Acórdão nº 6917/16.3T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução10 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: José intentou a presente acção declarativa comum contra “Banco A, S.A.” pedindo a condenação do réu a restituir ao autor a quantia de € 59.277,81, bem como os juros à taxa de 6,25% contados desde 12.07.20112 até integral pagamento.

Mais pediu a condenação do réu no pagamento da quantia de € 10.000,00 a título de dano não patrimonial.

Para tanto e em suma alegou que em Julho de 2012, por lhe ter sido dito pelo funcionário do Réu que, para clientes com montantes superiores a 50.000 €, tinha um depósito a prazo, pelo período de 4 anos, vencendo juros à taxa de 6,25%, sem qualquer risco de capital ou de juros, e que ele o poderia movimentar quando quisesse, entregou o montante de 59.277,81 € para a constituição de um depósito naquelas condições, não lhe tendo sido lido nem explicado o teor de qualquer documento, nem nenhum documento lhe tendo sido entregue.

Contudo, na data de vencimento (27.07.2016), quando pretendeu aceder aos valores que tinha, segundo cria, colocado num depósito a prazo, percebeu que afinal estava em causa um produto bem distinto, ações da “Telecomunicações Internacional Finance B.V.”, e que as ditas ações estavam bloqueadas, não lhe tendo sido disponibilizado o valor que entregara e/ou os respectivos juros.

Mais alegou que foi iludido e enganado pelo Réu, já que o produto em questão não correspondia, de todo, ao que pretendia, apenas tendo efectuado o negócio por estar convicto de que se tratava de um depósito a prazo e que, por força da não disponibilização das verbas na data de vencimento, tem andado num estado de grande ansiedade e preocupação, devendo receber uma compensação de € 10.000,00 a título de dano não patrimonial.

Na sua contestação, o Réu confirmou que o Autor é titular de uma conta bancária aberta no Banco A, com o nº …, e que em Julho de 2012 aquela conta foi debitada pelo montante de € 59.000,00, movimento este que correspondeu ao débito do custo da subscrição de 59 unidades, do valor de 1.000,00 € cada, de "Obrigações Telecomunicações taxa fixa 2012/2016 6,25 %", dizendo, porém, ter sido o Autor quem, em Julho de 2012, deu ao Banco instruções para assim proceder.

Segundo as suas condições de emissão, a Telecomunicações Internacional Finance B.V. obrigou-se a reembolsar as obrigações aos subscritores, pelo seu valor nominal, de uma só vez, em 26 de Julho de 2016, tendo assim este investimento uma maturidade de quatro anos (26.07.2012 a 26.07.2016).

Esta obrigação de reembolso assumida pela Telecomunicações está dependente da sua solidez, pelo que, por definição, nenhum produto financeiro tem capital garantido, por muito que as entidades emitentes se constituam na obrigação de reembolsar o capital investido.

Quando este produto financeiro foi colocado no mercado, com a devida autorização da CMVM e do Banco de Portugal, o Autor mostrou-se interessado na sua subscrição, dispondo-se a fazê-lo com parte do montante que se encontrava a crédito da conta de que era titular, mais propriamente € 59.000,00.

Na circunstância, o funcionário do Banco que atendeu o Autor explicou-lhe as características do investimento acima enunciadas, o Autor ficou agradado com as características do produto e decidiu realizar o investimento.

Aliás, não foi a única vez que o Autor investiu em aplicações financeiras, tendo investido no passado em acções do fornecedor de electricidade e do Banco P.

De todo o modo, alegou o Réu, na medida em que, na sequência de um questionário, o Autor foi classificado como “investidor não profissional”, o mesmo assinou um documento onde atestava sob compromisso de honra que pretendia adquirir o referido produto; que o réu lhe solicitou e este prestou toda a informação sobre os seus conhecimentos e experiência em matéria de investimento e /ou sobre o seu património e que o Banco B o advertiu expressamente para o facto de não considerar a operação adequada ao seu perfil de cliente.

Contudo, o autor ainda assim quis investir e atestou que “(i) possui a experiência e conhecimentos necessários para compreender os riscos envolvidos, os quais constam, em síntese, de suporte duradouro já fornecido pelo Banco B, e que o seu património lhe permite suportar financeiramente quaisquer riscos conexos de investimento e que a operação/produto/serviço está em coerência com os seus objectivos de investimento;(…) que conhece, compreende e aceita as Condições Gerais de contas de registo e depósito de instrumentos financeiros e de intermediação financeira em vigor no Banco B para a prestação deste serviço e todos os anexos às mesmas, designadamente a política de execução de ordens, constante do Anexo I, com a qual concorda.

Por conta deste produto o Autor já recebeu a quantia de € 9.006,34, relativa a juros.

