Acórdão nº 8893/08.7 TBCSC-B.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelTERESA PARDAL
Data da Resolução15 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO.

Por apenso à acção de divórcio litigioso que AB… intentou contra CB…, veio a autora intentar contra o réu acção de atribuição de casa de morada de família, alegando, em síntese, que casou com o requerido em 1987, desse casamento tendo nascido três filhos, sendo a casa de morada de família aquela onde reside actualmente com os três filhos, depois de o requerido daí sair em 2010 e que foi comprada com dinheiro proveniente de sociedades de que a requerente e o requerido são sócios.

Mais alegou que o requerido é arquitecto e sócio gerente das referidas sociedades e possui uma casa onde está a viver, enquanto a requerente não possui nenhuma outra habitação e não exerce qualquer actividade profissional, nem tem qualquer rendimento, pois o requerido não contribui para as suas despesas domésticas.

Concluiu pedindo para lhe ser atribuída a casa de morada de família.

Foi proferido despacho em 30/10/2012 sobreestando na decisão até ser proferida decisão no processo de divórcio e, posteriormente, em 24/11/2015, foi proferido novo despacho, onde se decide que, apesar de não ter transitado a sentença de divórcio entretanto já proferida, devem os autos prosseguir e marcando tentativa de conciliação para 21/01/2016.

Na tentativa de conciliação não foi possível obter acordo entre as partes e, não tendo comparecido o requerido, foi a sua mandatária notificada para deduzir oposição em dez dias.

A oposição foi apresentada em 22/02/2016, alegando o requerido, em síntese, que a casa de morada de família tem cerca de 470 m2, valor de mercado de 1 000 000,00 euros e é propriedade exclusiva do requerido, pelo que, a ser-lhe atribuída, a requerente teria de pagar renda por inteiro, sendo o valor da renda de 5 000,00 euros.

Mais alegou que os filhos do casal já são todos maiores, encontrando-se os dois mais velhos a trabalhar, pelo que está em causa apenas o interesse da requerente e não dos filhos, sendo certo que o requerido já lhe propôs vender a casa de morada de família, para comprar uma casa com valor até 250 000,00 euros, com condições para habitação da requerente e com espaço para os filhos do casal, o que a requerente recusou.

Alegou ainda que a requerente é interessada em duas heranças, dos seus pais, com vasto património imobiliário e é proprietária de uma quota em armazéns e de uma loja, recebendo rendimentos de ambas, enquanto o requerido, que tem uma filha menor a seu cargo, não tem recebido rendimentos do seu trabalho como arquitecto e vive do produto da venda da casa onde morava, que também serviu para pagar as suas dívidas e reside numa casa onde paga a renda mensal de 1 000,00 euros na expectativa de a conseguir comprar, o que só poderá fazer se puder vender a casa de morada de família, caso em que tem a intenção de comprar à requerente uma casa até 250 000,00 euros para habitação vitalícia.

Concluiu pedindo a improcedência do pedido.

A requerente veio então apresentar requerimento em 21/04/2016, pedindo para ser considerada extemporânea e desentranhada a oposição.

O requerido respondeu, opondo-se, alegando que o requerimento da requerente é extemporâneo, por já terem decorrido dois meses depois da apresentação da oposição e que, na apresentação deste articulado foi considerado o prazo de 30 dias e não de 10 dias, por o primeiro prazo respeitar a situação de processo de divórcio e, à data, ainda não ter transitado a sentença que decretou o divórcio entre as partes, devendo considerar-se que o desentranhamento da oposição contraria os princípios inerentes à natureza de jurisdição voluntária do processo e a sua prioridade na indagação dos factos e havendo ainda, de qualquer forma, que manter nos autos os documentos juntos com a oposição. Procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que se pronunciou quanto à tempestividade da oposição, admitindo-a, e, julgando improcedente a acção, indeferiu o pedido de atribuição da casa de morada de família à requerente.

