Acórdão nº 163/14.8GAMGD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: 1 - RELATÓRIO Nestes autos de processo comum, com a intervenção do Tribunal Singular, nº. 309/12.0TBCBT.G1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Guimarães – Juízo Central de Competência Criminal – J4, foi proferida sentença em 20/03/2017, depositada no dia seguinte, condenando a arguida/demandada Maria: - Pela prática, em autoria material, de dois crimes de difamação agravada p. e p. pelos artigos 180º, nº. 1 e 183, nº. 2, ambos do Código Penal, na pena de 250 dias de multa, por cada um dos crimes e em cúmulo jurídico na pena de 375 dias de multa, à taxa diária de €6,00, perfazendo a multa global de €2.250,00: e - No pagamento de indemnização, por danos morais, aos demandantes Rui e Manuela, sendo no montante de €1.000,00 ao primeiro e de €750,00 ao último; - A publicar a expensas suas, ao abrigo do disposto no artigo 189º, nº. 1, do Código Penal, o teor do dispositivo da sentença, no jornal “X”, em formato papel e em formato online, no prazo de vinte dias a contar do trânsito em julgado da sentença.

Inconformada com o decidido, a arguida Maria interpôs recurso, apresentando a respetiva motivação e formulando, a final, as conclusões que seguidamente se transcrevem: I.

A PRESENTE SENTENÇA É NULA POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO N.º 10 DO ART.113.º DO C.P.PENAL O QUAL ESTABELECE QUE QUE A DESIGNAÇÃO DE DIA PARA JULGAMENTO E PARA A SENTENÇA/ACÓRDÃO SÃO OBRIGATORIAMENTE NOTIFICADAS TAMBÉM AO ADVOGADO DOS ARGUIDOS, COM A EXPRESSA RESSALVA DE QUE O PRAZO PARA O ATO PROCESSUAL SUBSEQUENTE SÓ SE INICIA COM A COMUNICAÇÃO EFETUADA EM ÚLTIMO LUGAR; II.

A PRESENTE DECISÃO É POIS NULA, FICANDO TODO O PROCESSO DESDE A NOTIFICAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO EIVADO DE TAL VICIO, QUER POR VIA DE ILEGALIDADE QUER PELA SUA MANIFESTA INCONSTITUCIONALIDADE.

III.

A VIOLAÇÃO DAS NORMAS SUPRA REFERIDAS FEZ AINDA O TRIBUNAL “A QUO” INCORRER NA VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO N.º 1 DO ART.32.º DA CRP APLICÁVEL DIRETAMENTE POR FORÇA DO ART.18.º, N.º 1 DO MESMO SUPREMO DIPLOMA, O QUE É AINDA MAIS GRAVE SE ATENDERMOS AO FACTO DO TRIBUNAL “A QUO” TER PROMOVIDO UMA ALTERAÇÃO DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA, SEM QUE AO ARGUIDO TENHA SIDO, LEGALMENTE, CONCEDIDA OPORTUNIDADE DE DEFESA.

IV.

O DIREITO AO CONTRADITÓRIO E DE DEFESA TEM CONSAGRAÇÃO CONSTITUCIONAL (ART. 32.º N.º 5 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUES

  1. E SIGNIFICA QUE “NENHUMA PROVA DEVE SER ACEITE EM AUDIÊNCIA, NEM NENHUMA DECISÃO DEVE SER TOMADA PELO JUIZ, SEM QUE PREVIAMENTE TENHA SIDO DADA AMPLA E EFETIVA POSSIBILIDADE AO SUJEITO PROCESSUAL SE PRONUNCIAR SOBRE A MESMA.

    V.

    DEVE POIS A PRESENTE DECISÃO CONSIDERAR-SE NULA POR FALTA DE NOTIFICAÇAO À ARGUIDA DA DATA DE LEITURA DA SENTENÇA; VI.

    ACRESCE AINDA, VENERANDOS SENHORES DESEMBARGADORES, QUE A DECISÃO ORA SINDICADA PELA NÃO CONSIDEROU ASSENTES FACTOS QUE PERMITAM IMPUTAR À ARGUIDA A PRATICA DE QUALQUER ILICITO; NA VERDADE UMA LEITURA RÁPIDA DA DECISÃO SOB RECURSO PERMITE CONCLUIR QUE ESTA NÃO IMPUTA À ARGUIDA MARIA QUALQUER FACTO, LIMITANDO-SE A FAZER VERTER NOS AUTOS ELEMENTOS QUE CONSIDERA ASSENTES, ISTO É; VII.