Sucedeu contudo que na data de vencimento da obrigação de reembolso aos titulares das obrigações do valor nominal que haviam investido, ou seja, no dia 26 de Julho de 2016, a Telecomunicações International Finance B.V não cumpriu essa obrigação, porquanto no dia 21 de Junho de 2016 a CMVM deliberou a suspensão da negociação das obrigações “Obrigações Telecomunicações Taxa Fixa 2012/2016” até à divulgação de informação relevante relativa ao processo de recuperação judicial das Empresas Telecomunicações X, apresentado no dia 20 de Junho.

Esta suspensão veio a ser prorrogada pela CMVM no dia 18 de Julho de 2016 com o mesmo fundamento e mantém-se em vigor no presente.

Assim, as obrigações de que o Autor é titular mantêm-se em carteira, embora suspensas, não sendo possível neste momento aferir-se se e quando e por que montante serão elas reembolsadas – donde, não há ainda dano.

Por excepção alegou que mesmo que alguma responsabilidade do Banco pudesse existir, ela estaria necessariamente prescrita à luz do disposto no art. 324º do CVM Isto porque o Autor desde a data da subscrição das obrigações em causa nos autos que tem conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos.

De resto, ao longo dos mais de quatro anos que mediaram a subscrição do produto em questão e a propositura da presente acção, o Autor recebeu mensalmente o extracto combinado da conta nº …, que o Banco lhe enviou, onde vem descrita e bem identificada, num capítulo reservado a “carteira de títulos” a aplicação em causa.

Nessa medida, seria abusivo o exercício de qualquer direito relativo a este negócio, se direito se considerasse existir.

Na audiência prévia, o Autor, para além do mais, defendeu a integração da operação em causa no exercício da atividade de intermediação financeira, mais defendendo que, não obstante haver que ponderar se se deve efetuar o enquadramento da responsabilidade do intermediário financeiro no âmbito da responsabilidade delitual ou obrigacional, o por ele alegado sobre a atuação do Banco Réu não pode deixar de ser interpretado como um compromisso contratual, por parte daquele para com o Autor, no sentido de garantir o reembolso do capital e juros na data de vencimento; quanto à invocada prescrição, defendeu que, estando em causa uma culpa grave do Réu, não é aplicável o prazo previsto no art. 324º, nº 2, do CVM, mas sim o previsto no art. 309º do Cód. Civil; por último, relativamente ao abuso de direito, argumentou que não pode imputar-se-lhe qualquer comportamento que legitimamente pudesse criar no Banco Réu a ideia de que não exerceria o direito a ser indemnizado.

*Efetuado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, condenando o Réu no pagamento da quantia de € 60.564,43 (sessenta mil, quinhentos e sessenta e quatro euros e quarenta e três cêntimos), correspondente a € 59.277,81 (cinquenta e nove mil, duzentos e setenta e sete euros e oitenta e um cêntimos) a título de capital e € 1.286,62 (mil, duzentos e oitenta e seis euros e sessenta e dois cêntimos) a título de juros vencidos em Julho de 2016 e no pagamento da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) a título de dano não patrimonial.

*Inconformado, o Réu interpôs o presente recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: 1ª) Não pode o Banco Recorrente conformar-se com a sentença recorrida que o condenou a título de responsabilidade civil contratual por, na veste de intermediário financeiro, ter vendido ao Autor obrigações telecomunicações sem, no entanto, o esclarecer que o risco deste produto em relação aos vulgares depósitos a prazo era distinto, ficando este no convencimento de que se tratava de um produto com características idênticas àquele; 2ª) Constituem objecto de impugnação da matéria de facto os pontos 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 12 por entender o Recorrente que os mesmos deviam ter sido considerados não provados, desde logo em virtude das declarações confessórias que constam dos pontos 17, 18 e 19 terem força probatória plena, não tendo sido requerida a nulidade desta confissão por parte do confitente, aqui Autor. Por outro lado e sem prescindir, 3ª) Sustentou o Tribunal a quo a prova do ponto 5 no depoimento de A. C., funcionário bancário que comercializou o produto em causa nos autos ao Autor, depoimento este que, além de se entender que do mesmo não resultou, tal como se admite na fundamentação desta matéria, que este tenha assegurado o que quer que fosse ao Autor, revelou-se parcial e contraditório (Min. 01:47 a 02:44, Min. 02:52 a 04:40, Min. 05:10 a 07:33, Min. 07:51 a 08:04, Min.10:17 a 11:20, Min. 17:23 a 17:45 e Min. 18:40 a 19:19), no confronto com o depoimento de demais testemunhas isentas, nomeadamente a testemunha D. L. (Min 04:51 a 11:05, Min. 18:52 a 26;24, Min. 27:55 a 32:37, Min. 39:09 a 40:12 e Min. 01:11:59 a 01:12:32) e M. (Min. 03:42 a 04:23 d Min. 09:41 a 09:54); 4ª) A não prova dos pontos 6 e 9 fundamenta-se no depoimento da testemunha A. C. (Min.01:47 a 02:44) uma vez que, além do mesmo ter afirmado já ter vendido ao Autor no passado acções, entre outros produtos do “mesmo género”, afirmou ainda não se recordar em concreto da comercialização do produto em causa nos autos, sendo...

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