* Depois de lhe ter sido disponibilizado em 22/05/2017 um CD com a gravação da prova, a requerente, inconformada com a sentença, interpôs recurso e alegou em 12 de Junho de 2017, formulando conclusões com os seguintes argumentos: - Parte relevante da gravação da prova produzida na audiência de julgamento é ininteligível, o que prejudicou o direito de a requerente impugnar a decisão da matéria de facto, o que determina a nulidade de toda a prova gravada e a sua repetição.

- O despacho de 30/10/12 não suspendeu a instância, tendo sido praticados nos autos actos não urgentes, como a tentativa de reconciliação, onde foi determinada a notificação para ser deduzida oposição no prazo de 10 dias, pelo que, não estando suspensa a instância, nem suspensos os prazos judiciais, é intempestiva a oposição, apresentada fora do prazo de 10 dias previsto nos artigos 931º nº5 e 293º nº1, aplicáveis por via do artigo 990 nº2, todos do CPC, nos termos dos artigos 271º nº1 e 275º nº1 do mesmo código.

- O facto de a falta de oposição não ter efeito cominatório pleno nos processos de jurisdição voluntária não implica que possa ser admitida a contestação apresentada fora de prazo, conclusão a que não obsta a dispensa de o tribunal verificar critérios de legalidade estrita nos termos do artigo 987º do CPC, que se refere a critérios de legalidade material e não de critérios de legalidade formal ou processual.

- Ainda que se considere que a instância estava suspensa, os factos praticados no período de suspensão são nulos por não serem urgentes ou destinados a evitar dano irreparável, de acordo com o artigo 275º nº1 do CPC, nulidade de conhecimento oficioso, nos temos do artigo 578º do mesmo código, sendo também nulos os actos posteriores, face à obrigatoriedade de realização da tentativa de conciliação.

- Devem ser considerados não provados os factos dos pontos 29, 30, 31, 33, 35, 36 e 37 da matéria de facto e parcialmente não provados os factos dos pontos 25 e 34 e deve ser considerado provado o ponto 2 dos factos não provados.

- O processo principal de divórcio foi instaurado antes da entrada em vigor da Lei 61/2008 de 31/10, não se aplicando esta lei aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, por isso nos presentes autos de atribuição de casa de morada de família haverá que atender, na ponderação dos interesses a compor na decisão, ao conteúdo da sentença de divórcio, que declarou o requerido como o único cônjuge culpado, interpretando o artigo 1793º do CC à luz do sistema jurídico à data dos factos.

- Resulta dos factos que a requerente tem necessidade da casa para a sua habitação, o que fundamenta a aplicação do artigo 1793º nº1 do CC, já que apenas tem um rendimento de 440,00 euros resultante de parte na renda de uns armazéns, não podendo atender-se à ajuda que o seu irmão lhe tem vindo a prestar, por não constituir uma obrigação, não retirando ainda a recorrente rendimento do imóvel que não conseguiu arrendar, nem das heranças em que é interessada, cuja partilha não depende da sua vontade.

- Por outro lado, o requerido não precisa do imóvel para satisfazer as suas necessidade de habitação e, não ficando provados os factos acima impugnados, também não existe necessidade atendível do recorrido para vender a casa de morada de família.

- Pelo contrário, dos pontos 38 e 39 resulta que o requerido não tem dificuldades económicas, conclusão que não é afastada pelo facto não provado nº5, pois a vida profissional do recorrido é apenas um factor, face à real composição do seu património e da sua situação financeira, não havendo assim fundamento para não atribuir a casa de morada de família à recorrente ao abrigo do referido artigo 1793º.

- Quanto ao interesse dos filhos do casal, mais concretamente da filha CC…, devem ser atendidos os interesses dos filhos maiores, especialmente quando se encontrem em situação de dependência económica, como é o caso desta filha, que ainda não completou a sua formação profissional e reside com a mãe, dependendo economicamente desta.

- A lei 122/015 de 1/9 deve aplicar-se aos presentes autos, apesar de a filha CC… já ter atingido a maioridade antes da sua publicação, havendo que considerar os seus interesses para efeitos do artigo 1793º nº1 do CC.

- Deve ser revogada a sentença recorrida e...

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