    POR FORMA A QUE À ARGUIDA MARIA FOSSE POSSÍVEL IMPUTAR O CRIME DE DIFAMAÇÃO NECESSÁRIO SERIA DAR-SE COMO PROVADO QUE ESTE IMPUTOU AOS OFENDIDOS, DIRECTA OU INDIRETAMENTE, FACTOS OFENSIVOS DA SUA HONRA E CONSIDERAÇÃO, A FORMA COMO O FEZ E POR QUE MEIOS, SENDO QUE APENAS SE CONSIDEROU PROVADO QUE A NOTÍCIA FOI DIVULGADA EM ÓRGÃO DE COMUNICAÇAO SOCIAL, NADA MAIS CONCLUÍDO OS AUTOS, TAL COMO NÃO CONSIDERARAM ASSENTE QUE AO PARTICIPAR OS FACTOS A ARGUIDA, SABIA QUE OS MESMOS ERAM FALSOS, O QUE ALIÁS NÃO É VERDADE.

    VIII.

    SE A EXISTÊNCIA DA NOTICIA RESPEITANTE AOS OFENDIDOS NUNCA ESTEVE EM DÚVIDA, IMPORTARIA APURAR OS FACTOS QUE LEVARAM À MESMA E QUEM MOTIVOU A SUA DIVULGAÇÃO, ELEMENTOS ESTES QUE NÃO CONSTAM DO PROCESSO, SENDO QUE A ESTE PROPOSITO NADA É IMPUTADO À ARGUIDA; IX.

    O TRIBUNAL “A QUO” TÃO POUCO ESCLARECE SE A CONDUTA IMPUTADA À ARGUIDA RESPEITA À IMPUTAÇÃO EM PROCESSO CRIME DE TAIS COMPORTAMENTOS OU AO FACTO DESTES COMPORTAMENTOS TEREM SIDO ALVO DE NOTICIA, LEVANDO A QUE, SEM EXPLICAR, OBTENHA CONCLUSÃO SEM SUSTENTAÇÃO NA MATÉRIA DE FACTO ASSENTE; X.

    DAQUI DECORRE QUE CONCLUIR A SIMPLES PROVA DOS FACTOS ATRÁS INDICADOS – PONTOS 1.º A 27.º DA MATÉRIA DE FACTO ASSENTE – NÃO PERMITE IMPUTAR À ARGUIDA A PRATICA DE QUALQUER ILÍCITO CRIMINAL PADECENDO A PRESENTE DECISÃO DO VÍCIO DE INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA PARA A BOA DECISÃO DA CAUSA; XI.

    PELO EXPOSTO, É MANIFESTO QUE A SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA, PADECE DO VÍCIO DE INSUFICIÊNCIA DOS FACTOS PARA A DECISÃO RECORRIDA, VÍCIO PREVISTO NO ARTIGO 410º, Nº 2, ALÍNEA

  2. DO CPP, PORQUE ASSENTA EM FACTOS QUE, POR NÃO TEREM QUALQUER RELEVÂNCIA PENAL, SÃO INSUSCEPTÍVEIS DE PREENCHER O TIPO LEGAL DE CRIME PELO QUAL O ARGUIDO VEM ACUSADO; XII.

    PADECE ASSIM A DECISÃO SINDICADA DOS VÍCIOS DE INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO MATÉRIA DE FACTO PROVADA, CFR. ARTIGO 410.º N.º 2

  3. E ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA, CFR. ARTIGO 410.º N.º 2 C), AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, VÍCIOS QUE SE REQUER SEJAM DECLARADOS; XIII.

    AOS VICIOS ATRÁS SINDICADOS ACRESCE AINDA O VICIO DECORRENTE DA EXISTENCIA DE UMA ACUSAÇÃO QUE NÃO RESPEITA OS PRESSUPOSTOS LEGAIS; XIV.

    QUANDO O PROCEDIMENTO CRIMINAL DEPENDER DE ACUSAÇÃO PARTICULAR, DO OFENDIDO OU DE OUTRAS PESSOAS, É NECESSÁRIO QUE ESSAS PESSOAS SE QUEIXEM, SE CONSTITUAM ASSISTENTES E DEDUZAM ACUSAÇÃO PARTICULAR – ARTIGO 50.°, N.º 1, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

    XV.

