Acórdão nº 171/11.0JABRG.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução05 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção penal) Relatora: Fátima Furtado; adjunta: Laura Maurício.

  1. RELATÓRIO No processo comum coletivo n.º 171/11.0JABRG, do juízo central criminal de Guimarães, juiz 2, da comarca de Braga, no procedimento para determinação da pena única derivada do cúmulo de penas aplicadas ao arguido Ricardo, com os demais sinais dos autos, foi realizada a audiência a que alude artigo 472°, n° 1 do Código de Processo Penal, após o que, em 26 de outubro de 2017, foi proferida decisão, depositada no mesmo dia, com o seguinte dispositivo: «Termos em que, este Tribunal, procedendo ao cúmulo jurídico das penas aplicadas no âmbito dos presentes autos com aquelas que foram aplicadas no âmbito dos Processos n.ºs 2239/09.4PBGMR, 1943/09.1PBGMR, 786/10.4PBGMR, 418/10.0GAFAF, 979/13.2TAGMR: 1. Condena Ricardo na pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; 2. E, efectua-se à referida pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses o desconto, previsto no art. 82º do Código Penal, de 21 (vinte e um dias) e ainda de 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 9 (nove) dias.

Notifique.

Deposite.

Oportunamente: a) remeta boletins à DSIC; b) remeta certidão da presente decisão aos processos cujas penas foram englobadas no presente cúmulo jurídico; c) abra termo de vista ao Ministério Público para efeitos de desconto e liquidação da pena.»*Inconformado, o arguido interpôs recurso, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões: «1. Afigura-se ao aqui Recorrente Ricardo que, salvo o devido respeito - que é muito, devido e merecido e sem prescindir a reconhecida qualidade técnica e humana dos magistrados judiciais que compunham o coletivo, os quais são reconhecidamente qualificados e merecem todo o respeito e são um bom exemplo da grande qualidade dos magistrados judicias portugueses - no douto Acórdão prolatado em 26.10.2017, o Tribunal a quo não fez uma correta valoração da factualidade dada como provada e fez uma incorreta escolha da pena e da respetiva dosimetria, condenando o arguido numa pena de 6 (seis) anos 6 (seis) meses de prisão, sem que para isso existisse fundamento de facto, nem de direito; 2. A aplicação da pena visa a proteção dos bens jurídicos violados (prevenção geral positiva) e a reintegração do agente na sociedade, não podendo a medida concreta da pena exceder a culpa do agente (art. 40º do Código Penal), proibindo o nosso ordenamento jurídico as penas exemplares ou as penas que não respeitem os seus próprios fins. Deve, na sua determinação atender-se a todas as concretas circunstâncias e ao homem (ou mulher) que está perante o Tribunal; 3. Conforme resulta do processo n.º 418/10.0GAFAF, por decisão datada de 13.06.2014, e transitada em julgada aos 14.07.2014, foi realizado o cúmulo jurídico, nos termos do disposto art. 78º do Código Penal, que englobou as penas parcelares aplicadas ao condenado nesse processo e nos processos 2239/09.4PBGMR, 1943/09.1PBGMR E 786/10.4PBGMR (todas elas pendentes), e, foi aplicada a pena única de 5 anos de prisão, cuja execução foi suspensa, por igual período de tempo, mediante a sujeição do arguido a regime de prova que inclui a obrigação de manter acompanhamento clínico à síndrome obsessivo-compulsiva de que padece e com restante conteúdo a definir pela entidade responsável pela sua execução, em função das necessidades reveladas pelo arguido, e, à obrigação de pagar, no período de um ano e seis meses contado desde o trânsito em julgado da aludida decisão de cúmulo, os montantes indemnizatórios fixados aos demandantes civis nos acórdãos dos processos coletivos nºs 1943/09.1PBGMR E 418/10.0GAFAF, sendo que a aludida pena única aplicada encontra-se pendente; 4. Ora, salvo o devido respeito, é nosso entendimento que, e no seguimento de alguma jurisprudência dos tribunais superiores, a pena de prisão suspensa na sua execução, é uma pena de substituição, autónoma, que se não confunde, ou não se pode confundir, com a pena de prisão. Esta e aquela são penas de espécies diferentes, não podendo, nem devendo, ser cumuladas, ao menos sem previamente o tribunal competente ter determinado a sua revogação nos termos do art. 56.º do Código Penal – cfr. Acórdãos de 02-06-2004, Proc. N.º 1391-04, da 3ª Secção, CJACSSTJ, Ano XII, T.2.º 2004, p. 217 e de 20-04-2005, Proc. n.º 4742/04, da 3ª Secção; 5. As penas de execução suspensa, aplicadas por decisões transitadas em julgado, não devem poder ser revogadas para efeitos de formação de uma pena conjunta, privativa de liberdade, a menos que o condenado nisso consinta. Ou seja, o critério seria o do designado cúmulo jurídico facultativo, em que o condenado, com base numa dada 23/27 22 interpretação do art. 77.º, n.