Acórdão nº 896/16.4T8VRL-I.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DAMI
Data da Resolução17 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

*A Autora Massa Insolvente de Fernando, representada pelo Sr. Administrador de Insolvência, intentou a presente acção de resolução de contrato em benefício da massa, ao abrigo do disposto no artigo 120.º do CIRE, contra Fernando e outros.

No final dos articulados, foi dispensada a realização de Audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, onde, desde logo, se proferiu a seguinte decisão: “O insolvente veio arguir a caducidade do direito de resolução do negócio em benefício da massa insolvente.

De acordo com o preceituado no artigo 123.º, n.º 1, do C.I.R.E., a resolução pode ser efectuada pelo Administrador da Insolvência por carta registada, com aviso de recepção, mas tem vindo a ser entendido que nesse normativo apenas são consagradas as formalidades mínimas para a resolução em benefício da massa insolvente, não obstando ao recurso à via judicial pelo Sr. Administrador da Insolvência(1).

O artigo 123.º, n.º 1, do C.I.R.E., estabelece dois prazos de caducidade, apesar da equívoca redacção da epígrafe do preceito, que alude a prescrição do direito (cfr. artigo 298.º, n.º 2, do Código Civil) (2): - o negócio deverá ser resolvido nos seis meses seguintes ao conhecimento do acto; - a resolução pressupõe que não tenham decorrido mais de dois anos sobre a data da declaração de insolvência.

Posto isto, a insolvência foi declarada em 20/02/2017 (ref. n.º. 30806935), tendo sido expedida em 21/02/2017 a notificação pessoal da nomeação do Sr. Administrador da Insolvência (ref. n.º. 30796888), pelo que este se deverá considerar notificado no dia 24/02/2017 (cfr. artigo 255.º do C.P.C.), data em que assumiu imediatamente as suas funções (cfr. artigo 54.º do C.I.R.E.) o que implicou que apenas nesse momento se poderia iniciar o prazo de caducidade, uma vez até aí o Sr. Administrador da Insolvência não gozava da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 123.º, n.º 1, do C.I.R.E. (cfr. artigo 329.º do Código Civil).

De todo o modo, tem sido jurisprudência maioritária (3) que o prazo de seis meses só deve contar a partir do conhecimento pelo Administrador da Insolvência do acto na sua íntegra e, portanto, dos pressupostos de que depende o exercício do direito de resolução, não sendo suficiente o mero conhecimento do acto ou negócio.

Cumpre também ter presente que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine (cfr. artigo 328.º do Código Civil), apenas impedindo a caducidade a prática, dentro do prazo, do acto a que a lei atribua efeito impeditivo (cfr. artigo 331.º, n.º 1, do Código Civil), o que corresponde, na resolução em benefício da massa insolvente, à recepção da carta enviada pelo Sr. Administrador da Insolvência, ou à citação em processo tendente a obter tal efeito resolutivo (cfr. artigo 219.º, n.º 1, do C.P.C.), pois a declaração de vontade do Sr. Administrador da Insolvência tendente à resolução do negócio é receptícia, apenas sendo eficaz quando dela o destinatário tomou conhecimento (cfr. artigos 224.º, n.º 1 e 295.º do Código Civil) (4).

Dito isto, mesmo admitindo que o Sr. Administrador da Insolvência dispusesse de todos os elementos em data anterior à sua nomeação, como alega o insolvente, o que se encontra ainda controvertido, o prazo de seis meses apenas se iria completar em 24/08/2017 (cfr. artigos 279.º, al. c) e 296.º do Código Civil).

Nesse conspecto verifica-se que a sociedade ré foi citada em 02/08/2017 (ref. n.º 1358177), enquanto o Sr. Administrador da Insolvência requereu a citação edital do insolvente em 22/08/2017 (ref. n.º 1366303), mas o processo apenas foi concluso em 25/08/2017 (ref. n.º 31346077), data em que foi ordenada a realização da citação edital e também foi publicado o respectivo anúncio (ref. n.º 31346894), pelo que o insolvente se considera citado em 25/08/2017 (cfr. artigos 240.º, n.º 1 e 242.º, n.º 1, do C.P.C.).