    O CRIME IMPUTADO À ARGUIDA ASSUME NATUREZA DE CRIME PARTICULAR PELO QUE IMPÕE O CÓDIGO DE PROCESSO PENAL QUE A ACUSAÇÃO SEJA FORMULADA PELO ASSISTENTE, SENDO QUE RESULTA DESTES NORMATIVOS QUE A ACUSAÇÃO SERÁ NULA, E COMO TAL MANIFESTAMENTE INFUNDADA, “

  4. QUANDO NÃO CONTENHA A IDENTIFICAÇÃO DO ARGUIDO.”; XVI.

    NO CASO AOS AUTOS A ACUSAÇÃO É PERFEITAMENTE OMISSA QUANTO À IDENTIFICAÇÃO DA ARGUIDA ORA RECORRENTE NÃO CONSTANDO DA MESMA SEQUER O SEU NOME COMPLETO OU SEQUER A SUA FILIAÇÃO, FREGUESIA E CONCELHO DE NATURALIDADE, DATA DE NASCIMENTO, ESTADO CIVIL, PROFISSÃO, RESIDÊNCIA OU SEQUER O LOCAL DE TRABALHO; XVII.

    POR TAL FACTO REQUER A RECORRENTE MARIA QUE ESTE VENERANDO TRIBUNAL CONSIDERE A ACUSAÇÃO MANIFESTAMENTE INFUNDADA POR NÃO CONTER OS ELEMENTOS ESSENCIAIS E OBRIGATÓRIOS XVIII.

    DEVE POIS A ARGUIDA MARIA, PELOS MOTIVOS EXPOSTOS, SER ABSOLVIDA DA PRÁTICA DO CRIME DE QUE VEM ACUSADA, O QUE SE REQUER.

    TERMOS EM QUE E NOS MAIS DE DIREITO, CONCEDENDO-SE INTEGRALMENTE PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO, FARÃO V. EX.AS, VENERANDOS SENHORES JUÍZES DESEMBARGADORES, A IMPETRADA JUSTIÇA! O Ministério Público, junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso, nos termos constantes a fls. 595 a 605, que aqui se dão por reproduzidos, formulando, a final, as seguintes conclusões: 1. A ora recorrente foi regularmente notificada da data da leitura da sentença, em prazo e não apresentou qualquer justificação para a sua falta; 2. A Ilustre Mandatária da mesma também foi notificada, o que se comprova se atendermos ao requerimento do dia 15 de Março de 2017; 3. A falta da arguida regularmente notificada, não é motivo para não prosseguir com a audiência, pelo que, assegurando o seu direito de defesa, foi-lhe nomeada uma Advogada para o efeito; 4. A alteração da qualificação jurídica foi formalmente comunicada à Advogada nomeada em sede própria e nada foi requerido; 5. Assim, não existe qualquer nulidade por falta de notificação da arguida, ora recorrente, da sentença proferida; 6. A prova produzida e que serve de fundamento para a condenação da arguida, ora recorrente, está bem explanada na D. Sentença recorrida; 7. Dúvida não há de que, a matéria indiciária da factualidade dada como provada, é suficiente; 8. A identificação da arguida na acusação particular, onde se consta o nome completo da mesma, não foi levantada aquando do requerimento de abertura de instrução, pelo que se consolidou esta irregularidade, uma vez que a arguida está identificada na íntegra nos autos, não havendo dúvidas quanto à pessoa em causa.

    9. Não havendo, assim, lugar a revogação e substituição da sentença condenatória da Arguida, pelos motivos explanados.

    Pelo exposto, concluímos que a douta decisão recorrida não violou qualquer dispositivo legal, mostrando-se justa e adequada, pelo que deve ser mantida nos seus precisos termos.

    Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu, a fls. 614 a 617, parecer, pronunciando-se no sentido de o recurso dever merecer provimento quanto à invocada nulidade insanável, que importará declarar, tendo em conta o disposto nos artigos 332º, nº. 1 e 119º, al. c), do C.P.P., porquanto o dia em que se presume efetuada a notificação à arguida coincide com a data designada para a audiência, não podendo assim, considerar-se eficazmente concretizada a notificação.

    Cumprido o disposto no nº. 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, não houve resposta.

    Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência. Cumpre agora apreciar e decidir: 2 – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Delimitação do objeto do recurso: Constitui jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada pelo recorrente (artigos 403º e 412º, nº 1 in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões que importe conhecer, oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito.

    No caso vertente e vistas as conclusões dos recursos em apreciação interposto pelo arguido, as questões suscitadas são as seguintes: – Nulidade por falta de notificação da arguida, ora recorrente, da data designada para a leitura da sentença; – Violação do direito de defesa e do direito ao contraditório (artigos 32º, nº. 1 e 18º, nº. 1, ambos da CRP) por o tribunal ter determinado a alteração da qualificação jurídica dos factos, sem que à arguida tenha sido concedida a oportunidade de defesa; – Insuficiência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT