Acórdão nº 1578/17.5T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelCONCEI
Data da Resolução04 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

I – A Embargante/executada:- Natália, viúva, residente na Rua … Guimarães, executada nos autos à margem identificados, interpôs contra o Exequente: X – Instituição Financeira de Crédito SA, os presentes embargos, alegando em síntese, que no contrato celebrado entre a exequente e a sociedade N. N. Têxtil, Unipessoal Ldª, a mesma foi avalista, tendo para o efeito dado o seu aval numa livrança.

Apesar do contrato ser intitulado como sendo de locação financeira tratou-se de um contrato de aquisição do veículo pela N. N..

As duas livranças assinadas pela embargante enquanto avalista foram assinadas em branco.

À data em que foram preenchidas as livranças a dívida da N. N. não era a que está referida, em cada uma delas.

A exequente abusiva e ilegitimamente , na data de 16/01/17 preencheu as livranças e inscreveu nelas montantes de dívida que não existiam nem eram devidas pela N. N..

A embargante não autorizou o preenchimento das livranças, agindo a embargada com manifesto abuso de direito.

Também não comunicou à embargante que ia preencher as livranças, não existindo qualquer acordo de preenchimento.

Por outro lado, a exequente recebeu os dois veículos, que reintegro no seu património com o valor de € 23.000,00 e € 25.000,00, respectivamente.

Conclui pela procedência dos embargos, com a consequente extinção da execução.

A embargada contestou e impugnou a versão da embargante.

Os autos prosseguiram e efectuado o julgamento foi proferida sentença na qual se decidiu: Pelo exposto, decido: 5.1.

- julgar improcedentes os presentes embargos de executado e, em consequência, determino o prosseguimento da execução apensa contra o embargante/executado.

5.2.

- julgar improcedente o pedido de condenação da contraparte como litigante de má-fé.