Sucede, porém, que decorre da aplicação conjugada dos artigos 156.º, n.º 3 e 162.º, n.º 1, do C.P.C., que os requerimentos em processos urgentes, como o presente (cfr. artigo 9.º, n.º 1, do C.I.R.E.), devem ser conclusos e despachados no prazo máximo de 2 dias (5), o que não ocorreu, não podendo as partes ser prejudicadas pelas omissões da Secretaria (cfr. artigo 157.º, n.º 6, do C.P.C.), uma vez que a citação edital poderia e deveria ter sido efectuada até ao dia 24/08/2017, ao ter sido requerida dois dias antes.

Nesta decorrência, independentemente da materialidade que se encontra controvertida, conclui-se que o Sr. Administrador da Insolvência logrou impedir a caducidade do direito de resolução, e, nessa conformidade, conclui-se pela improcedência de tal defesa exceptiva”.

*Recorreu desta decisão, o Recorrente concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES

  1. O prazo de seis meses constante no artigo 123º do CIRE, e não obstante a sua epígrafe, deve ser tido como um prazo de caducidade, não lhe são aplicáveis as regras de suspensão e da interrupção da prescrição.

  2. Tal prazo começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido – artigo 329º do CC.

  3. No caso vertente a lei estipula que o prazo conta-se a partir do conhecimento do ato que se pretende resolver - artigo 123º do CIRE.

  4. No que concerne ao alcance e abrangência de tal “conhecimento”, deve entender-se que ele se reporta ao conhecimento, pelo administrador da insolvência: das partes nele intervenientes, da sua data, do seu objecto e das obrigações dele resultantes para cada uma das partes, e não desde o conhecimento do ato na sua íntegra e, portanto, dos pressupostos que podem fundamentar a resolução.

  5. Em concreto, não pode deixar de haver um momento exacto passível de ser enunciado e absolutamente subtraído à disponibilidade do Administrador da Insolvência que, exercendo com zelo as suas funções, fica a partir do momento em que é investido nas mesmas (art. 54º do CIRE) investido, também, do conhecimento de todos os elementos que lhe permitem exercer cabalmente a função, nomeadamente, os que respeitem a negócios lesivos para a massa passíveis de resolução.

  6. Assim, o prazo de seis meses do artigo 123º inicia após a nomeação do Administrador de Insolvência.

  7. A resolução, como declaração de vontade, a operar, no caso, mediante comunicação legalmente tabelada, é uma declaração receptícia, cuja eficácia depende do conhecimento do destinatário só impedindo a caducidade a prática, dentro do prazo legal de 6 meses, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo (artº 331º, nº 1 do CC).

  8. Assim sendo, no caso vertente, só impediria a caducidade do direito de resolução, a citação do Réu, ora recorrente, dentro do referido prazo de seis meses, isto é até ao dia 24/08/2017.

  9. Ora, tendo a citação sido efectuada por edital no dia 25/08/2017, a saber no dia seguinte à apresentação do requerimento do AI a solicitar, com urgência, a citação edital do insolvente, não logrou o Sr. Administrador da Insolvência impedir a caducidade do direito de resolução.

  10. O Tribunal “ a quo” ao considerar que o AI, ao requerer com urgência a citação edital do insolvente, no último dia de prazo de que dispunha para impedir a caducidade do direito de resolução do negócio a favor da massa insolvente – isto é, no dia 24/08/2017, pelas 16h42min. –, citação essa que veio a concretizar-se no dia seguinte – isto é, um dia após o término do prazo de caducidade (25/08/2017), havia logrado impedir a invocada caducidade, fez uma errada interpretação dos factos originando, consequentemente, uma errada aplicação do direito, e violou, entre outros, os artigos 123º do CIRE, 323º, 328º e 329º do Código Civil e 157º, n.º 6 e 561º do C.P.C.

    Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve conceder-se provimento ao presente recurso, ordenando-se a revogação do douto despacho saneador na parte em que concluiu pela improcedência da excepção de caducidade do direito de resolução do negócio a favor da massa insolvente, substituindo-o por outro que julgue procedente a excepção de caducidade arguida pelo ora recorrente, seguindo os autos os ulteriores termos legais.,”*Foram apresentadas contra-alegações pelo Sr. Administrador de Insolvência, onde pugna pela improcedência do Recurso apresentando as seguintes conclusões: “

  11. O douto despacho ora recorrido, que julgou improcedente a excepção de caducidade do direito de resolução do negócio em benefício da massa insolvente não enferma de vício algum; B) O apelante pretende que o prazo de caducidade a que alude o art. 123º do CIRE, se inicie da data em que o Administrador de...

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