º 3 do Código Penal, poderia optar entre o cúmulo jurídico ou a acumulação material das penas, conforme ele próprio achasse mais favorável para si, hipótese em que se justificaria uma eventual quebra do caso julgado com a perda da autonomia e da especificidade da pena de substituição, pela sua integração no cúmulo jurídico; 6. Posição esta que nós defendemos, uma vez que a não ser assim, o arguido acaba por ser prejudicado, como o foi nos presentes autos, uma vez que, todas as penas, objeto de cúmulo, que se encontravam suspensas na sua execução foram consideradas, para efeitos de cúmulo, como se de prisão efetiva se tratasse, contribuindo decisivamente para aumentar a dosimetria da pena, que culminou na aplicação a final de uma pena de prisão efetiva, sendo certo que nenhumas das penas de prisão suspensas na sua execução, que entraram no cúmulo, foram revogadas; 7. Nestas circunstâncias deveria o Tribunal a quo, ter notificado o condenado para o mesmo esclarecer se pretendia ou não a inclusão no cúmulo a realizar das penas suspensas não revogadas. O que não fez, e que no nosso entender devia ter feito; 8. Pelo exposto, na esteira do entendimento de Nuno Brandão e da melhor Jurisprudência do STJ, as penas de prisão suspensas na sua execução em que o arguido foi condenado quer nos presentes autos, quer nos demais processos não deveriam ter sido englobados neste cúmulo jurídico, uma vez que nenhuma das penas foi revogada, nem o arguido deu o seu consentimento para a inclusão da mesma no cúmulo; 9. Com o devido respeito que é muito, e no caso concreto devido e merecido, o Tribunal a quo não viu, nos presentes autos o jovem a carecer de uma nova oportunidade, mas apenas o reflexo negativo deste, vertido nas penas e crimes que emergem do registo criminal. O Tribunal a quo deveria, para determinar as concretas penas deste cúmulo, aqui postos em crise, atender a factualidade por si dada como provada e ainda procurado conhecer o jovem para além daquele reflexo que ali era exibido ou que pudesse resultar de declarações prestadas em audiência de julgamento; 10. O Tribunal a quo, sem prescindir a reconhecida qualidade técnica e humana dos magistrados judiciais que compunham o coletivo, nestes autos errou, e não considerou as circunstâncias por si apuradas e vertidas na matéria de facto que depunham a favor do recorrente, nem sequer teve em conta que, neste exato processo, o arguido foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução e já depois das demais condenações terem tido lugar e transitado em julgado, e nessas circunstâncias o Tribunal a quo logrou ainda fazer um juízo de prognose positivo e por essa razão determinou a suspensão da pena de prisão. Posteriormente nada se alterou, o recorrente não praticou nenhum novo crime, o arguido, aliás conforme resulta do douto Acórdão tem efetivamente cumprido os planos de forma exemplar - como era sua obrigação - em liberdade, o que tudo resulta da matéria dada agora como provada; 11. Reitere-se, quer nos presentes autos, quer no âmbito do cúmulo jurídico anteriormente realizado no âmbito do processo 418/10.0GAFAF em sede de julgamento dos crimes de que o aqui recorrente veio a ser condenado, o Tribunal a quo logrou fazer juízo de prognose favorável, tendo decidido, e bem, suspender a execução da pena, quando, além do mais e conforme supra referido, do registo criminal do arguido já constavam as demais condenações Ainda assim, entendeu o Tribunal suspender a execução da pena de 5 anos de prisão em que foi condenado, nada se tendo alterado desde aí; 12. Sem prescindir, não podemos esquecer que a pena aplicável tem como limite máximo o resultado da soma das penas parcelares concretamente aplicadas aos crimes em concurso, com o limite de 25 anos, e como limite mínimo a mais elevada das penas parcelares aplicadas – cfr. art. 77º, n.º 2, do Código Penal - sendo que no caso concreto a moldura do concurso a considerar (da pena única a aplicar a Ricardo) oscilará entre 3 anos de prisão e os 24 anos, 9 meses e 15 dias de prisão; 13. Contudo e de acordo com a factualidade dada como provada, é nosso entendimento que era possível fazer um mais favorável juízo de prognose positivo, do que aquele que o Tribunal a quo fez; 14. Acresce ainda que o Recorrente é ainda jovem, teve e tem fatores endógenos e exógenos que condicionaram o seu percurso, teve o passado que teve, carece de ter um FUTURO distinto e a possibilidade de continuar no caminho que vem seguindo nos últimos anos, mantendo o percurso conforme ao direito que encetou, com apoio da namorada e dos pais que o apoiam; 15. Em reclusão, em cumprimento de pena, para além de ver coartado um futuro e um caminho de retidão e honestidade que tem pela frente, irá tomar contacto com a realidade das prisões que poderá vir a ter uma influência perniciosa e contrária aos interesses de reinserção social que o nosso ordenamento institui, e deixará de contar com o apoio psiquiátrico de que carece, e poderá a reclusão e o habitat prisional e a tensão que ali se vivencia ser um gatilho para um comportamento disforme; 16. Efetivamente, a liberdade é um dos valores, senão o mais importante da existência humana. Pela sua possibilidade muitos homens se submeteram e submetem à...

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