matéria de gestão de infraestruturas existentes no subsolo das estradas nacionais (infraestruturas essas que são constituídas por condutas, câmaras de visita, redes de tubagens – o C.T.R.), destinadas a alojar redes de telecomunicações; Z) Nos termos do art.º 15.º do mesmo diploma (E.E.R.R.N.) só a I.P. dispõe de especiais atribuições no que respeita à gestão do C.T.R., infraestrutura destinada ao alojamento das redes de telecomunicações eletrónicas, sita no subsolo das estradas, que, por sua vez, integram o domínio público rodoviário sob gestão da I.P.; AA) Somente nas normas impositivas o E.E.R.R.N. identifica o sujeito passivo da relação jurídica (art.º 54.º - ditas obrigações reais); BB) Sempre por reporte ao E.E.R.R.N., afigura-se-nos que as normas proibitivas e permissivas não distinguem a qualidade do sujeito passivo, razão porque se aplicam diretamente ao autor material das obras, in casu, à impugnante; CC) O escopo das nomas do E.E.R.R.N. que, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo desconsiderou, é a defesa do património rodoviário do Estado, sendo indiferente a qualidade em que intervém o agente que executa materialmente a obra; DD) In casu, a ocupação ou utilização do solo, subsolo ou espaço aéreo da zona da estrada (domínio público rodoviário) por equipamentos, materiais ou infraestruturas não relacionadas com a exploração ou com a segurança das estradas constitui uso privativo do domínio público rodoviário (neste sentido, de forma expressa, o impõe o art.º 56.º, n.º2 do E.E.R.R.N.); EE) Aquele uso só é permitido desde que seja compatível com o uso público viário e não exista prejuízo para as condições de circulação e segurança rodoviárias, bem como para a estabilidade, conservação e exploração da infraestrutura (complementa e esclarece o n.º1 do mesmo art.º 56.º do E.E.R.R.N.); FF) Ora, a compatibilidade do uso...

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