Inconformada a embargante interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: 1. Devem ser adicionados aos factos provados os fatos identificados e descriminados nas alegações, bem como devem ser retificados e acrescentados os factos descritos, e ser suprimido na matéria de facto provado, os factos atrás elencados; 2. As duas livranças assinadas pela Recorrente, como avalista, foram assinadas em branco, e entregues sem data de vencimento, nem montante nem local de pagamento; 3. Em Junho de 2015, a sociedade N. N. foi objeto de uma providência cautelar de arresto instaurada pela sociedade Y – Acabamentos Têxteis, Ldª que apreendeu e removeu da empresa, a totalidade das existências, bens, equipamentos e estes veículos, tendo a Exequente-Recorrida requerido na providência cautelar a sua restituição, retirando-os do arresto; 4. Com o decretar do arresto, causa judicial à qual a Recorrente é alheia, nunca a Recorrente nem a N. N. tinha qualquer possibilidade jurídica ou de facto de entregar os veículos à Exequente-Recorrida que só os podia obter através do processo que instaurou apenso à providência cautelar; 5. Imputar à Recorrente o dever desta indemnizar valores que ultrapassam e ultrapassaram a vontade e o poder jurídico da N. N., é uma violência jurídica que integra o abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil; 6. Mesmo que fosse admitido o direito da Exequente-Recorrida ao recebimento das quantias com que ela preencheu as livranças (o que não se aceita) sempre existirá abuso de direito, pois este exercício do eventual direito da Exequente- Recorrida é exercitado em termos clamorosamente ofensivos da justiça, ainda que ajustados ao conteúdo formal do direito, tanto mais que, até, à data do arresto que a impossibilitou de continuar a exercer a sua atividade, sempre pagou as prestações mensais relativas à compra destes dois veículos; 7. A Recorrida não estava autorizada pela Recorrente a preencher livremente as livranças nos montantes que entendesse e muito menos estava autorizada a preencher cada uma das livranças com valores ou quantias que muito ultrapassavam os montantes em dívida aquando da resolução em 28-09-2015 dos contratos que foi feita pela Recorrida; 8. A Recorrente nunca teve conhecimento nem consciência que, aquando da assinatura dos contratos e das livranças, que os contratos continham dentro das cláusulas contratuais gerais insertas nas condições gerais dos contratos estava incluída, a autorização de preenchimento das livranças, a aplicação de sanções abusivas e a obrigação de pagamento de variadas indemnizações que ultrapassam, em muito, o princípio de boa fé contratual que deve presidir na formação dos contratos; 9. Aquando da celebração destes contratos entre a Recorrida e a N. N., a livrança em branco entregue pela Recorrente e que se destinaria a ser uma livrança, porque era uma livrança em branco, esta ainda não valia nem nunca valeu como livrança, atento o seu preenchimento abusivo (não produzirá efeito como livrança, como diz o artigo 76º da Lei Uniforme das Letras e Livranças - LULL); 10. A subscrição-emissão pela sociedade de uma livrança em branco – isto é, sem algum dos requisitos essenciais indicados no artigo 75 da LULL, designadamente o montante da promessa de pagamento – a favor de um seu financiador não cria imediatamente um título cambiário, sujeito ao regime geral desta Lei (art. 76º) e, em especial, independente, desprendido quer da relação subjacente quer do pacto de preenchimento a que alude o artigo 10 da LULL; 11. O título – enquanto título de crédito, com as características que a Lei lhe confere – apenas existirá se e quando apresentar os requisitos essenciais do artigo 75º: designadamente, quando dele constar uma promessa de pagar perfeitamente identificada, com a indicação do valor devido, o tempo e o lugar do pagamento, etc.; 12. A Recorrente, como avalista, nunca foi colocada pela Recorrida em condições de poder cumprir nos mesmos termos em que o podia fazer a subscritora da livrança – a sociedade N. N., pelo que, ao não lhe ter sido possibilitada essa possibilidade, nunca a Recorrente pode ser obrigada a pagar mais do que aquilo que estaria obrigada a pagar se fosse esse o momento do vencimento da obrigação; 13. As garantias vertidas nas livranças em branco são nulas nos termos gerais (art. 280/1 do CC), por inexistência do direito invocado pela Recorrida através do preenchimento das livranças, por ser contrário à lei e ser ofensivo dos bons costumes; 14. A Recorrida recebeu e fez dela os dois veículos que haviam sido objeto destes dois contratos e que, à data da sua devolução, valor económico de mercado, embora não tenha, no processo, sido determinado o respetivo valor comercial de mercado; 15. A Recorrida, ao serem-lhe devolvidos os dois veículos do contrato, recebeu com essa devolução, valores económicos não determinados; 16. A Recorrida com a resolução fez acrescer o seu património no valor dos dois veículos, pelo que a não consideração deste valor, no que respeita à obrigação da avalista Recorrente, representa e constitui uma situação de enriquecimento sem justa causa por parte da Recorrida em relação à ora Recorrente; 17. O artigo 12º do DL 446/85 estabelece que «as cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição deste diploma são nulas nos termos nele previstos», acrescentando a alínea c) do seu artigo 19º que «são proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que: (…) c) consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir»; 18. O DL nº. 446/85 diz que são “objecto da proibição relativa da alínea c) do artigo 19º as cláusulas que visam a prévia fixação do montante da indemnização são absolutamente proibidas pela previsão da alínea d) do artigo 21º e as cláusulas penais em sentido estrito” - "Cláusulas Contratuais Gerais" (DL n.º 446/85 Anotado - Recolha Jurisprudencial), Wolters Kluwer - Coimbra Editora, 2010, pág. 235; 19. A lei proíbe a desproporcionalidade entre a pena (ou a indemnização convencionada) e os danos previsíveis, sendo este juízo de valor sobre a desproporção reportado ao momento em que a cláusula é concebida (aos danos típica e previsivelmente a ressarcir, dentro do quadro negocial padronizado), sendo incorreto relacioná-lo com as vicissitudes que o contrato em que se integra sofreu, nomeadamente com os termos em que foi resolvido” - ob. citada, pág. 237 e no mesmo sentido, Sousa Ribeiro, "Responsabilidade e Garantia em Cláusulas Contratuais Gerais", Coimbra Editora, 2007, pág. 139 e sgs..

  1. A jurisprudência vem predominantemente julgando nulas as cláusulas que estipulem uma penalização que se situe para lá de 20% do valor dos bens e serviços que ficaram por entregar e prestar - Na ob. citada, págs. 248 a 252, faz- se uma breve resenha de orientação jurisprudencial que versa tais casos”.

  2. Relativamente às nulidades suscitadas, de acordo com o teor do artigo 286º do Código Civil - «a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal»; 22. No caso concreto dos preenchimentos das livranças, a Exequente-Recorrida acumulou ilegalmente montantes provenientes de causas de indemnização que se excluem e não são cumulativas; 23. Na sentença que proferiu, o senhor juíz a quo omitiu a obrigação de se pronunciar sobre a existência do contrato de adesão com a inclusão, validade ou nulidade das cláusulas contratuais gerais, questão que havia sido levantada pela Recorrente antes da audiência de julgamento e atempadamente quando tivera conhecimento dessas cláusulas; 24. Tal conhecimento era oficioso e o senhor juiz a quo, devia ter-se pronunciado sobre ele, e, ao não se pronunciar sobre esta questão, a sentença padece da nulidade estatuída na alínea d) do nº. 1 do artigo 615 do CPC.

  3. Deve ser adicionado como ponto de facto provado que: • os dois...

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